Conflito
de Atribuições – Cível
Protocolado nº 114.128/2011
Inquérito Civil nº 14.0216.0000033/2011-2
Suscitante: 4ª Promotor de Justiça de Brás Cubas
Suscitado: 1º Promotor de Justiça de Mogi das Cruzes
Ementa:
1.
Conflito negativo de atribuições. 4ª Promotor de
Justiça de Brás Cubas (suscitante) e 1º Promotor de Justiça de Mogi das Cruzes
(suscitado).
2.
Investigação civil instaurada para apurar
eventual ato de improbidade administrativa e dano ao erário, praticados pelo 2º
Ten. PM Gilberto de Carvalho Júnior, quando exercia o comando do 5º Pelotão da
3ª Companhia do 1º Batalhão da Polícia Militar Rodoviária.
3. A Lei de Improbidade Administrativa (Lei n. 8.429/92) não tem disposição específica sobre competência, ao contrário do que ocorre com a Lei da Ação Civil Pública (Lei n. 7.347/85) e com o Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90), os quais, em seus arts. 2º e 93, respectivamente, disciplinam a matéria. De toda forma, ao se considerar que a ação de improbidade administrativa pertence ao minissistema processual coletivo, de rigor aplicar-se a regra do art. 2º da Lei n. 7.347/85 também às ações ajuizadas com suporte na Lei n. 8.429/92, à medida que a ação de improbidade pode ser considerada uma ação coletiva.
4. No caso dos direitos transindividuais (e a probidade constitui direito difuso), pela sua dimensão social, política e jurídica, resta claro o interesse público no sentido que a competência territorial se exprima como absoluta. Justifica-se essa opção pelas seguintes razões: a) facilitar a instrução probatória; b) permitir que a demanda seja julgada pelo juiz que de alguma forma teve contato com o dano ou ameaça de dano a direito transindividual.
5. Colhe-se com segurança que em sede de improbidade administrativa a competência a ser considerada é aquela onde foi perpetrada a conduta que ofendeu a higidez pública.
6.
Distinção entre competências (jurisdicionais) e
atribuições (administrativas). Considerações a respeito dos critérios e fases
relacionados à identificação do órgão judicial competente. Constatação de que
nem sempre os órgãos ministeriais oficiam perante um único órgão de execução,
ou mesmo perante o órgão de execução cuja sede física é a mesma em que oficia o
membro do Ministério Público.
7. Impossibilidade de adoção da solução preconizada pela suscitante sem alteração do ato regulamentar que fixa a divisão de serviços, com prévia apreciação por parte do Col. Órgão Especial do Colégio de Procuradores de Justiça.
8. Abrangência do princípio do promotor natural. Necessidade de respeito às atribuições legitimamente fixadas pela lei e por atos regulamentares.
9. Conflito conhecido e dirimido, determinando-se o prosseguimento do suscitante na investigação.
Vistos,
1)
RELATÓRIO
Tratam estes
autos de conflito negativo de
atribuições, figurando como suscitante o DD. 4ª Promotor de Justiça de Brás Cubas, e como suscitado o DD. 1º Promotor de Justiça de Mogi das Cruzes.
O Inquérito civil foi instaurado pela
Promotoria de Justiça de Brás Cubas para apurar eventual ato de improbidade administrativa e dano ao
erário, praticados pelo 2º Ten. PM Gilberto de Carvalho Júnior, quando exercia
o comando do 5º Pelotão da 3ª Companhia do 1º Batalhão da Polícia Militar
Rodoviária. Registra a portaria de instauração da investigação que o
investigado, “por ocasião da compra de materiais de construção e contratação de
serviços para reforma e conservação do prédio da Base Operacional situada na
Av. Lourenço de Souza Franco, km 45, Jundiapeba, teria, em detrimento do
patrimônio público, se beneficiado pessoalmente com parte dos materiais de
construção e serviços adquiridos e contratados, bem como efetivado a aquisição
de materiais que não foram devidamente empregados na mencionada obra, em
valores a serem apurados” (fls. 02).
Após
considerável tempo de investigação os autos foram remetidos à Promotoria de
Justiça de Mogi das Cruzes, sob o fundamento de que a competência para o
conhecimento de eventual ação de improbidade administrativa e/ou ressarcimento
de danos ao erário seria da Vara da Fazenda Pública, recentemente instalada na
sede, ou seja, em Mogi das Cruzes (fls. 984/985).
O suscitado
inicialmente praticou atos de investigação, mas posteriormente decidiu
restituir o feito à origem, adotando como fundamento a decisão prolatada por
esta Procuradoria-Geral de Justiça nos autos do Protocolado nº 9.378/2011 (IC
nº 04/2008), cf. fls. 1106/110.
Diante
disso, o DD. 4º. Promotor de Justiça de
Brás Cubas suscitou o conflito negativo, afirmando, em síntese, que:
(a) o
Provimento nº 1667/2009, do Conselho Superior da Magistratura, determinou a
redistribuição dos feitos de interesse da Fazenda Pública em tramitação no Foro
Distrital de Brás Cubas para a Vara da Fazenda de Mogi das Cruzes, recentemente
instalada;
(b) foi
realizada “consulta” informal à Procuradoria-Geral de Justiça, obtendo-se
informação de que os Promotores de Justiça de Mogi das Cruzes, com atribuições
para oficiar perante a Vara da Fazenda Pública, deveriam oficiar em todas as
ações em curso na Vara Especializada, bem como em procedimentos investigatórios
relacionados a entes públicos cujos feitos sejam da competência da Vara
Especializada;
(c) a
Procuradoria-Geral de Justiça proferiu decisão, posteriormente, no conflito
suscitado no Inquérito Civil nº 14.0216.0000052/2011-5, assentando que só o
Promotor de Justiça lotado no local onde ocorreu ou deva ocorrer o dano ou o
ilícito é que poderá instaurar o Inquérito Civil para a apuração dos fatos;
estatuiu-se, igualmente, que “o fato de existir Vara Especializada na
Circunscrição (foro) não impede que o membro do Ministério Público de Brás
Cubas proponha a demanda na Vara da Fazenda de Mogi das Cruzes (competência de
Juízo)”;
(d) os
Promotores de Mogi passaram a restituir feitos à Promotoria de Brás Cubas;
(e) a
situação do Foro Regional de Brás Cubas é peculiar, pois possui as mesmas
competências que a Comarca sede (Mogi das Cruzes), exceção feita à competência
dos feitos da Fazenda Pública e dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, que
ficam na sede da comarca;
(f) a
população de Brás Cubas e o número de feitos em tramitação neste Foro
Distrital, comparativamente com os dados correlatos da sede da Comarca,
demonstram a dificuldade de enfrentamento da massa de feitos existente naquele,
havendo uma distribuição desproporcional de serviços;
(g) as
diferenças de cunho social das áreas envolvidas (sendo a população da Distrital
de baixa renda) provoca uma disparidade na qualidade dos serviços prestados
quando feito o cotejo com as características da Sede da Comarca, e a estrutura
nesta existente;
(h) a
decisão proferida em anterior conflito de atribuições provoca descompasso entre
as atribuições do MP e as competências dos Juízes no Foro Distrital de Brás
Cubas;
(i) o
reconhecimento de atribuição dos Promotores de Justiça de Mogi das Cruzes para
atuar nos feitos de Brás Cubas que tramitem pela Vara Especializada da Fazenda
Pública é legítima, não se fazendo necessária modificação de atribuições, visto
que tal solução melhor atenderia ao interesse público;
(j) os
Promotores de Brás Cubas permaneceriam com atribuições para atuar apenas nos
casos em que a Fazenda Pública não estiver envolvida;
(l) o
princípio do promotor natural determina que o feito tramite junto à Promotoria
de Mogi das Cruzes, em função da regra da especialidade;
(m) os
Promotores de Brás Cubas somente possuem atribuições para oficiar nos feitos
que tramitem no Foro Distrital, enquanto só os Promotores de Mogi das Cruzes
possuem atribuições para oficiar na Vara Especializada da Fazenda Pública;
(n) a
solução adotada em conflito anterior é contrária ao interesse público (fls.
