Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado nº 0147691/15

(Ref. SIS nº 43.0417.0001474/2015-1)

Suscitante: 6º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital

Suscitado: Promotor de Justiça de Santa Bárbara D'Oeste (Consumidor)

 

 

 

Conflito negativo de atribuições. Consumidor. Empresa sediada na Capital que fabrica produto  comercializado em Santa Bárbara D'Oeste imprestável à finalidade alardeada pelo vendedor. Dúvida quanto à extensão do dano. Potencialidade de extensão da dimensão espacial da lesão que constitui mera presunção decorrente do fato da sede da empresa. Necessidade de realização de investigações preliminares. Atribuição, por ora, da Promotoria de Justiça do Consumidor de Santa Bárbara D'Oeste. 1. Procedimento instaurado para apuração de prática abusiva por parte de pessoa não identificada, que comercializa em Santa Bárbara D'Oeste "supressor de ar", a ser instalado na tubulação de fornecimento de água ao consumidor, após o cavalete, com o objetivo de reduzir o ar que vem com a água, aumentando, com isso, a vazão. Dispositivo que não produz o efeito desejado. 2. A atribuição do órgão do MP segue a competência jurisdicional do art. 93, I e II, do CDC. 3. A regra balizadora da atribuição se encontra na mensuração da extensão espacial do prejuízo. 4. Potencialidade de dano regional e nacional que, à míngua de maiores elementos de informação, traduz-se em mera presunção, inapta, pelo momento, a ensejar o deslocamento da atribuição para o foro da Capital. 5. Dano que decorre da comercialização de produto que não se presta à finalidade alardeada, e não propriamente da simples fabricação, na medida em que é possível que o produto seja utilizado para outras finalidades. 6. "O fato de a empresa investigada estar sediada na comarca da Capital não é motivo suficiente para deslocar a competência, sobretudo porque na seara supraindividual a competência territorial é absoluta"  (Prot. nº 63.280/11). 7. Necessidade de investigação prévia com o escopo de apurar a dimensão espacial do dano, a ensejar o deslocamento da atribuição, se for o caso. 8. Compreensão das regras de competência do local do dano (art. 2º da LACP e art. 93, I e II, do CDC). 9. Conflito conhecido e dirimido, com determinação de prosseguimento da atuação ministerial por parte do Suscitado.

 

 

 

 

Vistos.

1)  Relatório.

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o DD. 6º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital, e como suscitado o DD. Promotor de Justiça de Santa Bárbara D'Oeste – Consumidor.

 

O procedimento foi instaurado por força de representação encaminhada pelo Departamento de Água e Esgoto de Santa Bárbara D'Oeste à Promotoria de Justiça do Consumidor de Santa Bárbara D'Oeste, solicitando providências contra a comercialização, por pessoa não identificada, de dispositivo chamado "supressor de ar", fabricado pela empresa Termoinjet Indústria Termoplástica Ltda - EPP, sediada na Capital, constituída em 2003 (cf. ficha cadastral de fl. 15). O dispositivo, a ser instalado na tubulação de fornecimento de água ao consumidor, após o cavalete, propõe-se a reduzir o ar que vem com a água, aumentando, com isso, o volume de água que serve o imóvel, mas não produz o efeito desejado. Cuida-se, pois, de comercialização de "supressor de ar" para tubulação de água que não funciona.

O Suscitado, DD. Promotor de Justiça do Consumidor de Santa Bárbara D'Oeste, ao verificar que a empresa fabricante se encontra sediada na Capital - conquanto reconhecesse que "Não está minimamente identificada a pessoa que está comercializando os produtos dela nesta cidade" - e, pois, por vislumbrar a potencialidade de dano nacional ou regional, ordenou a remessa dos autos à Promotoria de Justiça do Consumidor da Capital.

A Suscitante (DD. 6º Promotor de Justiça do Consumidor da Capital) expôs as razões do conflito negativo a fls. 21/26. Afirmou que: (a) não há nenhum elemento que indique tratar-se de produto comercializado em diversos municípios do Estado de São Paulo, tampouco que demonstre haver possíveis consumidores lesados em todo o território nacional; (b) o DD. Promotor de Justiça do Consumidor de Santa Bárbara D'Oeste encaminhou os autos ao foro da Capital tão somente por observar que o fabricante se encontra sediado neste Município; (c) impunha-se que tivesse realizado investigação prévia, tendente a apurar a extensão do dano; (d) à míngua de maiores elementos de informação, a extensão nacional ou regional do dano constitui mera presunção; (e) em precedente julgamento ficou assentado que "O fato de a empresa investigada estar sediada na comarca da Capital não é motivo suficiente para deslocar a competência, sobretudo porque na seara supraindividual a competência territorial é absoluta"  (Prot. nº 63.280/11).

É o relato do essencial.

2) Fundamentação.

         O conflito negativo de atribuições está configurado e comporta conhecimento.

