Conflito de Atribuições – Cível

Protocolado nº 0181494/12

(Ref. Ação de internação compulsória nº 306.01.2011.000259-7/000000-000)

Suscitante: 2º Promotor de Justiça de José Bonifácio

Suscitado: 1º Promotor de Justiça de José Bonifácio

 

 

Ementa:

1.   Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 2º Promotor de Justiça de José Bonifácio. Suscitado: 1º Promotor de Justiça de José Bonifácio

2.   Ação de internação compulsória. Ato de divisão de serviços da Promotoria de Justiça. Previsão de atribuição do suscitado para oficiar nos “feitos cíveis” da 1ª Vara Judicial.

3.   Interpretação dos atos de divisão de serviços. Análise contextual e finalista.

4.   O 1º Promotor de Justiça de José Bonifácio atuará na seara da Saúde Pública em questões referentes aos municípios de Ubarana e Mendonça, enquanto o 2º Promotor de Justiça de José Bonifácio atuará na seara da Saúde Pública em temas relativos aos municípios de José Bonifácio e Adolfo. Contudo, quanto às demandas propostas por terceiros, que, em tese, se relacionem à matéria de Saúde Pública, cada qual funcionará na Vara em que oficia, na condição de custos legis.

5.   Conflito conhecido e dirimido, cabendo ao suscitado prosseguir no feito.

 

 

 

Vistos.

1. Relatório.

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o 2º Promotor de Justiça de José Bonifácio e como suscitado o 1º Promotor de Justiça de José Bonifácio, nos autos da ação de internação compulsória nº 306.01.2011.000259-7/000000-000, em trâmite na 1ª Vara Judicial de José Bonifácio.

Na presente demanda, postula-se a internação compulsória de L.C.F. em Hospital Psiquiátrico ou Clínica de Desintoxicação até sua completa recuperação.

O feito foi inicialmente distribuído ao membro do Ministério Público oficiante na 1ª Vara Cível da Comarca de José Bonifácio, o qual se manifestou às fls. 26/28, 72 e 82. Ocorre que, em nova manifestação, o 1º Promotor de Justiça de José Bonifácio requereu que o feito fosse encaminhado ao 2º Promotor de Justiça de José Bonifácio, “a fim de evitar ofensa ao princípio do Promotor Natural e a nulidade do feito”  (fl. 87).

Embora o 2º Promotor de Justiça de José Bonifácio tenha se manifestado a fl. 90, posteriormente suscitou conflito negativo de atribuições (fls. 94/99), assentando, em síntese, que a atribuição para funcionar na demanda é do suscitado, pelos seguintes motivos: (a) o feito tramita perante a 1ª Vara Cível da Comarca de José Bonifácio, logo, a atribuição é do membro do Ministério Público que nela oficia, nos termos do Ato n. 87/2008-PGJ, de 03 de julho de 2008; (b) não se pode confundir a função específica de Promotor de Justiça responsável pela Saúde Pública com a referente à atuação nos processos cíveis em geral; (c) há precedente desta Procuradoria-Geral de Justiça no sentido de que a atribuição para atuar nos autos é do suscitado.

É o relato do essencial.

1. Fundamentação.

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Como se sabe, no processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador estabelece critérios para a repartição do serviço.

Nesse sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 23. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e competência, 11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.

Esta ideia, aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de competência (objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por Adolf Wach, e sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t. I, trad. esp. de Jose Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922, p. 621 e ss; e em suas Instituições de direito processual civil, 2º vol., trad. port. de J. Guimarães Menegale, São Paulo, Saraiva, 1965, p. 153 e ss), bem como por Piero Calamandrei (Instituciones de derecho procesal civil, v. II, trad. esp. Santiago Sentís Melendo, Buenos Aires, EJEA, 1973, p. 95 e ss), entre outros clássicos doutrinadores.

Ora, se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada demanda a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão ministerial com atribuições para certo caso também não parta da hipótese concretamente considerada, ou seja, de seu objeto.

Registre-se que o Ato n. 87/2008-PGJ, de 03 de julho de 2008, responsável por homologar a modificação das atribuições dos cargos de Promotor de Justiça da Promotoria de Justiça de JOSÉ BONIFÁCIO, fixa o seguinte:

“I. 1º PROMOTOR DE JUSTIÇA.

a) feitos cíveis da 1ª Vara;

b) feitos criminais da 1ª Vara e feitos criminais requisitados a partir de 30/11/2007;

c) feitos ímpares do Juizado Especial Criminal;

d) Cidadania (feitos relativos aos municípios de Ubarana e Mendonça);

e) Habitação e Urbanismo (em atuação conjunta com o 2º Promotor de Justiça);

f) Meio Ambiente (em atuação conjunta com o 2º Promotor de Justiça);

g) Infância e Juventude, inclusive na área de direitos difusos e coletivos;

h) Procedimento Administrativo Criminal (em atuação conjunta com o 2º Promotor de Justiça);

i) Corregedoria de Registro de Imóveis;

j) Habilitações de Casamento;

k) Atendimento ao público.

