Conflito de Atribuições – Cível

 

Protocolado nº 88.344/2018

Suscitante: 6ª Promotora de Justiça de Itu (Patrimônio Público)

Suscitada: Promotora de Justiça de Direitos Humanos da Capital (Saúde Pública)

 

 

Ementa:

1.      Conflito negativo de atribuições. Suscitante: 6ª Promotora de Justiça de Itu (Patrimônio Público). Suscitada: Promotora de Justiça de Direitos Humanos da Capital (Saúde Pública).

2.      Os elementos colhidos até o momento indicam a prática de supostos atos de improbidade administrativa além de outras possíveis irregularidades na gestão hospitalar, ambos circunscritos ao Município de Itu. Atribuição da Promotoria de Justiça de Itu.

3.      Sobreposição de atribuições dada existência de notícia de suposta prática de ato de improbidade administrativa e de possíveis irregularidades relativas à proteção da saúde pública.

4.      Relatividade da diretriz de reunião de feitos em decorrência da conexão. Possibilidade de desmembramento, por conveniência da investigação, prosseguindo em cada inquérito civil a apuração de fatos diversos.

5.      A eficiência da atuação ministerial também pode estar relacionada à atuação de órgãos especializados, para análise profunda dos diversos aspectos investigados.

6.      É justificável, portanto, o trato especializado e separado entre duas Promotorias de Justiça cujas missões são distintamente específicas, à vista da diversidade de bens jurídicos tutelados.

7.      Conflito conhecido e dirimido, determinando-se o desmembramento do feito, mediante extração de cópia de inteiro teor, e restituição do original à Suscitante, 6ª Promotora de Justiça de Itu (Patrimônio Público), e remessa das cópias ao 2º Promotor de Justiça de Itu (Saúde Pública), para as providências cabíveis, no âmbito de suas respectivas atribuições.

 

1)  Relatório.

Trata-se de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante a DD. 6ª Promotora de Justiça de Itu, com atribuição para atuar no Patrimônio Público, e como suscitada a DD. Promotora de Justiça de Sorocaba, da Saúde Pública.

Cuida-se de representação anônima noticiando eventuais irregularidades no Hospital Dr. Francisco Ribeiro Arantes e no Centro de Desenvolvimento a Portador de Deficiência Mental, localizados no Município de Itu, distribuídos inicialmente à Promotoria de Justiça do Patrimônio Público de Itu, que remeteu o expediente à Promotoria de Justiça da Saúde Pública da Capital para as providências cabíveis (fl. 07).

A Promotora de Justiça da Saúde Pública da Capital restituiu os autos à 6ª Promotora de Justiça de Itu, sob o fundamento de que “os fatos noticiados dão conta de irregularidades na administração das unidades mencionadas, tais como duplicidades de cargos, excesso de profissionais contratados, manipulação de dados e confluência de atividades públicas e privadas, irregularidades estas que, em tese, configurariam atos de improbidade administrativa, nos termos da Lei nº 8.429/92” (fl. 04). Destacou ainda que caso “se entenda que a denúncia em comento deve ser processada em uma das Promotorias de Saúde, uma vez que as unidades apontadas estão localizadas no Município de Itu, afetando diretamente à população da cidade, deve a representação ter prosseguimento na Promotoria de Justiça de Itu.” (fl. 05).

A 6ª Promotora de Justiça de Itu suscitou o conflito de atribuições (fl. 21/23) alegando, em síntese, que ambos os hospitais, embora sediados no Município de Itu, atenderiam pacientes de toda a unidade federativa e estariam sob a responsabilidade da Fazenda Pública do Estado, com gestão descentralizada, mas vinculada à Secretaria Estadual de Saúde, de forma eventual irregularidade afetaria interesse de âmbito regional e não local. Destacou que embora a representação afirme a ocorrência de ato de improbidade administrativa, “as denúncias mais se amoldam a possíveis irregularidades meramente de gestão, de adequação do regime de atendimento, situação que ultrapassa, ao menos neste primeiro momento, a análise de eventuais danos ao erário, ou que caracterize, de pronto, condutas ímprobas de algum envolvido. (...) Com este convencimento, por não vislumbrar, ao menos por ora, qualquer indício mais robusto de atos de improbidade administrativa (senão depois da preliminar apuração de irregularidades próprias da administração/gestão) e, ainda que assim o fosse, por se tratar de patrimônio certo do Estado, cuja responsabilidade direta é da Secretaria Estadual da Saúde (dever de fiscalização, repasse e prestação de contas).

