Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado n. 103.455/18

Suscitante: 8º Promotor de Justiça de Direitos Humanos (Idoso)

Suscitado: 5º Promotor de Justiça do Consumidor

 

 

 

 

Ementa: Conflito negativo de atribuições. Representação para autorizar o pagamento de IPTU, nos caixas físicos dos estabelecimentos bancários e não apenas nos terminais de auto atendimento. Promotorias de Justiça de Direitos Humanos (Idoso) e do Consumidor. Atribuição da Promotoria de Justiça do Consumidor. 1. A eventual abusividade consistente no impedimento de pagamento de tais tributos em caixas físicos atinge indistintamente idosos ou não. 2. Interesse público de maior abrangência. 3. Precedentes (Protocolados n. 92.991/08 e 7419/14). 4. Conflito conhecido e dirimido, com determinação de prosseguimento da intervenção ministerial por parte do suscitado.

 

 

  Põem-se em conflito negativo de atribuições o douto 8º Promotor de Justiça de Direitos Humanos (Idoso) e o digno 5º Promotor de Justiça do Consumidor a respeito de representação recebida do Juizado Especial Cível Central da Capital – Anexo FAAP, encaminhada originariamente ao suscitado, em razão de sentença proferida a fls. 05/07, sob o argumento de que a possível crise de direito material apreciada no aludido processo, atingiria apenas o grupo de idosos e não de outras pessoas atendidas pelo Banco do Brasil, interessadas em realizar o pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), pois se trataria de um conflito coletivo e não simplesmente individual.

Inicialmente os autos foram encaminhados à Promotoria de Justiça do Consumidor, tendo o suscitado 5º. Promotor de Justiça, encaminhado a representação à Promotoria de Direitos Humanos – Idoso, ao argumento de que a prática abusiva em questão somente se configuraria em razão da hipossuficiência do idoso, tendo em vista sua baixa visão e percepção, enfim, com a específica situação de vulnerabilidade da pessoa idosa.

O preclaro 8º Promotor de Justiça de Direitos Humanos dissente infirmando limitação subjetiva da questão aos idosos ao salientar que “ainda que a sentença tenha apreciado conflito de interesses aforado por pessoa idosa, outros indivíduos acabam por ficar na mesma situação, o que parece ser refutado pelo art. 3º., caput da Resolução Bacen 3.694/09. Tais grupos podem sentir as mesmas ou mais dificuldades que a população idosa, bastando imaginar que pessoas com deficiência física ou sensorial, analfabetas e outras poderiam se defrontar com as mesmas dificuldades”.

O Estatuto do Idoso confia ao Ministério Público a função de tutela dos interesses dos idosos e no plano da divisão de atribuições no âmbito interno da instituição existe órgão de execução próprio para o desempenho dessa importante missão, assim como outro para as relações de consumo e defesa dos interesses difusos e coletivos do consumidor.

Anotamos que, o artigo 3º, “caput” da Resolução do Banco Central nº 3694, de 26 de março de 2009, a ocorrência de possível violação a relação de consumo, ao dispor que:

É vedado às instituições referidas no art. 1º recusar ou dificultar, aos clientes e usuários de seus produtos e serviços, o acesso aos canais de atendimento convencionais, inclusive guichês de caixa, mesmo na hipótese de oferecer atendimento alternativo ou eletrônico.

 

Com efeito, assim preceitua o art. 295 da Lei Complementar Estadual n. 734/93:

 

“Artigo 295 — Aos cargos especializados de Promotor de Justiça, respeitadas as disposições especiais desta lei complementar, são atribuídas as funções judiciais e extrajudiciais de Ministério Público, nas seguintes áreas de atuação:

(...)

VII — Promotor de Justiça do Consumidor: defesa dos interesses difusos ou coletivos relacionados com o consumidor;

(...)

XIV — Promotor de Justiça de Direitos Humanos: garantia de efetivo respeito dos Poderes Públicos e serviços de relevância pública aos direitos assegurados nas Constituições Federal e Estadual, e, notadamente, a defesa dos interesses individuais homogêneos, coletivos e difusos dos idosos, das pessoas com deficiência, e da saúde pública”.

         Embora em outras oportunidades tenha adotado o critério da prevenção em conflitos desse jaez, penso que o caso inspira solução diversa.

         Afinal, parece-me ponderada a argumentação do suscitante: eventual dificuldade de pagamento de impostos no caixa de autoatendimento, por dificuldades pessoais, atinge indistintamente idosos ou não, inclusive indivíduos com deficiência física ou sensorial, analfabetos, dentre outros. E não há elementos, pelo menos por ora, a indicar que a idade foi erigida como fator determinante da discriminação. De qualquer modo, a idade não sobrepuja o essencial, que é a relação de consumo.

         Neste sentido, invoco valioso precedente que concluiu pela atribuição da Promotoria de Justiça do Consumidor, que se encontra assim ementado:

“CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES –– Associação dos Comerciantes do Mercado Kinjo Yamato, contratante de plano privado de assistência médica – Representação à Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital, ante proposta não aceita de reajuste das mensalidades – Proteção ao idoso que não se sobrepõe à atuação na defesa do consumidor, em tese considerada – Aplicação do disposto no Art. 114, § 2º., da LC nº 734/93 – Atribuição do Suscitado” (Protocolado n. 92.991/2008).

         Adoto, por pertinentes, os fundamentos desse decisum:

       De fato, a solução do conflito de atribuições passa pela caracterização do direito mais amplo atingido pela pretensão da representada, permitindo a fixação de qual Promotoria de Justiça atuará.

(...)

         Por outro lado, pacífico que o Ministério Público atuará na defesa dos consumidores, tendo por fundamento legal o Código de Defesa do Consumidor, independentemente da qualificação jurídica de idoso. No caso concreto, a proposta de reajuste das taxas mensais (fls. 9/12) não se limita aos consumidores idosos, ao contrário, incide sobre os Planos Empresariais Plus e Master.

         Além disso, a própria representação (fl. 6) menciona que os associados são ‘na sua maioria idosos’, obviamente revelando que os consumidores (tomados individualmente) não se limitam àqueles que recebem a especial proteção da lei. Daí que o interesse jurídico tutelado de maior abrangência é, efetivamente, o dos consumidores genericamente considerados.

         A atuação do GAEPI seria fundada nas hipóteses dos incisos I e II do artigo 74 do Estatuto do Idoso acima transcrito, dado que são os interesses dos idosos coletivamente considerados que atraem os feitos, ao contrário do observado na hipótese dos autos, cuja tutela jurídica se funda na relação de consumo, em tese considerada, cabendo à Promotoria de Justiça do Consumidor examinar se é hipótese de atuação ministerial (...)”.

         Face ao exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115, da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitado 5º. Promotor de Justiça do Consumidor, a atribuição para oficiar no feito.

         Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

         Remeta-se cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

 

                   São Paulo, 11 de dezembro de 2018.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

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