Conflito de Atribuições – Cível

 

 

Protocolado MP nº 14.0695.0000023/2017-9

Suscitante: Promotor de Justiça da 1ª Zona Eleitoral da Capital

Suscitado: 10º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital

 

 

 

Conflito negativo de atribuições. Suscitante: Promotor de Justiça da 1ª Zona Eleitoral da Capital. Suscitado: 10º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital. Inquérito civil instaurado com o objetivo de apurar eventual ato de improbidade administrativa praticado pelo Vereador Municipal Police Neto, que teria nomeado donos de empresa para ocuparem cargos de assessores em seu gabinete, como forma de pagamento dos serviços por tais pessoas prestadas, em sua campanha eleitoral. Remessa dos autos ao Promotor de Justiça da Zona Eleitoral, sob o fundamento de que caberia ao Ministério Público eleitoral apurar o uso indevido da máquina em prol de certas candidaturas. Conflito suscitado.

1.      Fatos que demandam dupla apuração. Possíveis repercussões na esfera da tutela do patrimônio público e social e na esfera eleitoral.

2.      Reconhecimento de que, no âmbito da Justiça Eleitoral, não há providências que ainda possam ser adotadas, visto que já houve a diplomação e que a jurisprudência restringe o prazo de ajuizamento da investigação judicial por abuso de poder até tal data.

3.      Reconhecimento do conflito negativo de atribuições, declarando, no atual momento, caber ao 10º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital prosseguir na investigação, em seus ulteriores termos.

 

 

Vistos.

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante o DD. Promotor de Justiça da 1ª Zona Eleitoral da Capital e como suscitado o DD. 10º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital.

Conforme se depreende dos autos, o 10º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital instaurou inquérito civil para apurar suposto ato de improbidade administrativa praticado pelo Vereador Municipal Police Neto, que teria nomeado donos de empresa para ocuparem cargos de assessores em seu gabinete (fls.02-A/03-B).

O inquérito civil fora iniciado, após o recebimento de representação anônima, que dava conta dos fatos e indicava que a nomeação ocorrera como forma de pagamento dos serviços por tais pessoas prestadas ao Vereador, dentro de sua campanha eleitoral (fls.02/66). 

Na sequência, foi ofertada manifestação relativa a declínio de atribuição em favor da Promotoria de Justiça Eleitoral da Capital, enfatizando-se que caberia ao Ministério Público Eleitoral zelar pelo processo eleitoral escorreito e uso indevido da máquina administrativa em prol de determinadas candidaturas (fls.70/71).

Sobreveio, então, manifestação do DD. Promotor de Justiça da 1ª Zona Eleitoral da Capital, suscitando conflito negativo de atribuição. Afirmou que a ação de investigação judicial eleitoral – AIJE, prevista na Lei Complementar nº 64/90, com hipótese indicadas na Lei nº 9.504/97, tem por objetivo coibir a prática de atos tendentes a afetar a igualdade de um pleito eleitoral, tais como abuso de poder econômico e de poder político, sancionando o candidato beneficiado e aqueles que contribuíram para a prática do ato, com a declaração de inelegibilidade. Afirmou, contudo, que, como é omissa a legislação quanto ao prazo de interposição desta ação, a jurisprudência se consolidou no sentido de que tal ação somente pode ser ajuizada até a data da diplomação. Concluiu, então, que, como a diplomação se aperfeiçoara no dia 16 de dezembro de 2016, não havia interesse de agir que justificasse a atuação da Justiça Eleitoral (fls.72/77).

É o breve relato do essencial.

Fundamentação.

De início, impõe-se observar que condutas possivelmente lesivas à probidade administrativa podem apresentar repercussão concomitante na esfera eleitoral, acarretando a imposição de sanções distintas contempladas pela Lei de Improbidade Administrativa e pela Lei Eleitoral.

Neste sentido, vale citar que o art. 73, § 7º, da Lei nº 9.504/97 (que estabelece normas para as eleições), expressamente prevê que as condutas vedadas aos agentes públicos eleitorais também caracterizam atos de improbidade administrativa.

Destarte, é possível que Promotores de Justiça com atribuições distintas, um para a tutela da probidade administrativa e outro para a defesa da lisura do processo eleitoral, possam e devam atuar na investigação e persecução dos mesmos fatos.

É o que se verificaria, em tese, no caso vertente.   

Conforme se depreende dos autos, o Vereador José Police Neto teria nomeado para ocupar cargos de assessores em seu gabinete sócios de empresas de marketing pessoal e jornalistas, como forma de remuneração dos serviços por tais pessoas prestados, durante a campanha eleitoral. Por oportuno, ressalte-se que José Police Neto já era Vereador e foi reeleito para novo mandato no ano de 2016.

Diante de tal quadro, infere-se que a conduta noticiada na representação deveria ensejar investigação no âmbito da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social.

Por outras palavras, os fatos comunicados ao Ministério Público poderiam representar lesão ao princípio da moralidade e até mesmo prejuízo ao erário, caso os ocupantes dos cargos comissionados não estivessem ou estejam efetivamente exercendo as suas atividades, porém apenas recebendo a remuneração como forma de pagamento pelos anteriores serviços prestados durante a campanha eleitoral.

Por conseguinte, não há dúvidas de que a Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social tem atribuição para investigar e atuar no presente caso.

Por outro lado, a conduta acima referida igualmente poderia representar uso indevido, desvio ou abuso do poder de autoridade, no curso do processo eleitoral, nos termos do art. 22 da Lei Complementar nº 64/90 (Lei de Inexigibilidade), o que recomendaria melhor apuração por parte do Promotor de Justiça designado para a função eleitoral.

Entretanto, a ação de investigação judicial eleitoral somente poderia ser ajuizada até a data da diplomação, conforme jurisprudência pacífica do Tribunal Superior Eleitoral. Eis precedente de relevo neste sentido:

“[...] Recurso em mandado de segurança. Ação de investigação judicial eleitoral. Prazo. Propositura. Diplomação. [...] 1. De acordo com a jurisprudência deste Tribunal Superior Eleitoral, as ações de investigação judicial eleitoral (AIJE) fundamentadas em abuso de poder e condutas vedadas a agentes públicos podem ser propostas até a data da diplomação [...] 2. Esse entendimento já era pacífico durante as Eleições 2008 e, com a inclusão do § 12 ao art. 73 da Lei nº 9.504/1997 (redação dada pela Lei nº 12.034/2009), não se confirma a suposta violação ao princípio da anterioridade da Lei Eleitoral (art. 16, da Constituição Federal de 1988). [...]”

(Ac. de 29.4.2014 no AgR-RMS nº 5390, rel. Min. João Otávio de Noronha, grifos nossos)

Sendo assim, conclui-se que, como a diplomação dos candidatos eleitos no ano de 2016 já se verificou, não há providências a serem adotadas no âmbito da Justiça Eleitoral.

Assim, de rigor, que agora a investigação prossiga sob a presidência do suscitado.

Conclusão

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, declarando caber ao 10º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital prosseguir na investigação, em seus ulteriores termos.

Publique-se. Comunique-se. Registre-se. Restituam-se os autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 08 de agosto de 2017.

 

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

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