Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado n. 0136027/13

Suscitante: 24º Promotor de Justiça de Campinas

Suscitado: 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital

 

 

Ementa:

1.   Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 24º Promotor de Justiça de Campinas. Suscitado: 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital.

2.   Redução do objeto do procedimento, limitando-se a investigação a questão centrada na Capital. Registre-se, assim, que o objeto do conflito negativo de atribuições circunscreve-se a este último ponto, na medida em que as demais questões foram encaminhadas a outras Promotorias de Justiça (Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital, Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social de Campinas e Promotoria de Justiça do Meio Ambiente da Capital).

3.   Conflito conhecido e dirimido, declarando caber ao suscitado, 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital, prosseguir a investigação, em seus ulteriores termos.

 

Vistos.

 

1.  Relatório.

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o DD. 24º Promotor de Justiça de Campinas e como suscitado o 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital.

Observa-se dos autos que no dia 21 de agosto de 2012 o Sr. Paulo Henrique Selbmann Sampaio compareceu ao Gabinete da 9ª Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital solicitando providências do Ministério Público do Estado de São Paulo acerca dos fatos narrados em suas declarações, devidamente tomadas por termo (fls. 02/06).

O procedimento foi distribuído ao 2ª Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital (fl. 47), o qual declinou de sua atribuição por entender que o feito deveria ser presidido pela Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social de Campinas, já que a sede do escritório encontra-se naquela localidade e “onde teriam partido ações e omissões administrativas eventualmente ilícitas, pois a competência para eventual ação é do local do dano, lá ocorrido” (fl. 392).

Distribuído ao 24º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social de Campinas (fl. 395), este suscitou conflito negativo de atribuições, pontuando o seguinte:

(a) os fatos narrados na representação não guardam conexão entre si, envolvendo atos de fiscalização ocorridos em estabelecimentos comerciais de diversas localidades, com a participação de funcionários lotados em distintos Escritórios de Defesa Agropecuária (EDAS);

(b) há três áreas de interesse do Ministério Público a ser investigada no presente procedimento: patrimônio público, meio ambiente e consumidor;

 (c) diante da diversidade de áreas, procedeu-se ao desmembramento do expediente, da seguinte forma:

(c.1.) fiscalização das grandes redes de supermercado e omissão na atuação de entreposto de pescados na Praia Grande, matéria a ser investigada pela Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital;

(c.2) favorecimento da empresa “Novilho de Ouro”, matéria a ser investigada pela própria suscitante (2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social de Campinas);

(c.3) prática da vaquejada no âmbito regional, a ser investigada pela Promotoria de Justiça do Meio Ambiente da Capital;

 (c.4) atuação de “Turin Comércio e Entreposto de Carnes LTDA”, com conivência de Diretor do Centro de Inspeção de Produtos de Origem Animal (CIPOA) e do Secretário de Estado da Agricultura e do Coordenador de Defesa Agropecuária, para favorecimento do dono do hipermercado, Sr. José Ariovaldo Rodrigues, candidato a Deputado Estadual e Vereador de São Paulo pelo PSDB, tema a ser investigado pela Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital.

Registre-se, assim, que o objeto do conflito negativo de atribuições circunscreve-se a este último ponto, na medida em que as demais questões foram encaminhadas às Promotorias de Justiça acima referidas (Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital; 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social de Campinas e Promotoria de Justiça do Meio Ambiente da Capital).

É o relato do essencial.

2.  Fundamentação.

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Como se sabe, no processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador estabelece critérios para a repartição do serviço.

Nesse sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 23. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e competência, 11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.

Esta ideia, aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de competência (objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por Adolf Wach, e sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t. I, trad. esp. de Jose Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922, p. 621 e ss; e em suas Instituições de direito processual civil, 2º vol., trad. port. de J. Guimarães Menegale, São Paulo, Saraiva, 1965, p. 153 e ss), bem como por Piero Calamandrei (Instituciones de derecho procesal civil, v. II, trad. esp. Santiago Sentís Melendo, Buenos Aires, EJEA, 1973, p. 95 e ss), entre outros clássicos doutrinadores.

Ora, se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada demanda a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão ministerial com atribuições para certo caso também não parta da hipótese concretamente considerada, ou seja, de seu objeto.

Veja-se que a suscitante, na presidência do presente procedimento, providenciou seu desmembramento. Ora, deve-se destacar que o Procurador-Geral de Justiça não pode dizer como deve o membro do Ministério Público atuar, mas pode e deve dizer se deve ou não atuar, e qual o membro ou órgão de execução que o fará, diante de discrepância concretamente configurada. Assim, é fato que não pode o Chefe da Instituição pautar a conduta de seus membros, sob pena de violação à independência funcional.

Uma vez providenciado o desmembramento, o objeto do conflito negativo de atribuições limita-se à atuação de “Turin Comércio e Entreposto de Carnes LTDA”, com conivência de Diretor do Centro de Inspeção de Produtos de Origem Animal (CIPOA) e do Secretário de Estado da Agricultura e do Coordenador de Defesa Agropecuária, para favorecimento do dono do hipermercado, Sr. José Ariovaldo Rodrigues, candidato a Deputado Estadual e Vereador de São Paulo pelo PSDB. Como visto, o suscitante investigará o favorecimento da empresa “Novilho de Ouro”; os demais pontos serão investigados pelas Promotorias de Justiça do Consumidor e do Meio Ambiente da Capital.

Insta asseverar que o representante ocupa o cargo de Assistente Agropecuário, lotado na Coordenadoria de Defesa Agropecuária, no escritório de Defesa Agropecuária de São Paulo, departamentos vinculados à Secretaria de Estado da Agricultura; acrescentou também que a atividade de fiscalização dos estabelecimentos industriais como frigoríficos, matadouros, abatedouros, entrepostos de carnes, laticínios, entrepostos de mel, ovos, enfim, estabelecimentos relacionados ao trato de produtos de origem animal é feita pelo Serviço de Inspeção de São Paulo (SISP), sendo que a Coordenadoria de Defesa Agropecuária conta com 178 (cento e setenta e oito) veterinários distribuídos em  40 (quarenta) escritórios em todo o Estado.

Destarte, diante da redução do objeto do procedimento, limitando-se o conflito à apontada conivência de Diretor do Centro de Inspeção de Produtos de Origem Animal (CIPOA) e do Secretário de Estado da Agricultura e do Coordenador de Defesa Agropecuária, para favorecimento de terceiro, caberá ao suscitado prosseguir na investigação especificamente nesse ponto.

3. Decisão.

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, declarando caber ao suscitado, 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital, prosseguir na investigação, em seus ulteriores termos.

Publique-se. Comunique-se. Registre-se. Restituam-se os autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

 

São Paulo, 23 de setembro de 2013.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

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