Conflito de Atribuições – Cível
Protocolado nº
0058513/17
(Ref. MP: PANI n° 36.0190.0000472/2015-4)
Suscitante: 4º
Promotor de Justiça de Andradina (Idoso)
Suscitado: 1º Promotora de Justiça de Andradina (Direitos Humanos)
Ementa:
1. Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 4º Promotor de Justiça Cível de Andradina (Idoso). Suscitado: 1º Promotora de Justiça Cível de Andradina (Direitos Humanos).
2. Muito embora seja comum que
em determinada investigação se verifique a existência de mais de um interesse, afeto
a mais de uma área de atuação do Ministério Público, no caso dos autos
sobressai de forma clara a questão dos Direitos Humanos.
3. Conflito conhecido e dirimido, declarando caber a suscitada, 1º Promotora de Justiça Cível de Andradina, prosseguir com a investigação, em seus ulteriores termos.
1) Relatório
Trata-se
de conflito negativo de atribuições,
figurando como suscitante o DD. 4º
Promotor de Justiça de Andradina (Idoso) e como suscitada a DD. 1º Promotora de Justiça de Andradina
(Direitos Humanos), relativamente ao feito em epígrafe, tendo como objeto a
apuração de provável situação de risco vivenciada no domicilio do Sr. Adriano
Ribeiro Pelaes.
O Centro de Referência Especializada de
Assistência Social – CREAS, encaminhou representação à Promotora de Justiça
da 1ª Promotoria de Andradina, com atribuição na área de Direitos Humanos, para
apurar eventual situação de risco vivenciada por Adriano Rodrigues Pelaes, de
59 anos, com deficiente intelectual, o qual, segundo relatório de fls. 02/05 e
documentos de fls. 06/15, estaria sofrendo agressões e limitações por seu filho
Willian de Castro Pelaes, com 21 anos, também diagnosticado com deficiência
intelectual.
Segundo
consta, na residência viviam além de Adriano e Willian, mais dois filhos
daquele, de nomes Elder e Vanessa, ambos menores de idade. A família é
assistida por Ideir, irmã de Adriano.
A
relação conflituosa entre pai e filho foi apresentada nos relatórios de fls.
32/34, 43/44 e 50/52 com relatos, inclusive, de agressões físicas praticadas por Willian contra o pai, que
culminou com a elaboração de diversos boletins de ocorrência e a saída de
Adriano e dos filhos do lar.
Várias
foram as tentativas de submeter Willian à realização de laudo psiquiátrico,
porém sem êxito, considerando sua resistência em comparecer ao local onde seria
realizado o exame.
Tendo
em vista as agressões praticadas por Willian contra Adriano, foi decretada sua
prisão preventiva (fls. 56/57).
Foi
solicitada então avaliação psiquiátrica ao CDP de Caiuá, onde Willian estava custodiado
(fls.58), a qual não foi realizada tendo em vista sua transferência para a
Penitenciaria de Andradina (fls. 73). O relatório psiquiátrico realizado nesta
unidade prisional foi juntado a fls. 78/79.
Em
novo relatório juntado a fls. 92/94, o Centro de Referência de Assistência
Social III informou que Adriano continua residindo com os filhos Elder e
Vanessa, sendo que Willian continua recluso na Penitenciaria Guareí II e a
família continua sendo assistida por Ildeir, a qual se encontra com idade avançada
e se sente sobrecarregada. Aduz que Elder está apresentando faltas na escola e
Vanessa abandonou os estudos.
Oficiou-se
à Penitenciaria de Guareí II, a fim de que informasse se o estabelecimento
fornece ao sentenciado Willian tratamento psiquiátrico (fls. 96).
Segundo
informações de fls. 100, Willian foi transferido para o CDP III de Pinheiros,
para o qual foi oficiado com o mesmo fim. (fls. 107).
Oficiou-se
também ao CRAS solicitando informações sobre as medidas adotadas pelo órgão a
fim de promover a inclusão social de Adriano. As informações foram prestadas às
fls. 116/117.
