Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado nº 160.826/2014

Representação nº SIS 38.0548.0000110/2014-9

Suscitante: 5º Promotor de Justiça Cível do Jabaquara

Suscitado: Promotora de Justiça em exercício no GEDUC (Grupo de Atuação Especial de Educação)

 

Ementa:

1)   Conflito negativo de atribuições. 5º Promotor de Justiça Cível do Jabaquara (suscitante). Promotora de Justiça em exercício no GEDUC (Grupo de Atuação Especial de Educação).

2)   Representação noticiando que, em razão da cassação do registro de determinada escola, há obstáculo à emissão de Certificados de Conclusão de Curso. Plausibilidade de que essa situação, provocada, conforme a representação, por deliberação administrativa da Diretoria de Ensino da região afetada, venha criando dificuldades não só em relação ao representante, mas também em relação a outros ex-alunos.

3)   Conflito conhecido e dirimido, declarando-se caber à suscitada examinar a representação.

 

Vistos,

1) RELATÓRIO

Tratam estes autos de conflito negativo de atribuições, suscitado pelo DD. 5º Promotor de Justiça Cível do Jabaquara, figurando como suscitada a DD. Promotora de Justiça em exercício no GEDUC (Grupo de Atuação Especial de Educação) – Núcleo da Capital.

Tiago Cezar Bueno de Souza encaminhou representação ao Ministério Público do Estado de São Paulo, solicitando providências em face da Diretoria de Ensino Centro Sul, diante da notícia da recusa de emissão de Certificado de Conclusão do Ensino Médio, decorrente da cassação do registro da “Escola Planeta”, na qual o interessado teria concluído seus estudos.

Ao receber a representação, a suscitada, DD. Promotora de Justiça em exercício no GEDUC (Grupo de Atuação Especial de Educação), declinou de oficiar no expediente, determinando seu encaminhamento à Promotoria de Justiça do local da residência do interessado (fls. 4).

O suscitante, DD. 5º Promotor de Justiça Cível do Jabaquara, suscitou o conflito negativo, salientando, em suma, que: (a) a representação noticia fatos (cassação do registro de funcionamento de escola, e impossibilidade de emissão de certificados de conclusão de curso) que relevam lesão a interesses metaindividuais; (b) a atribuição para a investigação, no plano coletivo, é do GEDUC; (c) as atribuições do suscitante são limitadas à esfera da Infância e da Juventude; (d) o autor da representação é pessoa maior e capaz (fls. 7/11).

É o relato do essencial.

2) FUNDAMENTAÇÃO

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Como se sabe, no processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador estabelece critérios para a repartição do serviço. Nesse sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 23. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e competência, 11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.

Esta ideia, aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de competência (objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por Adolf Wach, e sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t. I, trad. esp. de Jose Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922, p. 621 e ss; e em suas Instituições de direito processual civil, 2º vol., trad. port. de J. Guimarães Menegale, São Paulo, Saraiva, 1965, p. 153 e ss), bem como por Piero Calamandrei (Instituciones de derecho procesal civil, v. II, trad. esp. Santiago Sentís Melendo, Buenos Aires, EJEA, 1973, p. 95 e ss), entre outros clássicos doutrinadores.

Ora, se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada demanda a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão ministerial com atribuições para certo caso também não parta da hipótese concretamente considerada, ou seja, de seu objeto.

A representação ao Ministério Público, como se observa de fls. 5, noticia que o interessado concluiu o Ensino Médio e, segundo narra, não teve êxito na obtenção do Certificado de Conclusão, porque teria sido cassada a autorização de funcionamento da escola.

Destaca o suscitante que:

”(...)

Portanto, torna-se claro que o fato a ser investigado no presente caso se relaciona com a cassação de um curso supletivo de ensino médio de uma escola chamada Planeta. O representante está impossibilitado de concluir o ensino médio não por motivos individuais (ex. ausência às provas, excesso de falas, falta de documentos etc), mas sim por um motivo afeto a toda a coletividade discente da Escola Planeta, que teve seu registro cassado pela Diretoria de Ensino.

(...)”

Pois bem.

A investigação ainda não começou e há escassos elementos para a apreciação do presente expediente, visto que dele consta exclusivamente a representação do interessado.

Com esses parcos elementos, entretanto, é possível perceber, ao menos em princípio, dois aspectos:

(a) primeiro, que embora a representação tenha sido feita com a preocupação da defesa da situação individual do interessado, noticia ela fato que, ao que tudo indica, teve repercussão coletiva (cassação do registro de determinado curso, com prejuízo concreto – impedimento de expedição de Certificados de Conclusão – para várias pessoas);

(b) segundo, que as atribuições do suscitante são limitadas à matéria da Infância e da Juventude, nos termos da divisão de serviços ora em vigor na Promotoria de Justiça Cível do Jabaquara.

Adite-se que, nos termos do art. 2º do Ato Normativo 672/2010-PGJ-CPJ, de 21 de dezembro de 2010, que criou o Grupo de Atuação Especial de Educação, cabe a este, em suma, “promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses difusos e coletivos relacionados a todos os níveis e modalidades de educação básica e, no que couber, da educação superior” (art. 2º, I), bem como “exercer a fiscalização dos sistemas estadual e municipal de ensino” (art. 2º, IV).

Esse quadro sinaliza, ao menos por ora, mais que a necessidade de analisar a situação individual do autor da representação, ser pertinente o exame da repercussão dos fatos na esfera dos interesses supraindividuais.

Em suma, caberá à suscitada oficiar no caso, apurando, no plano coletivo e difuso, a situação narrada na representação.

3) DECISÃO

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber à suscitada, DD. Promotora de Justiça em exercício no GEDUC (Grupo de Atuação Especial da Educação), a atribuição para análise da representação.

Publique-se a ementa.

Comunique-se.

Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 28 de outubro de 2014.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

rbl