         Data vênia de entendimento contrário, assiste razão ao Suscitante.

         Na hipótese em análise, o elemento central para a decisão do conflito reside em se saber a extensão do dano e, consequentemente, em se verificar a regra de competência a ser aplicada: se aquela prevista no art. 93, I ou a do art. 93, II do CDC, c.c. a do art. 2º da Lei da Ação Civil Pública.

O objeto da investigação, como se infere dos autos, está relacionado à comercialização de dispositivo que não se presta à finalidade alardeada, não propriamente à sua fabricação, na medida em que não é possível inferir dos autos se o produto é utilizado para outros fins.

         Não há dúvida que a atribuição do órgão do MP segue a competência jurisdicional do art. 93, I e II, CDC (Protocolado n. 19.816/14). Destaca-se desse precedente o seguinte excerto de sua fundamentação:

“7.               Em tema de competência jurisdicional assim vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça sobre dano regional:

‘PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO DE ÂMBITO REGIONAL. COMPETÊNCIA DA VARA DA CAPITAL PARA O JULGAMENTO DA DEMANDA. ART. 93 DO CDC.

1. O art. 93 do CDC estabeleceu que, para as hipóteses em que as lesões ocorram apenas em âmbito local, será competente o foro do lugar onde se produziu o dano ou se devesse produzir (inciso I), mesmo critério já fixado pelo art. 2º da LACP. Por outro lado, tomando a lesão dimensões geograficamente maiores, produzindo efeitos em âmbito regional ou nacional, serão competentes os foros da capital do Estado ou do Distrito Federal (inciso II).

2. Na espécie, o dano que atinge um vasto grupo de consumidores, espalhados na grande maioria dos municípios do estado do Mato Grosso, atrai ao foro da capital do Estado a competência para julgar a presente demanda.

3. Recurso especial não provido’ (RT 909/483).

8.                E em se tratando de dano nacional, a Corte Federal decidiu que:

‘AÇÃO CIVIL PÚBLICA. POUPANÇA. DANO NACIONAL. FORO COMPETENTE. ART. 93, INCISO II, DO CDC. COMPETÊNCIA CONCORRENTE. CAPITAL DOS ESTADOS OU DISTRITO FEDERAL. ESCOLHA DO AUTOR.

1. Tratando-se de dano de âmbito nacional, que atinja consumidores de mais de uma região, a ação civil pública será de competência de uma das varas do Distrito Federal ou da Capital de um dos Estados, a escolha do autor.

2. Conflito de competência conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da 7ª Vara Cível do Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba/PR’ (STJ, CC 112.235-DF, 2ª Seção, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 09-02-2011, v.u., DJe 16-02-2011).

9.                Anoto que a competência do art. 93, I, do Código de Defesa do Consumidor tem natureza absoluta enquanto a do art. 93, II, do codex, é de caráter relativo, como assentado em outro aresto:

‘(...) muito embora o inciso II do art. 93 do CDC tenha criado uma vedação específica, de natureza absoluta – não podendo o autor da ação civil pública ajuizá-la em uma comarca do interior, por exemplo -, a verdade é que, entre os foros absolutamente competentes, como entre o foro da capital do Estado e do Distrito Federal, há concorrência de competência, cuidando-se, portanto, de competência relativa. (...)’ (RDDP 91/123).

10.              A regra balizadora é a extensão espacial do prejuízo”.

 

         Sem embargo, a mera possibilidade de ocorrência de dano nacional ou regional, à míngua de maiores elementos de informação, constitui, a esta altura da investigação civil, mera conjectura ou, como bem frisou o Suscitante, presunção, na medida em que o próprio Suscitado reconheceu que "Não está minimamente identificada a pessoa que está comercializando os produtos dela nesta cidade" (fl. 2).

Em outras palavras, "O fato de a empresa investigada estar sediada na comarca da Capital não é motivo suficiente para deslocar a competência, sobretudo porque na seara supraindividual a competência territorial é absoluta"  (Prot. nº 63.280/11).

Repise-se que, pelo que verte dos autos, a ofensa a direito do consumidor decorre da comercialização do produto, e não propriamente de sua fabricação, na medida em que não são conhecidos todos os fins a que se destina o dispositivo em questão, podendo ocorrer que seja fabricado para finalidades diversas daquela vislumbrada e alardeada pelo autor da infração em Santa Bárbara D'Oeste.

         Impende, pois, a realização de diligências preliminares, tendentes a apurar a extensão do dano, a fim de que se possa, se for o caso, ordenar o deslocamento da atribuição para o foro da Capital.

         Ante o exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115, da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao Suscitado, DD. Promotor de Justiça do Consumidor de Santa Bárbara D'Oeste, a atribuição para oficiar nos autos, sem prejuízo de posterior deslocamento da atribuição para o foro da Capital, a depender do resultado das diligências preliminares empreendidas.

         Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

         Remeta-se cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

                                São Paulo, 03 de novembro de 2015.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

lfmm