Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado SEI n. 29.0001.0016118.2019-58

Suscitante: 2º Promotor de Justiça de Socorro (Direitos Humanos/Idoso)

Suscitado: 1º Promotor de Justiça de Socorro (Cível)

 

 

Ementa: Conflito negativo de atribuição. Civil. Processo civil. Ação demolitória proposta em face de idoso em situação de risco. Atribuição do Promotor de Justiça Cível, e não do Promotor de Justiça de Direitos Humanos - Idoso, cuja atuação é reservada para a tutela judicial, enquanto autor, e extrajudicial em defesa de interesses individuais indisponíveis de idoso em situação de risco.

1. Conflito negativo de atribuições. 2º Promotor de Justiça de Socorro – Direitos Humanos/Idoso (suscitante). 1º Promotor de Justiça de Socorro – Cível (suscitado).

2. Ação demolitória proposta em face de idoso em situação de risco. Intervenção Ministerial que decorre do disposto no arts. 74, II, e 75 do Estatuto do Idoso, a ensejar a atuação obrigatória da Promotoria de Justiça, com atribuição na área cível residual, que oficia perante a Vara na qual está em trâmite a ação. A situação de risco do idoso não é critério apto a deslocar a atribuição à Promotoria de Justiça do Idoso, a quem compete a defesa dos interesses individuais indisponíveis de idoso em situação de risco, sem prejuízo da tutela dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos dos idosos.

3. Conflito conhecido e dirimido. Atribuição do 1º Promotor de Justiça de Socorro (Cível) para oficiar nos autos.

Vistos,

1)    Relatório

Consta do presente expediente que o 1º Promotor de Justiça de Socorro, com atribuição para atuar nos feitos cíveis judiciais, nos autos do Processo n. 1001287-94.2018.8.26.0601, ação demolitória proposta pelo Município da Estância de Socorro em face de idoso em situação de risco, em trâmite na 2ª Vara da Comarca de Socorro – após exarar uma primeira manifestação, em que firmou a sua atribuição (fls. 39/40) – declinou de sua atribuição e requereu a remessa dos autos à Promotoria de Justiça do Idoso de Socorro, a fim de que analisasse a possível intervenção do Parquet em sua área de atuação, como fiscal da lei, argumentando que o caso envolvia “pessoa idosa, em situação de risco e vulnerabilidade”, tendo invocado o Ato Normativo n. 857/14 - PGJ-CGMP, de 27 de novembro de 2.014 (fl. 107).

O 2º Promotor de Justiça de Socorro, com atribuição na área de Direitos Humanos/Idoso, suscitou conflito negativo de atribuições, sustentando que não havia controvérsia quanto à existência de situação de risco do idoso, tanto que, no exercício de suas funções, instaurou o PANI n. 36.0448.0000241/18 e, por força de sua atuação extrajudicial, assegurou-se ao idoso – que figura como requerido na ação demolitória – o benefício de aluguel social. Prosseguiu, pontuando que é a própria situação de risco do idoso que justifica a intervenção do Parquet nos autos do processo, cabendo verificar, entre os critérios de divisão de atribuição, qual é o Promotor que deve atuar, sendo, na sua ótica, o Promotor de Justiça Cível, porquanto “na demanda judicial concreta,  a situação de risco é questão subjacente, já que se trata de demanda de natureza individual cuja controvérsia remanescente repousa em possível dever de indenizar por parte da Fazenda Pública”, restringindo-se a lide à discussão patrimonial. Invocou os artigos 296 e 297 da Lei Complementar n. 734/1.993 (fls. 111/117).

É o relato do essencial.

2)    Fundamentação

Cuida-se, na origem, de ação demolitória proposta pelo Município da Estância de Socorro em face de idoso em situação de risco, em trâmite na 2ª Vara da Comarca daquela localidade, em que o 1º Promotor de Justiça de Socorro, com atribuição para atuar nos feitos cíveis judiciais do aludido Juízo, declinou de sua atribuição e requereu a remessa dos autos à Promotoria de Justiça do Idoso de Socorro, a fim de que analisasse a possível intervenção do Parquet em sua área de atuação, como fiscal da lei, argumentando que o caso envolvia “pessoa idosa, em situação de risco e vulnerabilidade” (fl. 107).

De início, saliento que o suscitado é portador de atribuição residual para atuar nos feitos cíveis em andamento na 2ª Vara Judicial de Socorro.

