Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Processo n.º 0051767-97.2011.8.26.0000

Autor: Sindicato dos Condutores Autônomos de Veículos Rodoviários de Itapetininga

Objeto de impugnação: alíneas “d” e “e” do §2º, §3º, do art. 1º, a expressão trabalhista inserta no § 3º, do art. 2º, art.3º, §§ 2º, 7º, 8º, 9º e 10º, do art. 7º e inciso VIII, do art. 12, todos da Lei n. 5.414, de 02 de dezembro de 2010, do Itapetininga.

 

 

 

 

Ementa: Ação Direta de Inconstitucionalidade – alíneas “d” e “e” do §2º, §3º, do art. 1º, a expressão trabalhista inserta no § 3º, do art. 2º, art.3º, §§ 2º, 7º, 8º, 9º e 10º, do art. 7º e inciso VIII, do art. 12, todos da Lei n. 5.414, de 02 de dezembro de 2010, do Município de Itapetininga, que “disciplina os serviços de taxi do Município de Itapetininga e dá outras providências” – Dispositivos legais originados de emendas parlamentares. Matéria que demanda a iniciativa do Chefe do Poder Executivo, porque trata de prestação do serviço público. Afronta aos artigos 5º, 37 e 47, II, da CE, aplicáveis aos Municípios por força do artigo 144 da CE. Parecer pela procedência da ação.

 

 

  

 

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator,

Colendo Órgão Especial:

 

 

                Cuida-se de ação proposta pelo Sindicato dos Condutores Autônomos de Veículos Rodoviários de Itapetininga na qual se pretende ver declarada a inconstitucionalidade das alíneas “d” e “e” do §2º, §3º, do art. 1º, a expressão trabalhista inserta no § 3º, do art. 2º, art.3º, §§ 2º, 7º, 8º, 9º e 10º, do art. 7º e inciso VIII, do art. 12, todos da Lei n. 5.414, de 02 de dezembro de 2010, que “disciplina os serviços de taxi do Município de Itapetininga e dá outras providências”.

 

Sustenta o autor que o projeto de lei que a antecedeu partiu do Executivo, mas recebeu 03 (três) Emendas do Legislativo, que fez acrescer os dispositivos legais impugnados.   Depois de aprovados, foram vetados pelo Poder Executivo. O veto foi derrubado e, afinal, a lei foi promulgada pelo Presidente da Câmara Municipal.

         Alega, também, que a Câmara Municipal exorbitou de suas atribuições, invadindo a esfera de atuação reservada ao Poder Executivo, com afronta ao princípio da independência e harmonia dos poderes, pela supressão de iniciativa e da responsabilidade da Administração da necessidade, oportunidade, conveniência e do interesse público.

         Aponta como violados os arts. 5º, 47, inciso II e 144, da Constituição Estadual.

 

O ato normativo teve a vigência e eficácia suspensas ex nunc, atendendo-se ao pedido liminar (fls. 165/v).

O Prefeito do Município de Itapetininga ao prestar informações opinou pela procedência da ação em face da inconstitucionalidade noticiada na inicial (fls. 170/171).

O Presidente da Câmara Municipal prestou informações defendendo a constitucionalidade dos dispositivos legais questionados (fls. 112/142).

A Procuradoria-Geral do Estado declinou da defesa do ato impugnado, observando que o tema é de interesse exclusivamente local (fls. 254/256).

Este é o breve resumo do que consta dos autos.

         Preliminarmente, observo ter havido erro material no tocante ao pedido de declaração de inconstitucionalidade dos parágrafos 1º, 2º, 3º, 7º, 8º, 9º e 10º do art. 6º, eis que pela narrativa da peça inicial conclui-se que o autor buscou a declaração da inconstitucionalidade dos parágrafos 2º, 7º, 8º, 9º e 10 do art. 7 e não do art. 6º, que sequer tem parágrafos, observando, também que o paragrafo 3º do art. 7º, não foi objeto de emenda, razão pela qual foi equivocadamente incluído pelo autor.           

 

         O mesmo se pode dizer em relação ao pedido de declaração de inconstitucionalidade do inciso XVII do art. 11, da referida lei, posto que o autor se reportou ao disposto no inciso XVII do art. 12, da Lei n. 5.414/10.

 

         E, por se tratar de simples erro material, nada impede que se faça a correção necessária, para a devida apreciação da presente ação.

 

         No mérito, a Lei n. 5.414, de 02 de dezembro de 2010, “disciplina os serviços de taxi no Município de Itapetininga e dá outras providências”.

 

         Os dispositivos impugnados apresentam a seguinte redação:

 

“Art. 1.º (...)

§§ 1º e 2º (....)

a)     a a c (...)

d)     Táxi Distrital/Rural – aquele que terá ponto nos distritos do Tupy, Rechã, Gramadinho, Morro do Alto, Varginha e Conceição e nas demais áreas rurais do Município;

e)     Táxi Urbano – aquele que terá ponto nas demais localidades da cidade excluídas as da alínea anterior.

§3º - Os táxis referidos nas alíneas “d” e “e” do §2º deste artigo deverão ter identificação própria a fim de permitir a fiscalização pelo Poder executivo.

 

Art. 2º (...)

§§1º e 2º (...)

§3º - A contratação de terceiro para condução do veículo só será autorizada pelo Poder Executivo se tiver sido respeitada toda legislação trabalhista e previdenciária por parte do permissionário.

