Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

 

Autos nº 0052667-80.2011.8.26.0000

Requerente: Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado de São Paulo (SETPESP)

Objeto: inconstitucionalidade de Emenda à Lei Orgânica do Município nº 35, de 19 de outubro de 2010, de Ferraz de Vasconcelos

 

Ementa:

1)      Ação direta de inconstitucionalidade da Emenda à Lei Orgânica do Município nº 35, de 19 de outubro de 2010, de Ferraz de Vasconcelos. Alteração da Lei Orgânica do Município a fim de prever a gratuidade do transporte coletivo para portadores de deficiência e para idosos de idade superior a 60 anos.

2)      Preliminar. Impossibilidade de realização do controle concentrado de constitucionalidade adotando como parâmetros dispositivos da Constituição da República, da legislação federal, ou da própria Lei Orgânica do Município. Precedentes do STF.

3)      Mérito. Inexistência de vício formal. Ausência de reserva de iniciativa legislativa do Poder Executivo na matéria em exame (concessão de isenção tarifária). Inteligência do art. 24, § 2º da Constituição Paulista, e do art. 61, § 1º da CF.

4)      Alegação de criação de despesas sem previsão de receita e de rompimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão do serviço de transporte. Impossibilidade de exame de questões de fato, bem como de inconstitucionalidades indiretas ou reflexas, em sede de ação direta de inconstitucionalidade. Inteligência do art. 25 da Constituição Paulista. Exame de questões de fato implicaria afronta ao art. 102, I, a, da CF.

5)      Constitucionalidade da norma impugnada.

6)      Competência do Município para legislar sobre assuntos de interesse local e sobre transporte coletivo (art. 30, I e V, da CR). Improcedência da ação direta de inconstitucionalidade.

 

 

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Desembargador Relator

 

 

 

 

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado de São Paulo (SETPESP), tendo como alvo a Emenda à Lei Orgânica do Município nº 35, de 19 de outubro de 2010, de Ferraz de Vasconcelos, que tratou da gratuidade do transporte público no referido Município.

Alega o autor que a norma é inconstitucional, em suma, por: (a) vício de competência legislativa (a matéria não poderia ser veiculada por lei municipal); (b) vício de iniciativa (só poderia ter partido do Prefeito a iniciativa para a alteração da Lei Orgânica Municipal nesse tema); (c) falta de indicação da fonte de custeio.

Foi concedida a liminar, determinando-se a suspensão dos preceitos impugnados (fls. 133/134).

Citado, o Senhor Procurador-Geral do Estado declinou de defender o ato normativo (fls. 148/150).

O Município apresentou informações, defendendo a constitucionalidade da norma (fls. 152 e ss.).

A Câmara Municipal não prestou informações (fls. 164).

É o relato do essencial.

A Emenda à Lei Orgânica Municipal nº 35, de 29 de outubro de 2010, de Ferraz de Vasconcelos, tem a seguinte redação:

“(...)

Art. 1º. O parágrafo único constante do artigo 202 do texto da Lei Orgânica do Município, passa a ser § 1º e 2º com as seguintes redações:

‘Art. 202. ...

§ 1º. Aos portadores de deficiência física e às pessoas com mais de 60 (sessenta) anos de idade, é garantida a gratuidade no transporte coletivo do Município.

§ 2º. A forma de comprovação da condição de idoso e de deficiente físico para obter a isenção e demais obrigações tributárias acessórias, será regulamentada pelo Poder Executivo’.

Art. 2º. Esta Emenda à Lei Orgânica do Município entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

(...)”

É necessário observar, inicialmente, a impossibilidade, na ação direta de inconstitucionalidade estadual, de adoção de dispositivos da Constituição da República, da legislação federal, bem como da Lei Orgânica do Município, como parâmetros para o controle abstrato.

Foi por essa razão que na ADI 347/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, j. 20/09/2006 (DJ 20/10/2006) foi declarada a inconstitucionalidade do art. 74, XI, da Constituição do Estado de São Paulo, que permitia a adoção de parâmetro constitucional federal no controle de constitucionalidade estadual. Eis a ementa do julgado:

“(...)

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO. ART. 74, XI. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE, PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, DE LEI OU ATO NORMATIVO MUNICIPAL EM FACE DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PROCEDÊNCIA. É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, antes e depois de 1988, no sentido de que não cabe a tribunais de justiça estaduais exercer o controle de constitucionalidade de leis e demais atos normativos municipais em face da Constituição federal. Precedentes. Inconstitucionalidade do art. 74, XI, da Constituição do Estado de São Paulo. Pedido julgado procedente.

(...)”

Dessa forma, não comportam exame, nesta ação direta, as alegações do autor de que o ato normativo contraria dispositivos da Constituição da República, da legislação federal (v.g. a Lei nº 8.666/93, a Lei nº 10.741/2003, a Lei nº 8.987/95, entre outras, mencionadas na inicial), ou mesmo da própria Lei Orgânica do Município (relativamente à limitação de iniciativa legislativa na matéria em debate).

Reitere-se: a ação direta de inconstitucionalidade no plano estadual tem escopo limitado, e consiste, exclusivamente, em instrumento de verificação quanto à existência de compatibilidade entre a lei e a Constituição do Estado.

Esse sistema decorre do art. 125, § 2º da Constituição da República, pelo qual “cabe aos Estados a instituição de representação de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituição Estadual (...)” (g.n.).

Portanto, declarar a inconstitucionalidade da lei municipal utilizando como parâmetro de controle dispositivo da Constituição Federal ou mesmo da legislação infraconstitucional significaria contrariar o art. 125, § 2º, da CR.

Ademais, no mérito a ação deve ser julgada improcedente.

Com o nosso devido respeito ao entendimento adotado em outras ocasiões pelo Col. Órgão Especial do Tribunal de Justiça, não há inconstitucionalidade na concessão de transporte público gratuito para idosos e deficientes, por lei de iniciativa parlamentar.

A matéria versada na lei impugnada não é de iniciativa legislativa reservada ao Executivo, pois não está contemplada no rol do art. 24, § 2º, 1 a 6, da Constituição Paulista (que reproduz, de modo geral, o disposto no art. 61, § 1º, da CR), inexistindo, por esse aspecto, qualquer inconstitucionalidade a ser declarada em razão do impulso parlamentar dado ao projeto que culminou com a edição do ato normativo em epígrafe.

De outro lado, não há, também, violação ao postulado constitucional da independência e harmonia entre os Poderes.

A Constituição Federal atribuiu competência aos Municípios para legislar sobre assuntos de interesse local, bem como para organizar e prestar, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, os serviços de interesse local, incluído o transporte coletivo (art. 30, I e V, da CF).

E legislar a respeito do tema não significa invadir a seara da administração local.

A propósito, a Constituição do Estado prescreve iniciativa privativa do Chefe do Executivo para leis que versem em síntese sobre: cargos, funções e empregos públicos na administração direta e indireta e sua remuneração; criação e extinção de órgãos na Administração Pública; regime jurídico dos servidores públicos (cf. art. 24, §2º, n. 1 a 6 da Constituição Estadual). Reitera a Carta Paulista, em linhas gerais, as limitações contidas no art. 61, § 1º, II, da Constituição Federal.

De outro lado, a Constituição do Estado de São Paulo também determina caber ao Executivo exercer a direção superior da Administração Estadual, bem como a prática de atos de administração (art. 47, II e XIV).

Parte o requerente da ideia de que legislar a respeito de direitos de idosos no sistema de transporte municipal estaria na esfera privativa de iniciativa do Chefe do Poder Executivo. Ademais, o planejamento, deliberação, e realização dos serviços seriam atos de gestão, da esfera exclusiva da Administração.

O princípio da independência e harmonia entre os Poderes, adotado expressamente no ordenamento constitucional brasileiro, não coloca o Executivo em posição de preeminência, e o Legislativo em situação de mera coadjuvação. É indispensável vislumbrar na proporcionalidade de forças na formulação das opções políticas do Estado, decorrente do sistema de separação associado aos freios e contrapesos (checks and balances), que Executivo e Legislativo, atuando em suas respectivas esferas de atribuição, possuem a mesma relevância política.

