Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado nº 51337/15

Suscitante: 4ª Promotora de Justiça de São Caetano do Sul (Saúde Pública)

Suscitado: 8º Promotor de Justiça de São Caetano do Sul (Pessoa Portadora de Deficiência Física)

 

Ementa:

1.      Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 4ª Promotora de Justiça de São Caetano do Sul (Saúde Pública). Suscitado: 8ª Promotor de Justiça de São Caetano do Sul (Pessoa Portadora de Deficiência Física).

2.      Representação encaminhada ao Ministério Público para providências relacionadas à notícia de irregularidades no fornecimento de medicamentos à pessoa portadora de tetraplegia, que sinalizam para a preponderância da tutela da pessoa portadora de deficiência.

3.      Conflito conhecido e dirimido, cabendo ao Suscitado prosseguir na investigação.

 

1)  Relatório.

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante a DD. 4ª Promotora de Justiça de São Caetano do Sul (Saúde Pública) e como suscitado o DD. 8º Promotor de Justiça de São Caetano do Sul (Pessoa Portadora de Deficiência), relativamente ao feito em epígrafe (Notícia de Fato 1.34.011.000050/2015-19 0 – encaminhado pelo Ministério Público Federal).

O presente expediente teve início em razão de representação oferecida por Marco Henrique Lopes, portador de tetraplegia, o qual noticiou que a Prefeitura de São Caetano do Sul não estaria fornecendo acompanhamento médico, medicamentos e materiais de enfermagem.

O DD. 8º Promotor de Justiça de São Caetano do Sul (Pessoas com Deficiência) encaminhou o expediente à DD. 4ª Promotora de Justiça de São Caetano do Sul (Saúde Pública), sob o fundamento de que se trata de expediente que postula providências afetas à saúde pública, que evidenciam possível falha na prestação do serviço de saúde pública, falecendo atribuição na seara da Pessoa com Deficiência.

A DD. 4ª Promotora de Justiça de São Caetano do Sul (Saúde Pública) suscitou o presente conflito de atribuições, sob o fundamento de que os fatos noticiados no expediente deverão ensejar providências relativas à proteção de pessoa portadora de deficiência, ainda que envolva falha no sistema de dispensação de medicamentos e insumos, inclusive em face da prioridade estabelecida na Lei Municipal n. 4.207/2004.

É a síntese do necessário.

2) Fundamentação.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Como se sabe, no processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador estabelece critérios para a repartição do serviço.

Nesse sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 23. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e competência, 11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.

Esta ideia, aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de competência (objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por Adolf Wach, e sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t. I, trad. esp. de Jose Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922, p. 621 e ss; e em suas Instituições de direito processual civil, 2º vol., trad. port. de J. Guimarães Menegale, São Paulo, Saraiva, 1965, p. 153 e ss), bem como por Piero Calamandrei (Instituciones de derecho procesal civil, v. II, trad. esp. Santiago Sentís Melendo, Buenos Aires, EJEA, 1973, p. 95 e ss), entre outros clássicos doutrinadores.

Ora, se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada demanda a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão ministerial com atribuições para certo caso também não parta da hipótese concretamente considerada, ou seja, de seu objeto.

Pode-se, deste modo, afirmar que a definição do membro do parquet a quem incumbe a atribuição para conduzir determinada investigação na esfera cível, que poderá, ulteriormente, culminar com a propositura de ação civil pública, deve levar em consideração os dados do caso concreto investigado.

Pois bem.

A pretensão deduzida pelo autor da representação, ao pugnar providências em face do Município de São Caetano do Sul, destacou; a) tratar-se de pessoa portadora de tetraplegia; b) falha no fornecimento de atendimento médico, medicamentos e materiais de enfermagem; c) desrespeito à Lei Municipal n. 4207/2004, que instituiu o Estatuto Municipal da Pessoa Deficiente e do Portador de Necessidades Especiais.

Das parcas informações contidas no expediente emerge a inadequação do atendimento prestado a pessoa portadora de deficiência (tetraplegia), não se podendo, ao menos com base nas informações até então colhidas, deduzir que tal falha estenda-se sobre todo o sistema municipal de saúde.

Não se adota, nesta oportunidade, o posicionamento fixado no Protocolado n. 158.714-10, invocado pelo suscitado, porque a situação de fato, naquele caso, é diversa da que se verifica no presente. No citado procedimento, pelos elementos que o instruíram, sobressaia a necessidade de providências em razão de falha no serviço prestado pelo Hospital Municipal a todos os munícipes, preponderando a necessidade de providências na área da Saúde Pública.

Na hipótese em comento, conforme apontado, os elementos fornecidos pelo representante indicam, com o devido respeito ao entendimento externado pelo suscitado, que o interesse preponderante no caso concreto está relacionado à pessoa portadora de deficiência.

 

3) Decisão

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao Suscitado, DD. 8º Promotor de Justiça de São Caetano do Sul (Pessoa Portadora de Deficiência), a atribuição para oficiar no procedimento investigatório.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

 

São Paulo, 07 de maio de 2015.

 

        Márcio Fernando Elias Rosa

        Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

 

 

aaamj