A suscitante postulou ainda que, caso reconhecida a atribuição da Promotoria de Justiça de Itu, seja a representação encaminhada à Promotoria de Justiça com atribuição na área da Saúde Pública.

É o relato do essencial.

2) Fundamentação.

O conflito negativo de atribuições está configurado e, pois, comporta conhecimento.

A representação anônima encaminhada ao Ministério Público narra, em síntese: 1 - suposta prática de ato de improbidade administrativa, favorecimento e desvio de recursos públicos, nos Hospitais Dr. Francisco Ribeiro Arantes (Pirapitingui) e CEDEME – Centro de Desenvolvimento ao Portador de Deficiência Mental, localizados no Município de Itu. 2 - que o Dr. Ivo Augusto Gagliard não cumpriria sua carga horária nas referidas unidades de saúde, cumulando outro cargo de médico na Prefeitura de Sorocaba, sendo certo que o acerto de frequência seria realizado pelo Diretor de Recursos Humanos; 3 - eventual ociosidade no quadro de 53 médicos e 15 enfermeiros, além de plantões extras e remunerados, pois tais profissionais ficariam no conforto, conversando, assistindo TV ou dormindo; 4 – casos de hanseníase na colônia, em razão de falta de cuidados; 5 – falta de conhecimento técnico e poder de decisão do Diretor Médico Cassiano Cesar Saviolo, gerando mais ociosidade no Hospital; 6 – inexistência de intercâmbio no atendimento de médicos do CEDEME e HFRA; 7 – manipulação de dados da Comissão de Infecção Hospitalar do CEDEME; 8 – não funcionamento efetivo das Comissões de Prontuário, Óbitos e Segurança do Paciente; 9 – não reversão ao paciente de verba do Contrato Programa (R$ 55 mil reais), aplicada para reforma do campo de futebol ou implementação de anfiteatro, e não para melhoria da área externa possibilitando que pacientes tenham contato com sol; 10 – compras e gastos indevidos, pois 10 camas hospitalares e vários carrinhos de medicação de inox foram adquiridos nunca foram utilizadas; 11 – parte da área hospitalar estaria sendo arrendada pela Caixa Beneficente para uso de terceiros;  12 – a Caixa Beneficente, com rendimento de mais de R$ 120 mil por mês, não reverteria o valor em benfeitorias aos pacientes.

Pois bem.

Da análise atenta da representação percebe-se que a investigação civil deverá ser cindida, pois se constata a coexistência de notícia: (i) de suposta prática de atos de improbidade administrativa e lesivos ao erário (itens 1, 2, 9, 10, 11 e 12), de atribuição da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público; (ii) bem como outras irregularidades administrativas nas unidades hospitalares, não inseridas, a priori, na Lei n. 8.429/92 (itens 3, 4, 5, 6, 7 e 8), de atribuição de Promotoria de Justiça com atribuição na área da Saúde Pública.

Não obstante a Promotora de Justiça Suscitante tenha afirmado que, apenas em um segundo momento, casos “ultrapassadas apurações de irregularidades internas, se poderia deduzir possível dano patrimonial, enriquecimento ilícito dos envolvidos ou condutas que tenham, dolosamente, ferido princípios gerais da administração pública”, percebe-se que a representação é enfática ao imputar a prática de atos de improbidade administrativa, não cumprimento de carga horária, alteração de ponto, acumulação irregular de cargos públicos, desvio na aplicação de verbas públicas e prejuízo ao erário em razão da compra e não utilização de equipamentos hospitalares.

A identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada demanda, a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, a identificação do órgão ministerial com atribuições para certa investigação também deve partir de elementos do caso concreto, ou seja, seu objeto.

Pode-se, deste modo, afirmar que a definição do membro do parquet a quem incumbe a atribuição para conduzir determinada investigação na esfera cível, que poderá culminar com a propositura de ação civil pública, deve levar em consideração os dados do caso concreto investigado.

