Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado nº 31.738/17 (MP nº 43.0712.0001206/2017-8)

Suscitante: 4º Promotor de Justiça Cível de Sorocaba (atribuição na área da Habitação e Urbanismo)

Suscitado: 15º Promotor de Justiça Cível de Sorocaba (atribuição na área do Patrimônio Público e Social)

 

 

Ementa:

1.      Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 4º Promotor de Justiça Cível de Sorocaba (atribuição na área da Habitação e Urbanismo). Suscitado: 15º Promotor de Justiça Cível de Sorocaba (atribuição na área do Patrimônio Público e Social). Representação que notifica apropriação por particular de área de via pública pertencente ao Município de Sorocaba, mediante apossamento seguido de retificação administrativa do registro do imóvel.

2.      Muito embora se possa cogitar sobreposição de atribuições, percebe-se com segurança que a matéria investigada nos autos está relacionada preponderantemente ao uso e ocupação do solo urbano, pois tem reflexo direto na questão referente à mobilidade urbana diante da redução da área destinada à via pública, matéria de atribuição da Promotoria de Justiça da Habitação e Urbanismo.

3.      Conflito conhecido e dirimido, declarando-se caber ao suscitado, DD. 4º Promotor de Justiça Cível de Sorocaba, a atribuição para oficiar nos autos.

Vistos,

1.   Relatório

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o 4º Promotor de Justiça Cível de Sorocaba com atribuição na área da Habitação e Urbanismo e como suscitado o 15º Promotor de Justiça Cível de Sorocaba com atribuição na área do Patrimônio Público e Social, em face de representação que noticiava apropriação por particular de área de via pública pertencente ao Município de Sorocaba, mediante apossamento seguido de retificação administrativa do registro do imóvel.

Ao receber a representação, o 15º Promotor de Justiça Cível de Sorocaba, com atribuição na área do Patrimônio Público e Social, declinou de sua atribuição remetendo as peças ao 4º Promotor de Justiça Cível de Sorocaba e ao Promotor de Justiça responsável pela Corregedoria do 2º Cartório do Registro de Imóveis, por não vislumbrar participação de agentes públicos e entender mais produtivo, conveniente e eficiente, antes de eventual análise de ponto de vista da improbidade administrativa, fosse a questão analisada por cargos com atribuições mais técnicas e relacionados à matéria.

O 4º Promotor de Justiça Cível de Sorocaba, com atribuição na área da Habitação e Urbanismo, ao receber a representação suscitou o presente conflito negativo de atribuições, afirmando que não haveria lesão à ordem urbanística, haja vista que o alegado apossamento não alterou o traçado urbano, nem afetou área destinada a equipamento público, área verde ou de infraestrutura urbana. Entende, desta forma, que a apropriação ou o apossamento de bem de natureza dominicais representa prejuízo real ou potencial ao patrimônio público, somando-se ainda possível ato de improbidade consistente na omissão dos agentes públicos municipais na proteção física e jurídica de tal patrimônio.

Determinou-se a manifestação do 14º Promotor de Justiça de Sorocaba, uma vez que o suscitante sustentou, subsidiariamente, atribuição do mesmo, por envolver questão referente a Registros Públicos.

O 14º Promotor de Justiça de Sorocaba, por sua vez, a fls. 102/103, afirmou que atuou exclusivamente no expediente administrativo instaurado acerca dos fatos junto ao Juízo Corregedor do 2º Oficial de Registro de Imóveis de Sorocaba, onde entendeu ter o procedimento de retificação de área administrativo transcorrido de forma regular.

É o relato do essencial.

2.   Fundamentação

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Verifica-se que a representação noticia que houve, atráves de apossamento e posterior retificação do registro de imóvel, apropriação de área pública que integrava vias da Prefeitura e do DER. Ressaltou-se que em face de tal apropriação a Estrada Municipal Heitor Cury foi reduzida para 11 metros de largura, quando inicialmente possuía leito carroçável de 20 metros, suportando grande movimentação de veículos.

Embora possa cogitar eventual irregularidade no procedimento administrativo de retificação da área do imóvel e omissão de agentes públicos municipais a questão preponderante está relacionada a matéria relativa a circulação e mobilidade urbana, tendo em vista a apropriação de área que integrava via pública.

A representação deixa bem claro sua preocupação com a redução da largura da via pública que afirmou possuía 20 metros de leito carroçável e suportava grande movimentação de veículos.

Assim, está evidente em primeiro plano e de forma preponderante lesão à ordem urbanística no que se refere a circulação, haja vista apropriação de área destinada e vocacionada a servir à infraestrutura urbana.

 Não há na representação indicação concreta de indícios de atos de improbidade administrativa praticados pelos servidores municipais em decorrência de omissão no procedimento administrativo de retificação de área.

É oportuno anotar que se afigura extremamente comum que, em determinada investigação, verifique-se a existência de mais de um interesse afeto a mais de uma área de atuação do Ministério Público. Isso decorre da própria complexidade dos interesses coletivos, cujo dinamismo faz com que nem sempre se acomodem, de forma singela, aos critérios normativos previamente estabelecidos de repartição das atribuições dos órgãos ministeriais.

Cabe ressaltar que a questão relacionada à área de Registros Públicos teve seu encaminhamento independente da análise das matérias relativas à Habitação e Urbanismo e Patrimônio Público.

Muito embora a hipótese em análise possa resvalar em aspectos relacionados ao Patrimônio Público, sobretudo ante a possibilidade da aludida omissão de servidores públicos, a questão central está afeta às atribuições da Promotoria de Habitação e Urbanismo.

A propósito o Manual de Atuação Funcional (Ato Normativo nº 675/2010-PGJ-CGMP, de 28 de dezembro de 2010), que atendo à lei ao tratar das atribuições da Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo, prevê o que segue:

“Art. 453. Lembrar que a atuação abrange questões relacionadas à ordem urbanística (habitação, trabalho, circulação e recreação) e, no exercício de suas atribuições, o Promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo deve adotar, dentre outras, as seguintes providências:

(...)

Art. 469. Zelar pela efetiva aplicação das normas de uso e ocupação do solo urbano, cuidando para que as edificações, obras, atividades e serviços observem as posturas urbanísticas, especialmente aquelas concernentes ao zoneamento, ao meio ambiente, à estética, à paisagem, à segurança, ao licenciamento sanitário e à salubridade e funcionalidade urbanas.

Parágrafo único. Atentar para a possibilidade de responsabilização dos agentes de fiscalização em todas as esferas, inclusive por improbidade administrativa, e de outras pessoas que, de qualquer modo, colaboraram para infringir a legislação de uso e ocupação do solo.”

Registre-se que o parágrafo único do art. 469 dispositivo reconhece ao membro do Ministério Público da Habitação e Urbanismo a possibilidade de responsabilização dos agentes de fiscalização em todas as esferas, inclusive por improbidade administrativa.

Assim, o objeto da representação reclama a intervenção da Promotoria de Justiça da Habitação e Urbanismo haja vista estar a questão preponderante relacionada à redução de áreas pública destinadas e vocacionada à infraestrutura viária que traz reflexo na circulação.

Resolve-se o conflito, portanto, reconhecendo-se a atribuição da Promotoria de Justiça de Habitação e Urbanismo para atuar no caso.

3.   Decisão

Face ao exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115, da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitante, 4º Promotor de Justiça Cível de Sorocaba, a atribuição para oficiar nos autos.

Publique-se a ementa. Comuniquem-se os interessados. Cumpra-se, providenciando-se o encaminhamento dos autos. Remeta-se cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

         São Paulo, 09 de maio de 2017.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

aca