Conflito de Atribuições – Cível
Protocolo nº 62.551/13
(nº MP
43.0161.0002165/2012-7)
Suscitante: 8º
Promotor de Justiça do Guarujá (Idoso)
Suscitado: 4º
Promotor de Justiça do Consumidor da Capital
Ementa:
1) Conflito negativo de atribuições. 8º Promotor de Justiça do Guarujá (suscitante), com atribuições para a defesa dos idosos, e 4º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital (suscitado).
2) Representação dirigida à Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital solicitando providências do Ministério Público em relação a possíveis aumentos abusivos de mensalidades, praticados pela empresa representada.
3) Apuração de fatos que repercutem nas atribuições tanto da Promotoria do Idoso (art. 74, I, do Estatuto do Idoso), quanto da Promotoria do Consumidor. Aplicação do critério da prevenção para solução do conflito (Art. 2º, parágrafo único, da Lei nº. 7.347/85).
4) Conflito conhecido e dirimido, com determinação de prosseguimento da intervenção ministerial por parte do suscitado.
Vistos.
1) Relatório
Trata-se
de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o DD. 8º
Promotor de Justiça do Guarujá (Idoso) e como suscitado o DD. 4º Promotor de
Justiça do Consumidor da Capital.
Dois
associados encaminharam representação à Promotoria de Justiça do Consumidor,
relatando possíveis aumentos abusivos de mensalidades por parte da ABET
(Associação Beneficente dos Empregados em Telecomunicações), em decorrência,
possivelmente, dos ajustes decorrentes do compromisso de ajustamento de conduta
que foi celebrado pela representada com o 8º Promotor de Justiça do Guarujá.
A
representação foi recebida pelo DD 4º Promotor de Justiça da Capital, que
determinou a notificação da representada para prestar informações e, a seguir,
determinou o encaminhamento dos autos à Promotoria do Guarujá (fl. 46).
Ao
receber os autos, o DD. 8º Promotor de Justiça do Guarujá negou sua atribuição
e afirmou a atribuição da 4ª Promotoria do Consumidor da Capital (fls.
197/200), pelos seguintes motivos: a) o aumento foi linear, alcançando todos os
consumidores e não apenas os idosos; b) pelo critério da prevenção, as
atribuições são do suscitado; c) o dano é regional.
É
o relato do essencial.
2) Fundamentação
É
possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo
ser conhecido.
Como
anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições
quando “dois ou mais órgãos de execução
do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de
determinado ato”, indicando-se, reciprocamente, um ao outro, como sendo
aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).
Como
se sabe, no processo jurisdicional, a identificação do órgão judicial
competente é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que
o legislador estabelece critérios para a repartição do serviço.
Nesse
sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido
Rangel Dinamarco, Teoria geral do
processo, 23. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão
Carneiro, Jurisdição e competência,
11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São
Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.
Esta
ideia, aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de
competência (objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por
Adolf Wach, e sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t.
I, trad. esp. de Jose Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922,
p. 621 e ss; e
Ora,
se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de
determinada demanda, a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa,
não há razão para que o raciocínio a ser desenvolvido para a identificação do
órgão ministerial com atribuições para certo caso também não parta da hipótese
concretamente considerada, ou seja, de seu objeto.
Pode-se,
deste modo, afirmar que a definição do membro do Parquet a quem incumbe a atribuição para conduzir determinada
investigação, ou ação na esfera cível, deve levar em consideração os dados do
caso concreto.
Insta colocar, inicialmente, que a atuação do membro do Ministério Público com atribuição na área do idoso em questões individuais ocorrerá quando o caso concreto apresentar alguma conotação diferenciada, além das hipóteses comuns ou corriqueiras que são verificáveis em conflitos de interesses envolvendo quaisquer pessoas.
É o que se dá, por exemplo, quando estão em discussão os direitos fundamentais indicados no próprio Estatuto do Idoso, como o direito à vida, à liberdade, à dignidade, à saúde, etc., ou por peculiaridades do caso que revelem situação incomum, que evidencie a fragilidade da parte em razão de sua condição de pessoa idosa. Assim, não é necessária a intervenção ministerial em caso de ação de cobrança, só pelo fato de ser uma das partes pessoa idosa. Mas quando estão em jogo direitos fundamentais apontados no Estatuto do Idoso, fica fora de dúvida a necessidade da atuação ministerial.
Afinal,
o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741, de 2003) prevê a atuação do Ministério
Público para a defesa de direitos individuais indisponíveis do idoso.
Nesse
sentido o disposto no art. 74, I, do Estatuto do Idoso, transcrito a seguir:
“Art.
74. Compete ao Ministério Público:
I – instaurar
o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos direitos e
interesses difusos ou coletivos, individuais indisponíveis e individuais
homogêneos do idoso”.
No
caso presente está em discussão direito fundamental e indisponível do idoso,
relacionada à proteção de sua saúde.
De
outro lado, a questão tratada no presente procedimento também diz respeito à
área de consumidor, pois evidente a existência de relação de consumo entre os
autores da representação e a empresa operadora do plano de saúde.
A situação é daquelas, portanto, em que estão presentes, em tese, de forma concomitante, fundamentos para a atuação das duas Promotorias especializadas.
Nesse passo, é oportuno lembrar que no processo coletivo a competência para julgamento da ação civil pública é do juízo de direito do foro do local do dano, nos termos do art. 2º da Lei nº 7347/85.
Mas quando o dano coletivo se produz em mais de um foro, o parágrafo único do art. 2º da Lei da Ação Civil Pública indica a prevenção como critério de solução de dúvidas a respeito da competência.
Nesse sentido, anotam Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de
Andrade Nery (Constituição Federal
Comentada e Legislação Constitucional, São Paulo, RT, 2006, p. 483/484,
nota nº 6 ao art. 2º da Lei da Ação civil Pública) que “Quando o dano ocorrer ou puder potencialmente ocorrer no território de
mais de uma comarca, qualquer delas é competente para o processo e julgamento
da ACP, resolvendo-se a questão do conflito da competência pela prevenção”.
Esse raciocínio é aplicável, analogicamente, para a solução de conflitos de atribuição entre órgãos administrativos encarregados da investigação.
Como a representação foi endereçada ao Promotor do Consumidor, caberá ao suscitado prosseguir na apuração.
3) Decisão
Diante
do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o,
com fundamento no art. 115, da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público,
declarando caber ao suscitado, DD. 4º Promotor de Justiça do Consumidor da
Capital, a atribuição para oficiar no feito.
Publique-se
a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.
Providencie-se
a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de
Tutela Coletiva.
São Paulo, 6 de
maio de 2013.
Márcio Fernando
Elias Rosa
Procurador-Geral
de Justiça
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