Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado n. 4.931/17

Conflito Negativo de Atribuição

Suscitante: 4º Promotor de Justiça de Itanhaém (Patrimônio Público e Social)

Suscitados: 1º Promotor de Justiça de Itanhaém (Habitação e Urbanismo) e 3º Promotor de Justiça de Itanhaém (Interesses Difusos e Coletivos – Infância e Juventude)

 

 

Ementa: Conflito negativo de atribuição. Promotoria de Justiça de Itanhaém. Áreas de Habitação e urbanismo, Patrimônio público e social, Cidadania e Infância e Juventude. Escola pública. Segurança das edificações. Atribuição do Promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo. Conflito conhecido e provido.

1. Não há conflito de atribuições entre Promotor de Justiça e Secretários Executivos de Promotorias de Justiça, posto que estes últimos não são órgãos de execução dotados de atribuições fim.

2. A existência de órgãos de execução especializados pressupõe a atuação específica em razão da distinta natureza jurídica dos bens envolvidos, embora não elimine nem estorve a atuação integrada ou conjunta quando os interesses distintos tenham afinidade ou aproximação.

3. O art. 114, LOEMP, que fornecia critérios para solução de conflitos de atribuição foi julgado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (ADI 932), mas, não se impede que, no plano administrativo, o Procurador-Geral de Justiça, incumbido de dirimir conflitos (positivos ou negativos) de atribuição, aplique os critérios de abrangência, especialização e prevenção – embora esta não seja adequada em face de órgãos de execução dotados de atribuições diversas, pois, a prevenção só se aplica se em face de núcleos de atribuições idênticas.

5. Representação que denuncia omissão, defeito ou morosidade estatal na conservação da higidez da estrutura física de escola pública estadual que se afeta potencial ou efetivamente os usuários do serviço público social (estudantes) também expõe a perigo outras categorias de pessoas como docentes e funcionários públicos em geral.

6. Repercussão da irregularidade apontada na qualidade da oferta de ensino é secundária ao foco primário da questão.

7. A segurança de edificações públicas ou privadas é assunto que pertence ao membro do Ministério Público titular do cargo com atribuição na área especializada de Habitação e Urbanismo e se captado algum elemento na instrução do procedimento a ser instaurado evidenciando improbidade administrativa ou lesão ao patrimônio público subjacentes, seu presidente deve encaminhar peças ao suscitante para as devidas providências.

8. Conflito negativo de atribuição conhecido e provido declarando caber ao suscitado, 1º Promotor de Justiça de Itanhaém (Habitação e Urbanismo), a atribuição para oficiar nos autos.

 

          

                  

                  

                   Representação com fundamento nos arts. 6º, 205, 206, I e VII, 208, §§ 1º e 2º, e 227 da Constituição da República e nas Leis n. 9.394/96 e n. 8.069/90 pedindo providências para reforma e ampliação da Escola Estadual Benedito Calixto, em Itanhaém, em face do estado de suas instalações (Protocolo n. 2.881/16 - fls. 02/05), foi remetida pelo douto 4º Promotor de Justiça de Itanhaém à Secretaria-Executiva da Promotoria de Justiça por não ter atribuição para apuração das condições de segurança de edificações destinadas ao ensino público para garantia do direito à educação e à sua oferta regular com qualidade, com sugestão de distribuição aos membros portadores de atribuições nas áreas de Infância e Juventude ou Habitação e Urbanismo (fls. 64/65).

                   O douto Secretário-Executivo apontando sobreposição de diversas áreas de atuação entendeu que o 4º Promotor de Justiça tem atribuição, nos termos do Ato n. 147/2015, para questões relacionadas à qualidade do serviço público educacional (Cidadania), além de a má conservação do prédio ser matéria de sua atribuição (Patrimônio Público e Social), e embora reconhecesse parciais atribuições de Infância e Juventude e Habitação e Urbanismo, restituiu-lhe os autos (fls. 69/73) e, em seguida, este suscitou conflito negativo de atribuição salientando, em suma, que o problema reside na infraestrutura predial da escola com risco a estudantes, docentes, funcionários e transeuntes, insistindo na atribuição do 1º Promotor de Justiça de Itanhaém (Habitação e Urbanismo) por revelar questão preponderante de segurança de edificação (fls. 75/81).

                   À vista de potencial atribuição do 3º Promotor de Justiça (Infância e Juventude), determinou-se a colheita de sua manifestação (fl. 86) que aderiu à postura do suscitante (fls. 88/94).

                   É o relatório.

