Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado n. 78619/17 (PT MP nº 43.0695.0000574/2017-1)

Suscitante: 1º Promotor de Justiça de Direitos Humanos da Capital (Inclusão Social)

Suscitado: 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital

 

 

Ementa:

1.      CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÕES. Suscitante: 1º Promotor de Justiça de Direitos Humanos da Capital (Inclusão Social).  Suscitado: 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital

2.      Representação que noticia irregularidades na Academia da Polícia Civil do Estado de São Paulo. Investigação afeta à Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital. Rememore-se que o termo “cidadania” apresenta delimitação conceitual de maior abrangência, não se limitando, destarte, aos quadrantes da proteção ao patrimônio público, e nem muito menos se circunscreve à esfera do combate à improbidade administrativa. A alteração da denominação da Promotoria de Justiça da Cidadania para Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social, operada pelo art. 5º do ATO NORMATIVO Nº 593/2009-PGJ, de 05 de junho de 2009 (Pt. nº 49.144/09), não teve o condão de retirar a atribuição residual de r. Promotoria de Justiça.

3.      Nos moldes do posicionamento atual da Procuradoria-Geral de Justiça, avaliar se há omissão do agente político ou ato de improbidade administrativa é mister específico do Promotor de Justiça titular de atribuições referentes à tutela do patrimônio público. Nesse sentido: PT. ns. 21.783/2017, 85.212/15, 52.478/15, 17.274/15 e 184.188/14. E de fato há referência a ato de improbidade administrativa na representação. Reafirme-se: não se objetiva no caso concreto verificar prática discriminatória ou violação ou risco iminente a direitos fundamentais ou básicos sociais dos alunos da ACADEPOL.

4.      Conflito conhecido e dirimido, determinando-se ao suscitado prosseguir no feito.

 

 

 

Vistos,

Trata-se de conflito negativo de atribuições provocado pelo 1º Promotor de Justiça de Direitos Humanos da Capital (Inclusão Social), em que figura como suscitado o 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital.

Segundo se apurou, instaurou-se a presente representação a partir de representação anônima endereçado ao Ministério Público do Estado de São Paulo (fls. 03/07) e encaminhada à Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital pela Subprocuradoria-Geral de Justiça de Políticas Administrativas e Institucionais (fl. 02).

Distribuído o procedimento ao 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital (fl. 09), este declinou de sua atribuição, porque “a preponderância é de assunto ligado à área de Direitos Humanos, por violação à integridade física, psíquica e emocional de concursados que estão em avaliação pela ACADEPOL”, não havendo indicações de improbidade administrativa ou outra situação do âmbito do patrimônio público (fls. 11/13).

Assim é que se procedeu à distribuição para a Promotoria de Justiça de Direitos Humanos (fl. 15).

Aportados os autos na Promotoria de Justiça de Direitos Humanos, a Promotora de Justiça oficiante suscitou conflito negativo de atribuições (fls. 18/22).

É o relatório.

Decisão.

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Como se sabe, no processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador estabelece critérios para a repartição do serviço. Nesse sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 23. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e competência, 11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.

Esta ideia, aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de competência (objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por Adolf Wach, e sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t. I, trad. esp. de Jose Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922, p. 621 e ss; e em suas Instituições de direito processual civil, 2º vol., trad. port. de J. Guimarães Menegale, São Paulo, Saraiva, 1965, p. 153 e ss), bem como por Piero Calamandrei (Instituciones de derecho procesal civil, v. II, trad. esp. Santiago Sentís Melendo, Buenos Aires, EJEA, 1973, p. 95 e ss), entre outros clássicos doutrinadores.

Ora, se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada demanda a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão ministerial com atribuições para certo caso também não parta da hipótese concretamente considerada, ou seja, de seu objeto.

Pode-se, deste modo, afirmar que a definição do membro do parquet a quem incumbe a atribuição para conduzir determinada investigação na esfera cível, que poderá, ulteriormente, culminar com a propositura de ação civil pública, deve levar em consideração os dados do caso concreto investigado.

E no caso ora em análise a representação noticia irregularidades ocorridas – em tesena Academia da Polícia Civil de São Paulo, que vão desde a omissão na fiscalização das avaliações aos concursados à ausência de materiais de higiene. Narra-se, entre outros pontos, suposta “venda” de plantão pela importância de R$400,00 (quatrocentos reais), e se aponta prática ilícita consistente na denominada “recolha” (fl. 06).

Dessume-se do teor da representação que a principal – senão exclusiva – preocupação da representante, no momento, assenta-se na investigação acerca de irregularidades ocorrentes na ACADEPOL.

 É fato que a representação não veio instruída com qualquer peça de informação ou elemento que permita avaliar a existência ou não do quanto mencionado; porém, não se deve negar que a apuração das diversas irregularidades ocorridas na ACADEPOL, consistentes na aplicação de prova para escolha de vagas nas Delegacias, ou mesmo a falta de proteção e protetor auricular em aulas de tiro e falta de material de limpeza – isso sem mencionar a notícia de ato graves como a denominada “recolha” ou “venda” de plantão – aponta que cabe ao suscitado a presidência da investigação.

Rememore-se que o termo “cidadania” apresenta delimitação conceitual de maior abrangência, não se limitando, destarte, aos quadrantes da proteção ao patrimônio público, e nem muito menos se circunscreve à esfera do combate à improbidade administrativa. A alteração da denominação da Promotoria de Justiça da Cidadania para Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social, operada pelo art. 5º do ATO NORMATIVO Nº 593/2009-PGJ, de 05 de junho de 2009 (Pt. nº 49.144/09), não teve o condão de retirar a atribuição residual da r. Promotoria de Justiça.

Assim é que a atribuição para presidir a investigação é do suscitado, na medida em que a atribuição da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público, anteriormente denominada de Promotoria de Justiça da “Cidadania”, ostenta caracteres residuais. E mais: nos moldes do posicionamento atual da Procuradoria-Geral de Justiça, avaliar se há omissão do agente político ou ato de improbidade administrativa é mister específico do Promotor de Justiça titular de atribuições referentes à tutela do patrimônio público. Nesse sentido: PT. ns. 21.783/2017, 85.212/15, 52.478/15, 17.274/15 e 184.188/14. E de fato há referência a ato de improbidade administrativa na representação.

Reafirme-se: não se objetiva no caso concreto verificar prática discriminatória ou violação ou risco iminente a direitos fundamentais ou básicos sociais dos alunos da ACADEPOL.

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, declarando caber ao suscitado prosseguir nos autos.

Publique-se. Comunique-se. Registre-se. Restituam-se os autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 11 de setembro de 2017.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

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