Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado nº 5.279/18

(Ref. SIS MP 14.0482.0000252/2017-8)

Suscitante: 2º Promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital

Suscitada: 1º Promotoria de Justiça do Meio Ambiente da Capital

 

Ementa:

1)    Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 2ª Promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital; Suscitado: 1º Promotor de Justiça do Meio Ambiente da Capital.

2)    Inquérito civil instaurado para apurar: a) Qualidade do ar no Município de São Paulo, com a entrada em vigor do plano diretor da cidade. Adensamento de construções civis – impacto na verticalização em centros urbanos – impedimento de circulação adequada do ar, gerando ilhas de calor e concentração de contaminantes. b) Os prejuízos ambientais e urbanísticos decorrentes da Lei n. 16.050/2014 e da Lei n. 16.402/2016 sem o embasamento de estudos técnicos. c) O regime de autorizações baseados em “protocolos”, “uma prática adotada pela Prefeitura de São Paulo em completo arrepio à lei para viabilizar obras de legalidade duvidosa”.

3)    Predominância da defesa da ordem urbanística, ainda que possa resvalar em aspectos relacionados à tutela do Meio Ambiente.

4)    Conflito conhecido e dirimido, cabendo ao suscitante (2º Promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital) prosseguir na investigação e adotar as medidas pertinentes.

 

 

 

1)    Relatório.

 

 

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o DD. 2º Promotor de Justiça da Habitação e Urbanismo da Capital e como suscitado o 1º Promotor de Justiça do Meio Ambiente da Capital, relativamente ao feito em epígrafe (SIS MP 14.0482.0000252/2017-8).

Cuida-se de inquérito civil instaurado pela Promotoria de Justiça do Meio Ambiente da Capital e que tem como objeto investigar: a) Qualidade do ar no Município de São Paulo, com a entrada em vigor do plano diretor da cidade. Adensamento de construções civis – impacto na verticalização em centros urbanos – impedimento de circulação adequada do ar, gerando ilhas de calor e concentração de contaminantes. b) Os prejuízos ambientais e urbanísticos decorrentes da Lei n. 16.050/2014 e da Lei n. 16.402/2016 sem o embasamento de estudos técnicos. c) O regime de autorizações baseados em “protocolos”, “uma prática adotada pela Prefeitura de São Paulo em completo arrepio à lei para viabilizar obras de legalidade duvidosa”.

O inquérito civil foi remetido à Promotoria de Justiça da Habitação e Urbanismo sob o fundamento de que “a questão principal aventada nos autos cinge-se aos impactos causados a cidade de São Paulo pela nova Lei de Zoneamento e pela Lei de Parcelamento do Solo. Eventuais danos ambientais causados em virtude das alterações noticiadas são apenas subsidiários, de modo que a legalidade de tais alterações – como o noticiado direito de protocolo – são questões de natureza urbanística.” (fls. 243/244).

A Promotoria de Justiça da Habitação e Urbanismo da Capital suscitou o presente conflito de atribuições sob o fundamento de que “A questão do regime de autorizações com base em “protocolos”, adotado pela Municipalidade já foi objeto de representação por inconstitucionalidade à Procuradoria Geral do Município, estando, portanto, exaurida. A matéria referente aos impactos urbanísticos da norma já foi integralmente avaliada no Inquérito Civil nº 72/2013, dessa 2ª PJHURB, conforme explicitado supra. Restam, portanto, diligências investigatórias referentes aos impactos da Nova Lei de Zoneamento na qualidade do ar, bem como prejuízos ambientais gerados pela edição da norma, sem o embasamento de estudos técnicos. Por evidência a matéria é eminentemente ambiental e mero fato dos impactos ambientais terem sido gerados por lei de zoneamento, per si, não caracteriza a questão como de ordem urbanística. (...) Não cabe a esta Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo avaliar poluição do ar, tampouco outras questões referentes ao meio ambiente natural. Do mais, conforme já consignado, a avaliação da norma sob o viés dos impactos urbanísticos já foi exaustivamente realizada no curso do IC PJHURB nº 72/2013”.

É o relato do essencial.

2) Fundamentação.

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

A definição do membro do parquet a quem incumbe a atribuição para conduzir determinada investigação na esfera cível, que poderá, ulteriormente, culminar com a propositura de ação civil pública, deve levar em consideração os dados do caso concreto investigado.

O objeto da investigação, delimitado na portaria de fls. 01/04, refere-se à:

“a) Qualidade do ar no Município de São Paulo, com a entrada em vigor do plano diretor da cidade. Adensamento de construções civis – impacto na verticalização em centros urbanos – impedimento de circulação adequada do ar, gerando ilhas de calor e concentração de contaminantes.

 b) Os prejuízos ambientais e urbanísticos decorrentes da Lei n. 16.050/2014 e da Lei n. 16.402/2016 sem o embasamento de estudos técnicos.

c) O regime de autorizações baseados em “protocolos”, “uma prática adotada pela Prefeitura de São Paulo em completo arrepio à lei para viabilizar obras de legalidade duvidosa”.

Percebe-se que o cerne da investigação está relacionado com o adensamento de construções civis, verticalização em centros urbanos, ausência de estudos técnicos em relação às Leis n. 16.050/2014 e n. 16.402/2016 e autorizações por meio de protocolos, a viabilizar obras de legalidade duvidosa.

Os eventuais impactos ambientais, como a poluição do ar, por exemplo, representam possíveis efeitos decorrentes de inadequada política de desenvolvimento urbano, ou mesmo de suposta irregularidade nas autorizações concedidas.

Muito embora a hipótese em análise possa resvalar em aspectos relacionados ao Meio Ambiente, sobretudo no que se refere à poluição do ar, a questão central, atrelada à defesa da ordem urbanística, está inserida nas atribuições da Promotoria de Habitação e Urbanismo.

A propósito, o Manual de Atuação Funcional (Ato Normativo nº 675/2010-PGJ-CGMP, de 28 de dezembro de 2010), ao tratar das atribuições da Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo, prevê o que segue:

“(...)

Art. 457. Zelar para que, na produção das normas locais de ordenação e planejamento urbano, sejam respeitados os preceitos de participação democrática da população, a iniciativa do Poder Executivo e a prévia realização de estudos técnicos, adotando-se as medidas administrativas ou judiciais cabíveis, em caso de irregularidades.

Art. 459. Observar que o parcelamento do solo para fins urbanos (residencial, comercial, industrial ou lazer) somente é possível em áreas urbanas ou de expansão urbana, observadas as condições geológicas, sanitárias e ecológicas para a sua implantação.

Art. 469. Zelar pela efetiva aplicação das normas de uso e ocupação do solo urbano, cuidando para que as edificações, obras, atividades e serviços observem as posturas urbanísticas, especialmente aquelas concernentes ao zoneamento, ao meio ambiente, à estética, à paisagem, à segurança, ao licenciamento sanitário e à salubridade e funcionalidade urbanas.

Art. 470. Ao tomar conhecimento, por qualquer meio, da aprovação de empreendimentos ou atividades públicas ou privadas, sem a elaboração do estudo prévio de impacto de vizinhança (EIV), adotar as medidas administrativas ou judiciais cabíveis

(...)”

A existência de outros procedimentos investigatórios que tramitam ou tramitaram na Promotoria de Justiça da Habitação e Urbanismo, ou mesmo a prévia representação perante a Procuradoria-Geral de Justiça quanto à inconstitucionalidade da Lei n. 16.403/16, ainda que possam interferir nos rumos a ser dado a este inquérito civil, não têm o condão de balizar a fixação de atribuição para a continuidade da presente investigação, que, como visto, relaciona-se ao acompanhamento da política de desenvolvimento urbano e à defesa da ordem urbanística.

 

3) Decisão

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitante, DD. 2º Promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital a atribuição para oficiar no presente feito.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se o encaminhamento dos autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

 

São Paulo, 07 de fevereiro de 2018.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

aaamj