Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Autos nº. 0033501-62.2011.8.26.0000

Requerente: Prefeito do Município de Iepê

Objeto: Lei nº 403, de 16 de fevereiro de 2011 

Ementa: Ação Direta de Inconstitucionalidade, ajuizada pelo Prefeito do Município de Iepê, da Lei nº 403, de 16 de fevereiro de 2011, do mesmo município, que obriga a Prefeitura Municipal a enviar à Câmara Municipal cópias dos requerimentos endereçados ao Poder Executivo. Caso em que o Poder Legislativo criou instrumento de controle não previsto na Constituição do Estado, violando, portanto, o princípio da separação dos poderes (art. 5º, CE). Parecer pela procedência do pedido.

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

 

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Prefeito Municipal de Iepê, tendo por objeto a Lei nº 403, de 16 de fevereiro de 2011, do mesmo município, que obriga a Prefeitura Municipal a enviar à Câmara Municipal cópias dos requerimentos endereçados ao Poder Executivo.

Sustenta o autor que a lei em questão, tendo instituído instrumento de controle do Poder Executivo pela Câmara Municipal em desacordo com o modelo constitucional, representa a violação do princípio da separação e independência dos Poderes, de que trata o art. 5º da Carta Paulista.

A Lei teve a vigência e eficácia suspensas ex nunc, atendendo-se ao pedido liminar (fls. 41/43).

O Presidente da Câmara Municipal prestou informações (fls. 57 e s.).

A Procuradoria-Geral do Estado declinou da defesa do ato impugnado, observando que o tema é de interesse exclusivamente local (fls. 54/55).

Este é o breve resumo do que consta dos autos.

A Constituição Estadual estabelece, em seu art. 5º, o princípio da separação dos poderes, nos seguintes termos:

“São poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”.

O princípio da separação dos poderes é o mecanismo jurídico que serve à organização do Estado, definindo órgãos, estabelecendo competências e marcando as relações recíprocas entre esses mesmos órgãos (Manoel Gonçalves Ferreira Filho, Do processo legislativo, São Paulo: Saraiva, p. 111/112).

Nessa sensível relação, destaca-se como relevante a missão do Poder Legislativo de controlar os atos do Poder Executivo, no propalado “sistema de freios e contrapesos”.

Esse controle, todavia, é restrito. Há de ser exercido nos estreitos lindes da previsão constitucional, sob pena de se tornar ilegítimo.

O tema é conhecido do E. Tribunal de Justiça.

O C. Órgão Especial tem firme orientação de que “o Legislativo não pode criar forma de controle interno não previsto na Constituição Estadual, em paralelo ao externo nela consagrado” (ADIN nº 172.909-0/0-00, j. 17.06.2009, rel. desig. Des. PALMA BISSON).

Consolidou jurisprudência no sentido de que:

“A Câmara, induvidosamente, detém o poder de fiscalização da atividade da Administração. Tal, contudo, deve obedecer determinados limites. Não pode extravasar sua área de atuação, nem mesmo nessa condição de ente fiscalizador, para impor obrigações aos particulares que contratam como a Administração, menos ainda, aos próprios órgãos públicos, subordinados ao Executivo (...). Importa, na hipótese, isto sim, obstar a quebra da estrutura funcional diferenciada dos órgãos do Poder permitindo a invasão de atribuição exclusiva do Executivo pelo Legislativo (art. 5º, da Constituição Estadual). Louvável a atitude do Poder Legislativo no sentido de buscar uma melhor fiscalização do exercício das atividades e da aplicação do dinheiro público no Município. Inviável, contudo, a fórmula encontrada pela Câmara Municipal, por fraturar o sistema jurídico constitucional do Estado (art. 144, da Constituição Estadual)” (ADIN nº 135.843.0/7-00, rel. Des. MARCUS ANDRADE).

No caso em análise, a lei impugnada criou um inusitado mecanismo de controle do Poder Executivo sem paralelo na Constituição Federal, determinando que cópias de todos os requerimentos endereçados ao Poder Executivo sejam encaminhados à Câmara Municipal.

Desse modo, a norma questionada representa, sem dúvida, ilegítima ingerência da Câmara nos atos de governo e nas prerrogativas do Prefeito, sendo forçoso reconhecer que é violadora do princípio da separação dos poderes.

Diante do exposto, nosso parecer é no sentido da integral procedência desta ação direta, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei nº 403, de 16 de fevereiro de 2011.

 

São Paulo, 18 de maio de 2011.

 

         Sérgio Turra Sobrane

         Subprocurador-Geral de Justiça

         Jurídico

/md