Conflito de Atribuições – Cível
Protocolado n. 10.506/15
(Ref.
Processo nº 1018633-51.2014.8.26.0002)
Suscitante: 19º Procurador de Justiça de
Interesses Difusos e Coletivos
Suscitado: Coordenadoria de Procuradores de
Justiça oficiantes perante a Câmara Especial
Ementa: Conflito de atribuições. Procuradorias de Justiça. Ação coletiva. Direitos da infância e da juventude. Ensino público. Matrícula. Diferenciação entre interesses processual e substancialmente coletivos. Soma de interesses individuais. Atribuição dos Procuradores de Justiça oficiantes perante a Câmara Especial. Conflito conhecido e provido, reconhecendo a atribuição do suscitado. 1. À luz dos arts. 2º, IV, e 3º, § 3º, do Ato Normativo n. 412/05, pertence aos Procuradores de Justiça designados para atuação perante a Câmara Especial do Tribunal de Justiça a intervenção em apelação oposta pela Municipalidade de São Paulo contra respeitável sentença proferida em ação coletiva (ajuizada pela Defensoria Pública) pelo douto Juízo de Direito da Vara da Infância e da Juventude do Foro Regional II – Santo Amaro, Capital, que determinou à ré a matrícula de todas as crianças arroladas na planilha que acompanha a petição inicial em unidades do ensino infantil. 2. Se à Procuradoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos compete atuar nas demandas moleculares envolvendo interesses transindividuais mesmo em trâmite nesse órgão jurisdicional, cumpre observar que interesses individuais homogêneos, qualificáveis ou não como individuais indisponíveis, não são ontologicamente interesses transindividuais: são interesses individuais, mas, cuja tutela judicial pode ser instrumentalizada coletivamente. 3. Distinção entre interesses processualmente e substancialmente coletivos. 4. A Defensoria Pública ao invés de ajuizar várias demandas atomizadas representando os beneficiários individualizados aforou a ação molecular para superar eventuais problemáticas inerentes à figura do litisconsórcio multitudinário, não se podendo, portanto, cogitar de interesse processualmente ou substancialmente coletivo, mas, da soma de interesses individuais. 5. Atribuição dos Procuradores de Justiça oficiantes perante a Câmara Especial.
Põem-se em conflito a ilustre Doutora Deborah Pierri, 19º Procurador de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos, e o digno Doutor Paulo Sérgio Puerta dos Santos, Procurador de Justiça Coordenador de Procuradores de Justiça oficiantes perante a Câmara Especial, a respeito de qual órgão deve oficiar em apelação oposta pela Municipalidade de São Paulo contra respeitável sentença proferida em ação coletiva (ajuizada pela Defensoria Pública) pelo douto Juízo de Direito da Vara da Infância e da Juventude do Foro Regional II – Santo Amaro, Capital, que determinou à ré a matrícula de todas as crianças arroladas na planilha que acompanha a petição inicial em unidades do ensino infantil, sob pena de multa diária, em trâmite na colenda Câmara Especial do egrégio Tribunal de Justiça (Processo n. 1018633-51.2014.8.26.0002).
Os autos foram encaminhados à Coordenadoria de Procuradores de Justiça oficiantes perante a Câmara Especial que os remeteu, em 15 de setembro de 2014, à douta Procuradoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos, assinalando no respectivo ofício que a “atribuição para manifestação, segundo nosso entendimento, é Procuradoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos” (fl. 08).
A ilustre Procuradoria de Justiça suscitou conflito, protocolizado em 22 de janeiro de 2015, sustentando, entre outros argumentos, se tratar não da defesa de interesses individuais homogêneos, mas, de “interesse individual de um certo grupo de indivíduos”.
É o relatório.
O Ato Normativo n. 412, de 24 de novembro de 2005, disciplina as atribuições das Procuradorias de Justiça.
A
Procuradoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos tem a missão de “oficiar nas ações civis
públicas e ações populares e respectivos incidentes e mandados de segurança,
ações cautelares e incidentes, mandados de segurança coletivos e mandados de
injunção coletivos, processos envolvendo inquérito civil e questões ambientais
cíveis e ações cautelares e incidentes, em trâmite no Tribunal de Justiça”
(art. 2º, IV).
