Conflito de Atribuições

– Cível –

Protocolado nº 70.026/16

(Ref. SIS nº 38.0344.0000522/2016-1)

Suscitante: 6º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital

Suscitado: 1º Promotor de Justiça de Mongaguá (Consumidor)

 

 

 

Conflito negativo de atribuições. Consumidor. Possíveis danos sofridos em face de cláusulas abusivas. Cooperativa investigada sediada na Capital. Dúvida quanto à extensão do dano. Extensão da dimensão espacial da lesão que não constitui mera presunção decorrente do fato da sede da empresa. Existência de possíveis cláusulas abusivas no regimento interno da cooperativa habitacional que constrói unidades habitacionais não apenas no foro de Mongaguá. Atribuição do suscitante.

 

Vistos.

1)  Relatório

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o DD. 6º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital, e como suscitado o DD. 1º Promotor de Justiça de Mongaguá (Consumidor).

O procedimento foi instaurado por força de cópias extraídas dos autos do Processo nº 1000399-59.2015.8.26.0366, em trâmite perante 1ª Vara da Comarca de Mongaguá, movido por um consumidor em face da “Cooperativa Habitacional Baalbek”.

Ocorre que os documentos noticiam possíveis danos aos consumidores praticados pela Cooperativa Habitacional Baalbek.

O Suscitado, DD. 1º Promotor de Justiça de Mongaguá (Consumidor), ao verificar que a empresa fabricante se encontra sediada na Capital e, pois, por vislumbrar a potencialidade de dano regional, ordenou a remessa dos autos à Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital.

O Suscitante (DD. 6º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital) expôs as razões do conflito negativo às fls. 131/135. Afirmou que não há nenhum elemento que indique tratar-se de dano regional. No seu entender, impunha-se que tivesse realizado investigação prévia, tendente a apurar a extensão do dano. Assim, à míngua de maiores elementos de informação, a extensão nacional ou regional do dano constitui mera presunção. Ademais, invocou decisão lançada em conflito de atribuições anterior, no qual restou consignado que o fato de a empresa investigada estar sediada na comarca da Capital não é motivo suficiente para deslocar a competência.

É o relato do essencial.

2) Fundamentação

         O conflito negativo de atribuições está configurado e comporta conhecimento.

         Data vênia de entendimento contrário, assiste razão ao Suscitado.

         Na hipótese em análise, o elemento central para a decisão do conflito reside em se saber a extensão do dano e, consequentemente, em se verificar a regra de competência a ser aplicada: se aquela prevista no art. 93, I ou a do art. 93, II do CDC, c.c. a do art. 2º da Lei da Ação Civil Pública.

O objeto da investigação, como se infere dos autos, está relacionado a possíveis danos sofridos por consumidores, em face de cláusulas aparentemente abusivas no regimento interno da cooperativa.

         Não há dúvida de que a atribuição do órgão do MP segue a competência jurisdicional do art. 93, I e II, do CDC (Protocolado n. 19.816/14). Destaca-se desse precedente o seguinte excerto de sua fundamentação:

“7. Em tema de competência jurisdicional assim vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça sobre dano regional:

‘PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO DEÂMBITO REGIONAL. COMPETÊNCIA DA VARA DA CAPITAL PARA O JULGAMENTO DADEMANDA. ART. 93 DO CDC.

1. O art. 93 do CDC estabeleceu que, para as hipóteses em que aslesões ocorram apenas em âmbito local, será competente o foro dolugar onde se produziu o dano ou se devesse produzir (inciso I),mesmo critério já fixado pelo art. 2º da LACP. Por outro lado,tomando a lesão dimensões geograficamente maiores, produzindoefeitos em âmbito regional ou nacional, serão competentes os forosda capital do Estado ou do Distrito Federal (inciso II).

2. Na espécie, o dano que atinge um vasto grupo de consumidores,espalhados na grande maioria dos municípios do estado do Mato Grosso, atrai ao foro da capital do Estado a competência para julgara presente demanda.

3. Recurso especial não provido’ (RT 909/483).

8.                E em se tratando de dano nacional, a Corte Federal decidiu que:

‘AÇÃO CIVIL PÚBLICA. POUPANÇA. DANO NACIONAL. FORO COMPETENTE. ART.93, INCISO II, DO CDC. COMPETÊNCIA CONCORRENTE. CAPITAL DOS ESTADOSOU DISTRITO FEDERAL. ESCOLHA DO AUTOR.

1. Tratando-se de dano de âmbito nacional, que atinja consumidoresde mais de uma região, a ação civil pública será de competência de uma das varas do Distrito Federal ou da Capital de um dos Estados, aescolha do autor.

2. Conflito de competência conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da 7ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba/PR’ (STJ, CC 112.235-DF, 2ª Seção, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 09-02-2011, v.u., DJe 16-02-2011).

9.                Anoto que a competência do art. 93, I, do Código de Defesa do Consumidor tem natureza absoluta enquanto a do art. 93, II, do codex, é de caráter relativo, como assentado em outro aresto:

‘(...) muito embora o inciso II do art. 93 do CDC tenha criado uma vedação específica, de natureza absoluta – não podendo o autor da ação civil pública ajuizá-la em uma comarca do interior, por exemplo -, a verdade é que, entre os foros absolutamente competentes, como entre o foro da capital do Estado e do Distrito Federal, há concorrência de competência, cuidando-se, portanto, de competência relativa. (...)’ (RDDP 91/123).

10.              A regra balizadora é a extensão espacial do prejuízo”.

 

         Portanto, a ocorrência de dano regional determina a competência do foro da Capital.

         E no caso em tela os elementos de informação extraídos dos autos revelam a ocorrência de possível dano regional. Não se trata de mera conjectura ou, então, de presunção.

A referida conclusão não se deve, apenas, ao fato de a empresa investigada estar sediada na comarca da Capital, o que não seria motivo, por si só, suficiente para deslocar a competência.

Deve ser considerado o fato de que o objeto da investigação é a existência de possíveis cláusulas abusivas do regimento interno da cooperativa habitacional investigada.

A questão, inclusive, já foi discutida no foro da Capital (fl. 14).

Há, ainda, que se considerar a existência, nos contratos, de cláusula de eleição do foro da Comarca da Capital nos mencionados contratos, como se verifica, por exemplo, a fl. 73.

Se não bastasse, cabe observar que as unidades habitacionais não são construídas apenas em Mongaguá, de tal forma que as cláusulas do regimento interno serão aplicadas em todos os lugares onde a investigada constrói ou venha a construir unidades habitacionais.

Portanto, configurado, em tese, o possível dano regional, evidencia-se a atribuição do suscitante.

        3) Conclusão    

Ante o exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115, da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao Suscitante, DD. 6º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital, a atribuição para oficiar nos autos, sem prejuízo de posterior deslocamento da atribuição para o foro da Capital, a depender do resultado das diligências preliminares empreendidas.

         Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

         Remeta-se cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

                            São Paulo, 8 de junho de 2016.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

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