Também é certo que o Estatuto do Idoso prevê a atuação do Ministério Público como fiscal da ordem jurídica nos casos em que não for parte, desde que se trate de idoso em situação de risco (arts. 74, II, e 75).

Assim, forçoso reconhecer que, em ação cível, a situação de risco do idoso não constituiu critério apto a ser utilizado, visando a definir qual Promotoria de Justiça vai atuar, se aquela com atribuição cível residual ou na área de idosos.

A Lei Orgânica Estadual do Ministério Público (Lei Complementar Estadual n. 734/1.993) trata genericamente das atribuições das Promotorias em conflito nos dispositivos transcritos a seguir:

Art. 295. Aos cargos especializados de Promotor de Justiça, respeitadas as disposições especiais desta lei complementar, são atribuídas as funções judiciais e extrajudiciais de Ministério Público, nas seguintes áreas de atuação:

(...)

XIV - Promotor de Justiça de Direitos Humanos: garantia de efetivo respeito dos Poderes Públicos e serviços de relevância pública aos direitos assegurados nas Constituições Federal e Estadual, e, notadamente, a defesa dos interesses individuais homogêneos, coletivos e difusos dos idosos, das pessoas com deficiência;

(...)

Art. 296. Aos cargos criminais e cíveis são atribuídas todas as funções judiciais e extrajudiciais de Ministério Público, respectivamente na sua área e atuação penal ou cível, salvo aquelas que, na mesma comarca, forem de atribuição de cargos especializados ou de cargos com designação de determinada localidade.

(...)

§ 1º Os cargos com designação de determinada localidade, sejam especializados, criminais, cíveis ou cumulativos ou gerais, terão as atribuições judiciais e extrajudiciais de Ministério Público em correspondência com a competência do órgão jurisdicional nela localizado.

(...)

Art. 297. Aos cargos gerais ou cumulativos são atribuídas todas as funções judiciais e extrajudiciais de Ministério Público, tanto na área de atuação penal como cível, respeitadas as limitações previstas no artigo anterior.

O Ato Normativo n. 593/2.009-PGJ, de 05 de junho de 2.009, que “cria a Promotoria de Justiça de Direitos Humanos e a Promotoria de Justiça de Repressão à Sonegação Fiscal e dá outras providências” e cujo teor aplica-se ao caso em função das disposições anteriores, assim dispõe:

Art. 3º Compete também à Promotoria de Direitos Humanos:

I – na área de idosos:

(a) Exercer a tutela judicial e extrajudicial dos direitos individuais indisponíveis dos idosos em situação de risco residentes na área de jurisdição do Foro Central da Comarca da Capital;

(...)

§ 2º Nas ações individuais relativas ao idoso em situação de risco em tramitação no Foro Central da Comarca da Capital, a intervenção caberá ao Promotor de Justiça com atribuições no respectivo Juízo.

§ 3º Nas áreas de jurisdição dos Foros Regionais e Distritais da Comarca da Capital, a tutela judicial e extrajudicial dos direitos individuais indisponíveis do idoso em situação de risco será de atribuição dos respectivos Promotores de Justiça Cíveis.

Daí resulta que compete ao Promotor de Justiça, com atribuição na área cível residual, atuar no feito, em andamento perante o Juízo, no qual oficia.

E aludida atuação, que não é incompatível com o teor do Ato Normativo n. 857/14 - PGJ-CGMP, de 27 de novembro de 2.014, se distingue daquela reservada à Promotoria de Justiça do Idoso – a quem compete a tutela de interesses individuais indisponíveis de idoso em situação de risco (nesse caso, como autor de eventual ação judicial), sem prejuízo da defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos dos idosos, em tutela judicial e extrajudicial.

É certo que, se constatada lesão ou ameaça a interesse ou direito coletivo em sentido amplo ou individual indisponível de idoso ou mesmo crime, o Promotor de Justiça, oficiante no processo, deve remeter peças de informação ao Promotor de Justiça com atribuição para conhecer de tais questões. Todavia, essa premissa não desloca a competência do membro do Parquet.

         À vista de todo o explanado, indubitável que o 1º Promotor de Justiça de Socorro, com atribuição cível (residual), ora suscitado, detém atribuição para funcionar como custos iuris nos autos da ação demolitória especificada anteriormente.

3) Decisão

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, declarando caber ao 1º Promotor de Justiça de Socorro oficiar no feito, em seus ulteriores termos, intervindo como fiscal da ordem jurídica.

Publique-se. Comunique-se. Registre-se. Restituam-se os autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 22 de abril de 2.019.

 

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

psv