Art. 28 - Cível

 

 

Protocolo n. 0039682/10

Autos Judiciais n. 567/2009

Procedimento Verificatório - Pedido de Providências perante o Juízo de Direito da

Infância e da Juventude de São Carlos

 

Ementa:

1) Art. 28 - Cível. Procedimento Verificatório – Pedido de Providências – Juízo da Infância e da Juventude. Possível negativa de intervenção. Magistrado que vislumbra a conveniência do ajuizamento da ação de destituição de pátrio poder. Remessa dos autos à Procuradoria Geral de Justiça, por deliberação do magistrado, para reexame.

2) Divergência que diz respeito à qualidade (modo de intervir) da intervenção, e não quanto a esta. Avaliação que depende de aprofundado exame da conveniência e da oportunidade acerca da adoção de medida extrema, que importa na perda do vínculo da criança com sua família natural, como também por força das relevantes repercussões em sua vida sócio-afetiva.

3) Atuação do parquet, como custos legis, que não se recusou à propositura da ação, mas deliberou acerca do melhor momento para o seu ajuizamento.

4) Recusa inexistente. Devolução dos autos para prosseguimento.

 

1) Relatório

Consta dos autos que a Secretaria de Administração Penitenciária do Estado de São Paulo encaminhou ao Juiz de Direito da Infância e Juventude de Santana solicitação na qual se postula, em caráter de urgência, a internação do menor D.A.S.T., uma vez que a genitora se encontra detida e não dispõe de familiares para abrigá-lo.

De acordo com a decisão de fls. 09, os autos foram remetidos para a Comarca de São Carlos, porque a genitora do menor D.A.S.T. é daquela localidade, onde inclusive tramita procedimento sobre a sua prole na Vara da Infância e Juventude.

No curso do procedimento verificatório, o magistrado oficiante afirmou que o estudo social realizado atestou que a genitora de D.A.S.T. se encontra em situação de vulnerabilidade; determinou, então, nova vista ao membro do Ministério Público. Este, por sua vez, lançou a seguinte manifestação:

“Com as informações contidas nos autos, e considerando que a mãe teve a criança na prisão, não há que se falar em abandono, a legitimar eventual destituição.

O próprio Setor Técnico sugeriu, como alternativa secundária (fls. 30), a continuidade do abrigo e posteriormente a entrega para a genitora, com a assistência de sua irmã.

É verdade que o ST sugere, implicitamente, a adoção, mas não vislumbro, até o momento, circunstâncias que justifiquem a destituição do poder familiar. Por isso a cota de fls. 100, que inclusive, acompanha a linha de sugestão (secundária) do ST.

Diante deste quadro, manifesto-me pela manutenção do acolhimento institucional”(fls. 102).

A Excelentíssimo Juiz de Direito, então, determinou (fls. 103) a remessa dos autos à Procuradoria Geral, por aplicação analógica do art. 28 do CPP, para que seja designado Promotor de Justiça para promover ação de destituição do poder familiar em face dos genitores, entendendo que houve recusa indevida do Ministério Público.

É o relato do essencial.

2) Fundamentação

Inicialmente impõe consignar que a remessa para controle da negativa de intervenção ministerial no feito deve ser conhecida.

É pacífico o entendimento de que, muito embora a independência funcional do Ministério Público, a recusa de intervenção é passível de controle, realizado pelo Procurador-Geral de Justiça, por analogia do art. 28 do Código de Processo Penal. Nesse sentido: Hugo Nigro Mazzilli (Manual do Promotor de Justiça, 2ªed., São Paulo: Saraiva, 1991, p. 537) e Emerson Garcia (Ministério Público, 2ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 73).

De outro lado, os elementos evidenciem que o Ministério Público se recusou a propor ação para o qual é legitimado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, embora não tenha se recusado a intervir no feito, na qualidade de custos legis.

A remessa, portanto, foi para controle da negativa do Promotor de Justiça em tomar a providência vislumbrada pelo Poder Judiciário.

Trata-se, pois, de divergência que diz respeito à qualidade (modo de intervir) da intervenção, e não quanto a esta.

 Essa avaliação, contudo, depende de aprofundado exame da conveniência e oportunidade acerca da adoção de medida extrema, que importa na perda do vínculo da criança com sua família natural, como também por força das relevantes repercussões em sua vida sócio-afetiva, o que pode ser inadequado nesse momento.

Não se nega que o Procurador-Geral de Justiça possa, além de saber se é o caso ou não de intervir, verificar, também, como deve se dar tal intervenção.

Em outras palavras, a qualidade da intervenção Ministerial é questão cuja solução pode ser imprescindível quando a dúvida concreta se apresenta.

No caso concreto, porém, não se pode afirmar, a rigor, que tenha ocorrido a recusa à intervenção ministerial neste feito ou que a intervenção tenha colocado em risco a tutela dos direitos fundamentais das crianças.

Ao contrário, o que se infere dos autos é que a intervenção ministerial vem ocorrendo, e com o necessário zelo.

Com o devido respeito ao entendimento do r. Juízo, diante da atuação do parquet, como custos legis, que não se recusou à propositura da ação, mas deliberou acerca do melhor momento para o seu ajuizamento e, ante o caráter extremo da medida, a melhor solução parece ser a prosseguimento do feito, até que se configure eventual e própria recusa em intervir ou que se evidencie que a atuação poderá comprometer a tutela dos direitos para os quais o Ministério Público foi legitimado a agir.

Registre-se, ainda, que não houve uma discordância expressa quanto à necessidade da medida por parte do órgão ministerial de execução, mas sim quanto ao momento mais adequado à propositura da ação de destituição do poder familiar. Tanto é assim que a manifestação de fls. 102 assenta que “até o momento” não se justificava a propositura de demanda de destituição do poder familiar.

Se, por um lado, o princípio hierárquico que anima toda e qualquer organização administrativa – inclusive o Ministério Público – justifica o controle quando da indevida negativa de atuação do membro do parquet, é necessário que esta reste devidamente caracterizada, sob pena de configuração da usurpação de atribuição e conseqüentemente da própria independência funcional, princípio institucional assentado no art. 127, § 1º da CR/88.

3) Decisão

Diante do exposto, e por analogia ao disposto no art. 28 do Código de Processo Penal, conheço da remessa, e deixo, pelo menos por ora, de acolher as ponderações formuladas pelo MM. Juiz de Direito, restituindo os autos ao juízo de origem para o prosseguimento.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Registre-se.  Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 31 de março de 2010.

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

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