Protocolo nº 52.413/18

Suscitante: 33º Promotor de Justiça de Campinas (Infância e Juventude)

Suscitados: 24º Promotor de Justiça de Campinas (Patrimônio Público e Social)

 

Ementa:

1.      Inquérito civil oriundo do Ministério Público Federal, visando apurar eventual violação a direitos fundamentais (privacidade) decorrente da instalação de câmeras de segurança nas salas de aulas de centro estadual de educação.

2.      Não há conflito de atribuições entre Promotor de Justiça e Secretário Executivo de Promotoria de Justiça, posto que estes últimos não são órgãos de execução dotados de atribuições fim, cabendo-lhe responder por serviços administrativos, a teor do disposto no art. 47, II da Lei Complementar nº 734/93, o que inclui a distribuição de representações e inquérito civis.

3.      Além disso, os conflitos de atribuições configuram-se in concreto, jamais in abstracto, quando, considerado o posicionamento de órgãos de execução do Ministério Público quando “(a) dois ou mais deles manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusões às de outro membro (conflito positivo); (b) ao menos um membro negue a própria atribuição funcional e a atribua a outro membro, que já a tenha recusado (conflito negativo)” (cf. Hugo Nigro Mazzilli, Regime Jurídico do Ministério Público, 6ª ed., São Paulo, Saraiva, 2007, p. 486/487).

4.      Remessa não conhecida, determinando-se o encaminhamento do expediente ao suscitante.

 

Vistos.

1.   Relatório

Trata-se de inquérito civil originalmente instaurado pelo Ministério Público Federal, com o fim de apurar eventual violação a direitos fundamentais decorrente da instalação de câmeras de segurança nas salas de aulas de centro estadual de educação (CEETEPS).

O procedimento foi arquivado pelo Procurador da República, sob o entendimento que aplicada a regra da ponderação na colisão dos direitos fundamentais potencialmente em conflito no caso concreto (direito à privacidade dos alunos x segurança do patrimônio público), há preponderância do interesse público, já que o número de ocorrências envolvendo depredação do patrimônio da escola é crescente (fls. 113/114).

Os autos foram encaminhados para homologação da promoção de arquivamento pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal, ocasião em que se reconheceu ausente hipótese de intervenção. Porém, considerando precedentes adotados em casos análogos, a promoção de arquivamento foi convolada em declínio de atribuição para que o Ministério Público Estadual adotasse “medidas que julgar cabíveis”, aparentemente na área da educação, mediante análise das condições das escolas (fls. 119/120).

Recebidos os autos da Promotoria de Justiça de Campinas, o 24º Promotor de Justiça de Campinas, na qualidade de “Coordenador Setorial de Interesses Difusos e Coletivos”, encaminhou os autos à Coordenadora da Área da Infância e Juventude local (fls. 124), que por sua vez o distribuiu ao 33º Promotor de Justiça de Campinas, com atribuição na área da educação (fls. 126).

O 33º Promotor de Justiça de Campinas, por seu turno, ao receber o inquérito civil, suscitou conflito de atribuições em face do 24º Promotor de Justiça, aduzindo, em síntese, que a suposta violação à privacidade decorrente da instalação das câmeras de segurança atingiria não apenas adolescentes, mas também adultos e funcionários do local, extrapolando, portanto, o âmbito da proteção aos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos da infância e juventude sob o viés da área da educação. De outro lado, considerando que as câmeras foram instaladas com o fim de proteger o patrimônio público, a atribuição para oficiar no feito é do órgão de execução que atua em referida área, qual seja, o suscitado.

É o relato do essencial.

2.   Fundamentação.

Não está configurado o conflito de atribuições.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

No presente caso, as partes envolvidas são o 24º Promotor de Justiça, que ocupa a função de “Coordenador Setorial de Interesses Difusos e Coletivos” da Promotoria de Justiça de Campinhas, responsável pelo encaminhamento do inquérito civil e o 33º Promotor de Justiça de Campinas, para o qual o procedimento foi distribuído.

O “Coordenador Setorial” exerce funções equivalentes ao de Secretário Executivo da Promotoria de Justiça, a quem incumbe responder pelos serviços administrativos das Promotorias, conforme disposto no artigo 47, inciso II da Lei Complementar nº 734/93:

“Artigo 47 - As Promotorias de Justiça serão organizadas por Ato do Procurador-Geral de Justiça, observadas as seguintes disposições:
(...)

II - nas Promotorias de Justiça com mais de 1 (um) integrante serão escolhidos Promotores de Justiça para exercer, durante o período de 1 (um) ano, permitida uma recondução consecutiva, as funções de Secretário Executivo e respectivo Suplente, com incumbência de responder pelos serviços administrativos da Promotoria;

(...)”

Assim, ao Coordendor Setorial, em função equivalente ao Secretário Executivo, cabe a distribuição do inquérito civil a uma das Promotorias de Justiça que secretaria administrativamente.

Recebido o inquérito civil, por ordem de distribuição, caberia ao  Promotor de Justiça destinatário do procedimento – no caso em testilha o 33º DD. Promotor de Justiça, ora suscitante - a recusa de atuação e consequente remessa à Promotoria de Justiça que entender dotada de atribuição, ocasião em que se abriria, então, possibilidade para eventual conflito negativo entre referidos órgãos de execução.

No caso em testilha, verifica-se que os autos não foram remetidos ao 24º Promotor de Justiça, ora suscitado, para manifestação na qualidade de órgão de execução com atuação na área do patrimônio público e social.

Em outras palavras, não há recusa de intervenção pelos dois órgãos de execução envolvidos.

Desse modo, ausente pretensão resistida do suscitado, inviável a instauração do conflito negativo de atribuições.

3. Decisão

Diante do exposto, determino o encaminhamento do presente expediente ao 33º Promotor de Justiça, para apreciação do inquérito civil e tomada das medidas que entender pertinentes, seja realizando novas diligências; reiterando a promoção de arquivamento já existente nos autos, ou ainda, encaminhando os autos ao órgão de execução que entender possuir atribuição para atuar no feito.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando o encaminhamento dos autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

Restituam-se os autos à origem.

São Paulo, 04 de julho de 2018.

 

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

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