Conflito
de Atribuições – Cível
Protocolado
MP nº 72.944/17
PJPP-CAP nº
43.0695.0000507/2017 (Representação)
Suscitante: 7º Promotor
de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital
Suscitado: 6º Promotor
de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital
Ementa:
1. Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 7º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital. Suscitado: 6º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital.
2. Representação voltada a apurar improbidade administrativa consistente em direcionamento de procedimento licitatório para favorecer empresa determinada.
3. Inquérito civil precedente e arquivado, envolvendo o mesmo tipo de fraude e a mesma empresa beneficiada, no bojo do qual foi expedida recomendação voltada a sanar irregularidades nos editais dos certames.
4. Declínio de atribuição do órgão de execução que expediu a recomendação, sob o argumento de inexistência de conexão entre os objetos.
5. Aparente descumprimento da recomendação, instrumento de atuação extrajudicial do Ministério Público, regido pelo princípio da máxima utilidade e efetividade, bem como pelo princípio da moralidade, eficiência e legalidade, ensejando apuração nos autos do inquérito civil em que expedida, impondo ao órgão do Ministério Público prevento a adoção das medidas cabíveis à obtenção do resultado pretendido (arts. 8º e 11 da Resolução nº 164, do Conselho Nacional do Ministério Público, de 28 de março de 2017).
6. Se a investigação precedente merece ser desarquivada ante a nova representação ou se essa deve ensejar a instauração de procedimento autônomo, ante a ausência de conexão ou descumprimento da recomendação expedida, não consulta ao interesse público que se desafie a prevenção – que, de certo modo, decorre do princípio do promotor natural – nem a eficiência que a visão macroscópica, concentrada e uniforme produz tanto no aspecto da instrução quanto no atinente à formação da convicção.
7. Diante
do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o,
declarando caber ao 6º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da
Capital prosseguir na investigação, em seus ulteriores termos.
Vistos.
Trata-se de conflito negativo
de atribuições, figurando como suscitante o DD. 7º Promotor de Justiça do Patrimônio Público
e Social da Capital e como suscitado o DD. 6º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital.
Conforme se depreende dos autos, foi ofertada representação envolvendo possíveis irregularidades no Pregão nº 02/2017, promovido pela Fundação Zerbini, tendo por objeto a contratação de empresa especializada na prestação de serviço de estacionamento, administração e operação de garagem no Instituto do Coração de São Paulo. Segundo a representante, teria ocorrido direcionamento no processo licitatório em favor da empresa Hora Park, sagrada vencedora no referido certame. As irregularidades envolvendo a Fundação Zerbini e a empresa Hora Park já teriam sido constatadas anteriormente, por ocasião do Pregão nº 12/2015, que foi objeto de representação junto ao Ministério Público, dando ensejo à instauração do inquérito civil nº 504/2016, no qual foi expedida recomendação (fls. 03/12).
Ante a menção ao Inquérito Civil nº 504/2016 (IC nº 14.0695.0000504/2016-9), a representação foi encaminhada ao 6º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social, que afirmou inexistir conexão entre os objetos, posto que a representação envolveria procedimento licitatório diverso (fls. 02).
Determinada a livre distribuição, o expediente foi encaminhado ao 8º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital, que determinou a juntada de cópia da portaria e da recomendação expedidas no inquérito civil nº 504/2016 (fls. 119 e 121/137).
Na sequencia, o 8º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital suscitou conflito negativo de atribuições, sustentando que não obstante as irregularidades narradas na representação que deu origem ao inquérito civil nº 504/2016 não sejam idênticas àquelas objeto da presente representação, ambos os certames possuem a mesma licitante e o mesmo objeto. Além disso, em ambos a empresa Hora Park teria sido favorecida, havendo “indícios veementes de que, justamente por conta da recomendação, novo subterfúgio teria sido engendrado pela contratante com o intuito de favorecer a empresa declarada vencedora”. Além disso, ainda que se considere que a recomendação teve objeto diverso ao ora noticiado, ou seja, que tenha se restringido aos editais de licitação, fato é que foi utilizada como fundamento para a promoção de arquivamento do inquérito civil nº 504/2016, não se afigurando lógico ou justo que, diante da repetição da mesma fraude (direcionamento para favorecer a mesma empresa, porém com artifício diverso), em manifesta burla à recomendação, haja declínio de atribuição pelo DD. Promotor de Justiça suscitado (fls. 139/143).
Determinou-se a juntada de cópia da decisão de arquivamento do inquérito civil nº 504/2016, na qual expressamente resta consignada a expedição de recomendação para adequação de futuros editais (fls. 50).
É o breve relato do essencial.
Fundamentação.
Concessa venia, assiste razão ao suscitante.
Tanto no inquérito civil nº 504/2016 como na presente
representação há notícia de direcionamento de procedimento licitatório em favor
da empresa Hora Park, tendo por
objeto a administração do estacionamento do INCOR, em razão de expediente
fraudulento engendrado pela Fundação
Zerbini.
Não obstante os procedimentos licitatórios sejam
diversos e não se tenha apurado fato ilícito relacionado ao Pregão nº 12/2015,
há indícios de que a recomendação expedida no inquérito civil nº 504/2016 foi
desatendida, sendo utilizado expediente fraudulento diverso, em novo
procedimento licitatório, para novamente favorecer a mesma empresa.
Há, sem dúvida alguma, unidade de qualificação
jurídica entre os fatos apurados, sendo conveniente
que a representação em análise seja apreciada pelo órgão de execução prevento, sobretudo ante o
aparente descumprimento da
recomendação expedida.
Destaque-se que a Resolução nº 164, do Conselho
Nacional do Ministério Público, de 28 de março de 2017, estabelece que a
recomendação, como instrumento de atuação extrajudicial do Ministério Público,
é regida pelo princípio da máxima utilidade e efetividade, bem como pelo
princípio da moralidade, eficiência e legalidade, prescrevendo, ainda, que seu atendimento deverá ser apurado nos
autos do inquérito civil em que for expedida:
“Art. 8º A recomendação conterá a indicação de prazo razoável para a
adoção das providências cabíveis, indicando-as de forma clara e objetiva. Parágrafo
único. O atendimento da recomendação será apurado nos autos do inquérito civil,
procedimento administrativo ou preparatório em que foi expedida”.
Além disso, em caso de desatendimento da recomendação, necessária a adoção de medidas voltadas à obtenção do resultado objetivado:
“Art. 11. Na hipótese de desatendimento à recomendação, de falta de
resposta ou de resposta considerada inconsistente, o órgão do Ministério Público adotará as medidas cabíveis à obtenção do
resultado pretendido com a expedição da recomendação”.
Não se olvide, ainda, que o Ato Normativo n. 484, de
2006, assim dispõe:
“Art. 22. As representações ou comunicações que se refiram a fatos conexos previnem a atribuição do membro do Ministério Público, devendo este promover, se for o caso, o aditamento da portaria.
(...)
Art. 105. (..)
§ 1º. O desarquivamento do inquérito civil, diante de novas provas ou para investigar fato novo relevante, poderá ocorrer no prazo máximo de 6 (seis) meses após o arquivamento. Decorrido o prazo, será instaurado novo inquérito civil, sem prejuízo das provas já colhidas. (Incluído pelo Ato (N) nº 718/2011 – CPJ, de 01/12/2011)
§ 2º. Em qualquer das situações previstas no parágrafo anterior, a atribuição será do órgão do Ministério Público que promoveu o arquivamento do inquérito civil. (Incluído pelo Ato (N) nº 718/2011 – CPJ, de 01/12/2011).
No caso de conflito entre
Promotores de Justiça dotados de idêntica atribuição, integrantes da mesma
unidade especializada, a análise conjugada dessas regras abona a subordinação
da representação ao membro do Ministério Público responsável pela expedição da
recomendação, que aparenta ter sido descumprida, sendo aconselhável a difusão
quando inconveniente ou se cuidar de fatos desconexos ou diversos.
Desse modo, a conveniência é o critério determinante para se aferir, na hipótese, se deverá ou não ocorrer eventual desarquivamento da investigação anterior, frente a notícia de fatos conexos em razão da prevenção.
Se a investigação precedente
merece ser desarquivada ante a nova representação ou se essa deve ensejar a
instauração de procedimento autônomo, ante a ausência fundamentada de
descumprimento da recomendação expedida, não consulta ao interesse público que se
desafie a prevenção – que, de certo modo, decorre do princípio do promotor
natural – nem a eficiência que a visão macroscópica, concentrada e uniforme
produz tanto no aspecto da instrução quanto no atinente à formação da
convicção.
Assim, de rigor, que a
representação seja analisada pelo suscitado.
Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, declarando caber ao 6º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital prosseguir nos autos, em seus ulteriores termos.
Publique-se. Comunique-se. Registre-se. Restituam-se os autos.
Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.
São Paulo, 03 de julho de
2017.
Gianpaolo Poggio Smanio
Procurador-Geral de Justiça
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