Conflito de Atribuições

– Cível –

 

 

Protocolado n. 56.012/2018

Referência: Processo n. 1005565-41.2018.8.26.0019 (Juízo de Direito da  3ª Vara Cível de Americana)

Suscitante: 6º Promotor de Justiça de Americana

Suscitado: 3º Promotor de Justiça de Americana

 

 

 

Ementa: Conflito negativo de atribuições. Ação Popular. 1. A intervenção do Ministério Público em ação popular recai sobre o membro que, nos termos da divisão de atribuições da respectiva Promotoria de Justiça, oficia perante o correlato Juízo de Direito, e não ao Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Comarca, conforme decisões precedentes. 2. Conflito conhecido e dirimido, declarando a atribuição do suscitado.

 

 

1.                Põem-se em conflito a respeito da intervenção em ação popular em trâmite no douto Juízo de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Americana (Processo n. 1005565-41.2018.8.26.0019) os ilustres 6º Promotor de Justiça de Americana (suscitante), com atribuições para intervir nos feitos da 3ª Vara Cível Judicial, e 3º Promotor de Justiça de Justiça de Americana (suscitado), com atribuições na área do Patrimônio Público e Social, incluindo a repressão aos atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito, causam prejuízo ao erário ou atentam contra os princípios da Administração Pública, inclusive as ações civis públicas distribuídas e os feitos criminais respectivos.

2.                Os autos foram remetidos ao 6º Promotor de Justiça de Americana que requereu ao Juízo de Direito seu envio ao 3º Promotor de Justiça de Americana porque a este cabe, segundo a divisão de atribuições, a tutela do patrimônio público.

3.                Recebendo o processo, o 6º Promotor de Justiça de Americana suscitou conflito negativo de atribuições alegando, em suma, que entre suas tarefas não se incluem a intervenção em ações populares na área de Patrimônio Público e Social, “incluindo a repressão aos atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito, causam prejuízo ao erário ou atentam contra os princípios da Administração Pública, inclusive as ações civis públicas distribuídas e os feitos criminais respectivos”.

4.                Nesse contexto foi encaminhada cópia dos autos à Procuradoria-Geral de Justiça.

5.                É o relatório.

6.                Conforme precedente desta Procuradoria-Geral de Justiça (Pt. 126.214/15), ação popular e ação civil pública por ato de improbidade administrativa são remédios jurídico-processuais paralelos que se destinam, lato sensu, ao combate de atos ilegais e lesivos ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente (arts. 5º, LXXIII e 129, III, Constituição Federal). Enquanto naquela o Ministério Público atua como custos legis (tendo legitimidade ativa ulterior supletiva e condicionada ut art. 9º da Lei n. 4.717/65) nesta é um dos colegitimados ativos embora possa atuar como fiscal da lei. Além disso, o objeto da ação civil pública pode ser mais amplo por envolver as sanções do art. 12 da Lei n. 8.429/92, a qual não se vocaciona a ação popular cuja legitimidade ativa é restrita ao cidadão. No caso presente, não notícia da promoção de ação civil pública a despertar os fenômenos da conexão ou da continência.

7.                Analisada a divisão de atribuições da Promotoria de Justiça de Americana – homologada pelo Órgão Especial do Colégio de Procuradores de Justiça – constata-se que não foi confiada ao Promotor de Justiça com atribuição especializada a intervenção em ação popular tanto no domínio do patrimônio público e social quanto na esfera das demais áreas de interesses difusos e coletivos (meio ambiente, por exemplo) que têm habilitação para tutela também pela via da ação popular.

8.                Ao contrário, sendo a ação popular concebida ontologicamente, para fins processuais, como feito cível, a atuação do Ministério Público é ordenada pela regra que vincula a atribuição ao juízo respectivo.

9.                A ratio conducente deste raciocínio, aliás, é fomentada pela própria concepção da especialização no Ministério Público paulista cuja Lei Orgânica Estadual resolveu compreender dois órgãos distintos no assunto:

“Artigo 295 — Aos cargos especializados de Promotor de Justiça, respeitadas as disposições especiais desta lei complementar, são atribuídas as funções judiciais e extrajudiciais de Ministério Público, nas seguintes áreas de atuação:

(...)

VIII — Promotor de Justiça de Mandados de Segurança: mandados de segurança, ações populares, ‘habeas data’ e mandados de injunção ajuizados na primeira instância;

IX — Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social: defesa da probidade e legalidade administrativas e da proteção do patrimônio público e social;

(...)

Artigo 296 — Aos cargos criminais e cíveis são atribuídas todas as funções judiciais e extrajudiciais de Ministério Público, respectivamente na sua área de atuação penal ou cível, salvo aquelas que, na mesma comarca, forem de atribuição de cargos especializados ou de cargos com designação de determinada localidade.

(...)

Artigo 297 — Aos cargos gerais ou cumulativos são atribuídas todas as funções judiciais e extrajudiciais de Ministério Público, tanto na área de atuação penal como cível, respeitadas as limitações previstas no artigo anterior”.

10.              É nítido que o inciso VIII do art. 295 subtrai do inciso IX a intervenção em ação popular destacando o exercício da função em razão da natureza da lide e de sua posição processual. Nessa conformidade, a par do citado linhas acima, há precedentes específicos:

“1) Conflito negativo de atribuições. 1º Promotor de Justiça de Matão, acumulando atribuições do 3º Promotor de Justiça (suscitante) e 4º Promotor de Justiça de Matão (suscitado). 2) Ação popular. Ato de divisão de serviços da Promotoria de Justiça. Previsão de atribuição do suscitante para oficiar nos ‘feitos cíveis’ da Vara Judicial. Atribuição do suscitado para ‘Cidadania, incluindo a repressão aos atos de improbidade, a defesa do patrimônio público’. 3) Interpretação dos atos de divisão de serviços. Análise contextual e finalista. Princípio da especialidade. As atribuições especializadas são discriminadas expressamente. Atuação especializada, como regra, relacionada à atuação como autor ou fiscal em ações civis públicas. Analogia com o art. 295, VIII e IX da Lei Complementar nº 734/93, referente às Promotorias Especializadas da Capital. Atuação como fiscal da ordem jurídica, afora os casos de ação civil pública, que recai no órgão com atribuição para oficiar em ‘feitos cíveis’. 4) Não ocorrência de prevenção em decorrência de expedição de recomendação. Prevenção: configuração apenas em função da anterior atuação no feito considerado. Pressuposto da prevenção: existência concomitante de atribuições de dois órgãos, não verificada na hipótese. 5) Eventualidade de propositura de ação civil pública, e reunião, para julgamento conjunto, com a ação popular, em virtude da conexão (art. 105 do CPC). Caso em que caberá atuar no feito um só órgão de execução, revestido de atribuição mais especializada, cf. art. 114, § 3º da Lei Complementar nº 734/93” (Protocolado n. 51.192/10).

“1) Conflito negativo de atribuições. 7º Promotor de Justiça de São Caetano do Sul (suscitante) e 4º Promotor de Justiça de São Caetano do Sul (suscitada). 2) Ação popular. Ato de divisão de serviços da Promotoria de Justiça. Previsão de atribuição da suscitada para oficiar nos ‘feitos cíveis’ da Vara Judicial. Atribuição da suscitante para a defesa do patrimônio público. 3) Interpretação dos atos de divisão de serviços. Análise contextual e finalista. Princípio da especialidade. As atribuições especializadas são discriminadas expressamente. Atuação especializada, como regra, relacionada à atuação como autor ou fiscal em ações civis públicas. Analogia com o art. 295, VIII e IX da Lei Complementar nº 734/93, referente às Promotorias Especializadas da Capital. Atuação como fiscal da ordem jurídica, afora os casos de ação civil pública, que recai no órgão com atribuição para oficiar em ‘feitos cíveis’. 4) Conflito conhecido e dirimido, cabendo à suscitada prosseguir no feito” (Protocolado n. 30.094/12).

“1) Conflito negativo de atribuições. 2º Promotor de Justiça de Valinhos (suscitante) e 1º Promotor de Justiça de Valinhos (suscitado). 2) Ação popular. Ato de divisão de serviços da Promotoria de Justiça. Previsão de atribuição do suscitado para oficiar nos ‘feitos cíveis’ da Vara Judicial. Atribuição do suscitante para a defesa do patrimônio público. 3) Interpretação dos atos de divisão de serviços. Análise contextual e finalista. Princípio da especialidade. As atribuições especializadas são discriminadas expressamente. Atuação especializada, como regra, relacionada à atuação como autor ou fiscal em ações civis públicas. Analogia com o art. 295, VIII e IX da Lei Complementar nº 734/93, referente às Promotorias Especializadas da Capital. Atuação como fiscal da ordem jurídica, afora os casos de ação civil pública, que recai no órgão com atribuição para oficiar em ‘feitos cíveis’. 4) Conflito conhecido e dirimido, cabendo ao suscitado prosseguir no feito” (Protocolado n. 15.394/13).

11.              Por esses fundamentos, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115, da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitante, 6º Promotor de Justiça de Americana, a atribuição para oficiar nos autos.

12.              Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos. Remeta-se cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

 

São Paulo, 16 de agosto de 2018.

 

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

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