Após,
a Promotora de Justiça da 1ª Promotoria de Andradina, com atribuição na área de
Direitos Humanos e abrangência na defesa da Saúde Pública, que acompanhava o
caso desde 2015, em virtude de o representado ter atingido 60 anos, entendendo
não ser mais sua a atribuição, remeteu o procedimento ao Promotor de Justiça da
4ª Promotoria de Andradina.
É
o relato do essencial.
2) Fundamentação
É
possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado,
devendo ser conhecido.
Como
anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições
quando “dois ou mais órgãos de execução
do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado
ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá
atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério
Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).
Como
se sabe, no processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente
é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o
legislador estabelece critérios para a repartição do serviço.
Nesse
sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido
Rangel Dinamarco, Teoria geral do
processo, 23. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão
Carneiro, Jurisdição e competência,
11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São
Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.
Esta
ideia, aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de
competência (objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por
Adolf Wach, e sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t.
I, trad. esp. de Jose Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922,
p. 621 e ss; e em suas Instituições de
direito processual civil, 2º vol., trad. port. de J. Guimarães Menegale,
São Paulo, Saraiva, 1965, p. 153 e ss), bem como por Piero Calamandrei (Instituciones de derecho procesal civil,
v. II, trad. esp. Santiago Sentís Melendo, Buenos Aires, EJEA, 1973, p. 95 e
ss), entre outros clássicos doutrinadores.
Ora,
se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de
determinada demanda a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa,
não há razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão
ministerial com atribuições para certo caso também não parta da hipótese
concretamente considerada, ou seja, de seu objeto.
Na
hipótese em exame, o objeto da representação endereçada pelo Centro de Referência Especializada de Assistência
Social – CREAS, à 1ª Promotora de
Justiça de Andradina, com atribuição na área de Direitos Humanos e abrangência
na Defesa da Saúde Pública, consiste na apuração de eventual situação de risco
vivenciada por Adriano Rodrigues Pelaes.
Anote-se
que o caso foi acompanhado desde 2015 pela 1ª Promotora de Justiça de
Andradina, com atribuição na área de Direitos Humanos e abrangência na Defesa
da Saúde Pública, a qual encaminhou o feito ao 4° Promotor de Justiça de
Andradina, com atribuição na área do Idoso, em decorrência do representado ter
completado 60 anos de idade, o que por si só não justifica a alteração da atribuição.
Muito
embora seja comum que em determinada investigação se verifique a existência de
mais de um interesse, afeto a mais de uma área de atuação do Ministério
Público, no caso dos autos sobressai de forma clara a questão dos direitos
humanos e defesa da saúde pública, cujo objeto é mais abrangente que a questão
etária. Ou seja, prevalece a necessidade de apurar situação de risco que envolve
integridade de pessoa com deficiência intelectual.
Não
bastasse o critério da prevalência do interesse, por analogia ao artigo 43 do
CPC, também seria o caso de se aplicar a ideia da perpetuação da atribuição,
sendo, no contexto, irrelevante o fato de o deficiente ter se tornado
idoso.
Por todo o exposto se vê que a questão central
noticiada nos autos está afeta às atribuições da Promotoria de Justiça na área de Direitos Humanos e
abrangência na Defesa da Saúde Pública.
Destarte, conclui-se que a suscitada, Promotora de
Justiça com atribuição na área de Direitos Humanos e abrangência na Defesa da Saúde
Pública, deverá prosseguir na investigação.
3. Decisão.
Diante do exposto, conheço do presente conflito
negativo de atribuições e dirimo-o, declarando caber à suscitada, 1º Promotora de Justiça de Direitos Humanos
e abrangência na Defesa da Saúde Pública
de Andradina, prosseguir na investigação, em seus ulteriores termos.
Publique-se. Comunique-se. Registre-se. Restituam-se
os autos.
Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao
Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.
São Paulo, 03 de julho de 2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral
de Justiça
efsj