                   Anoto, prefacialmente, que é descabida a solução de conflito de atribuição entre Promotor de Justiça e Secretário-Executivo de Promotoria de Justiça porque somente aquele que efetiva ou potencialmente é titular de atribuição pode fazê-lo.

                   Neste sentido já foi decidido:

“3. Não há conflito de atribuições entre Secretários Executivos de Promotorias de Justiça, posto que não são órgãos de execução dotados de atribuições fim;

4. Incumbe aos Secretários Executivos responder por serviços administrativos, a teor do disposto no art. 47, II da Lei Complementar nº 734/93, o que inclui a distribuição de representações, sendo-lhes vedado decidir pela inexistência de hipótese de atuação do Ministério Público pelo não enquadramento imediato em quaisquer das atribuições das Promotorias de Justiça que secretaria” (Protocolado n. 53.347/16).

“4. Secretário Executivo que responde por serviços administrativos, a teor do disposto no art. 47, II, da Lei Complementar nº 734/93, de forma que, rejeitada a prevenção por qualquer Promotoria de Justiça, não lhe compete decidir sobre a controvérsia, sob pena de se substituir aos Promotores de Justiça e ao Procurador-Geral de Justiça na apreciação de eventual conflito de atribuições” (Protocolado n. 56.586/16).

“2. Não há conflito de atribuições entre Promotor de Justiça e Secretários Executivos de Promotorias de Justiça, posto que estes últimos não são órgãos de execução dotados de atribuições fim;

3. Incumbe aos Secretários Executivos responder por serviços administrativos, a teor do disposto no art. 47, II da Lei Complementar nº 734/93, o que inclui a distribuição de representações, sendo-lhes vedado decidir pela inexistência de hipótese de atuação do Ministério Público pelo não enquadramento imediato em quaisquer das atribuições das Promotorias de Justiça que secretaria” (Protocolado n. 149.289/16).

                   Entretanto, o caso em foco apresenta singularidade porque o Promotor de Justiça Secretário-Executivo é titular do cargo de 1º Promotor de Justiça de Itanhaém, competente na área de Habitação e Urbanismo, e declinou de sua atribuição.

                   Portanto, o conflito merece conhecimento.

                   Em linhas gerais é de se registrar, preambularmente, que a existência de órgãos de execução especializados pressupõe a atuação específica em razão da distinta natureza jurídica dos bens envolvidos, embora não elimine nem estorve a atuação integrada ou conjunta quando os interesses distintos tenham afinidade ou aproximação.

                   O art. 114 da Lei Orgânica Estadual n. 734/93 que fornecia critérios para solução de conflitos de atribuição foi julgado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (ADI 932), cuja ementa do venerando acórdão assim expressa:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTS. 6º, I, 16 E 17 DA LEI COMPLEMENTAR 667/1991 DO ESTADO DE SÃO PAULO. CRIAÇÃO E EXTINÇÃO DE CARGOS NO QUADRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO E OUTRAS PROVIDÊNCIAS CORRELATAS. PREJUDICIALIDADE QUANTO AO ART. 18 REJEITADA. AÇÃO JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE. I – Dispositivo de lei estadual que apenas altera denominação de cargo ou estabelece prazo para reorganização interna da carreira do Ministério Público não afronta o art. 22 da Constituição Federal. II – Não há qualquer inconstitucionalidade em dispositivo que revoga uma atribuição inconstitucional conferida ao Parquet, como a curadoria no processo civil de réu revel ou preso. III – Embora o art. 18 da Lei Complementar 667/1991 tenha sido derrogado pelo art. 114 da Lei Complementar 734/1993, o Tribunal recebeu a manifestação do Conselho Federal da OAB como aditamento à inicial, superando a preliminar de prejudicialidade, para conhecer da ação direta quanto a ambos os artigos. IV – A legislação estadual, ao disciplinar matéria processual, invadiu competência privativa conferida à União. V – Ação julgada parcialmente procedente para declarar inconstitucional o art. 18 da Lei Complementar 667/1991, bem como o art. 114 da Lei Complementar 734/1993”.

                   O dispositivo previa o seguinte:

Artigo 114 - No mesmo processo ou procedimento não oficiará simultaneamente mais de um órgão do Ministério Público.

§ 1º - Para fins de atuação conjunta e integrada, como propositura de ações ou interposição de recursos, será admitida a atuação simultânea de membros do Ministério Público.

§ 2º - Se houver mais de uma causa bastante para a intervenção do Ministério Público, nele oficiará o órgão incumbido do zelo do interesse público mais abrangente.

