Conflito de Atribuições – Cível

 

 

Protocolado nº 007355/16

Suscitante: 2º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital

Suscitado: 4º Promotor de Justiça de Suzano

 

 

Ementa:

1.      Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 2º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital; Suscitado: 4º Promotor de Justiça de Suzano. Representação noticiando deficiência dos serviços de Telefonia em Suzano. Encaminhamento dos autos à Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital, com suporte no art. 93, II, da Lei n. 8.078/90.

2.      Inexistência de notícia dano de âmbito regional a legitimar a atuação da Promotoria Especializada da Capital. As regras de competência para as ações judiciais também orientam a determinação do órgão competente para a instauração de inquérito civil e a realização de termo de ajustamento de conduta. Em respeito ao princípio do promotor natural, somente o promotor de justiça lotado no local onde ocorreu ou deva ocorrer o dano ou o ilícito é que poderá instaurar inquérito civil para apuração dos fatos e seguir nas investigações.

3.      Ausência de elementos, até o presente momento, aptos a justificar a intervenção da Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital. Inaplicabilidade do art. 93, II, da Lei n. 8.078/90.

4.      Conflito conhecido e dirimido, declarando-se caber ao suscitado, 4º Promotor de Justiça de Suzano, prosseguir na investigação, em seus ulteriores termos.

 

Vistos,

1)  Relatório

Tratam estes autos de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o 2º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital e como suscitado o 4º. Promotor de Justiça de Suzano.

Inicialmente, o 4º. Promotor de Justiça de Suzano recebeu representação postulando a apuração e eventuais providências quanto às más condições dos serviços prestados pelas operadoras de telefonia móvel que atuam naquele Município (fls. 04/17).

Após pesquisa junto ao SIS, foi determinada a remessa da representação à Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital, sob o argumento de que se tratava de dano regional, em tese (fls. 22/23).

Encaminhados os autos ao 2º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital, este, por sua vez, ao receber a representação, suscitou o conflito negativo de atribuições (fls. 33/36), argumentando que o dano noticiado na representação é localizado e a atribuição, portanto, é da Promotoria de Justiça de Suzano.

É o relato do essencial.

2)  Fundamentação

  Inicialmente, é possível afirmar que o conflito negativo de atribuições, neste caso, está configurado e deve ser conhecido.

  Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

 Como se sabe, no processo jurisdicional, a identificação do órgão judicial competente é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador estabelece critérios para a repartição do serviço.

  Nesse sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 23. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e competência, 11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.

   Ora, se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada demanda a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão ministerial com atribuições para certo caso também não parta da hipótese concretamente considerada, ou seja, de seu objeto.

  Pode-se, deste modo, afirmar que a definição do membro do Parquet a quem incumbe a atribuição para conduzir determinada investigação na esfera cível, que poderá, ulteriormente, culminar com a propositura de ação civil pública, deve levar em consideração os dados do caso concreto investigado.

  Na hipótese em análise, o elemento central para a decisão do conflito reside em saber qual é a provável dimensão do risco ou dano e, consequentemente, se deve ser aplicada a regra de competência prevista no art. 2º, da Lei da Ação Civil Pública, ou a norma prevista no art. 93, II, do Código de Defesa do Consumidor.

  Os critérios utilizados pelo legislador, definindo a competência do foro do local do dano ou da Capital do Estado, conforme a situação tenha dimensão local, regional ou nacional, consideram a probabilidade de maior eficiência do processo coletivo na coleta de provas e, consequentemente, o contato direto do órgão jurisdicional com os fatos.

  No presente caso, a representação narra fatos e apresenta documentos dando conta da “má qualidade dos serviços de telefonia móvel no Município de Suzano, prestados pelas operadoras VIVO, TIM e OI”.

 Portanto, essas informações iniciais indicam pretendidas providências ministeriais circunscritas aos serviços prestados no local.

 Isso nos leva a entender no sentido de que, embora possa vir a ser constatada a existência de qualidade de serviço abaixo do proposto e alto número de reclamações em todas as regiões do Estado, os fatos descritos nesta representação e delimitados, até o presente momento, pela representante dizem respeito a danos identificados e passíveis de solução no âmbito Municipal.

Não fosse assim, chegar-se-ia a um resultado que certamente não foi o desejado pelo legislador, qual seja estabelecer como juízo competente aquele que está dissociado, até mesmo fisicamente, do contexto da situação de dano ou risco e da coleta da prova em eventual ação judicial.

 Nesse sentido, a doutrina destaca que a fixação da competência no local do dano tem por escopo “facilitar a instrução, pois a proximidade do juízo com relação à prova milita em favor de sua elaboração. Como nas demandas coletivas há maior interesse público e preocupação com a busca da verdade real, adequado propiciar a proximidade entre o juiz e o dinamismo dos atos de colheita das provas. Isto implica o respeito máximo ao direito constitucional de ação e à garantia do acesso à justiça e à ordem jurídica justa” (LEONEL, Ricardo de Barros. Manual do Processo Coletivo. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2002, p. 220).

Ainda, intenção de fixar o foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer o dano ou o ilícito como o competente para a causa foi a de seguir o critério do resultado, “que vai coincidir, em muitos casos, com o do domicílio das vítimas e da sede dos entes e pessoas legitimadas, facilitando o acesso à justiça e a produção da prova” (GRINOVER, Ada Pellegrini. “Da defesa do consumidor em juízo”. In: Benjamin, A H V; Fink, D R; Filomeno, J G; Grinover, Ada Pellegrini; Nery Júnior, N; Denari, Z. Código brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 877).

Pois bem. No caso ora sob análise não há nenhuma informação no sentido de que o dano tenha dispersão suficiente para justificar a intervenção da Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital, sobretudo porque o próprio objeto da representação circunscreve-se à qualidade dos serviços prestados pelas empresas na Municipalidade de Suzano.

Afigura-se melhor, pois, atribuir ao suscitado a presidência da investigação, competindo ao Promotor de Justiça do Consumidor de Suzano prosseguir na investigação, em seus ulteriores termos.

3) Conclusão

Face ao exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115, da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitado, 4º Promotor de Justiça de Suzano, a atribuição para oficiar nos autos.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

Remeta-se cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

 

São Paulo, 17 de fevereiro de 2016.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

Efco