Conflito de Atribuições – Cível
Protocolado nº
0110376/2017 (SISMP nº 66.0719.0001784/2017-0)
Suscitante: 15º
Promotor de Justiça de São José dos Campos (atribuições na área de pessoa com
deficiência)
Suscitado: 14º
Promotor de Justiça de São José dos Campos (atribuições na área do Saúde Pública)
Ementa:
1. Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 15º Promotor de Justiça de São José dos Campos (atribuições na área de pessoa com deficiência). Suscitado: 14º Promotor de Justiça de São José dos Campos (atribuições na área da Saúde Pública)
2. Representação para instauração de inquérito civil decorrente de interrupção no fornecimento de material de uso diário a pessoas com falta de mobilidade e incontinência urinária.
3. Falta de continuidade no fornecimento de material de uso diário a pessoas que apresentam incontinência urinária. Interesse difuso e coletivo não exclusivo de pessoas com deficiência.
4. Prevalência e dos aspectos relacionados à atuação da Promotoria de Justiça com atribuição na área da Saúde Pública.
5. Conflito conhecido e dirimido, reconhecendo a atribuição do suscitado: 14º Promotor de Justiça de São José dos Campos (atribuições na área da Saúde Pública)
1)
Relatório.
Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o DD. 15º Promotor de Justiça de São José dos Campos (atribuições na área de pessoa com deficiência), e como suscitado o 14º Promotor de Justiça de São José dos Campos (atribuições na área da Saúde Pública) em face de representação que reclama a apuração na falta e/ou interrupção no fornecimento de material de uso diário por pessoas que apresentam falta de mobilidade e incontinência urinária.
Recebida a representação, após diligências preliminares, o 14º Promotor de Justiça de São José dos Campos (atribuições na área da Saúde Pública), determinou a remessa dos autos ao DD. 15º Promotor de Justiça de São José dos Campos (atribuições na área de pessoa com deficiência), por entender que a matéria versada na representação ensejaria análise circunscrita à área da Pessoa Portadora de Deficiência, pois no interesse de pessoa ostomizada.
Ao receber os autos, o DD. 15º Promotor de Justiça de São José dos Campos (atribuições na área de pessoa com deficiência), suscitou o presente conflito negativo, afirmando que em que pese o representante seja pessoa com deficiência e, usuário de bolsas coletoras e uripens, tais dispositivos não são de uso exclusivo de pessoa com deficiência, e que podem e são utilizados por idosos, pessoas com incontinência urinária em qualquer idade e outras situações médicas pontuais que não se traduzem em pessoa com deficiência. Assim, alega que os fatos dizem respeito ao fornecimento de dispositivos ofertados a todos os munícipes e não exclusivamente no tocante à pessoa com deficiência, estando a questão, portanto, afeta à Saúde Pública.
É o relato do essencial.
2) Fundamentação.
É possível afirmar que o
conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.
Como anota a doutrina
especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do
Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de
determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo
aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p.
196).
Como se sabe, no
processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente é extraída
dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador
estabelece critérios para a repartição do serviço. Nesse sentido: Antônio
Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 23. ed., São
Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e competência, 11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56;
Patrícia Miranda Pizzol, A competência no
processo civil, São Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves,
Competência no processo civil, São
Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.
Esta ideia, aliás,
estava implícita no critério tríplice de determinação de competência (objetivo,
funcional e territorial) intuído no direito alemão por Adolf Wach, e
sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t. I, trad. esp. de Jose
Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922, p. 621 e ss; e
Ora, se para a
identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada
demanda a lei processual estabelece, a priori,
critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há razão para que
o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão ministerial com
atribuições para certo caso também não parta da hipótese concretamente
considerada, ou seja, de seu objeto.
Pode-se, deste modo,
afirmar que a definição do membro do parquet
a quem incumbe a atribuição para conduzir determinada investigação na esfera
cível, que poderá, ulteriormente, culminar com a propositura de ação civil
pública, deve levar em consideração os dados do caso concreto investigado.
No caso em exame, a investigação
foi iniciada pelo Promotor de Justiça com atribuição na área do patrimônio
público para apuração da falta de conservação dos banheiros da Praça Mauá em
Santos em decorrência do descumprimento das obrigações pela empresa contratada,
que levou a rescisão do contrato. Havia ainda alusão a problemas relativos à
necessidade de manutenção dos banheiros. (fls. 04/05 e 12/13).
A questão preponderante
na hipótese dos autos refere-se à adequada prestação de serviços de saúde
pública, haja vista que o fornecimento de medicamentos e materiais de uso
diário para determinadas moléstias ou disfunções, refere-se à promoção a
promoção, defesa e recuperação da saúde, individual ou coletiva.
A propósito o art. 440
do Ato Normativo nº 675/2010-PGJ-CGMP, de 28 de dezembro de 2010 que aprovou o "Manual de Atuação Funcional dos
Promotores de Justiça do Estado de São Paulo", estabelece que na
defesa da saúde pública caberá ao Promotor de Justiça:
Art. 440. Zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nas Constituições Federal e Estadual e nas demais normas pertinentes, que disciplinam a promoção, defesa e recuperação da saúde, individual ou coletiva, promovendo as medidas necessárias à sua garantia, cuidando em especial de:
O uso de bolsas
coletoras de urina e uripens, materiais que deixaram de ser fornecidos pelo
Município de São José dos Campos, atinge uma gama de pessoas, sobretudo as que
apresentam incontinência urinária, que não são totalmente pessoas com
deficiência nos termos da definição legal.
A questão, portanto,
está abrangida pelo direito à saúde garantida constitucionalmente.
Assim exposto, deve prosseguir na investigação o suscitado o 14º Promotor de Justiça de São José dos Campos (atribuições na área da Saúde Pública), por força da preponderância da questão.
2)
Decisão
Diante do exposto,
conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento
no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao
órgão ministerial suscitado, DD. 14º
Promotor de Justiça de São José dos Campos (atribuições na área da Saúde
Pública), a atribuição para apuração do fato.
Publique-se a ementa.
Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.
Providencie-se a remessa
de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela
Coletiva.
São
Paulo, 25 de setembro de 2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
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