AÇÃO DIRETA DE
INCONSTITUCIONALIDADE
Autos
n.º
0292467-34.2011.8.26.0000
Autor:
Prefeito Municipal de Serrana
Objeto de impugnação:
Emenda Aditiva n.º 4 à Lei n.º 1.465, de 26 de setembro de 2011, do Município
de Serrana.
EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade.
Emenda ao Projeto de Lei n.º 10/2011, a dispor sobre as diretrizes
orçamentárias para o exercício de 2012 (Lei n.º 1.465/2011), que destinou R$ 150.000,00
(cinquenta mil reais) para a implantação do “Programa Leva e Traz” no âmbito do
Município. Despesa que não foi contemplada na propositura original. Necessidade
de sincronismo entre a LOA, a LDO e o PPA. Aprovação de emenda com
inobservância do devido processo legislativo constitucional. Intervenção na
esfera de competência administrativa do Prefeito, com violação do princípio da
independência e harmonia entre os Poderes (CE, art. 5.º). Procedência.
Excelentíssimo Senhor
Desembargador Relator,
Colendo Órgão Especial:
Cuida-se de ação – movida pelo Prefeito
Municipal de Serrana – na qual se pretende ver declarada a
inconstitucionalidade de emenda inserida na Lei de Diretrizes Orçamentárias de
2012 (Emenda Aditiva n.º 4), que destinou a importância de R$ 150.000,00 (cinquenta
mil reais) para a implantação do “Programa Leva e Traz” no âmbito do Município,
ante sua flagrante incompatibilidade com os arts. 5.º, 47, incisos II e XIV, e
144, todos da Constituição do Estado de São Paulo.
Eis a íntegra da disposição normativa ora
impugnada:
"Lei
n.º 1.465/2011
EMENDA
ADITIVA N. 004/2011 – LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTÁRIAS DE 2012.
VALMIR
ROSA,
Presidente da Câmara Municipal de Serrana, Estado de São Paulo, no uso das suas
atribuições legais e constitucionais a ele conferidas e com o fulcro no
parágrafo 6.º, do artigo 45 da Lei Orgânica do Município de Serrana.
FAZ
SABER que a Câmara Municipal aprovou e ele sanciona e
promulga a seguinte Emenda Aditiva:
Art. 1.º - O Anexo V – Descrição dos
Programas/Metas/Custos, página 12 de 20 da lei que dispõe sobre as diretrizes
orçamentárias de 2012 passa a vigorar com a seguinte redação:
"Fica
destinado o valor de R$ 150.000,00 para a implantação do programa leva e traz
no âmbito do Município"
Art. 2.º - O acréscimo do custo
financeiro previsto no artigo anterior será suportado com a redução das
despesas previstas no Anexo V – Descrição dos Programas
Governamentais/Metas/Custos, página 2 de 20.
Art. 3.º - Esta lei entra em vigor
na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
PAÇO MUNICIPAL ESTRELA D’ALVA.
26 de setembro de 2011.
NELSON
CAVALHEIRO GARAVAZZO
PREFEITO
MUNICIPAL”
Segundo consta da inicial, a iniciativa
das leis que disponham sobre programas ou projetos de governo foi confiada ao Executivo;
houve criação de despesa extraordinária, que nem sequer está prevista na lei
orçamentária anual; a Câmara usurpou prerrogativa do Prefeito, violando, com
tal iniciativa, o princípio da independência e harmonia entre os Poderes; conquanto
gere aumento da despesa, a emenda aditiva não indicou a respectiva fonte de
custeio, descumprindo a Lei de Responsabilidade Fiscal; a execução da obra
gerará aumento de despesa aos cofres municipais que não está prevista no PPA.
Houve concessão de liminar (fl. 14).
Em atenção ao disposto no art. 90, §
2.º, da Constituição do Estado de São Paulo, a Procuradoria Geral do Estado expressou
o seu desinteresse na defesa de lei que disciplina matéria exclusivamente
local, conforme se vê às fls. 31/32, anotando, por oportuno, que a sua
intervenção nos feitos desta natureza somente seria cabível se a lei impugnada
afetasse algum interesse estadual.
Notificada, a Presidência da Câmara
Municipal de Serrana prestou informações no prazo regimentalmente previsto,
manifestando a sua aquiescência ao pedido formulado na inicial, por entender
que realmente a aprovação de tal emenda se deu em desacordo com os ditames
constitucionais.
Em
resumo, é o que consta nos autos.