Assim como o Executivo não deve sofrer indevida interferência em sua primacial função de administrar (planejamento, direção, organização e execução das atividades da Administração), o Legislativo não deve ver minimizada sua atividade de legislar. Afinal, em última análise, nosso regime democrático é representativo, e o Poder Legislativo, em sede de elaboração legislativa, reflete a própria voz da vontade popular.

Entendimento diverso significa admitir, como perfil do Estado Democrático brasileiro, numa imagem representativa, uma balança deslocada para um lado de maior importância e prestígio: o lado do Poder Executivo. Um Executivo hipertrofiado em suas atribuições e poderes, ladeado por um Legislativo que se limitará a chancelar iniciativas daquele.

Não parece ter sido esta a opção do Constituinte.

Note-se, de início, que a essência da separação de Poderes, como ensina Manoel Gonçalves Ferreira Filho, é a “proteção da independência de determinado Poder, como ocorre com a de iniciativa em favor do Judiciário, que aliás, procede da inspiração que em Montesquieu sugeria a atribuição de veto ao Executivo, ou a redução das despesas públicas”(Do processo legislativo, 5. ed., São Paulo, Saraiva, 2002, p. 147).

Como anota José Afonso da Silva, nos casos de iniciativa reservada aos Chefes do Executivo só estes “estão em condições de saberem quais são esses interesses e como fazerem para resguardá-los” (Processo constitucional de formação das leis, 2. ed., São Paulo, Malheiros, 2006, p. 179).

Deve-se notar, entretanto, que a regra em nosso regime constitucional é a livre iniciativa legislativa, que decorre do art. 61, caput, da CF, ao passo que as hipóteses de iniciativa reservada são excepcionais. Como tal é curial que regras de exceção sejam interpretadas restritivamente, sem a possibilidade de extensão por integração ou interpretação analógica.

Lembrando o brocardo latino segundo o qual “exceptiones sunt strictissimae interpretanionis”, há muito Carlos Maximiliano anotava que “as disposições excepcionais são estabelecidas por motivos ou considerações particulares, contra outras normas jurídicas ou contra o direito comum, por isso não se estendem além dos casos e tempos que designam expressamente” (Hermenêutica e aplicação do direito, 18. ed., Rio de Janeiro, Revista Forense, 1999, p. 227).

O Col. STF já assentou que as hipóteses indicadas pelo texto constitucional como casos de iniciativa legislativa privativa do Executivo, assumindo o caráter de direito excepcional, na expressão de Carlos Maximiliano, devem ser interpretadas de forma restritiva. Confira-se:

"(...)

O respeito às atribuições resultantes da divisão funcional do Poder constitui pressuposto de legitimação material das resoluções estatais, notadamente das leis. Prevalece, em nosso sistema jurídico, o princípio geral da legitimação concorrente para instauração do processo legislativo. Não se presume, em conseqüência, a reserva de iniciativa, que deve resultar — em face do seu caráter excepcional — de expressa previsão inscrita no próprio texto da Constituição, que define, de modo taxativo, em numerus clausus, as hipóteses em que essa cláusula de privatividade regerá a instauração do processo de formação das leis. O desrespeito à prerrogativa de iniciar o processo legislativo, quando resultante da usurpação do poder sujeito à cláusula de reserva, traduz hipótese de inconstitucionalidade formal, apta a infirmar, de modo irremissível, a própria integridade do diploma legislativo assim editado, que não se convalida, juridicamente, nem mesmo com a sanção manifestada pelo Chefe do Poder Executivo (...) (ADI 776-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 23-10-92, DJ de 15-12-06, g.n.).

A disciplina jurídica do processo de elaboração das leis tem matriz essencialmente constitucional, pois residem, no texto da Constituição — e nele somente —, os princípios que regem o procedimento de formação legislativa, inclusive aqueles que concernem ao exercício do poder de iniciativa das leis. A teoria geral do processo legislativo, ao versar a questão da iniciativa vinculada das leis, adverte que esta somente se legitima — considerada a qualificação eminentemente constitucional do poder de agir em sede legislativa — se houver, no texto da própria Constituição, dispositivo que, de modo expresso, a preveja. Em conseqüência desse modelo constitucional, nenhuma lei, no sistema de direito positivo vigente no Brasil, dispõe de autoridade suficiente para impor, ao Chefe do Executivo, o exercício compulsório do poder de iniciativa legislativa. (MS 22.690, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 17-4-97, DJ de 7-12-06).

