Conflito de Atribuições – Cível

Protocolado nº 101967/16 (SISMP nº 38.0236.0000767/2016-7)

Suscitante: 1º Promotor de Justiça de Casa Branca (Meio Ambiente)

Suscitado: 2ª Promotor de Justiça de Casa Branca (Habitação e Urbanismo)

 

 

Ementa:

1.      Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 1º Promotor de Justiça de Casa Branca (Meio Ambiente). Suscitado: 2ª Promotora de Justiça de Casa Branca (Habitação e Urbanismo). Representação para embargo de instalação de torre de telefonia móvel (celular).

2.      Muito embora se possa dizer que haja sobreposição de atribuições, percebe-se com segurança que a matéria investigada nos autos está relacionada à instalação de torre de telefonia móvel (celular) e o princípio da precaução, considerando a potencial ocorrência de poluição eletromagnética e danos à saúde humana, matéria de atribuição Promotoria de Justiça do Meio Ambiente.

3.      Conflito conhecido e dirimido, declarando-se caber ao suscitante, DD. 1ª Promotor de Justiça de Casa Branca (Meio Ambiente) a intervenção no feito.

 

Vistos,

1.   Relatório

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o 1º Promotor de Justiça de Casa Branca (Meio Ambiente) e como suscitado o 2ª Promotor de Justiça de Casa Branca (Habitação e Urbanismo), em face de representação para embargo da instalação de torre de telefonia móvel (celular).

A representação foi encaminhada inicialmente ao 2ª Promotor de Justiça (Habitação e Urbanismo), que entendendo tratar de potencial ocorrência de poluição eletromagnética (ou radiação), determinou sua remessa à Promotoria de Justiça do Meio Ambiente (fls. 16).

Ao receber a representação, o 1º Promotor de Justiça do Meio Ambiente de Casa Branca suscitou o presente conflito negativo de atribuições entendendo que a matéria relatada, qual seja, instalação de antena de celular em área residencial, bem como emissão de ondas eletromagnéticas, são temas afetos à Habitação e Urbanismo. Consignou, ainda, que na hipótese de se vislumbrar interesse conjunto, também afeto à área do meio ambiente, deveria ser aplicado o critério de prevenção, visto que já realizada diligência pelo Promotor de Justiça suscitado (fls. 18/21).

É o relato do essencial.

2.   Fundamentação

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Verifica-se que a representação reclama intervenção ministerial para que seja embargada a instalação de torre de telefonia móvel, considerando os potenciais efeitos nocivos à saúde humana derivados da radiação, bem como a impropriedade do local de instalação, que seria em bairro residencial, próximo a creches e áreas de preservação permanente.

Conforme consta da representação, há estudos científicos que apontam a possibilidade de a radiação eletromagnética, oriunda de estações de rádios base para telefonia celular, produzir vários efeitos biológicos potencialmente nocivos à saúde humana.

De fato, a radiação eletromagnética, consistindo em forma de energia potencialmente nociva à saúde humana, poderá adequar-se ao conceito legal de poluição.

Pois bem. O meio ambiente ecologicamente equilibrado, assegurado pelo art. 225 da Constituição Federal, é considerado bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida.

Pode-se afirmar, portanto, que a interpretação constitucional da expressão “sadia qualidade de vida” está diretamente ligada ao direito à vida e ao direito à saúde.

Desse modo, a questão tratada na representação se encontra diretamente relacionada ao princípio da precaução no controle ambiental de antenas celulares, considerando os potenciais efeitos nocivos à saúde humana[1].

Vale relembrar que pelo princípio da precaução, na pendência de dúvida científica a respeito dos riscos ambientais inerentes a determinada atividade, devem ser adotadas as medidas viáveis como fim de evitar a potencial ocorrência da poluição.

Dessa forma, a matéria tratada na representação - riscos à saúde humana decorrentes da potencial exposição de seres humanos a radiações - é matéria afeta ao meio ambiente, haja vista o disposto no § 1º, inciso V do art. 225 da Constituição Federal, verbis:

“Art. 225 - Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

 § l ° - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

(...)

V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente".

É oportuno anotar, por relevante, ser comum a identificação, em uma mesma investigação, de interesses afetos a mais de uma área de atuação do Ministério Público. Isso decorre da própria complexidade dos interesses coletivos, cujo dinamismo faz com que nem sempre se acomodem, de forma singela, aos critérios normativos previamente estabelecidos de repartição das atribuições dos órgãos ministeriais.

Muito embora a hipótese em análise possa resvalar em aspectos relacionadas à Habitação e Urbanismo, sobretudo no que se refere ao local de instalação da antena, a questão central está afeta às atribuições da Promotoria do Meio Ambiente.

A propósito, o Manual de Atuação Funcional (Ato Normativo nº 675/2010-PGJ-CGMP, de 28 de dezembro de 2010), ao tratar das atribuições da Promotoria de Meio Ambiente, impõe:

“(...)

Art. 481. Considerar que os objetivos da proteção ambiental são a prevenção ou precaução, a reparação e a obtenção de indenização, em escala decrescente de valores.

(...)”

Assim, o objeto da representação reclama a intervenção da Promotoria de Justiça do Meio Ambiente a fim de apurar a regularidade da instalação da antena de telefonia móvel e a potencial ocorrência de poluição e outros efeitos nocivos à saúde humana.

Resolve-se o conflito, portanto, reconhecendo-se a atribuição da Promotoria de Justiça do Meio Ambiente para atuar no caso.

3.   Decisão

Face ao exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115, da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitante, 1ª Promotora de Justiça de Casa Branca, a atribuição para oficiar nos autos.

Publique-se a ementa. Comuniquem-se os interessados. Cumpra-se, providenciando-se o encaminhamento dos autos. Remeta-se cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

        

São Paulo, 01 de agosto de 2016.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

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[1]Ação Civil Pública – Poluição Eletromagnética – Linhas de Transmissão de Energia Elétrica

Ação Civil Pública Ambiental - pleito para redução da intensidade dos campos eletromagnéticos - alegação de que a radiação é potencialmente cancerígena - Sentença de procedência. Obrigação da Concessionária de Energia Elétrica em reduzir o Campo Eletromagnético da Linha de Transmissão a 01 (um) μT (Micro Tesla). Adoção do Princípio da Precaução para assegurar o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e à sadia qualidade de vida. Inversão do ônus probatório- cabe aquele que pratica a atividade de risco comprovar a inocuidade dos procedimentos ao meio ambiente, além de indicar que tomou medidas de precaução específicas. Dilação de prazo fixado na sentença para cumprimento de obrigações. Multa cominatória destinado ao Fundo Especial previsto no art. 13 da Lei Federal nº 7.347/85 - gestão dos recursos por Fundo Estadual e não Federal. (Apelação Cível nº 679.208-5/5-00-TJSP - Aviso PGJ-SP nº 571/08).

Estação de Rádio-Base – Instalação – Princípio da Precaução:

Ação civil pública- Instalação das antenas de estações de rádio-base - Lei estadual nº 10.995/2001 - Inconstitucionalidade da lei - Descabimento - Presunção de legalidade e compatibilidade com o ordenamento de norma produzida de acordo com o processo legislativo - Apelo desprovido. Princípio da precaução - Alegado descabimento de sua invocação em tema de telecomunicação - Afirmação temerária, diante dos efeitos da radiação produzidos pela telefonia celular - Princípio que permeia toda a atuação jurisdicional de urgência, diante da complexidade das matérias que demandam intervenção do Judiciário - Apelo desprovido (TJSP - Apelação Cìvel nº 621.509.5/0-00).