(.....)

 

Art. 3º - Os veículos utilizados para fins desta Lei não poderão ter mais do que 7 (sete) anos de uso, bem como não poderão estar com mais de 250.000 km (duzentos e cinquenta mil quilômetros) rodados.

 

Art. 7º  (...)

§1º  (...)

§2º - Para o táxi distrital/rural fica estabelecido o limite de 1 (um) veículo para cada 500 (quinhentos) habitantes, de acordo com a informação do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que será obtido a cada 2 (dois) anos, salvo previsão do §3º, assegurando-se pelo menos uma permissão para distritos ou zonas rurais com população inferior a esse número.

§§ 3º, 4º, 5º, e 6º (...)

§7º - Os Táxis Distrital/Rural poderão atuar comercialmente apenas no respectivo distrito.

§8º Os Táxis Distrital/Rural só poderão conduzir passageiros na zona urbana para levá-los ou trazê-los ao distrito/zona urbana.

§9º - É expressamente vedado ao Táxi Distrital/Rural conduzir passageiros na zona urbana que não seja para a finalidade mencionada no parágrafo anterior.

§10º - A disciplina prevista nos três parágrafos anteriores aplica-se ao Táxi Urbano, no que couber.

 

Art. 12 (...)

I a XVI (...)

XVII- Descumprir o disposto nos §§ 7º, 8º, 9º e 10 do art. 7º.

Pena: Advertência por escrito e multa do 5 (cinco) UFM, com a revogação da permissão no caso de reincidência”.

 

De fato, os dispositivos legais impugnados, de origem parlamentar são inconstitucionais, ofendendo o artigo 5º, caput, da Constituição do Estado de São Paulo, diante da invasão, pela conduta do Poder Legislativo, de competência exclusiva do Poder Executivo.

São confiadas ao Poder Executivo e ao Poder Legislativo, funções diferenciadas e independentes, de acordo com a estrutura da organização política da República, inclusive quanto ao município, é que sua parte integrante. Bem por isso a Constituição Federal procurou estabelecer as atribuições do Poder Executivo e Poder Legislativo, fixando funções adequadas à organização dos poderes, no que foi seguida pela Constituição do Estado de São Paulo.

O Prefeito, enquanto chefe do Poder Executivo exerce tarefas específicas à atividade de administrador, tendente à atuação concreta, devendo planejar, organizar e dirigir a gestão das coisas públicas. Entre os atos de administração ordinária, pode o prefeito ter qualquer atuação voltada para a “conservação, ampliação ou aperfeiçoamento dos bens, rendas ou serviços públicos” (Hely Lopes Meirelles, Direito Municipal Brasileiro, São Paulo, Malheiros, 1997, p. 520).

Se deve o prefeito administrar os bens públicos — conservando-os, administrando-os e utilizando-os —, e se tais atos se inserem na condução ordinária da Administração, não é possível que a Câmara Municipal interfira em sua competência, editando emendas no tocante a prestação de serviços de táxi, como é o caso presente.

Sobre isso, ensina Hely Lopes Meirelles:

“Em princípio, o prefeito pode praticar os atos de administração ordinária independentemente de autorização especial da Câmara. Por atos de administração ordinária entendem-se todos aqueles que visem à conservação, ampliação ou aperfeiçoamento dos bens, rendas ou serviços públicos. (...)

Advirta-se, ainda, que, para atividades próprias e privativas da função executiva, como realizar obras e serviços municipais, para prover cargos e movimentar o funcionalismo da Prefeitura e demais atribuições inerentes à chefia do governo local, não pode a Câmara condicioná-las à sua aprovação, nem estabelecer normas aniquiladoras dessa faculdade administrativa, sob pena de incidir em inconstitucionalidade, por ofensa a prerrogativas do prefeito.  (em “Direito Municipal Brasileiro”, 9ª ed., pp. 519/520).

Ademais, além de invadir a esfera privativa do Poder Executivo no tocante à realização da prestação dos serviços públicos, os dispositivos legais em questão, nela também interferem na direção superior da administração municipal. O tema da organização da estrutura administrativa deve ser, necessariamente, de iniciativa do Poder Executivo, que tem interesse preponderante em sua organização. E este exercício independe de qualquer autorização legislativa, pois é inerente à atividade do administrador, voltado para a execução ordinária da prestação dos serviços públicos.

A não ser assim adentraria o Poder Legislativo na esfera de atribuições do Poder Executivo, o que não se coaduna com o princípio da harmonia e independência entre os poderes.

Conclui-se, portanto, que houve supressão de atribuição reservada do Chefe do Poder Executivo com a consequente imposição de normas que ofende diretamente sua iniciativa legislativa, com infringência aos artigos 5º, caput e 44, todos da Constituição do Estado de São Paulo.

         Assim, com base nessas premissas, requer-se a declaração de inconstitucionalidade material das alíneas “d” e “e” do §2º, §3º, do art. 1º, a expressão trabalhista inserta no § 3º, do art. 2º, art.3º, §§ 2º, 7º, 8º, 9º e 10º, do art. 7º e inciso VIII, do art. 12, todos da Lei n. 5.414, de 02 de dezembro de 2010, que “disciplina os serviços de taxi do Município de Itapetininga e dá outras providências”.

 

 

                                  São Paulo, 9 de setembro de 2011.

 

Sérgio Turra Sobrane

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

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