Por
sua vez, esse diploma normativo preceitua que “junto ao Tribunal de Justiça
Militar, ao Órgão Especial e à Câmara Especial do Tribunal de Justiça, na
equipe do Setor de Recursos Extraordinários e Especiais Criminais, oficiarão
procuradores de Justiça, especialmente designados, os quais serão substituídos,
nas Procuradorias de Justiça de origem, por promotores de Justiça, convocados
na forma do artigo 12 (art. 3º, caput).
E dispõe o § 3º de seu art. 3º que:
“Caberá à equipe de procuradores de Justiça designados para atuar junto à Câmara Especial do Tribunal de Justiça oficiar em todos os feitos afetos a esse órgão, exceto naqueles cujas atribuições são deferidas à Procuradoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos e à Procuradoria de Justiça de Habeas Corpus e Mandados de Segurança Criminais”.
Percebe-se que a atribuição desse
núcleo é correspondente à competência do órgão jurisdicional nele referido,
salvo em relação aos processos que são da esfera de atribuições
das Procuradorias de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos e de Habeas
Corpus e Mandados de Segurança Criminais.
Portanto,
em face de demandas moleculares (“ações civis públicas e ações populares e
respectivos incidentes e mandados de segurança, ações cautelares e incidentes,
mandados de segurança coletivos e mandados de injunção coletivos”), a
atribuição para oficiar em processos que tramitam na Câmara Especial do
Tribunal de Justiça pertence, à vista do art. 3º, § 3º, in fine, do Ato Normativo n. 412/05, à Procuradoria de Justiça de
Interesses Difusos e Coletivos.
A
digna suscitante aponta que verba non
mutant substantiam rei para sustentar que não se trata de ação civil
pública em defesa de interesses individuais homogêneos, argumentando em reforço
que, no plano das atribuições dos órgãos de primeira instância do Ministério
Público, a atribuição para intervenção processual pertence à Promotoria de
Justiça da Infância e da Juventude e não ao Grupo de Atuação Especial de
Educação (GEDUC) que não oficia em face de lesões de natureza individual ou em
que haja identificação dos lesados.
Anoto,
por sua essencialidade, que a demanda sob a qual se controverte a atribuição
tem por objeto a tutela de interesses individuais indisponíveis – no caso,
acesso ao serviço público de ensino por crianças – embora tenha sido aforada em
prol de beneficiários identificados (e, portanto, determinados).
Em
verdade, interesses individuais homogêneos, qualificáveis ou não como
individuais indisponíveis, não são ontologicamente interesses transindividuais
– ou seja, nem difusos e tampouco coletivos. São interesses individuais, mas,
cuja tutela pode ser judicialmente instrumentalizada a título coletivo a fim de
uniformidade e concentração jurisdicionais etc. Em outras palavras, são
interesses processualmente coletivos e não substancialmente transindividuais.
O
que mais se apresenta como decisivo é que, no caso, a Defensoria Pública ao
invés de ajuizar várias demandas atomizadas representando os beneficiários
individualizados aforou a ação molecular para superar eventuais problemáticas inerentes
à figura do litisconsórcio multitudinário, facultativo por excelência (art. 46,
parágrafo único, Código de Processo Civil), não se podendo, portanto, cogitar
de interesse processualmente coletivo, mas, da soma de interesses individuais.
Destarte,
não se cuida de assunto inerente à Procuradoria de Justiça de Interesses
Difusos e Coletivos, cuja atribuição é taxativa, afigurando-se, isto sim, na
esfera de atuação dos Procuradores de Justiça oficiantes perante a Câmara
Especial.
Diante do exposto, conheço do
presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art.
115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitado, a atribuição para oficiar no feito.
Publique-se a ementa. Comuniquem-se
os interessados, inclusive a colenda Câmara Especial do Tribunal de Justiça.
Cumpra-se, providenciando-se a remessa dos autos. Providencie-se o envio de
cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela
Coletiva.
São Paulo, 11 de fevereiro de
2015.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça
wpmj