CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES – CÍVEL

 

Protocolado nº 44.176/2008

Suscitante: Promotor de Justiça de Ilhabela

Suscitado: Promotor Regional do Meio Ambiente.

 

Ementa: 1)Conflito de atribuições. Promotoria Regional do Meio Ambiente (suscitada) e Promotoria com funções cumulativas (suscitante). Ação anulatória de ato administrativo (auto de infração administrativa ambiental), movida em face da autoridade de Polícia Ambiental e da Fazenda Pública do Estado. 2)Oportunidade de manifestação do Ministério Público sobre a necessidade ou não de intervir. Atribuição da Promotoria de Justiça especializada, ou seja, a Regional do Meio Ambiente (cf. art.114 §3º da Lei Complementar 734/93). Necessidade de evitar manifestações conflitantes de diferentes membros do Ministério Público. Princípio da eficiência na Administração Pública. 3)Dirimido o conflito, determinando-se caber à Promotoria Especializada (Regional do Meio Ambiente) oficiar no feito de origem.

 

 

         Vistos

 

 

         Tratam estes autos de conflito de atribuições suscitado pela d. Promotora de Justiça de Ilhabela, dra. (...), figurando como suscitada a d. Promotora de Justiça Regional do Meio Ambiente do Litoral Norte, dra. (...).

 

         Nos autos do processo nº 247.01.2006.001290-9 (ordem nº745/2006), da Vara Única de Ilhabela (ação declaratória de nulidade de ato administrativo, proposta pela Ilha Imóveis Empreendimentos e Participações S/C Ltda, em face do Comandante da 3ª Companhia do 3º Batalhão de Polícia Ambiental, e da Fazenda Pública do Estado de São Paulo), o d. magistrado oficiante determinou vista dos autos à Promotora de Justiça Regional do Meio Ambiente, para apreciação, em virtude da existência de discussão com repercussão sobre matéria ambiental, bem como pela informação no sentido da existência de inquérito civil a respeito.

 

         A Promotora de Justiça que oficia junto à Regional do Meio Ambiente do Litoral Norte postulou fosse oportunizada a manifestação da Promotoria de Justiça de Ilhabela, vindo esta última a suscitar o conflito negativo de atribuições.

 

         De um lado, a suscitante (i. Promotora de Justiça de Ilhabela), afirma, em síntese, que cabe à Promotoria de Justiça Regional do Meio Ambiente oficiar no feito, pois: (a) existe inquérito civil instaurado para apurar os fatos, e (b) o princípio da especificidade assim o recomenda, evitando-se posicionamentos institucionais contraditórios a respeito do mesmo caso. Por seu turno, a suscitada sustenta que a Promotoria Regional apenas deve oficiar nas ações civis públicas propostas pelo Ministério Público.

 

         Este é o breve relato do que consta destes autos. Passo a decidir.

 

         De acordo com a portaria de designação da d. Promotora de Justiça suscitada, ostenta ela, atualmente, atribuições para:

 

“(...) auxiliar no exercício das funções do 2º Promotor de Justiça de Ubatuba, do 3º Promotor de Justiça de São Sebastião, do 3º Promotor de Justiça Caraguatatuba e do Promotor de Justiça de Ilhabela, nas seguintes matérias: espaços territoriais especialmente protegidos e seus atributos (área de preservação permanente, reserva legal e unidades de conservação) e complexos vegetacionais objeto de especial proteção; recursos hídricos e poluição industrial hídrica; práticas rurais antiambientais; disposição final de esgoto doméstico, resíduos sólidos e industriais; proteção da fauna ameaçada de extinção e danos à fauna nativa de repercussão regional; mineração em leitos de cursos d´água e canais em áreas inundáveis e outras formas de mineração, desde que tenham repercussão regional; questões relativas à função socioambiental do grande imóvel rural e conflitos fundiários (CPC, art. 82, inc. III) ; b) habitação e urbanismo: parcelamentos do solo clandestinos (em zona urbana e rural); parcelamentos irregulares e ilegalmente licenciados, desde que tenham repercussão regional; regularização fundiária de assentamentos precários e informais, de 01 a 30 de abril de 2008 (Pt. nº 26.081/08, D.O.E.29.03.2008, portaria nº2176/2008).”