Pois bem, parte da investigação está relacionado com a suposta prática de atos de improbidade administrativa no Hospital Dr. Francisco Ribeiro Arantes e no Centro de Desenvolvimento a Portador de Deficiência Mental, sendo certo que os parcos elementos até agora amealhados restringem os fatos ao Município de Itu.

 Cumpre lembrar que a Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/92) não tem disposição específica sobre competência, ao contrário do que ocorre com a Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85) e com o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90), que, em seus arts. 2º e 93, respectivamente, disciplinam a matéria.

De toda forma, ao se considerar que a ação de improbidade administrativa pertence ao minissistema processual coletivo, de rigor aplicar-se a regra do art. 2º da Lei nº 7.347/85 também às ações ajuizadas com suporte na Lei nº 8.429/92, visto que a ação de improbidade pode ser considerada uma ação coletiva.

 Nesse sentido, assentou o STJ que “não há na Lei 8.429/92 regramento específico acerca da competência territorial para processar e julgar as ações de improbidade. Diante de tal omissão, tem-se aplicado, por analogia, o art. 2º da Lei 7.347/85, ante a relação de mútua complementariedade entre os feitos exercitáveis em âmbito coletivo, autorizando-se que a norma de integração seja obtida no âmbito do microssistema processual da tutela coletiva” (CC 97351/SP, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/05/2009, DJe 10/06/2009).

Colhe-se, com segurança, que, em sede de improbidade administrativa a competência a ser considerada é aquela onde foi perpetrada a conduta que ofendeu a higidez pública.

Em suma, considerando que os elementos de convicção até aqui carreados aos autos revelam que os fatos ocorreram em Itu, sem notícia de envolvimento de outras autoridades estaduais, bem como que a atribuição é definida pelo local do dano, a apuração dos supostos atos de improbidade administrativa deve prosseguir na Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social de Itu.

Cumpre enfrentar a atribuição para a investigação das demais irregularidades apontadas na representação e que não configuram, em princípio, atos de improbidade administrativa.

Há na representação a indicação de fatos específicos e próprios atrelados à possíveis irregularidades relacionadas diretamente com a gestão administrativa dos hospitais, como a ociosidade dos profissionais; casos de hanseníase; não funcionamento adequado de comissões, dentre outras.

Cuidam-se de questões relacionadas com a prestação adequada e eficiente de serviços de saúde e que, portanto, estão inseridas nas atribuições da Promotoria de Justiça de Saúde Pública.

Quanto à Promotoria de Justiça da Saúde Pública assim prevê o artigo 440 do Manual de Atuação Funcional:

Art. 440. Zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nas Constituições Federal e Estadual e nas demais normas pertinentes, que disciplinam a promoção, defesa e recuperação da saúde, individual ou coletiva, promovendo as medidas necessárias à sua garantia, cuidando em especial de: (...)

O artigo 295, XVII, da LOEMP dispõe:

Art. 295

(...)

XVII - Promotor de Justiça de Saúde Pública: tutela dos interesses e direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos e a fiscalização e acompanhamento de políticas públicas voltadas à implementação do direito à saúde.

Anote-se, por outro lado, que todas as supostas irregularidades narradas pelo representante estão relacionadas a fatos verificados nas próprias unidades hospitalares, localizadas no Município de Itu, sem qualquer indício, até o momento, de outras irregularidades que possam envolver diretamente a própria Secretaria de Estado da Saúde ou que exijam atuação equânime em todo o Estado.

Por esta razão a apuração quanto aos demais fatos que não configuram ato de improbidade administrativa deverão ter seguimento perante a Promotoria de Justiça da Saúde Pública de Itu.

Registre-se, por oportuno, ser plenamente possível o reconhecimento da atribuição de terceiro órgão de execução, diverso daqueles que constem no conflito como suscitante e suscitado, valendo citar a respeito a lição sempre oportuna de Emerson Garcia:

“Inexiste qualquer óbice a que o Procurador-Geral de Justiça, ao apreciar o conflito de atribuições, termine por reconhecer a atribuição de um terceiro órgão, distinto daqueles que figurem como suscitante e suscitado. Assim ocorre por derivar a atribuição diretamente da lei, por ter o Procurador-Geral de Justiça aptidão para declará-la e, acima de tudo, pelo fato de o conflito de atribuições não guardar similitude com uma relação processual convencional, em que os seus limites subjetivos, ressalvada a hipótese de substituição processual, se superpõe às partes no processo”. (Emerson Garcia, Ministério Público, 3ªed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2008, p.196).