727/747).
É o relato
do essencial.
2)
FUNDAMENTAÇÃO
Está configurado, no caso, o conflito de
atribuições.
Isso decorre do posicionamento de diversos
órgãos de execução do Ministério Público, quando “(a) dois ou mais deles manifestam, simultaneamente, atos que importem a
afirmação das próprias atribuições, em exclusões às de outro membro (conflito
positivo); (b) ao menos um membro negue a própria atribuição funcional e a
atribua a outro membro, que já a tenha recusado (conflito negativo)” (cf.
Hugo Nigro Mazzilli, Regime Jurídico do
Ministério Público, 6ª ed., São Paulo, Saraiva, 2007, p. 486/487). No mesmo
sentido Emerson Garcia, Ministério
Público, 2ª ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196/197.
Como se
sabe, no processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente é
extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador
estabelece critérios para a repartição do serviço.
Nesse
sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido
Rangel Dinamarco, Teoria geral do
processo, 23ª ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão
Carneiro, Jurisdição e competência,
11ª ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São Paulo,
RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.
Esta ideia,
aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de competência
(objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por Adolf Wach, e
sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t.I, trad. esp. de Jose
Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922, p. 621 e ss; e
Ora, se para
a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada
demanda a lei processual estabelece, a
priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há
razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão
ministerial com atribuições para certa investigação também não parta de
elementos do caso concreto, ou seja, seu objeto.
Pode-se,
deste modo, afirmar que a definição do membro do parquet a quem incumbe a atribuição para conduzir determinada
investigação na esfera cível, que poderá, ulteriormente, culminar com a
propositura de ação civil pública, deve levar em consideração os dados do caso
concreto investigado.
O objeto da investigação, como anotado anteriormente, é apurar eventual ato de improbidade administrativa e dano ao erário, praticados pelo 2º Ten. PM Gilberto de Carvalho Júnior, quando exercia o comando do 5º Pelotão da 3ª Companhia do 1º Batalhão da Polícia Militar Rodoviária.
Ocorre que o dissenso entre a suscitante e o suscitado, em
que pese o longo arrazoado daquele contendo respeitáveis fundamentos, cinge-se
essencialmente a definir a quem caberá investigar casos envolvendo a Fazenda
Pública ou mesmo a quem caberá a propositura de eventual ação de improbidade
administrativa.
Isso decorre
do fato de que recentemente foi criada na sede da Comarca de Mogi das Cruzes a
Vara Especializada da Fazenda Pública, sendo remetidos os feitos relacionados a
essa matéria, que tramitavam no Foro Distrital de Brás Cubas, àquela vara
especializada, por força do Provimento nº 1.667/2009 do E. Conselho Superior da
Magistratura.
Algumas
premissas devem, desde logo, ser assentadas.
Podemos
assim resumi-las:
(a)
competência jurisdicional não se confunde com atribuição ministerial;
(b) em sede
de competência jurisdicional há momentos sucessivos ou fases subsequentes que
regem a sua determinação, que vão desde a pesquisa em torno da existência ou
não de competência originária dos tribunais, passando pela identificação da
existência ou não de “competência de jurisdição” (competência de Justiças
Especializadas – do Trabalho, Militar, Eleitoral, ou mesmo comum da Justiça
Federal), passando pela definição da competência de foro (territorial), e
chegando, finalmente, à definição de competência de juízo (material);
(c) nem
sempre as atribuições ministeriais são fixadas em paridade com a competência
jurisdicional, embora, em boa parte dos casos, haja certa correlação entre
ambas.
Examinemos
essas ideias.
A afirmação de
que a competência jurisdicional não se confunde com a atribuição ministerial,
embora seja evidente, deve ser reafirmada. E essa observação se mostra oportuna
para afastar a suposição equivocada de que a ocorrência de modificação de
competência implicará, necessariamente, alteração da atribuição.
