Art. 28 - Cível

 

Protocolo n. 0129956/09

Autos Judiciais n. 177/06

Procedimento Verificatório - Pedido de Providências perante o Juízo de Direito da

Infância e da Juventude da Comarca de Tremembé

 

 

Ementa:

1) Art. 28 - Cível. Procedimento Verificatório – Pedido de Providências – Juízo da Infância e da Juventude. Pedido de diligências lançado nos autos. Possível negativa de intervenção. Magistrado que vislumbra a conveniência do ajuizamento da ação de destituição de pátrio poder – Remessa dos autos à Procuradoria-Geral de Justiça, por deliberação do magistrado, para reexame.

2) Remessa para controle da negativa do Promotor de Justiça em tomar a providência vislumbrada pelo Poder Judiciário.

3) Divergência que diz respeito à qualidade (modo de intervir) da intervenção, e não quanto a esta. Avaliação que depende de aprofundado exame da conveniência, oportunidade acerca da adoção de medida extrema, que importa na perda do vínculo da criança com sua família natural, como também por força das relevantes repercussões em sua vida sócio-afetiva.

4) Atuação do parquet, como custos legis, que não se recusou à propositura da ação, mas deliberou acerca do melhor momento para o seu ajuizamento.

5) Recusa inexistente. Devolução dos autos para prosseguimento.

 

Tratam estes autos de Pedido de Providências/Procedimento Verificatório que tramita perante o Juízo de Direito da Infância e da Juventude da Comarca de Tremembé, iniciado após notícia de abrigamento de crianças formulada pelo Conselho Tutelar da Comarca.

Os elementos de convicção que constam dos autos informam que a Nobre Magistrada da Comarca, após concluir que restou evidenciada a negligência dos pais na criação dos menores J.V.B.L., J.B.L., R.B.L., R.B.L e V.B.S.L., devido a ausência de interesse e de condições, somada à deficiência de políticas públicas efetivas de amparo, determinou a manifestação do Ministério Público sobre a possibilidade de ajuizamento da ação de destituição do poder familiar em relação aos irmãos.

Entendimento manifestado pela I. Magistrada no sentido de que, respeitada a livre convicção do representante do Ministério Público, a propositura da ação atenderia os princípios da economia processual e da celeridade (fls. 331/333).

Em sua manifestação (fls. 335/336), o Nobre Promotor de Justiça consignou que, “em que pesem as considerações (...), entendo que, por ora, não é o caso de ajuizar ação de destituição de poder familiar, uma vez que, a meu ver, antes de tal providência, é imperioso que se tenha, ao menos, uma provável definição da situação dos menores, que, por primeiro, deverão ser colocados em família substituta, mediante a concessão de guarda, como ocorrem com os irmãos J.V e V., para, após, ser verificada a viabilidade de eventual adoção. Nesta hipótese, é que os genitores deverão, efetivamente, ser destituídos do poder familiar, o que poderá ser providenciado pelo Ministério Público, como também pelos eventuais adotantes que, por primeiro, tiveram a guarda, pro meio de formulação de pedido de adoção cumulado com a devida destituição.

Justifico tal entendimento, que, aliás, já é de conhecimento deste juízo, com base no fato de que, não sendo viável a adoção após o término da ação de destituição do poder familiar, o menor ficará sem nenhum vínculo de parentesco, o que, certamente, poderá lhe causar sérios prejuízos.

Assim, se por um lado é certo que há certa preferência, por parte dos inscritos no cadastro da Vara ou de CEJAI, em acolher quem já tenha sido desligado de seu família natural, de outra parte é igualmente incontroverso que não atende aos interesses do menor deixá-lo sem nenhum vínculo de parentesco sem que se tenha uma real possibilidade de colocá-lo em família substituta”.

A Excelentíssimo Juíza de Direito, então, determinou (fls. 341) a remessa dos autos à Procuradoria-Geral, por aplicação analógica do art. 28 do CPP, para que seja designado Promotor de Justiça para promover ação de destituição do poder familiar em face dos genitores, entendendo que houve recusa indevida do Ministério Público.

É o relato do essencial.

Inicialmente impõe consignar que a remessa para controle da negativa de intervenção ministerial no feito deve ser conhecida.

É pacífico o entendimento de que, em pese a independência funcional do Ministério Público, a recusa de intervenção é passível de controle, realizado pelo Procurador-Geral de Justiça, por analogia do art. 28 do Código de Processo Penal. Nesse sentido: Hugo Nigro Mazzilli (Manual do Promotor de Justiça, 2ªed., São Paulo: Saraiva, 1991, p. 537) e Emerson Garcia (Ministério Público, 2ª ed., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 73).

De outro lado, os elementos evidenciem que o Ministério Público se recusou a propor ação para o qual é legitimado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, embora não tenha se recusado a intervir no feito, na qualidade de custos legis.

A remessa, portanto, foi para controle da negativa do Promotor de Justiça em tomar a providência vislumbrada pelo Poder Judiciário.

Trata-se, pois, de divergência que diz respeito à qualidade (modo de intervir) da intervenção, e não quanto a esta.

Essa avaliação, contudo, depende de aprofundado exame da conveniência e oportunidade acerca da adoção de medida extrema, que importa na perda do vínculo da criança com sua família natural, como também por força das relevantes repercussões em sua vida sócio-afetiva, o que pode ser inadequado nesse moemnto.

Não se nega que o Procurador-Geral de Justiça possa, além de saber se é o caso ou não de intervir, verificar, também, como deve se dar tal intervenção.

Em outras palavras, a qualidade da intervenção Ministerial é questão cuja solução pode ser imprescindível quando a dúvida concreta se apresenta.

No caso concreto, porém, não se pode afirmar, a rigor, que tenha ocorrido a recusa à intervenção ministerial neste feito ou que a intervenção tenha colocado em risco a tutela dos direitos fundamentais das crianças.

Ao contrário, o que se infere dos autos é que a intervenção ministerial vem ocorrendo, e com o necessário zelo.

Portanto, com o devido respeito ao entendimento do r. Juízo, diante da atuação do parquet, como custos legis, que não se recusou à propositura da ação, mas deliberou acerca do melhor momento para o seu ajuizamento e, ante o caráter extremo da medida, a melhor solução parece ser a prosseguimento do feito, até que se configure eventual e própria recusa em intervir ou que se evidencie que a atuação poderá comprometer a tutela dos direitos para os quais o Ministério Público foi legitimado a agir.

Registre-se, ainda, que não houve uma discordância expressa quanto à necessidade da medida por parte do órgão ministerial de execução, mas sim quanto ao momento mais adequado à propositura da ação de destituição do poder familiar.

Se, por um lado, o princípio hierárquico que anima toda e qualquer organização administrativa – inclusive o Ministério Público – justifica o controle quando da indevida negativa de atuação do membro do parquet, é necessário que esta reste devidamente caracterizada, sob pena de configuração da usurpação de atribuição e consequentemente da própria independência funcional, princípio institucional assentado no art. 127, § 1º da CR/88.

Diante do exposto, e por analogia ao disposto no art. 28 do Código de Processo Penal, conheço da remessa, e deixo, pelo menos por ora, de acolher as ponderações formuladas pelo MM. Juiz de Direito, restituindo os autos ao juízo de origem para o prosseguimento.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Registre-se.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 3 de novembro de 2009.

 

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

 

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