Conflito de Atribuições

– Cível –

 

Protocolado nº 118.856/16

Procedimento MP nº 36.0719.0001170/2016-7

Suscitante: 15º Promotor de Justiça do São José dos Campos (Pessoa com Deficiência)

Suscitado: 14º Promotor de Justiça do São José dos Campos (Saúde Pública)

 

 

Ementa:

1) Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 15º Promotor de Justiça do São José dos Campos (Pessoa com Deficiência). Suscitado: 14º Promotor de Justiça do São José dos Campos (Saúde Pública).

2) Procedimento instaurado para adoção de providências relacionadas à prestação do serviço de saúde mental prestado em São Francisco Xavier. Demanda por atuação ministerial em face, exclusivamente, do serviço público e não da condição de pessoa com deficiência. Não há prevalência do aspecto subjetivo, mas sim do objetivo, relacionado à prestação do serviço de forma universal.

3) Investigação afeta à área da saúde pública.

4) Conflito conhecido e dirimido, cabendo ao suscitado prosseguir na investigação.

 

 

1)  Relatório

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o DD. 15º Promotor de Justiça do São José dos Campos (Pessoa com Deficiência) e como suscitado o DD. 14º Promotor de Justiça do São José dos Campos (Saúde Pública), relativamente ao feito em epígrafe (MP nº 36.0719.0001170/2016-7).

Trata-se de procedimento que tem por objeto a possível adoção de providências relacionadas à prestação do serviço de saúde mental prestado em São Francisco Xavier.

O feito foi instaurado a partir de documento extraído de outra investigação, relativa a direito de pessoa idosa, no qual a Assistente Social relatou que “seria importante a criação de um serviço de saúde mental em São Francisco Xavier” (fl. 03).

A mencionada informação foi encaminhada, pela DD. Promotora de Justiça com atribuições para a tutela dos idosos, à Promotoria de Justiça com atribuições na área da Saúde Pública (fl. 04).

Após realizar diligências, o DD. 14º Promotor de Justiça do São José dos Campos (Saúde Pública) concluiu que há preponderância, no caso, da atribuição da Promotoria de Justiça com atuação na área da Pessoa com Deficiência, para quem determinou o encaminhamento do procedimento (fls. 31/37).

Ocorre, todavia, que o DD. 15º Promotor de Justiça do São José dos Campos (Pessoa com Deficiência) decidiu suscitar conflito negativo, por entender que não tem atribuições para todos os serviços de saúde (fls. 44/46): “O que se verifica é que a questão afeta à saúde pública se sobressai ante eventual questão da deficiência, ou mesmo de eventual internação involuntária”.

É o relato do essencial.

2) Fundamentação

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Como se sabe, no processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador estabelece critérios para a repartição do serviço. Nesse sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 23. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e competência, 11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.

Esta ideia, aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de competência (objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por Adolf Wach, e sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t. I, trad. esp. de Jose Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922, p. 621 e ss; e em suas Instituições de direito processual civil, 2º vol., trad. port. de J. Guimarães Menegale, São Paulo, Saraiva, 1965, p. 153 e ss), bem como por Piero Calamandrei (Instituciones de derecho procesal civil, v. II, trad. esp. Santiago Sentís Melendo, Buenos Aires, EJEA, 1973, p. 95 e ss), entre outros clássicos doutrinadores.

Ora, se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada demanda a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão ministerial com atribuições para certo caso também não parta da hipótese concretamente considerada, ou seja, de seu objeto.

Pode-se, deste modo, afirmar que a definição do membro do parquet a quem incumbe a atribuição para conduzir determinada investigação na esfera cível, que poderá, ulteriormente, culminar com a propositura de ação civil pública, deve levar em consideração os dados do caso concreto investigado.

Pois bem.

A questão central que se extrai do presente procedimento diz respeito a eventual omissão ou inoperância de órgão incumbido da tutela da Saúde Pública.

Dos autos não se capta que a atuação ministerial é cobrada em face, exclusivamente, da condição de pessoa com deficiência. Não há prevalência do aspecto subjetivo, mas sim do objetivo, relacionado à prestação do serviço de forma universal.

Verifica-se que a remessa foi ordenada para o escopo específico de investigar possível deficiência de serviço público de saúde, o que se situa no plexo de atribuições do suscitado.

Em suma, a remessa de peças não teve como objeto a pretensão individual contida no procedimento de origem, mas a investigação, a título coletivo, do mau funcionamento do serviço público de saúde.         

Destarte, à luz dos elementos especificamente colhidos nesse procedimento, pode-se concluir que o feito deve seguir sob a presidência do suscitado, evidenciando assim a necessidade de intervenção do membro do Ministério Público com atribuição na área da Saúde Pública.

3) Decisão

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitado, DD. 14º Promotor de Justiça do São José dos Campos (Saúde Pública), a atribuição para oficiar no procedimento investigatório.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 20 de setembro de 2016.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

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