Em segundo
lugar, há sucessivas fases para a fixação da competência dos órgãos
jurisdicionais, que podem ser representadas por sucessivas indagações.
Pergunta-se,
subsequentemente:
(a) trata-se
de caso de competência originária? O que se quer saber, com tal indagação, é se
o feito deve ou não tramitar originariamente em algum tribunal, nos casos assim
previstos no ordenamento;
(b) trata-se
de hipótese de “competência de jurisdição”? O que se quer saber, nesse caso, é
se há algum dispositivo constitucional determinando que a demanda tramite na
Justiça Federal, na Justiça do Trabalho, na Justiça Militar ou na Justiça
Eleitoral;
(c) qual o
foro competente? O que se quer saber, nesse passo, é qual a comarca ou circunscrição
na qual deve tramitar o feito;
(d) qual o
juízo competente? O que se deseja, aqui, é identificar a o órgão jurisdicional
competente em função da matéria versada na demanda.
Assim, no
caso das ações civis públicas, uma vez superada a questão da “competência de
jurisdição” (é competente a Justiça Federal ou Estadual), em função da regra
prevista no art. 2º da Lei da Ação Civil Pública a demanda coletiva deverá ser
ajuizada no foro do local do dano. Uma vez identificado esse foro (competência
territorial) é que se verificará qual o órgão jurisdicional competente (juízo)
em função da matéria.
É fato que a Lei de Improbidade Administrativa (Lei n. 8.429/92) não tem disposição específica sobre competência, ao contrário do que ocorre com a Lei da Ação Civil Pública (Lei n. 7.347/85) e com o Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/90), os quais, em seus arts. 2º e 93, respectivamente, disciplinam a matéria. De toda forma, ao se considerar que a ação de improbidade administrativa pertence ao minissistema processual coletivo, de rigor aplicar-se a regra do art. 2º da Lei n. 7.347/85 também às ações ajuizadas com suporte na Lei n. 8.429/92, à medida que a ação de improbidade pode ser considerada uma ação coletiva.
Nesse sentido, assentou o STJ que “não há na Lei 8.429/92 regramento específico acerca da competência territorial para processar e julgar as ações de improbidade. Diante de tal omissão, tem-se aplicado, por analogia, o art. 2º da Lei 7.347/85, ante a relação de mútua complementariedade entre os feitos exercitáveis em âmbito coletivo, autorizando-se que a norma de integração seja obtida no âmbito do microssistema processual da tutela coletiva” (CC 97351/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/05/2009, DJe 10/06/2009).
No caso dos direitos transindividuais (e a probidade constitui direito difuso), pela sua dimensão social, política e jurídica, resta claro o interesse público no sentido que a competência territorial se exprima como absoluta. Nas palavras de Proto Pisani: “È chiaro che quando il legislatore prevede criteri di competenza per territorio inderogabili, manifesta l’esistenza di un interesse pubblicistico al rispetto di tali criteri.” (PISANI, Andrea Proto. Lezioni di Diritto Processuale Civile. Quinta edizione. Napoli: Jovene, 2006, p. 272).
Colhe-se com segurança que em sede de improbidade administrativa a competência a ser considerada é aquela onde foi perpetrada a conduta que ofendeu a higidez pública. Veja-se o que ensina a doutrina:
“A questão da competência territorial para a ação de improbidade, à falta de regra específica na Lei n. 8.429/92 e tendo em conta o regime da mútua complementariedade entre as ações exercitáveis no âmbito da jurisdição coletiva, demanda a incidência do art. 2º da Lei n. 7.347/85, podendo considerar-se como local do dano, numa primeira aproximação interpretativa, a sede da pessoa jurídica de direito público lesada pela improbidade” (Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves. Improbidade Administrativa. 5ª ed. Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2010, p. 870).