II. 2º PROMOTOR DE JUSTIÇA

a) feitos cíveis da 2ª Vara;

b) feitos criminais da 2ª Vara e feitos criminais requisitados a partir de 30/11/2007;

c) feitos pares do Juizado Especial Criminal;

d) feitos de competência do Tribunal do Júri (desde o inquérito policial até final julgamento);

e) Execuções Criminais;

f) Cidadania (feitos relativos aos municípios de José Bonifácio e Adolfo);

g) Habitação e Urbanismo (em atuação conjunta com o 1º Promotor de Justiça);

h) Meio Ambiente (em atuação conjunta com o 1º Promotor de Justiça);

i) Consumidor;

j) Fundações;

k) Idoso;

l) Pessoa com Deficiência;

m) Procedimento Administrativo Criminal (em atuação conjunta com o 1º Promotor de Justiça);

n) Corregedoria Permanente da Polícia Judiciária e dos Presídios;

o) Corregedoria Permanente dos Serviços de Registro Civil;

p) Atendimento ao público”. (g.n.)

A divisão de atribuições acima não tratou da matéria atinente à Saúde Pública.

Por tal motivo, a Assessoria de Gestão e Planejamento Institucional da Procuradoria-Geral de Justiça firmou o entendimento no sentido de que os feitos relativos à Saúde Pública pertencem ao Promotor de Justiça com atribuição na área da Cidadania; ora, considerando que, em José Bonifácio, os feitos da Cidadania são divididos por municípios entre os dois Promotores, fixou-se que os feitos de Saúde Pública relativos aos Municípios de José Bonifácio e Adolfo pertencem ao 2º Promotor de Justiça, ao passo que os feitos de Saúde Pública relativos aos Municípios de Ubarana e Mendonça são de atribuição do 1º Promotor de Justiça (Promotorias – São José do Rio Preto – José Bonifácio – Gestão – Protocolos de Atribuições – Pt 1280-08 – fl. 103).

Depreende-se, pois, que ambos os Promotores de Justiça de José Bonifácio possuem atribuição para funcionar na área da Saúde Pública, de modo que a divisão é feita segundo critério territorial.

Deve-se colocar que a interpretação dos atos normativos que disciplinam a divisão de serviços no âmbito das Promotorias de Justiça deve ser feita de modo contextual e finalista. A análise literal da regra, embora seja um dos elementos para sua compreensão, não é suficiente, por si só, para o equacionamento das dúvidas e conflitos.

Insta salientar que o Ato n. 87/2008-PGJ, de 03 de julho de 2008, responsável por homologar a modificação das atribuições dos cargos de Promotor de Justiça da Promotoria de Justiça de JOSÉ BONIFÁCIO, atribui ao 1º Promotor de Justiça, ora suscitado, a atribuição para funcionar nos “feitos cíveis da 1ª Vara”.

Assiste razão ao suscitante quando afirma não se dever confundir “a função específica do Promotor de Justiça responsável pela saúde pública com aquele competente para atuar em processos cíveis em geral. Ainda que se trate de procedimento afeto à saúde pública deve se ter em conta que o procedimento foi distribuído em Juízo o que faz com que o 1º Promotor de Justiça tenha atribuição para oficiar no presente feito. A atuação perante a saúde pública se dá em relação aos casos que são trazidos ao conhecimento da Promotoria de Justiça, mas tal não impede que a própria família, que vive em contato com o dependente, ingresse com a ação pleiteando sua internação compulsória”(fl. 96).

Do exposto, pode-se concluir que o 1º Promotor de Justiça de José Bonifácio atuará na seara da Saúde Pública em temas relativos aos municípios de Ubarna e Mendonça, enquanto o 2º Promotor de Justiça de José Bonifácio atuará na seara da Saúde Pública em temas relativos aos municípios de José Bonifácio e Adolfo. Contudo, quando às demandas propostas por terceiros, que, em tese, se relacionem à matéria Saúde Pública, cada qual funcionará na Vara em que oficia.

Caberá, destarte, ao suscitado oficiar no caso.

3) Decisão

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitado, 1º Promotor de Justiça de José Bonifácio, a atribuição para oficiar no feito.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 07 de janeiro de 2012.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

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