Preliminarmente, nas ações propostas
com fundamento no art. 125, § 2.º, da Constituição Federal, o único parâmetro
de controle válido é a Constituição Estadual, desautorizando, assim, o
conhecimento desta ação sob o fundamento de afronta a dispositivos contidos na
Lei de Responsabilidade Fiscal.
No mérito, a ação comporta procedência.
Como se sabe, as leis orçamentárias
(PPA, LDO e LOA) são de iniciativa reservada ao Executivo, consoante o disposto
no art. 165, inciso I a III, da Constituição Federal, e no art. 174, I a III,
da Constituição do Estado de São Paulo.
No exercício de sua função normativa, a
Câmara pode emendar os projetos de lei de iniciativa reservada ao Executivo,
mas há limites claros para tanto, os quais foram prefixados pela Constituição,
tendo em vista que – se ilimitado fosse o poder de emenda – a iniciativa
reservada não faria nenhum sentido.
Pois bem, no seu art. 175, §§ 1.º a
5.º, a Constituição Estadual reza o seguinte:
"Art.
175 – Os projetos de lei relativos ao plano plurianual, às diretrizes
orçamentárias, ao orçamento anual e aos créditos adicionais, bem como suas
emendas, serão apreciados pela Assembleia Legislativa.
1.º - As emendas ao projeto de lei do
orçamento anual ou aos projetos que o modifiquem serão admitidas desde que:
1 – sejam compatíveis com o plano plurianual e com a lei de diretrizes
orçamentárias;
2 – indiquem os recursos necessários, admitidos apenas os provenientes de
anulação de despesa, excluídas as que incidam sobre:
a) dotações para pessoal e seus encargos;
b) serviço da dívida;
c) transferências tributárias constitucionais
para Municípios.
3)
sejam relacionadas:
a)
com correção de erros ou omissões;
b) com os dispositivos do texto do
projeto de lei.
§
2.º - As emendas ao projeto de lei de diretrizes orçamentárias não poderão ser
aprovadas quando incompatíveis com o plano plurianual.
§ 3.º - O Governador poderá enviar
mensagem ao Legislativo para propor modificações nos projetos a que se refere
este artigo, enquanto não iniciada, na Comissão competente, a votação da parte
cuja alteração é proposta.
§ 4.º - Aplicam-se aos projetos
mencionados neste artigo, no que não contrariar o disposto nesta seção, as
demais normas relativas ao processo legislativo.
§ 5.º - Os recursos que, em
decorrência de veto, emenda ou rejeição do projeto de lei orçamentária anual,
ficarem sem despesas correspondentes, poderão ser utilizados, conforme o caso,
mediante créditos especiais ou suplementares, com prévia e específica
autorização legislativa."
Apesar de a inicial não vir instruída com cópia de documentação
essencial ao julgamento da ação (do processo legislativo, da LOA, da LDO e do
PPA), o que se sugere seja
providenciado, é possível deduzir – à vista da argumentação trazida nos
autos pelas autoridades locais – que a emenda em destaque tornou a LDO
incompatível com o PPA e a LOA, nos quais nem sequer há alusão ao “Programa Leva
e Traz” no âmbito do Município, e não houve indicação dos recursos necessários,
provenientes da anulação de despesa.
Ou seja, a Câmara inovou ao introduzir
na Lei de Diretrizes Orçamentárias previsão estranha, não contemplada na
propositura original, que gerou aumento de despesa sem a indicação dos recursos
necessários, provenientes da anulação de outra despesa, conforme expressamente dispõe
a Constituição.
Mais grave ainda é constatar que a Câmara
assim agiu com o intuito de compelir o Prefeito à realização de obras e
serviços públicos, desconsiderando, porém, que a função de administrar é
estranha as suas atribuições.
Nessa seara, a Câmara pode quando muito
formular "indicações"
ao Prefeito, nunca, porém, compeli-lo – por lei ou qualquer outro meio – a
realizar atividades que são próprias da função executiva, donde também
caracterizada, na espécie, a violação da independência e harmonia entre os
Poderes.
Em verdade, se realmente desejasse implantar
o “Programa Leva e Traz”, bastaria ao Prefeito incluir na proposta orçamentária
anual previsão de recursos para tanto, sem a interferência da Câmara, exceto na
aprovação da despesa.
Nessa conformidade, aguarda-se o
julgamento de procedência da presente ação, com a confirmação da liminar, a fim
de ver declarada a inconstitucionalidade da Emenda Aditiva n.º 4 à Lei de
Diretrizes Orçamentárias (2012).
São
Paulo, 2 de março de 2012.
Sérgio Turra Sobrane
Subprocurador-Geral
de Justiça
Jurídico
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