 

         Adequado reconhecer, dessa forma, que todas as atribuições para oficiar nos feitos administrativos (inquéritos civis ou procedimentos preparatórios) ou judiciais, relacionados à defesa do meio ambiente, na Região abrangida na portaria de designação editada pela Procuradoria-Geral de Justiça (Litoral Norte), são conferidas à suscitada. Essa concentração de atribuições, associada à matéria especializada (defesa do meio ambiente) e à região que compõe, por aproximação, determinado ecossistema (Região do Litoral Norte) é essencialmente o fator que tem inspirado a idéia da criação de Promotorias Regionais.

 

         Observo, ainda, nesse mesmo sentido, que tais atribuições são indissociáveis do próprio caráter regional da Promotoria Especializada, pois, ainda que não haja menção expressa a respeito no próprio ato de designação, o princípio da eficiência no âmbito da Administração Pública conduz a tal conclusão.

        

                  É necessário ponderar, ademais, que a Lei Orgânica Estadual do Ministério Público (Lei Complementar nº734/93), adota, de forma expressa, critérios que servirão ao esclarecimento de dúvidas nas hipóteses de conflitos de atribuições, quais sejam: (a) o critério da especialização; e (b) o critério da prevenção.

 

         A propósito, o §3º do art.114 da Lei Orgânica Estadual prevê que, apresentando-se, em determinado caso concreto, interesses de abrangência equivalente que justifiquem a intervenção ministerial, deverá atuar no feito o membro da instituição investido de “atribuição mais especializada”; de outro lado, no caso de dúvida por haver mais de um membro com atribuição igualmente especializada, atuará o que estiver prevento, ou seja, aquele que “primeiro oficiar no processo ou procedimento”.

 

         Na hipótese em exame, o primeiro critério (especialidade) é suficiente para dirimir o conflito. Vale aqui, mutatis mutandis, a recomendação de Hugo Nigro Mazzilli, no sentido de que “tratando-se de interesses de abrangência equivalente, oficiará no feito o membro do Ministério Público investido da atribuição mais especializada” (Regime jurídico do Ministério Público, 6ªed., São Paulo, Saraiva, 2007, p.422).

 

         A atribuição da Promotoria de Justiça de Ilhabela é cumulativa, ao passo que a Promotoria Regional do Meio Ambiente é especializada.

 

         Seja, então, em virtude da especialização, seja em razão da necessidade de evitar-se manifestações conflitantes de membros do Ministério Público, seja, finalmente, pelo princípio da eficiência, caberá à d. Promotora Regional do Meio Ambiente oficiar no feito.

 

         Oportuno mencionar, ademais, um aspecto que ainda pende de apreciação, e que extrapola a solução do presente conflito, em respeito ao princípio da independência funcional, mas que merecerá análise por parte do membro do Ministério Público com atribuições para oficiar no caso: a pertinência ou não da intervenção ministerial, tendo em conta tratar-se de demanda cujo pedido volta-se, exclusivamente, à anulação de ato administrativo (autuação administrativa por infração de natureza ambiental), cujos reflexos com relação ao meio ambiente, ao que tudo indica, residem apenas no plano secundário e eventual.

 

         Diante do exposto, com fundamento no art.115 da Lei Complementar 734/93, dirimo o presente conflito de atribuições, declarando competir à d. Promotora de Justiça Regional do Meio Ambiente (Litoral Norte) oficiar no feito.

 

         Publique-se por extrato, comunique-se e cumpra-se.

 

São Paulo, 24 de abril de 2008.

 

 

 

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça