Conflito de Atribuições – Cível

 

 

Protocolado nº 75.236/2017

Suscitante: Promotor de Justiça do GEVID – São Miguel Paulista

Suscitado: 2º Promotor de Justiça de Itaquera

 

Ementa:

1.      Conflito negativo de atribuições. Suscitante: Promotor de Justiça do GEVID – São Miguel Paulista. Suscitado: 2º Promotor de Justiça de Itaquera.

2.      Notícia de fato relacionada à pessoa com deficiência visual, que necessita de cuidados médicos, havendo menção a possível violência doméstica.

3.      Conflito conhecido e dirimido, cabendo ao suscitado prosseguir na investigação, considerando suas atribuições na área da pessoa com deficiência e relatórios de acompanhamento que não indicam a prática de violência de gênero.

 

1)  Relatório

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o DD. Promotor de Justiça do GEVID (São Miguel Paulista) e como suscitado o 2º Promotor de Justiça de Itaquera, relativamente ao feito em epígrafe (NF nº 38.0726.0000206/2017-6).

Consta do expediente que o Centro de Referência Especializado em Assistência Social – CREAS encaminhou à 2ª Promotoria de Justiça de Itaquera relatório noticiando que a senhora C.G.N., idosa, é deficiente visual, possuidora de diabetes e estaria sendo negligenciada quanto aos necessários cuidados por seu marido. Segundo relato de C.G.N., seu marido faz uso de substâncias etílicas e a submeteria a violência física e psíquica (fls. 04/06).

O DD. 2º Promotor de Justiça de Itaquera, atentando-se somente quanto à idade de C.G.N., asseverou não possuir atribuição para atuar no feito, já que ela não é idosa e nem incapaz, determinando o encaminhamento do procedimento ao Promotor de Justiça do GEVID – São Miguel Paulista, “para as cautelas de praxe” (fls. 07).

Ao receber o expediente, o DD. Promotor do GEVID suscitou o conflito negativo de atribuições, afirmando que os elementos de convicção coligidos não apontam a prática de violência de gênero que autorize a tomada de providências no âmbito da Lei nº 11.340/06. Aduziu que “para aplicação dos dispositivos da Lei 11.340/06 há necessidade de demonstração de situação de vulnerabilidade ou hipossuficiência da vítima mulher num perspectiva de gênero, além da existência de vínculo, doméstico ou de afetividade” (fls. 14).

Afirma, ainda, que “no caso em tela, não se verifica a presença deste elemento caracterizador da violência de gênero. A vulnerabilidade da vítima, em verdade, decorre da deficiência da qual é portadora, e não do gênero feminino”.

Ao final, assevera não possuir atribuição para atuar no feito, determinando a extração de cópias e remessa à Promotoria de Justiça da Pessoa com Deficiência de Itaquera, considerando a situação de risco evidenciada (fls. 17).

Recebido o expediente, oficiou-se ao Promotor Secretário de Justiça de Itaquera, a fim de saber se foi instaurado procedimento na área afeta à pessoa com deficiência (fls. 21).

Em resposta, foi informada a instauração do procedimento NF nº 38.0726.0000206/2017, consoante relatórios acostados a fls. 28/33. Referidos relatórios mencionam que vem sendo feito acompanhamento da sra. C.G.N. pelo CRAS, apurando-se, em visitas domiciliares, que ela vem sendo bem cuidada pelo marido, que lhe ministra as doses de medicamentos necessárias e lhe assiste quanto às necessidades de higiene. Dos relatórios extrai-se que embora a interessada se queixe do marido quanto à atenção a ela dispensada, não se infere a prática de violência doméstica.

É o relato do essencial.

2) Fundamentação

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Pois bem.

No presente caso, infere-se que não obstante o suscitado tenha declinado sua atribuição para atuação no feito pelo fato da senhora C.G.N. não ser idosa ou incapaz, é certo que também possui, dentre suas atribuições, a tutela da pessoa com deficiência.

Com efeito, o ATO N. 116/2016 – PGJ, DE 04 DE AGOSTO DE 2016, estabelece ao 2ª Promotor de Justiça de Itaquera as seguintes atribuições:

II. 2º PROMOTOR DE JUSTIÇA:

a) feitos da 1ª Vara Cível de Itaquera;

b) feitos da 2ª Vara Cível de Itaquera;

c) Feitos da 3ª Vara Cível de Itaquera;

d) Feitos da 4ª Vara Cível de Itaquera;

e) feitos da 5ª Vara Cível de Itaquera;

f) processos CEJUSC fase pré-processual (matéria Cível);

g) audiências nas respectivas Varas Cíveis de atuação;

h) Idoso;

i) Pessoa com Deficiência;

j) atendimento ao público.

Tanto é que o ofício resposta enviado pela Promotoria de Justiça de Itaquera, a respeito da existência de procedimento na área da pessoa com deficiência, colacionado a fls. 28, indica a instauração da NF nº 38.0726.0000206/2017, que constitui o presente procedimento, na 2ª Promotoria de Justiça de Itaquera.

Resta evidente que houve equívoco na manifestação lançada a fls. 07, porquanto as atribuições do 2º Promotor de Justiça de Itaquera também englobam a tutela da pessoa com deficiência.

No caso específico dos autos, os elementos constantes da notícia de fato indicam que a sra. C.G.N. é pessoa com deficiência visual, necessitando de cuidados médicos adequados, não havendo elementos no sentido de que seja vítima de violência doméstica.

Destarte, à luz dos elementos especificamente colhidos nesse procedimento, pode-se concluir que o feito deve seguir sob a presidência do suscitado, evidenciando assim a necessidade de intervenção do membro do Ministério Público com atribuição na área da Pessoa com Deficiência.

3) Decisão

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitado, DD. 2º Promotor de Justiça de Itaquera (Pessoa com Deficiência), a atribuição para prosseguir nos autos.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 14 de setembro de 2017.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça