Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado nº 78.928/2014

Suscitante: 4º Promotor de Justiça de Sorocaba (Direitos Humanos)

Suscitado: 3º Promotor de Justiça de Sorocaba (Feitos da 2ª Vara da Família e Sucessões)

 

 

Ementa:

1)   Conflito negativo de atribuições. 4º Promotor de Justiça de Sorocaba (Direitos Humanos – suscitante) e 3º Promotor de Justiça de Sorocaba (Feitos da 2ª Vara da Família e Sucessões - suscitado).

2)   Ação de interdição, com pedido de medida liminar de internação, movida perante a 2ª Vara da Família e Sucessões de Sorocaba.

3)   Ato de divisão de serviços que é expresso quanto à atribuição. Demanda proposta por terceiro que, em tese, relaciona-se à matéria afeta à Vara de Família e Sucessões, cabendo ao Ministério Público oficiar na condição de custos legis. Atribuição para atuar na defesa da Saúde Pública que não se confunde com a atribuição para atuar em processos cíveis em geral.

4)   Conflito conhecido e dirimido, cabendo ao suscitado prosseguir no feito.

Vistos.

 

1) Relatório

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante a DD. 4º Promotor de Justiça de Sorocaba, com atribuições para a defesa dos Direitos Humanos, e como suscitado o DD. 3º Promotor de Justiça de Sorocaba, com atribuições para atuar nos feitos da 2ª Vara da Família e Sucessões.

O conflito restou configurado nos autos da ação de interdição que tramita perante o R. Juízo mencionado, movida por G. V. em face de V. V., G. V., A. I. V., Secretaria de Estado da Saúde e Prefeitura Municipal de Sorocaba.

O suscitado, DD. 3º Promotor de Justiça de Sorocaba, que tem atribuições para atuar nos feitos da 2ª Vara da Família e Sucessões, requereu a remessa dos autos à Promotoria de Justiça dos Direitos Humanos, pois “foi firmado termo de ajustamento de conduta entre o Ministério Público Estadual, através da Promotoria de Direitos Humanos, Ministério Público Federal, o Estado de São Paulo e os Municípios da região de Sorocaba, visando a desinstitucionalização dos pacientes internados nos hospitais psiquiátricos, a questão envolve Saúde Pública”.

O suscitante, DD. 4º Promotor de Justiça de Sorocaba, salienta que “no caso em tela, temos dois direitos individuais homogêneos indisponíveis: estado da pessoa e internação psiquiátrica. Parece evidente, porém, que a interdição, por dizer respeito ao estado da pessoa e ter caráter permanente, é mais abrangente do que a internação, cujo caráter é acessório e necessariamente transitório (Lei 10.216/01, art. 4º, § 3º).

Ademais, não há como negar que a indisponibilidade da capacidade da pessoa tem uma relevância muito maior do que a da internação, em razão do caráter menos drástico e necessariamente transitório desta última” – destaques no original.

Acrescentou o suscitante que, na hipótese de se entender que os interesses são de abrangência e relevância idênticas, aplica-se ao caso a regra da prevenção.

É o relato do essencial.

2) Fundamentação

É possível afirmar que o conflito negativo de atribuições está configurado, devendo ser conhecido.

Como anota a doutrina especializada, configura-se o conflito negativo de atribuições quando “dois ou mais órgãos de execução do Ministério Público entendem não possuir atribuição para a prática de determinado ato”, indicando-se reciprocamente, um e outro, como sendo aquele que deverá atuar (cf. Emerson Garcia, Ministério Público, 2. ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196).

Como se sabe, no processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador estabelece critérios para a repartição do serviço.

Nesse sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 23. ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e competência, 11. ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.

Esta ideia, aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de competência (objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por Adolf Wach, e sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t. I, trad. esp. de Jose Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922, p. 621 e ss; e em suas Instituições de direito processual civil, 2º vol., trad. port. de J. Guimarães Menegale, São Paulo, Saraiva, 1965, p. 153 e ss), bem como por Piero Calamandrei (Instituciones de derecho procesal civil, v. II, trad. esp. Santiago Sentís Melendo, Buenos Aires, EJEA, 1973, p. 95 e ss), entre outros clássicos doutrinadores.

Ora, se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada demanda a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão ministerial com atribuições para certo caso também não parta da hipótese concretamente considerada, ou seja, de seu objeto.

Tratando-se de ação de interdição, em que o pedido de internação é secundário, e tramitando o feito na 2ª Vara de Família e Sucessões, assiste razão ao suscitante.

Trata-se de típica ação de competência do Juízo da Vara de Família e Sucessões e o Ato 139/2013 – PGJ, de 07 de Novembro de 2013, que fixou a divisão de serviços na Promotoria de Justiça de Sorocaba, relativamente aos órgãos de execução em conflito, estabelece que cabe ao suscitado manifestar-se nos feitos que aí tramitam.

Encontra-se objetivamente estabelecido no mencionado ato normativo, portanto, que o suscitado tem atribuição para atuar no feito.

Ademais, trata-se de demanda proposta por terceiro, que, em tese, se relaciona à matéria afeta à Vara de Família e Sucessões, cabendo ao Ministério Público oficiar na condição de custos legis.

Pode-se argumentar, ainda, no sentido de que a atribuição para atuar na defesa da Saúde Pública não se confunde com a atribuição para atuar em processos cíveis em geral, ainda que a causa de pedir tenha relação com a saúde pública.

Esse contexto sinaliza para a atuação do suscitado.

3) Decisão                         

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitado, DD. 3º Promotor de Justiça de Sorocaba, oficiar nestes autos.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando a restituição dos autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 10 de junho de 2014.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

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