Conflito de Atribuições – Cível

 

 

Protocolado nº 111.717/2017

Suscitante: 15º Promotor de Justiça da Infância e Juventude da capital

Suscitado: 4º Promotor de Justiça Cível da Lapa

Assunto: Processo nº 1012435-84.2017.8.26.0004

 

 

1. Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 15º Promotor de Justiça da infância e juventude da Capital (com atribuições na área de Interesses Difusos e Coletivos). Suscitado: 4º Promotor de Justiça Cível da Lapa (com atribuição na área da Infância e Juventude -  Direitos Individuais).

2. Intervenção em pedido de alvará, deduzido perante a Vara da Infância e Juventude, para autorização do ingresso de crianças em evento.

3. A atribuição para manifestação em pedido de alvará perante a Vara da Infância e Juventude, com vistas à autorização de entrada e permanência de crianças e adolescentes em evento, é da Promotoria de Justiça Cível, pois, além da natureza estritamente administrativa, o pleito não revela, por si só, a existência de ameaça ou de lesão a direito difuso ou coletivo tutelado pelo Estatuto da Criança e Adolescente.

4. Conflito conhecido e dirimido. Atribuição do 4º Promotor de Justiça Cível da Lapa (suscitado).

 

 

Vistos,

 

1)  Relatório.

 

Consta dos autos que o 4º Promotor de Justiça Cível da Lapa (suscitado) encaminhou à 15ª Promotoria de Justiça da Infância e Juventude da Capital pedido de Alvará Judicial formulado por CDX Esporte e Entretenimento S.A., no qual requer autorização da Vara da Infância e Juventude do Foro Regional da Lapa, para a entrada e permanência de crianças entre 0 (zero) a 11 (onze) anos de idade, acompanhados de seus pai e/ou responsáveis legais e a entrada de adolescentes a partir de 12 (doze) anos de idade desacompanhados de seus pais e/ou responsáveis legais para o espetáculo CIRQUE DE SOLEIL – AMALUNA.

O DD 4º Promotor de Justiça Cível da Lapa declinou da atribuição sob o fundamento de que o objeto envolveria defesa de interesse de natureza difusa, ultrapassando a esfera de uma única criança ou adolescente.

O DD 15º Promotor de Justiça da Infância e Juventude da Capital suscitou o conflito negativo de atribuições, sob o fundamento de que a matéria extrapolaria a matéria extrapolaria as atribuições dos cargos da Promotoria de Justiça da Infância e Juventude da Capital.

2) Fundamentação

Está configurado, no caso, o conflito de atribuições.

Isso decorre do posicionamento de diversos órgãos de execução do Ministério Público, quando “(a) dois ou mais deles manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusões às de outro membro (conflito positivo); (b) ao menos um membro negue a própria atribuição funcional e a atribua a outro membro, que já a tenha recusado (conflito negativo)” (cf. Hugo Nigro Mazzilli, Regime Jurídico do Ministério Público, 6ª ed., São Paulo, Saraiva, 2007, p. 486/487). No mesmo sentido Emerson Garcia, Ministério Público, 2ª ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196/197.

O pedido de alvará judicial, deduzido perante a Vara da Infância e Juventude para a autorização da realização de evento, revela o exercício de polícia administrativa e não atuação estritamente jurisdicional. Neste sentido, ensina Valter Kenji Ishida que “tal poder do magistrado menorista repousa (...) no poder de polícia consistente na obrigação da Administração Pública condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado".[1]

A potencial ida de grande número de crianças e adolescentes ao evento não convola o pedido de alvará, de natureza administrativa, deduzido na forma do artigo 149 do ECA, em ação judicial de caráter coletivo. Tal pedido, por si só, não implica ou presume lesão ou ameaça de lesão a direitos e interesses difusos e coletivos, a justificar a atuação da Promotoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos.

 

Anote-se, ademais, que no Ato Normativo n. 43/2011, o qual homologou as atribuições da 15ª e 16ª Promotoria de Justiça da Infância e Juventude da Capital, não consta previsão de manifestação em pedidos administrativos de alvará judicial, deduzidos na Vara da Infância e Juventude, implicando a aplicação analógica do art. 296, § 2º, da Lei Orgânica do Ministério Público, que diz respeito à atribuição residual da Promotoria de Justiça Cível.

Nada impede, contudo, em vista das circunstâncias do caso concreto, caso se constate indícios de lesão ou ameaça de lesão a interesses difusos e coletivos afetos à infância e juventude, seja acionada a Promotoria de Justiça especializada.

3)Decisão.

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, declarando caber ao 4º Promotor de Justiça Cível da Lapa prosseguir na investigação, em seus ulteriores termos.

Publique-se. Comunique-se. Registre-se. Restituam-se os autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

 

São Paulo, 26 de setembro de 2017.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

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[1] ISHIDA, Valter Kenji: Estatuto da criança e do adolescente: doutrina e jurisprudência. São Paulo: Atlas: 2015, p. 396.