Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado n. 111.686/15

Suscitante: 9º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social

Suscitado: 3º Promotor de Justiça de Direitos Humanos (Saúde Pública)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Ementa: Conflito negativo de atribuição. Promotorias de Justiça do Patrimônio Público e Social e de Direitos Humanos. Serviço público de saúde. Terceirização. Radiologia. Irregularidades no trespasse. Questão subjacente à política pública. Diversidade de bens jurídicos tutelados. Atribuição do suscitante. 1. A atribuição da PJ de Justiça de Direitos Humanos no que toca à saúde pública é relacionada à prestação desse serviço público relevante em si mesma considerada, sem prejuízo da atribuição da PJ do Patrimônio Público e Social para apreciação de questões referentes à legalidade e moralidade nos assuntos subjacentes à execução daquele serviço público (art. 295, IX e XIV, LOEMP), porque decisões administrativas podem ser lícitas sob o prisma do atendimento ao direito subjetivo público de saúde pública, e ilícitas sob o enfoque da legalidade e da moralidade administrativas, e vice-versa. 2. Justificativa do trato especializado e separado entre duas Promotorias de Justiça cujas missões são distintamente específicas, à vista da diversidade de bens jurídicos tutelados. 3. Conflito conhecido e dirimindo, declarando a atribuição do suscitante.

 

                      

 

                   Põem-se em conflito os doutos 9º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social e 3º Promotor de Justiça de Direitos Humanos a respeito da atribuição em inquérito civil cujo objeto é a apuração de irregularidades na terceirização de serviços de radiologia no Ambulatório Médico de Especialidades Itapevi (Inquérito Civil n. 14.0695.0000610/2014-6).

                   O procedimento foi instaurado na douta Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social por portaria de 20 de maio de 2014, após remessa promovida pelo Ministério Público do Trabalho de representação oferecida pelo Sindicato dos Tecnólogos, Técnicos e Auxiliares em Radiologia no Estado de São Paulo em face de AME ITAPEVI, Serviço Estadual de Diagnóstico por Imagem – SEDI I e Samir Serviços Radiológicos Ltda.-ME.

                   O ilustre 9º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social entende que com a criação da Promotoria de Justiça de Direitos Humanos “a atribuição para a análise da legalidade da terceirização dos serviços de saúde” deve ficar a cargo desse órgão especializado, invocando em abono o inciso III do art. 440 do Manual de Atuação Funcional.

                   A suscitada, todavia, manifesta que sua atribuição respeita à “garantia da regular e eficiente prestação do serviço de Saúde, não lhe competindo adentrar nos aspectos contratuais e econômicos dos contratos celebrados pelo Poder Público”, assunto da competência do suscitante, e acrescenta que:

“A terceirização pode ser discutida, genericamente, pela Promotoria de Saúde como opção adequada ou não à prestação do serviço de saúde”.

                   Respeitado o fundamentado convencimento do suscitante, tem razão a suscitada, como espelha decisão precedente que resolveu conflito de atribuição no Inquérito Civil n. 14.0695.0000744/2013-5, e que se encontra assim ementada:

