Conflito de Atribuições – Cível

Protocolado nº 0094568/15 (nº MP 43.0189.0000606/2015-6)

Suscitante: 3º Promotora de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital

Suscitado: 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital

 

 

Ementa:

1)      Conflito negativo de atribuições. 3º Promotora de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital (suscitante). 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital (suscitado).

2)      Danos provocados por excesso de carga em veículos de transporte nas rodovias estaduais. Prevalência dos aspectos relacionados à atuação da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital, haja vista que o dano atinge predominantemente o erário público.

3)      Conflito conhecido e dirimido, cabendo ao suscitado prosseguir na investigação.

 

1.   RELATÓRIO

Tratam estes autos de conflito negativo de atribuições, figurando como suscitante a DD. 3º Promotora de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital e como suscitado o 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital.

O conflito foi suscitado no bojo do procedimento nº MP 43.0189.0000606/2015-6, que tem por objetivo a apuração de irregularidade no trânsito de caminhões com excesso de peso, em razão de ser uma das principais do péssimo estado de conservação da malha viária, trazendo consequentemente dano ao erário público.

O procedimento teve início após o encaminhamento de representação do Ministério Público Federal (Procuradoria da República de Campinas) à Promotoria de Justiça de Amparo, sede de uma das empresas com alta incidência em autuações por excesso de peso, que, por sua vez, entendendo tratar de dano que foge ao âmbito local, encaminhou a representação à Promotoria de Justiça do Patrimônio Público da Capital, nos termos do art. 93 do Código de Defesa do Consumidor.

O 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital (suscitado), entendendo que o dano seria por afronta ao Urbanismo, por importar em influência nas condições das vias públicas, em prejuízo à circulação de veículos, encaminhou a representação a Promotoria de Justiça da Habitação e Urbanismo da Capital.

Ocorre, porém, que a 2º Promotora de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital suscitou conflito negativo de atribuições, pontuando, em síntese, que seria atribuição da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social, pois eventual dano atinge primordialmente o erário público, na medida em que o excesso de peso em veículos de carga prejudica o asfalto das rodovias, exigindo manutenções frequentes e gastos não previstos (fls. 27/29)

É o relato do essencial.

2.   FUNDAMENTAÇÃO

Está configurado, no caso, o conflito de atribuições.

Isso decorre do posicionamento de diversos órgãos de execução do Ministério Público, quando “(a) dois ou mais deles manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusões às de outro membro (conflito positivo); (b) ao menos um membro negue a própria atribuição funcional e a atribua a outro membro, que já a tenha recusado (conflito negativo)” (cf. Hugo Nigro Mazzilli, Regime Jurídico do Ministério Público, 6ª ed., São Paulo, Saraiva, 2007, p. 486/487).

No mesmo sentido Emerson Garcia, Ministério Público, 2ª ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 196/197.

Como se sabe, no processo jurisdicional a identificação do órgão judicial competente é extraída dos próprios elementos da ação, pois é a partir deles que o legislador estabelece critérios para a repartição do serviço.

Nesse sentido: Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, Teoria geral do processo, 23ª ed., São Paulo, Malheiros, 2007, p. 250/252; Athos Gusmão Carneiro, Jurisdição e competência, 11ª ed., São Paulo, Saraiva, 2001, p. 56; Patrícia Miranda Pizzol, A competência no processo civil, São Paulo, RT, 2003, p. 140; Daniel Amorim Assumpção Neves, Competência no processo civil, São Paulo, Método, 2005, p. 55 e ss.

Esta ideia, aliás, estava implícita no critério tríplice de determinação de competência (objetivo, funcional e territorial) intuído no direito alemão por Adolf Wach, e sustentado, na doutrina italiana, por Giuseppe Chiovenda (Princípios de derecho procesal civil, t.I, trad. esp. de Jose Casais Y Santaló, Madrid, Instituto Editorial Réus, 1922, p. 621 e ss; e em suas Instituições de direito processual civil, 2º vol., trad. port. de J. Guimarães Menegale, São Paulo, Saraiva, 1965, p. 153 e ss), bem como por Piero Calamandrei (Instituciones de derecho procesal civil, v. II, trad. esp. Santiago Sentís Melendo, Buenos Aires, EJEA, 1973, p. 95 e ss), entre outros clássicos doutrinadores.

Ora, se para a identificação do órgão judicial competente para a apreciação de determinada demanda a lei processual estabelece, a priori, critérios que partem de dados inerentes à própria causa, não há razão para que o raciocínio a desenvolver para a identificação do órgão ministerial com atribuições para certa investigação também não parta de elementos do caso concreto, ou seja, seu objeto.

Pode-se, deste modo, afirmar que a definição do membro do parquet a quem incumbe a atribuição para conduzir determinada investigação na esfera cível, que poderá, ulteriormente, culminar com a propositura de ação civil pública, deve levar em consideração os dados do caso concreto investigado.

O expediente em exame foi instaurado em função da notícia, como já referido, de danos na malha viária decorrente da circulação de veículos com excesso de peso.

Assim, com o registro de que o feito está em estágio inicial e que eventuais diligências possam provocar nova reflexão sobre o objeto da investigação e sobre à atribuição para sua condução, os elementos até aqui coligidos apontam para a prevalência das questões relacionadas à tutela do patrimônio público e social.

Os veículos da empresa Cervejaria ASHBY Ltda. circulam por inúmeras vias públicas e rodovias do Estado, com potencial risco de dano à malha viária, decorrente da alta incidência de autuação por excesso de peso.

Ainda que os veículos circulem pela área urbana e os danos possam repercutir na fluidez do trânsito e segurança viária, prepondera o aspecto relacionado ao dano ao patrimônio público, pois somente indiretamente e, obviamente, se os danos na malha viária não forem prontamente e devidamente reparados é que o fato afetará a circulação viária.

É comum e frequente que no exercício da atividade ministerial na seara dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, fatos que são objeto de investigação apresentem repercussão em mais de uma área de atuação. Nesta hipótese, há de se identificar a prevalência da especialização, que no caso em análise, como anteriormente ressaltado é da Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social, com prejuízo da atribuição da Promotoria de Justiça da Habitação e Urbanismo.

3.   DECISÃO

Diante do exposto, conheço do presente conflito negativo de atribuições e dirimo-o, com fundamento no art. 115 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público, declarando caber ao suscitado, 2º Promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital, a atribuição para oficiar no procedimento investigatório.

Publique-se a ementa. Comunique-se. Cumpra-se, providenciando-se a restituição dos autos.

Providencie-se a remessa de cópia, em via digital, ao Centro de Apoio Operacional Cível e de Tutela Coletiva.

 

  São Paulo, 21 de julho de 2015.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

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