Conflito de Atribuições

– Cível –

 

Protocolado nº 30.854/2018

(MP nº 43.0695.0000139/2018-4)

Suscitante: 3º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital

Suscitado: 12º Promotor de Justiça de Campinas

 

Ementa:

1)      Conflito negativo de atribuições. 3º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital e 12º Promotor de Justiça de Campinas. Procedimento instaurado diante de reclamação de cidadã demonstrando o inconformismo com a cobrança de pedágio no deslocamento que faz dentro do Município de Campinas.

2)      Compreensão da regra de competência do foro do local do dano (art. 2º da LACP) e do foro da capital do Estado, nos casos de dano regional (art. 93, II do CDC). No caso ora em análise, importante considerar que a cobrança do pedágio é fixada segundo os parâmetros fixados no contrato de concessão, sendo que a Rodovia possui 170 (cento e setenta) quilômetros, ligando Campinas à cidade de Mococa, conforme esclareceu o suscitado a fl. 02. Há a informação, ainda, de que citada Rodovia apresenta 4 (quatro) praças de pedágio, situadas nos municípios de Campinas, Estiva Gerbi, Casa Branca e Mococa. Notório, pois, tratar-se de matéria de âmbito regional. Atribuição da Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital.

 

Vistos.

1)  Relatório.

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o DD. 3º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital, e como suscitado o DD. 12º Promotor de Justiça de Campinas, nos autos do Pt. nº 43.0695.0000139/2018-4, constando como assunto o seguinte: “Apuração de suposta irregularidade na cobrança de pedágio para a locomoção dos moradores de Campinas/SP que trafegam para o mesmo município”.

Pondera a Digníssima Promotora de Justiça suscitante, designada para o exercício das atribuições do 3º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital, em síntese, que a situação trazida à baila na presente representação tem como objeto a cobrança de pedágio dos moradores do bairro Bananal, em Campinas, para se deslocarem por pequeno trecho, dentro do próprio município. Alega que o art. 93, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor, disciplina a competência da Capital do Estado ou do Distrito Federal, para os danos de âmbito nacional ou regional, mas que não pode ser aplicado no caso vertente, por se tratar de dano de âmbito local, incidindo, por isso, as disposições do art. 93, inc. I, do CDC e do art. 2º, da Lei nº 7.347/85 (fl. 53).

O suscitado, DD. 12º Promotor de Justiça de Campinas, ao determinar a remessa dos autos ao suscitante, assentou que “toda e qualquer discussão envolvendo a questão da tarifa, por se tratar de dano de âmbito regional, deve ocorrer no Foro da Capital, nos termos do art. 93, II da Lei 8.078/90, ressalvado, evidentemente, entendimento contrário” (fl. 02).

É o relato do essencial.

2) Fundamentação.

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Como se sabe, no processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador estabelece critérios para a repartição do serviço. Nesse sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 23. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e competência, 11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.

Esta ideia, aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de competência (objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por Adolf Wach, e sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t. I, trad. esp. de Jose Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922, p. 621 e ss; e em suas Instituições de direito processual civil, 2º vol., trad. port. de J. Guimarães Menegale, São Paulo, Saraiva, 1965, p. 153 e ss), bem como por Piero Calamandrei (Instituciones de derecho procesal civil, v. II, trad. esp. Santiago Sentís Melendo, Buenos Aires, EJEA, 1973, p. 95 e ss), entre outros clássicos doutrinadores.

Ora, se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada demanda a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão ministerial com atribuições para certo caso também não parta da hipótese concretamente considerada, ou seja, de seu objeto.

Pode-se, deste modo, afirmar que a definição do membro do parquet a quem incumbe a atribuição para conduzir determinada investigação na esfera cível, que poderá, ulteriormente, culminar com a propositura de ação civil pública, deve levar em consideração os dados do caso concreto investigado.

Na hipótese em análise, o elemento central para a decisão do conflito é saber qual a provável dimensão do risco ou dano, e, consequentemente, se deve ser aplicada a regra de competência prevista no art. 2º da Lei da Ação Civil Pública, ou então a norma prevista no art. 93, II, do Código de Defesa do Consumidor.

O objeto da investigação, como se infere dos autos, está relacionado à reclamação de cidadã demonstrando o inconformismo com a cobrança de pedágio no deslocamento que faz dentro do Município de Campinas.

Dessa forma, não há dúvida de que os fatos investigados afetam usuários que, cotidianamente, utilizam do trecho da rodovia, no âmbito da Comarca de Campinas, por residirem ou passarem por tal região.

Resta saber, entretanto, se esse fato é suficiente para configurar a fattispecie prevista no art. 93, II do Código de Defesa do Consumidor, pelo qual a competência jurisdicional (e por analogia a atribuição ministerial) será do foro da Capital do Estado se o risco ou dano for “regional”.

Em outras palavras, resta delimitar o conceito de “dano regional” adotado pelo legislador, e saber se ele se contra preenchido no caso concreto, e se, nesse caso, fica afastado o critério primário de definição da competência, no foro do local do dano (nos termos previstos no art. 2º da Lei da Ação Civil Pública, e no art. 93, I do Código de Defesa do Consumidor).

No caso ora em análise importante considerar que a cobrança do pedágio é fixada segundo os parâmetros implantados no contrato de concessão, sendo que a Rodovia ora em análise possui 170 (cento e setenta) quilômetros, ligando Campinas à cidade de Mococa, conforme esclareceu o suscitado a fl. 02. Há a informação, ainda, de que citada Rodovia apresenta 4 (quatro) praças de pedágio, situadas nos municípios de Campinas, Estiva Gerbi, Casa Branca e Mococa. Notório, pois, tratar-se de matéria de incidência regional.

Destarte, a atribuição para oficiar na investigação será do DD. Promotor de Justiça do Consumidor da Capital.

3) Decisão

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitante, 3º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital, a atribuição para oficiar no procedimento investigatório.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 14 de maio de 2018.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

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