Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado nº 57.768/17 (MP nº 66.0426.0001959/2017-3)

Suscitante: 18º Promotor de Justiça de Santos (atribuição na área da Saúde Pública)

Suscitado: 14º Promotor de Justiça de Santos (atribuição na área do Patrimônio Público e Social)

 

 

Ementa:

1.      Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 18º Promotor de Justiça de Santos (atribuição na área da Saúde Pública). Suscitado: 14º Promotor de Justiça de Santos (atribuição na área do Patrimônio Público e Social). Representação que notifica condições de trabalho e estruturais inadequadas para a prestação de serviços no Hospital Municipal da Zona Noroeste e da Maternidade Silvério Fontes, em Santos, que decorreriam de omissão por parte do Prefeito Municipal e do Secretário Municipal de Saúde, caracterizadora de ato de improbidade administrativa.

2.      Potencial afetação de bens jurídicos diversos: patrimônio público e saúde pública, que reclama a atuação de órgãos diversos na defesa dos direitos e interesses difusos implicados.

3.      A investigação relacionada ao tema improbidade administrativa ou ressarcimento ao erário é de atribuição do membro do Ministério Público incumbido da tutela do patrimônio público. Precedente da Procuradoria-Geral de Justiça (PT nº 106.360/14).

4.      Conflito conhecido e dirimido, declarando-se caber ao suscitado, DD. 14º Promotor de Justiça de Santos, a atribuição para oficiar nos autos.

 

Vistos,

1.   Relatório

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o 18º Promotor de Justiça de Santos, com atribuição na área da Saúde Pública, e, como suscitado, o 14º Promotor de Justiça de Santos, com atribuição na área do Patrimônio Público e Social, em face de representação que noticia condições de trabalho e estruturais inadequadas para a prestação de serviços no Hospital Municipal da Zona Noroeste e da Maternidade Silvério Fontes, em Santos, que decorreriam de omissão por parte do Prefeito Municipal e do Secretário Municipal de Saúde, caracterizadora de ato de improbidade administrativa.

Ao receber a representação, o 18º Promotor de Justiça de Santos, com atribuição na área da Saúde Pública, remeteu cópia da mesma ao 14º Promotor de Justiça de Santos, com atribuição na área do Patrimônio Público e Social, consignando que as irregularidades no Hospital Municipal Arthur Domingues Pinto, incluindo a Maternidade Silvério Fontes, que fazem parte do complexo hospitalar da Zona Noroeste, bem como as irregularidades no Pronto Socorro da Zona Noroeste, incluindo a notícia de queda do teto e fechamento por falta de funcionários para a troca de plantão já eram objeto de apuração através dos Inquéritos Civis nº 1.295/2014 e 1.273/2013, nos quais se juntou a representação. Assim, entendeu que a apuração de eventual prática de ato de improbidade administrativa extrapolava o âmbito de sua atuação.

O 14º Promotor de Justiça de Santos, por sua vez, não vislumbrando nos fatos narrados na representação circunstância que sugerisse a prática de ato de improbidade administrativa, restituiu a mesma ao 18º Promotor de Justiça de Santos, sustentando que se ao longo da investigação fosse apurada ocorrência de ato de improbidade, nada impediria que o órgão ministerial com atuação na área da saúde pública, cumulasse, na ação destinada a regularização dos serviços de saúde, pretensão à aplicação das sanções da Lei de Improbidade (fls. 66/69).

Foi então suscitado o presente conflito negativo de atribuições pelo 18º Promotor de Justiça de Santos, afirmando que cópia da representação e dos documentos juntados já haviam sido juntados nos Inquéritos Civis que apuram aqueles fatos e de que a investigação da prática de ato de improbidade administrativa extrapolava o âmbito de atribuição da Promotoria de Justiça da Saúde Pública em razão da diversidade dos bens jurídicos tutelados, razão pela qual caberia ao suscitado o juízo de valor sobre eventual arquivamento ou instauração de procedimento investigatório sobre os fatos.

É o relato do essencial.

2.   Fundamentação

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

É possível afirmar no caso em análise que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

Verifica-se que a representação noticia diversas irregularidades no Hospital Municipal Dr. Arthur Domingues Pinto e na Maternidade Silvério Fontes relativas à infraestrutura e à prestação do serviço de saúde, notadamente: péssimas condições de trabalho para os funcionários; péssimas condições estruturais; queda de parte do teto de gesso do hospital; fechamento do Pronto Socorro da Zona Noroeste por falta de funcionamento durante a troca de plantão; inexistência de Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros; condições estruturais inadequadas da maternidade decorrente de paredes mofadas nos quartos, infiltrações, janelas quebradas, banheiro sem segurança para o paciente, elevadores quebrados e sem funcionamento; falta de médicos e de equipamentos na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal; falta de medicamento de uso diário, inclusive de uso diário nas Unidades de Terapia Intensiva Adulto e Neonatal e falta de segurança no próprio hospital e no entorno.

A representação aponta que as referidas péssimas condições estruturais e da prestação do serviço de saúde decorreriam da omissão do Prefeito e do Secretário Municipal de Saúde, o que caracterizaria ato de improbidade administrativa.

As questões relacionadas à regularidade, efetividade e eficácia dos serviços de saúde já são objeto de apuração por parte do suscitante, através dos Inquéritos Civis nº 1.295/2014 e 1.273/2013, aos quais se juntou cópia da representação e documentos por ela apresentados.

Importante consignar que não há na representação indicação concreta de que tenha ocorrido omissão por parte do Prefeito e Secretário Municipal de Saúde que importaram nas relatadas péssimas condições estruturais e do serviço de saúde.

Tal fato, no entanto, merece melhor apuração.

Esta apuração, embora possa tangenciar questões relativas à qualidade e eficiência dos serviços de saúdes prestados pelo Hospital Municipal Dr. Arthur Domingues Pinto e na Maternidade Silvério Fontes, têm objeto diverso, sendo oportuno na hipótese que fique a cargo da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social.

A apuração e correção das péssimas condições da prestação de serviços de saúde, que potencialmente podem colocar em risco a saúde das pessoas é diversa da investigação relativa a eventual nexo causal destas condições com negligência por parte dos administradores municipais.

Uma apuração visa a garantia da regularidade, efetividade e eficácia dos serviços de saúde, a outra, é relativa à averiguação de eventual omissão de administradores que tenha colaborado para aquele quadro de péssimas condições de infraestrutura e do serviço de saúde.

É oportuno anotar que se afigura extremamente comum que, em determinada investigação, verifique-se a existência de mais de um interesse afeto a mais de uma área de atuação do Ministério Público. Isso decorre da própria complexidade dos interesses coletivos, cujo dinamismo faz com que nem sempre se acomodem, de forma singela, aos critérios normativos previamente estabelecidos de repartição das atribuições dos órgãos ministeriais.

Não obstante o suscitado tenha trazido à colação precedente da Procuradoria-Geral de Justiça, no sentido de que nada impediria a análise de eventual improbidade administrativa pelo membro do Ministério Público com atribuição da esfera da Saúde Pública (PT 137.133/08), referida orientação foi revista.

Nos moldes do posicionamento atual, avaliar se há improbidade administrativa ou não é mister específico do Promotor de Justiça titular de atribuições referentes à tutela do patrimônio público.

Nesse sentido: PT. ns. 21.783/2017, 85.212/15, 52.478/15, 17.274/15 e 184.188/14.

Uma vez solicitada investigação de improbidade administrativa e promoção da respectiva ação civil pública de responsabilização, deve o membro do Ministério Público de atribuição de tutela do patrimônio público, emitir análise conclusiva positiva ou negativa acerca da imputação específica, sem prejuízo da provocação de outro, dotado de atribuição diversa, para exame de questão subjacente, paralela ou emergente.

Resolve-se o conflito, portanto, reconhecendo-se a atribuição da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público Social a atribuição para proferir juízo de valor acerca da imputação da prática de improbidade administrativa contida na representação.

3.   Decisão

Face ao exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115, da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitado, 14º Promotor de Justiça de Santos, a atribuição para oficiar nos autos.

Publique-se a ementa. Comuniquem-se os interessados. Cumpra-se, providenciando-se o encaminhamento dos autos. Remeta-se cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

 

São Paulo, 24 de maio de 2017.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

 

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