 Desse modo impõe-se o desmembramento da presente investigação civil, para afetar a DD. 6ª Promotor de Justiça de Itu, ora Suscitante, a atribuição para prosseguir na apuração relativa à suposta prática de atos de improbidade administrativa, e a DD. Promotoria de Justiça da Saúde Pública de Itu a apuração das supostas irregularidades atreladas à defesa da Saúde Pública.

No caso em análise, é fácil observar que há sobreposição de atribuições, tendo em vista a presença de vários interesses transindividuais.

A Lei Complementar nº 734/93, em seu artigo 295, enumera uma série de atribuições aos Promotores de Justiça, em diversas áreas. Aliás, esta múltipla legitimação do Ministério Público, que é fator de engrandecimento institucional, pode resultar, sim, na constatação de mais de um interesse afeto a mais de uma área de atuação do parquet.

Isso decorre da própria complexidade dos interesses coletivos, cujo dinamismo faz com que nem sempre se acomodem, de forma singela, aos critérios normativos, previamente estabelecidos, de repartição das atribuições dos órgãos ministeriais.

Posto isso, e havendo sobreposição de atribuições dos dois órgãos, dada a existência de suposta prática de ato de improbidade administrativa e risco à saúde pública, é o caso de atuação do Ministério Público por mais de um órgão.

Especialmente pelo fato de que não se vislumbra risco de atuação conflitante, nem de providências colidentes.

É justificável, em certas circunstâncias, portanto, o trato especializado e separado entre duas Promotorias de Justiça cujas missões são distintamente específicas, à vista da diversidade de bens jurídicos tutelados.

É relativa a diretriz de reunião de feitos em decorrência da conexão. Há possibilidade de desmembramento, por conveniência da investigação, prosseguindo em cada inquérito civil a apuração de fatos diversos.

Não há como negar que a eficiência da atuação ministerial também pode estar relacionada à atuação de órgãos especializados, para análise profunda dos diversos aspectos investigados.

Nos termos do art. 26, § 5º, da Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei nº 8625/93 “toda representação ou petição formulada ao Ministério Público será distribuída entre os membros da instituição que tenham atribuições para apreciá-la, observados os critérios fixados pelo Colégio de Procuradores”, regra esta reproduzida pelo art. 103, § 3º, da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público.

Essa lógica deve ser observada tanto nos casos em que os órgãos de execução recebem representações encaminhadas por terceiros, como naqueles em que, agindo de ofício, adotam providências iniciais que precedem a instauração formal de inquérito civil; ou ainda, finalmente, quando determinam a extração de cópias de certo inquérito, dada a notícia de fatos novos que não eram objeto, ainda, de perquirição.

Pensamento diverso criaria risco de se tangenciar a regra que colima a impessoalidade na atuação do Ministério Público, legitimando a conclusão de que, em Promotorias com vários cargos com idênticas atribuições, aquele que se antecipasse aos demais, requisitando informações ou mesmo instaurando procedimento investigatório quanto a certo caso concreto, estaria sempre prevento.

Essa interpretação não seria legítima, na medida em que a prevenção é um mecanismo para solucionar dúvidas quanto à competência de órgão jurisdicional ou atribuições de órgãos ministeriais, mas não para burlar o esquema legal, previamente estabelecido, de repartição da atividade funcional dos órgãos envolvidos.

Não fosse assim, adite-se, a regra da prevenção – de extração infraconstitucional – seria utilizada para burlar a própria garantia da inamovibilidade (corretamente compreendida, abrangente das funções do cargo), que, em última análise, tem assento na Constituição da República.

O Ato Normativo nº 484-CPJ, de 5 de outubro de 2006, por sua vez, ao regular as investigações civis do Ministério Público, prevê no art. 7º, inciso X, como regra geral, a necessidade de que a atividade de investigação civil seja norteada pelos princípios gerais da atividade administrativa, observando ainda a necessidade de distribuição de feitos entre os órgãos ministeriais dotados de atribuição fixada, previamente, por critérios objetivos.

