Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado MP nº 24812/17 (Inquérito Civil n. 14.0233.00000060/2015-8)

Suscitante: Promotor de Justiça de Ilhabela (Patrimônio Público)

Suscitado: Promotor de Justiça de Caraguatatuba (Patrimônio Público)

 

Ementa:

Conflito negativo de atribuições. Suscitante: Promotor de Justiça de Ilhabela (Patrimônio Público). Suscitado: Promotor de Justiça de Caraguatatuba (Patrimônio Público). Peças de informação encaminhadas ao suscitado para apurar contratações efetuadas pelo Município de Caraguatatuba. Providências já adotadas pela Promotoria de Justiça de Ilhabela.  Conflito conhecido e dirimido, cabendo ao suscitado prosseguir na investigação.

 

Vistos,

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o DD. Promotor de Justiça de Ilhabela – em exercício - e como suscitado o DD. Promotor de Justiça de Caraguatatuba.

Narra a Portaria de fls. 2-A/2-C que este inquérito civil foi instaurado para apurar possível irregularidade na contratação efetuada pela Câmara Municipal de Ilhabela da sociedade empresária Eskelsen & Eskelsen Pneus Ltda.

Verifica-se que o Promotor de Justiça de Ilhabela, por meio do Ofício n. 594/2014, encaminhou à Promotoria de Justiça de Caraguatatuba as peças de informação de fls. 2/36, extraídas dos autos da ação civil n. 41.0286.139/2012, para conhecimento e providências cabíveis.

No curso da investigação, o suscitado determinou a remessa dos autos à Promotoria de Justiça de Ilhabela, sob o seguinte fundamento:

“De início, forçoso lembrar que a improbidade administrativa é um ato praticado por agente público, ou por particular em conjunto com agente público, e que gera enriquecimento ilícito, causa prejuízo ao erário ou atenta contra os princípios da Administração Pública.

No caso em análise, verifica-se que as irregularidades apontadas foram praticadas por agentes públicos da Câmara Municipal de Ilhabela/SP, em prejuízo da Administração Pública da própria Comarca de Ilhabela/SP, supostamente valendo-se de particular que possui empresa com sede na Comarca de Caraguatatuba/SP.”

Contra o entendimento acima o Promotor de Justiça de Ilhabela suscitou conflito negativo de atribuições (fls. 142/144). Pontuou, em apertada síntese, que as cópias encaminhadas à Promotoria de Justiça de Caraguatatuba o foram para apurar a prática de ato de improbidade administrativa em face da Prefeitura Municipal de Caraguatatuba, “e não porque uma das empresas era localizada na cidade de Caraguatatuba”.

É o relatório.

Decisão.

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Como se sabe, no processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador estabelece critérios para a repartição do serviço. Nesse sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 23. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e competência, 11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.

Esta ideia, aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de competência (objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por Adolf Wach, e sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t. I, trad. esp. de Jose Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922, p. 621 e ss; e em suas Instituições de direito processual civil, 2º vol., trad. port. de J. Guimarães Menegale, São Paulo, Saraiva, 1965, p. 153 e ss), bem como por Piero Calamandrei (Instituciones de derecho procesal civil, v. II, trad. esp. Santiago Sentís Melendo, Buenos Aires, EJEA, 1973, p. 95 e ss), entre outros clássicos doutrinadores.

Ora, se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada demanda a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão ministerial com atribuições para certo caso também não parta da hipótese concretamente considerada, ou seja, de seu objeto.

Pode-se, desse modo, afirmar que a definição do membro do parquet a quem incumbe a atribuição para conduzir determinada investigação ou ação na esfera cível deve levar em consideração os dados do caso concreto.

No caso dos autos, pouco há a acrescentar às razões trazidas pelo suscitante.

Basta conferir a petição inicial de fls. 3/16 para se inferir que o suscitante adotou as medidas cabíveis em face dos responsáveis, no âmbito das atribuições da Promotoria de Justiça de Ilhabela.

O Ofício n. 594/2014 especifica que as cópias extraídas da ação de improbidade referida objetivavam a apuração das contratações efetuadas pelo Município de Caraguatatuba; este, portanto, o objetivo do encaminhamento de mencionadas peças.

Evidentemente que o objeto não poderia ser o mesmo do ventilado na ação de improbidade administrativa já ajuizada em Ilhabela.

Provavelmente a controvérsia tenha surgido por conta da delimitação feita pela portaria instauradora do inquérito civil (fls. 2-A/2-C), a qual delimitou o objeto da investigação a matéria já enfrentada pela Promotoria suscitante.

Destarte, cabe ao suscitado, Promotor de Justiça de Caraguatatuba, apurar se houve eventual irregularidade no tocante ao Município de Caraguatatuba. Conforme referido pelo suscitante, caso não se vislumbre ilicitude, resta o encerramento da investigação, e não a devolução dos autos à Promotoria de Justiça de Ilhabela.

3) Decisão

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitado, DD. Promotor de Justiça de Caraguatatuba, a atribuição para oficiar no procedimento investigatório.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 04 de abril de 2017.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

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