§ 3º - Tratando-se de interesses de abrangência equivalente, oficiará no feito o órgão do Ministério Público investido da atribuição mais especializada; sendo todas as atribuições igualmente especializadas, incumbirá ao órgão que por primeiro oficiar no processo ou procedimento, ou a seu substituto legal, exercer todas as funções de Ministério Público.

                   A Suprema Corte considerou que houve invasão da competência normativa federal sobre processo. Isso, todavia, não impede que, no plano administrativo, o Procurador-Geral de Justiça, incumbido de dirimir conflitos (positivos ou negativos) de atribuição, aplique tais critérios.

                   Convém destacar que, como já decidido, não é adequado o emprego da prevenção – embora seja determinante racional, impessoal e objetiva - em face de órgãos de execução dotados de atribuições diversas, pois, a “prevenção só se aplica se em face de núcleos de atribuições idênticas” (Protocolado n. 8.138/15; Protocolado n. 184.185/14).

                   Registro, ademais, que o interesse público de maior abrangência foi empregado (Protocolado n. 43.819/14; Protocolado n. 24.454/14).

                   A segurança de edificações públicas ou privadas é assunto que pertence ao membro do Ministério Público titular do cargo com atribuição na área especializada de Habitação e Urbanismo.

                   A contextura emergente dos autos revela omissão, defeito ou morosidade estatal na conservação da higidez da estrutura física de escola pública estadual (comprometimento do telhado e da parte externa da quadra poliesportiva, infiltração e alagamento etc.) que se afeta potencial ou efetivamente os usuários do serviço público social (estudantes) também expõe a perigo outras categorias de pessoas como docentes e funcionários públicos em geral.

                   Questão deste jaez é elementar à atribuição na área de habitação e urbanismo, como revela precedentes (Protocolado n. 27.462/13, v.g.), merecendo invocar recente decisão assim ementada:

1. Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 2º Promotor de Justiça de Bertioga (Patrimônio Público e Social). Suscitado: 1º Promotor de Justiça de Bertioga (Habitação e Urbanismo).

2. Representação noticiando ausência de auto de vistoria de corpo de bombeiro na Prefeitura Municipal. Alegação do suscitado no sentido de que por se tratar de prédio público, a atribuição é da Promotoria do Patrimônio Público e Social. Suscitante, por sua vez, que invoca do Manual de Atuação Funcional do MP para concluir que a atribuição é da Promotoria de Habitação e Urbanismo.

3. Inteligência do art. 473 do Manual de Atuação Funcional, aprovado pelo Ato Normativo 675/2010-PGJ-CGMP, de 28 de dezembro de 2010, segundo o qual compete à Promotoria de Justiça da Habitação e Urbanismo zelar pelo cumprimento da legislação sobre segurança e prevenção de incêndios nas áreas urbanas, em especial nas edificações públicas e privadas sujeitas a grande concentração de pessoas.

4. Conflito conhecido e dirimido, cabendo ao suscitado, 1º Promotor de Justiça de Bertioga (Habitação e Urbanismo), prosseguir na investigação” (Protocolado n. 60.470/16).

                   Ressalto, por oportuno, que decisão reconhecendo a atribuição da área de Cidadania (hoje equivalente a Direitos Humanos) foi afirmada no precedente invocado pelo suscitado tendo em mira conflito com o Promotor de Justiça titular de atribuição de Infância e Juventude sobre segurança de edificação em escola pública (Protocolado n. 150.031/14), sem abordar a competência da área de Habitação e Urbanismo envolvendo temáticas elementares ao uso do solo urbano.

                   Assim sendo, a atribuição pertence ao Promotor de Justiça com atribuição na área de Habitação e Urbanismo, ressaltando que a repercussão da irregularidade apontada na qualidade da oferta de ensino é secundária ao foco primário da questão.

                   Registro, por fim, que se captado algum elemento na instrução do procedimento a ser instaurado evidenciando improbidade administrativa ou lesão ao patrimônio público subjacentes, seu presidente deve encaminhar peças ao suscitante para as devidas providências.

                   Face ao exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuição e dirimo-o, com fundamento no art. 115, da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitado, 1º Promotor de Justiça de Itanhaém (Habitação e Urbanismo), a atribuição para oficiar nos autos.

                   Publique-se a ementa. Comuniquem-se os interessados. Cumpra-se, providenciando-se a remessa dos autos. Remeta-se cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

         São Paulo, 15 de fevereiro de 2017.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

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