Recusa de Intervenção

 

Protocolado nº 103.476/2017

(Autos nº 0008321-47.2003.8.26.0510)

Interessado: Juízo de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Rio Claro

Objeto: Ação de Interdição

                       

 

Ementa:

1)      Ação de Interdição. Provocação judicial em virtude de entendimento do órgão ministerial, nos autos do processo de interdição, no sentido de que não seria necessária propositura de ação para a declaração de nulidade de alienação realizado pela interdita, após a sentença de interdição.

2)      Não se trata de recusa de intervenção, mas de divergência acerca da necessidade de propositura de ação para declaração de nulidade de ato jurídico (compra e venda de imóvel) realizado por pessoa já interdita.

3)      Assim sendo, compete ao Juiz de Direito decidir se a nulidade da avença pode ou não ser declarada nos autos da interdição, podendo recorrer o Ministério Público, e sobre a qual o Procurador-Geral de Justiça não pode intervir.

4)      Remessa não conhecida.

 

 

 

 

1.   Relatório

Em ação de interdição já julgada procedente, à vista de notícia de realização de negócio jurídico (alienação de imóvel) pela interdita após a decretação de sua interdição, determinou o MM Juiz da 2ª Vara Cível da Comarca de Rio Claro que o Ministério Público manifestasse se pretendia propor ação para anulação do negócio jurídico, haja vista existência de colidência de interesses do Curador com a interdita (fl. 813/184).

Foi então lançada nos autos manifestação do Ministério Público no sentido de que em virtude da natureza jurídica da sentença de interdição a invalidade do negócio jurídico celebrado posteriormente poderia ser reconhecida no próprio processo de interdição (fls. 210/212).

Sob o entendimento de que a anulação requer propositura de ação própria, o MM. Juiz determinou nova manifestação do Ministério Público para informar se iria propor a referida ação, com comprovação em 30 dias (fl. 213).

O Ministério Público manteve o entendimento no sentido de que a nulidade poderia ser reconhecida de ofício nos autos da interdição, reiterando fosse declarado nulo o negócio jurídico praticado (fls. 215/216).

Argumentando que a sentença de interdição só teria sido averbada no assento do registro civil da interdita após a venda em questão e entendendo ser imprescindível a ação autônoma para o reconhecimento da nulidade, o MM Juiz novamente determinou a manifestação do Ministério Público para esclarecer se mantinha o posicionamento anterior (fl. 217).

O Ministério Público sustentando que é a sentença de interdição que constitui a incapacidade e não sua averbação, reiterou as manifestações anteriores afirmando que caberia ao Juiz nos termos do art. 168, parágrafo único do Código Civil declarar a nulidade do negócio jurídico (fls. 219/220).

É o breve relatório.

2. Fundamentação

Não está caracterizada a recusa de intervenção.

O ponto controvertido nos autos do processo de interdição refere-se a necessidade ou não de propositura de ação para o reconhecimento de nulidade de negócio jurídico (alienação de imóvel), realizado pela interdita após a sentença de interdição.

Tanto o Ministério Público quanto o MM .Juiz concordam acerca da nulidade do negócio jurídico. O primeiro entende que a nulidade pode ser declarada nos próprios autos de interdição, enquanto que o segundo entendendo ser imprescindível ação autônoma pretende, através da presente remessa, em analogia ao art. 28 do Código de Processo Penal, que a questão seja dirimida impondo ao órgão do Ministério Público eventual propositura da ação.

Não há propriamente recursa de intervenção por parte do órgão do Ministério Público que legitime a aplicação por analogia do art. 28 do CPP, mas divergência acerca da medida adequada para a declaração de nulidade de negócio jurídico realizado pela interdita após a sentença de interdição.

Não há possibilidade que, por esta via o Procurador Geral de Justiça, ingresse no mérito da questão e determine a forma adequada de agir para a tutela dos interesses do incapaz. Trata-se de matéria sujeita a discricionariedade do órgão ministerial dentro de sua independência funcional.

Assim, houve nos autos do processo requerimento do Ministério Público no sentido de se declarar a nulidade do negócio jurídico realizado pela interdita. Esta é questão a ser decidida, ou implicitamente já decidida pelo MM. Juiz, está sujeita a eventual recurso por parte do Ministério Público.

Tratando-se de questão jurisdicional, ou de pretensão deduzida em juízo, não cabe seja dirimida pelo Procurador Geral de Justiça, impondo o dever de atuar ao órgão ministerial desta ou daquela forma.

Se o órgão do Ministério Público nos autos do processo esboçou entendimento no sentido de que a nulidade pode ser reconhecida, independente de ação autônoma, requerendo provimento judicial neste sentido, em respeito ao princípio da independência funcional não caberia ao Procurador Geral de Justiça ingressar no mérito da questão e determinar a forma adequada de agir para a tutela dos interesses do incapaz.

A aplicação analógica do art. 28 do CPP ao processo civil, pressupõe recusa do órgão ministerial em intervir em processos que reclamam sua participação.

A hipótese em análise não se trata de recusa de agir diante da verificação de uma ilegalidade, mas da forma como agir, matéria inserida na órbita da independência funcional que está isenta de ingerência deste órgão superior.

Nestas condições a intervenção desta Procuradoria Geral de Justiça não seria para determinar a atuação do órgão ministerial, mas de indicar a forma adequada para intervir, o que ingressa em juízo acerca do conteúdo do ato, violando a independência funcional.

3. Decisão

Diante do exposto, não conheço da remessa.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Registre-se.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 13 de setembro de 2017.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

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