(...)”

Note-se que, nos precisos termos da Constituição Estadual (art. 120), cabe exclusivamente ao Poder Executivo a fixação de tarifas dos serviços públicos. Entretanto, essa exclusividade não se estende à prerrogativa de conceder isenções quanto ao pagamento de tarifas, o que é próprio de lei - cuja iniciativa é geral ou concorrente - a ser editada pelo ente público responsável pela prestação do serviço (Cf. Hely Lopes Meirelles, Direito Municipal Brasileiro, 15. ed., Malheiros, São Paulo, 2006, p. 164).

A referência feita na inicial ao art. 47, II, da Constituição Estadual, não é suficiente para afastar a conclusão de que inexiste reserva de iniciativa em matéria de isenção tarifária, uma vez não se possível extrair desse dispositivo constitucional, pelo qual ao Poder Executivo cabe “exercer, com o auxílio dos Secretários de Estado, a direção superior da administração estadual” reserva de iniciativa na matéria ora analisada.

Também não se caracteriza, na hipótese, prática de ato de administração pelo Poder Legislativo, o que poderia amparar o reconhecimento da tese da quebra do princípio da separação de poderes. Note-se que a lei aqui analisada reveste-se de todos os pressupostos necessários à sua configuração como ato normativo: generalidade, impessoalidade, e abstração.

Não há como aceitar a argumentação, assim, de que estaríamos diante de ato de administração.

Também não é possível acolher o pleito com amparo no art. 25 da Constituição do Estado de São Paulo.

Afirmar que a lei gerará aumento de despesas sem que haja recursos disponíveis é pautar o exame da constitucionalidade da norma em aspecto factual (existência ou não dos recursos e efetivo aumento de despesas), cuja análise extrapola o limite do controle abstrato de normas.

A adequada compreensão do art. 25 da Constituição do Estado nos leva à conclusão de que o Poder Executivo está impedido de sancionar qualquer projeto de lei que implique diretamente a criação ou o aumento de despesa pública, quando dele não constar, de forma igualmente expressa, a indicação dos recursos disponíveis, próprios para o atendimento dos novos encargos.

Reitere-se: saber se, concretamente, ocorrerá ou não qualquer diferença quanto a despesas que serão realizadas, é uma questão de fato, cujo exame é inviável no contexto do processo objetivo destinado à verificação da constitucionalidade de lei.

De outro lado, a alegação de quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato não leva ao êxito da ação direta.

Recorde-se, ainda uma vez, que tal discussão envolve questões de fato, cujo exame extrapola os limites da cognição realizada no processo objetivo, ou seja, no controle concentrado de constitucionalidade das leis.

Nessa linha de raciocínio, simplesmente não há elementos na persente ação que permitam examinar, efetivamente, se houve ou não rompimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão do serviço de transporte no Município.

Some-se que a regra da manutenção do equilíbrio econômico e financeiro dos contratos decorre da Constituição, da lei, e do próprio contrato, podendo ocorrer a qualquer tempo necessidade de adequação, que se dá através das tarifas ou concessão de subsídio por parte do Poder Público.

Assim, eventual necessidade de ajuste não significa, por si só, violação a qualquer dispositivo constitucional.

Se na ação direta de inconstitucionalidade não é possível o exame de questões de fato, e se essa afirmação decorre do modelo de processo objetivo adotado no art. 102, I, a, da Constituição da República (que fala em “ação direta de inconstitucionalidade”, g.n.), negando, portanto, o exame “indireto” da inconstitucionalidade, declarar-se a inconstitucionalidade, no caso em exame, significaria contrariar o art. 102, I, a, da Constituição Federal.

Em síntese, o argumento do autor é inconsistente para fins de reconhecimento de invalidade da lei impugnada.