Como esta
Procuradoria-Geral de Justiça já decidira anteriormente no conflito mencionado
na manifestação do suscitante (Protocolado nº 9.378/2011), não há dúvida alguma
de que a atribuição será da Promotoria de Brás Cubas, tanto para a investigação
civil, como ainda para a propositura de eventual ação civil pública e para
prosseguir nela, mesmo que o Poder Público figure no polo passivo da demanda e
esta venha a tramitar na Vara Especial da Fazenda Pública, ou mesmo que se
trata de eventual ação de improbidade administrativa.
Frise-se, a
propósito e com a devida vênia, que não há (ao contrário do que o suscitante
afirma em sua manifestação) qualquer equívoco na decisão anteriormente
proferida pela Procuradoria-Geral de Justiça.
Note-se,
aliás, um aspecto relevante: as atribuições relacionadas a interesses
metaindividuais quanto a fatos ocorridos na respectiva base territorial já
eram, anteriormente, da Promotoria de Brás Cubas.
A
modificação que se verificou foi no plano da competência (jurisdicional) e não
no plano das atribuições ministeriais.
Tanto a
fixação como a modificação de atribuições dos Promotores de Justiça depende de
aprovação, pelo Col. Órgão Especial do Colégio de Procuradores de Justiça, de
proposta encaminhada pelo Procurador-Geral, com posterior publicação de ato
normativo (art. 23, § 3º, da Lei nº 8.625/93; art. 22, XIX, e art. 47, III,
ambos da Lei nº 734/93).
Em outras
palavras, não é possível por simples interpretação modificar as atribuições já
fixadas por ato normativo, sob pena de violar-se claramente o princípio do
promotor natural, que assegura ao órgão ministerial de execução o exercício de
suas atribuições.
Além disso,
solução alvitrada pela suscitante implicaria, inclusive, usurpação de
atribuição do próprio Órgão Especial do Colégio de Procuradores de Justiça,
consistente em manifestar-se a respeito das propostas de alteração da divisão
de serviços dos órgãos de execução.
Nesse
particular, mostra-se oportuno observar o conteúdo dos atos que fixaram as
atribuições dos órgãos de execução em conflito.
O Ato nº 102/2008 – PGJ, de 18 de agosto de
2008, fixou as atribuições da Promotoria de Justiça de Brás Cubas, concedendo
aos seus integrantes, em sede de interesses metaindividuais, atribuições
compartilhadas relacionadas às áreas especializadas de atuação (Acidentes do
Trabalho, Cidadania, Consumidor, Idoso, Meio Ambiente, Pessoa com Deficiência e
Urbanismo). Há inclusive observação expressa, nesse ato regulamentar, no
sentido de que as atribuições relativas à defesa de interesses difusos das
áreas de Acidente do Trabalho, Consumidor, Cidadania, Urbanismo, Idoso, Meio
Ambiente e Pessoa com Deficiência “serão exercidas mediante distribuição livre
e sequencial das peças de informação”.
Por outro
lado, o Ato nº 050/2010 – PGJ, de 30 de
agosto de 2010 cuidou das atribuições da Promotoria de Justiça de Mogi das Cruzes. Quanto ao 1º Promotor de
Justiça, que aqui figura como suscitado, foram indicadas as seguintes
atribuições:
“(...)
a) feitos cíveis judiciais da 1ª Vara Cível, inclusive suas audiências;
b) feitos cíveis judiciais de finais 4, 5 e 6 da 3ª Vara Cível, inclusive suas audiências;
c) Corregedoria de Registros Públicos;
d) Patrimônio Público, incluindo a repressão aos atos de improbidade, inclusive as ações civis públicas distribuídas;
e) 1/3 dos feitos da Vara da Fazenda Pública, inclusive suas audiências;
f) atendimento ao público na área cível”.
Não bastasse
isso, relativamente aos feitos da Vara da Fazenda Pública, o regulamento acima
referido contém a seguinte observação:
“(...)
b) os feitos da Vara da Fazenda Pública serão
divididos conforme divisão elaborada na Promotoria de Justiça, observando-se
que os feitos relacionados às áreas de atuação de interesses difusos e
coletivos serão de responsabilidade do titular da respectiva atribuição.
(...)”
É
manifestamente claro, com a devida vênia, que a atribuição para oficiar em
“feitos da Vara da Fazenda Pública”, não se confunde com a atuação
especializada por área de interesses metaindividuais. A primeira (“oficiar em
feitos da Vara da Fazenda Pública”) significa atuar em processos em que o
Ministério Público figure como fiscal da lei.
No caso de
Mogi das Cruzes, a divisão de serviços foi ainda mais longe: previu
especificamente que na Vara da Fazenda Pública, se o feito envolve matéria
especializada em difusos e coletivos, a atuação será de “responsabilidade do
titular da respectiva atribuição”.
Essa
situação, ademais – e guardado expressamente o respeito relativamente ao
entendimento declinado pelo suscitante ao provocar a instalação do presente
conflito negativo -, revela aquilo que ordinariamente acontece não apenas em
uma, mas em inúmeras Comarcas do Estado de São Paulo, em que (a) há mais de uma
Vara Judicial instalada, e (b) há Varas Especializadas.
Em outras
palavras, nem sempre todas as atribuições do órgão ministerial de execução são
exercidas perante uma única Vara Judicial.
É dado da
experiência comum e conhecimento geral que o membro do Ministério Público por
vezes exerce suas atribuições perante mais de uma Vara Judicial, seja em função
da divisão numérica na distribuição de feitos, seja em função, igualmente, da
divisão por área especializada de atuação.
E por vezes,
acrescente-se, a atuação se faz em local distinto daquele em que está situada a
sede local do Ministério Público.
Isso ocorre,
por exemplo, nas cidades em que o Ministério Público possui sede própria (tendo
os Promotores de Justiça seus gabinetes fora do prédio do Fórum); em matéria
eleitoral; quando a sede de Varas Especializadas fica situada em prédio
distinto, etc.
Não há
novidade alguma relativamente a esse quadro.
Último e não
menos importante, mostra-se necessário considerar que caso seja acolhida a
alegação da suscitante, ela implicará, na prática, a possibilidade de
esvaziamento de suas atribuições e daquelas inerentes aos demais Promotores de
Brás Cubas no que diz respeito à tutela dos interesses metaindividuais.
Note-se a
interpretação adotada pela suscitante na manifestação que rendeu ensejo ao
conflito, cf. fls. 1141, vol. 6:
“(...)
Além disso, aos Promotores de Justiça de Brás
Cubas persistiriam as atribuições para atuar na defesa de todos os interesses
difusos e coletivos, excluindo apenas quando as demandas fossem de interesse da
Fazenda Pública.
(...)”
A
experiência prática mostra que em sede de tutela dos interesses metaindividuais
em boa parte dos casos estará envolvido Poder Público do Município ou do
Estado, ainda que por força de omissão quanto ao dever de fiscalizar a atuação
danosa dos particulares.
Em outras
palavras, em casos futuros bastaria a suposição, ainda que equivocada, de que o
Poder Público deveria ser investigado, para tornar-se forçosa a conclusão no
sentido da cessação da atribuição dos Promotores de Brás Cubas,
estabelecendo-se, a partir daí, a atuação dos Promotores de Mogi das Cruzes.
Isso
corresponderia à criação de um mecanismo impositivo por força do qual as
investigações teriam, forçosamente, que ser deslocadas para os órgãos de
execução do Ministério Público que atuam na sede da Comarca de Mogi das Cruzes.
A inconveniência
de tal solução fala por si só.
3)
DECISÃO
Diante do
exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com
fundamento no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público,
declarando caber ao suscitante, DD. 4ª
Promotor de Justiça de Brás Cubas, a atribuição para dar seguimento ao
presente expediente, nos termos da fundamentação supra.
Publique-se
a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.
Providencie-se
a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de
Tutela Coletiva.
São Paulo, 19 de outubro de 2011.
Fernando Grella Vieira
Procurador-Geral de Justiça
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