Conflito negativo de atribuição. Patrimônio Público, legalidade e moralidade administrativa. Terceirização de médicos em UTI pediátricas da rede pública municipal de saúde para suprimento da carência de profissionais. Questão subjacente à política pública. Diversidade de bens jurídicos tutelados. Atribuição do suscitante. 1. Não é CSMP competente para solução de conflito de atribuição, mas o PGJ exclusivamente (LONMP, art. 10, X; LOEMP, art. 115), desmerecendo a Súmula 49 do colegiado interpretação como meio de solução antecipada de conflitos desse jaez ou de ordenamento de reunião de investigações, pois, ao estimular atuação conjunta não admite isolada. 2. Investigando a falta de médicos nas UTI pediátricas da rede pública municipal de saúde a PJ de Direitos Humanos captou que a deficiência na prestação do serviço foi suprida com recurso à terceirização sem licitação, provocando a atuação da PJ do Patrimônio Público e Social que instaurou inquérito civil para apuração de eventual ilegalidade e lesividade ao patrimônio público ou à moralidade administrativa. 3. Homologação da promoção de arquivamento do inquérito civil da PJ de Direitos Humanos com recomendação do CSMP de acompanhamento do inquérito civil em trâmite na PJ do Patrimônio Público, para tomada de providências em face de eventual retorno ao status quo ante. 4. A atribuição da PJ de Justiça de Direitos Humanos no que toca à saúde pública é relacionada à prestação desse serviço público relevante em si mesma considerada, sem prejuízo da atribuição da PJ do Patrimônio Público e Social para apreciação de questões referentes à legalidade e moralidade nos assuntos subjacentes à execução daquele serviço público (art. 295, IX e XIV, LOEMP), porque decisões administrativas podem ser lícitas sob o prisma do atendimento ao direito subjetivo público de saúde pública, e ilícitas sob o enfoque da legalidade e da moralidade administrativas, e vice-versa. 5. Justificativa do trato especializado e separado entre duas Promotorias de Justiça cujas missões são distintamente específicas, à vista da diversidade de bens jurídicos tutelados. 6. Conflito conhecido e dirimindo, declarando a atribuição do suscitante” (Protocolado n. 184.188/14).

                   Reporto-me à sua fundamentação:

                A atribuição da Promotoria de Justiça de Direitos Humanos no que toca à saúde pública é relacionada à prestação desse serviço público relevante em si mesma considerada, sem prejuízo da atribuição da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social para apreciação de questões referentes à legalidade e moralidade nos assuntos subjacentes à execução daquele serviço público.

                   É o que preceitua a Lei Complementar Estadual n. 734/93:

‘Artigo 295 — Aos cargos especializados de Promotor de Justiça, respeitadas as disposições especiais desta lei complementar, são atribuídas as funções judiciais e extrajudiciais de Ministério Público, nas seguintes áreas de atuação:

(...)

IX — Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social: defesa da probidade e legalidade administrativas e da proteção do patrimônio público e social;

(...)

XIV — Promotor de Justiça de Direitos Humanos: garantia de efetivo respeito dos Poderes Públicos e serviços de relevância pública aos direitos assegurados nas Constituições Federal e Estadual, e, notadamente, a defesa dos interesses individuais homogêneos, coletivos e difusos dos idosos, das pessoas com deficiência, e da saúde pública’.

                   Conquanto determinada decisão administrativa possa ser conveniente e lícita sob o prisma do atendimento ao direito subjetivo público de saúde pública, pode ser ilícita sob o enfoque da legalidade e da moralidade administrativas, e vice-versa. Essa é uma das razões que justificam o trato especializado e separado entre duas Promotorias de Justiça cujas missões são distintamente específicas, à vista da diversidade de bens jurídicos tutelados.

                   Assim sendo, respeitada a independência funcional de cada um dos membros do Ministério Público portadores de singulares e reservadas atribuições sobre um mesmo fato, compete, no caso, ao suscitante concluir sua investigação a respeito da legalidade e da moralidade administrativas na mencionada terceirização. É o que se capta, aliás, da portaria que instaurou o presente inquérito civil centralizando seu objeto na contratação sem licitação e sua finalidade para instrução de eventual demanda destinada à anulação ou declaração de nulidade de atos lesivos ao patrimônio público ou à moralidade administrativa”.

                   Ressalto, por fim, que se for da convicção do suscitante a necessidade de provocar a atuação da suscitada para, nos limites de sua atribuição, averiguar eventual agravo à qualidade, adequação, eficiência do serviço público por conta da terceirização, nada obsta que assim o faça, remetendo-lhe as peças necessárias extraídas de sua investigação.

                   Face ao exposto, conheço do conflito negativo de atribuição e o resolvo declarando a atribuição do ilustre Promotor de Justiça suscitante (9º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social).

                   Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos. Remeta-se cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional.

                   São Paulo, 11 de agosto de 2015.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

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