Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado nº 125.355/2010

Autos nº 2010.157376-0 (controle nº 1139/2010)

27ª Vara Cível da Capital

Medida Cautelar

Suscitante: 3ª Promotora de Justiça de Direitos Humanos

Suscitado: 3º Promotor de Justiça de Registros Públicos

 

1)     Conflito negativo de atribuições. Remessa de autos de uma Promotoria a outra. Inexistência de manifestação fundamentada por parte de um dos órgãos de execução, suscitando o conflito.

2)     Interpretação e aplicação do art. 115 da Lei Complementar estadual nº 734/93.

3)     Conflito não conhecido. Devolução dos autos à origem.

Vistos.

1)   Relatório.

Trata-se de conflito negativo de atribuições, supostamente verificado entre a DD. 3ª Promotora de Justiça de Direitos Humanos e o DD. 3º Promotor de Justiça de Registros Públicos.

O feito foi inicialmente encaminhado à DD. 3ª Promotora de Justiça de Direitos Humanos, que lançou manifestação destacando que: (a) trata-se de ação individual movida pela autora em face da Associação dos Servidores do Instituto de Infectologia Emilio Ribas, pugnando pela nomeação de administrador provisório, tendo em vista que a entidade está há alguns anos sem diretor, o que a impede de continuar suas atividades; (b) não há fundamento que justifique a intervenção, no feito, da Promotoria de Justiça de Direitos Humanos, na área da saúde pública, por não se tratar de caso que diga respeito ao zelo por serviços de relevância pública relacionados à saúde; (c) vão além das suas atribuições tratar de questões relacionadas a problemas administrativos que não digam respeito à promoção, defesa e recuperação da saúde; (d) os autos tratam de demanda relativa, exclusivamente, a problemas relativos à gestão da associação civil, que não ostentam repercussão na área dos interesses difusos ou coletivos; (e) o feito deveria ser encaminhado à Promotoria de Justiça Cível da Capital (fls. 85/87).

Diante de tal manifestação, o MM. Juiz de Direito determinou a remessa dos autos à Promotoria Cível (fls. 88).

A DD 1ª Promotora de Justiça Cível pugnou no sentido de que a autora esclarecesse se a questão relacionava-se a matéria envolvendo fundações (fls. 88/v).

Com o esclarecimento da autora, no sentido de que a requerida não é fundação (fls. 89/v), o MM. Juiz de Direito determinou a remessa dos autos à Promotoria de Justiça de Registros Públicos, deixando o despacho consignado que “caso esta informe não ser sua atribuição, remetam-se os autos ao Procurador-Geral de Justiça para decidir acerca da competência” (fls. 92).

O DD 3º Promotor de Justiça de Registros Públicos, por seu turno, requereu o retorno do feito à Promotoria Cível para apreciação, sem suscitar conflito negativo (fls. 92/v).

É o relato do essencial.

2) Fundamentação.

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições não está configurado, razão pela qual não pode ser conhecido.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. Ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Em sentido análogo, confira-se Hugo Nigro Mazzilli, Regime Jurídico do Ministério Público, 6. Ed., São Paulo, Saraiva, 2007, p. 486/487.

No caso em exame, não foi suscitado conflito de atribuições por nenhum dos órgãos ministeriais de execução que tiveram contato com os autos.

Só se caracteriza o conflito quando um dos órgãos de execução, diante da divergência, fundamentadamente suscita o incidente, nos termos do art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público (Lei Complementar Estadual nº 734, de 1993), que assim dispõe:

“(...)

Art. 115. Os conflitos de atribuição deverão ser suscitados, fundamentadamente, nos próprios autos em que ocorrerem e serão decididos pelo Procurador-Geral de Justiça.

(...)”

Se não ficou caracterizado o conflito de atribuições – que depende de provocação fundamentada por parte de um dos órgãos ministeriais que atuaram no caso - nos estritos moldes delimitados na Lei Complementar nº 734, de 1993, não há razão para deliberação por parte do Procurador-Geral de Justiça.

Entendimento diverso, com a devida vênia, implicaria desconsideração da independência funcional, prerrogativa constitucional dos membros do Ministério Público.

Em sentido análogo, embora ao tratar da questão da recusa de intervenção por parte do Ministério Público, é a lição de Hugo Nigro Mazzilli (Regime Jurídico do Ministério Público, cit., p. 489), aplicável à hipótese mutatis mutandis:

 “(...)

          Se não faltou o ato ministerial, que está nos autos, mas o juiz cível discorda da forma ou do conteúdo do ato efetivamente apresentado pelo membro do Ministério Público, aí não haverá razão para invocar o art. 28 do Código de Processo Penal, em imprópria analogia com o sistema de controle de arquivamento do inquérito policial. (...) no caso ora em exame, não há como falar em inércia. Não se entendesse assim, e qualquer juiz ou tribunal, discordando do parecer do órgão ministerial, poderia propor ao procurador-geral o reexame do ato ou a substituição do membro do Ministério Público, o que seria uma forma inadmissível de contornar os princípios do promotor natural e da independência funcional.

(...)”

Assim, a solução que se mostra mais adequada ao caso é a abertura de nova vista ao órgão ministerial que postulou esclarecimentos por parte da autora (fls. 88/v), a fim de que, diante das informações prestadas pela requerente (fls. 89), manifeste-se, inclusive, caso entenda pertinente, quanto à necessidade ou não de intervenção ministerial no feito em exame.

3) Decisão

Diante do exposto, não se conhece da remessa.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 1º de outubro de 2010.

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

 

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