Acrescente-se que Constituição Federal, no seu art. 230, caput, prevê que “A família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida”, enquanto o § 2º desse mesmo garante que “Aos maiores de sessenta e cinco anos é garantida a gratuidade dos transportes coletivos urbanos”.

Por sua vez, o art. 39, do Estatuto do Idoso (Lei Federal nº 10.741/2003) estabelece que “Aos maiores de 65 (sessenta e cinco) anos fica assegurada a gratuidade dos transportes coletivos públicos urbanos e semi-urbanos, exceto nos serviços seletivos e especiais, quando prestados paralelamente aos serviços regulares”. O § 3º deste mesmo dispositivo prevê que “no caso de pessoas compreendidas na faixa etária entre 60 (sessenta) e 65 (sessenta e cinco) anos, ficará a critério da legislação local dispor sobre as condições para exercício da gratuidade nos meios de transporte previstos no caput deste artigo”.

Isso nos permite afirmar que o ato normativo em análise está em conformidade com a ordem jurídica vigente, sendo absolutamente razoável o benefício por ela concedido, cuja possibilidade é prevista, inclusive, no Estatuto do Idoso.

A propósito, ao examinar propositura semelhante, o Col. STF assentou que:

"(...)

Ação direta de inconstitucionalidade: Associação Brasileira das Empresas de Transporte Rodoviário Intermunicipal, Interestadual e Internacional de Passageiros – ABRATI. Constitucionalidade da Lei n.  8.899, de 29 de junho de 1994, que concede passe livre às pessoas portadoras de deficiência. Alegação de afronta aos princípios da ordem econômica, da isonomia, da livre iniciativa e do direito de propriedade, além de ausência de indicação de fonte de custeio (arts. 1º, IV; 5º, XXII; e 170 da CF): improcedência. A autora, associação de classe, teve sua legitimidade para ajuizar ação direta de inconstitucionalidade reconhecida a partir do julgamento da ADI 3.153-AgR, Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 9-9-2005. Pertinência temática entre as finalidades da autora e a matéria veiculada na lei questionada reconhecida. Em 30-3-2007, o Brasil assinou, na sede da ONU, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, bem como seu Protocolo Facultativo, comprometendo-se a implementar medidas para dar efetividade ao que foi ajustado. A Lei n.  8.899/1994 é parte das políticas públicas para inserir os portadores de necessidades especiais na sociedade e objetiva a igualdade de oportunidades e a humanização das relações sociais, em cumprimento aos fundamentos da República de cidadania e dignidade da pessoa humana, o que se concretiza pela definição de meios para que eles sejam alcançados. (ADI 2.649-6/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 8-5-2008, Plenário, DJE de 17-10-2008.)

(...)”

A Lei Federal nº 8.899/94, que concedeu passe livre aos portadores de deficiência, como informa o sítio eletrônico da Câmara dos Deputados (www.camara.gov.br, consulta realizada em 10.10.2011) foi fruto de iniciativa parlamentar. Isso serve para elidir de vez o argumento injurídico de que a isenção de tarifa é matéria de iniciativa reservada ao Poder Executivo, pois, se assim fosse, o Supremo Tribunal Federal teria proclamado a sua inconstitucionalidade formal no julgamento da aludida ação direta.

Do mesmo modo que a Lei Federal nº 8.899/1994, a norma ora impugnada visa a propiciar meios de inclusão dos idosos e dos deficientes na sociedade, assegurando a igualdade de oportunidades, o acesso à prestação de serviço público básico e a humanização das relações sociais, em cumprimento ao disposto no art. 1º, II e III, da Lei Maior, que instituiu entre os fundamentos da República Federativa do Brasil a cidadania e a dignidade da pessoa humana, tornando-se, assim, possível inferir que o seu conteúdo está afinado aos valores prestigiados na Constituição.

Deste modo, a relevância social do diploma deve também ser considerada no exame de sua constitucionalidade que, ao contrário do alegado pelo autor, deve ser confirmada.

Diante do exposto, aguarda-se a improcedência da ação, reconhecendo-se a constitucionalidade da Emenda nº 35, de 2010, à Lei Orgânica do Município de Ferraz de Vasconcelos.

São Paulo, 10 de outubro de 2011.

Sérgio Turra Sobrane

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

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