De outro lado, a Resolução nº 23, de 17 de setembro de 2007, do C. Conselho Nacional do Ministério Público, ao fixar diretrizes para a investigação civil, estipulou, em seu art. 4º, parágrafo único, que fatos novos devem render ensejo a nova distribuição. Confira-se:

“(...)

Art. 4º. (...)

Parágrafo único. Se, no curso do inquérito civil, novos fatos indicarem necessidade de investigação de objeto diverso do que estiver sendo investigado, o membro do Ministério Público poderá aditar a portaria inicial ou determinar a extração de peças para instauração de outro inquérito civil, respeitadas as normas incidentes quanto à divisão de atribuições.

(...)”

A norma do parágrafo único, para atender ao princípio do promotor natural, deve ser compreendida teleológica e sistematicamente.

Se há um único órgão com atribuição na matéria (o que normalmente ocorre em Promotorias cumulativas) é viável o simples aditamento da portaria inaugural, para ampliar o objeto da investigação.

Entretanto, se há vários órgãos com atribuição, em tese, para a investigação de outros fatos (o que se verifica nas Promotorias especializadas) deverá ser obedecida a regra da prévia distribuição.

Resta ainda dizer que nem mesmo a prevenção decorrente da conexão é critério absoluto, de sorte a abalar a necessidade de respeito à distribuição.

Como se sabe, a reunião de feitos em razão da prevenção, decorrente da conexão ou continência, tem como razão de ser a economia processual, com o aproveitamento da prova, a maior probabilidade de acerto na solução final, e para evitar-se conflitos lógicos entre decisões.

Guardadas as devidas adaptações, essas ideias são aplicáveis também às hipóteses de reunião de inquéritos civis por prevenção decorrente de conexão ou continência, que tem por objetivo otimizar a investigação e, num segundo momento, evitar soluções logicamente conflitantes nas eventuais ações civis públicas.

Pode-se mesmo afirmar, sem temor, que a conveniência é critério determinante para aferir se, em determinada hipótese, deverá ou não ocorrer a reunião de feitos conexos em razão da prevenção.

É bem verdade que boa parte da doutrina reconhece na regra que prevê a reunião de feitos em razão da conexão ou continência uma imposição, e não uma faculdade (Nesse sentido, v.g., Celso Agrícola Barbi, Comentários ao CPC, vol. I, 11ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2002, p. 350, em comentários ao art. 105 do CPC; bem como Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, Código de processo civil comentado, 10ª ed., São Paulo, RT, 2008, p. 362, nota n. 7 ao art. 105 do CPC).

Mas, com o devido respeito, essa posição não pode ser aplicada em termos absolutos. A interpretação das regras processuais e procedimentais não pode perder de vista seus fins. Se a aplicação de uma norma determinada leva a resultado diverso daquele que inspirou sua edição, deve ser mitigada sua incidência.

Assim, é possível afirmar, por identidade de razões, que se a reunião de procedimentos investigatórios ou de ações conexas levará à inviabilidade do proveito prático desejado, dever-se-á evitar a junção de feitos.

Feitos estes esclarecimentos, os autos deverão ser restituídos à 6ª Promotoria de Justiça de Itu, para a devida deliberação quanto à suposta prática de atos de improbidade administrativa, bem como cópia do presente deverá ser encaminhada à Promotoria de Justiça de Saúde Pública, para a deliberação quanto às questões relacionadas à Saúde Pública.

 

3) Decisão

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber tanto à suscitante, DD. 6ª Promotora de Justiça de Itu, quanto ao DD. 2º Promotor de Justiça de Itu, a atribuição para oficiar no procedimento investigatório, no âmbito de suas respectivas atribuições.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a remessa dos autos originais ao Suscitante, de cópia de inteiro teor, inclusive da presente decisão, ao 2º Promotor de Justiça de Itu e à Suscitada.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

São Paulo, 24 de outubro de 2018.

 

Gianpaolo Poggio Smanio

Procurador-Geral de Justiça

 

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