Ação Direta de Inconstitucionalidade

Autos nº 156.606-0/0-00

 

Requerente: Associação Paulista do Ministério Público

 

Requerido: Presidente da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo e Procurador-Geral de Justiça

 

 

Ementa: 1) ADIN. Lei Complementar Estadual nº 734, de 26/11/93. 2) Eleições para o cargo de Procurador-Geral de Justiça. 3) Previsão legal relativa a capacidade eleitoral passiva, restrita aos Procuradores de Justiça (art. 10, caput, §§ 1º e 2º e inc. VII). 4) Discricionariedade e juízo político do legislador estadual, ante a inexistência de mandamento constitucional ou legal que vede a previsão. 5) Pedido improcedente.

 

 

                                                         A Associação Paulista do Ministério Público, entidade de classe que congrega os Membros do Ministério Público do Estado de São Paulo, pessoa jurídica de direito privado, propõe ação direta de inconstitucionalidade, do artigo 10, caput, bem como dos §§ 1º e 2º, e seu inciso VII, todos da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993, por entender que tais dispositivos violam a norma do artigo 94, inciso II da Constituição Estadual, na medida em que limita a elaboração da lista tríplice apenas aos integrantes da carreira que ocupem o cargo de Procurador de Justiça. Sustenta que o legislador estadual infraconstitucional, ao restringir a capacidade eleitoral passiva, desatendeu aos requisitos da generalidade e abstração, acabando por violar o princípio da igualdade material. Assim, entendendo que a lei inquinada possui caráter casuístico restritivo, atenta também contra o Estado Democrático de Direito. Pediu a liminar, bem como a notificação da Assembléia Legislativa e o Procurador-Geral de Justiça, pelo fato da lei inquinada ser de sua iniciativa. Pediu a procedência do pedido, para ser reconhecida a inconstitucionalidade do art. 10, caput, bem como dos §§ 1º e 2º, inciso VII, da LC 734/93.

 

                                                         A liminar foi negada (fls. 145/146), determinando-se fossem solicitadas as informações do Presidente da Assembléia Legislativa e da Procuradoria Geral de Justiça, bem como a citação do Procurador Geral do Estado.

 

                                                         Houve interposição de agravo regimental (fls. 149/157), ao qual foi negado provimento em votação unânime (fls. 163/167).

 

                                                         A Presidência da Assembléia Legislativa ofereceu suas informações (fls. 180/187), sustentando a constitucionalidade da norma inquinada, inclusive dizendo que a eventual procedência da ação, levaria à situação em que um Promotor de Justiça Substituto pudesse ser eleito para a Chefia da Instituição. Pede a improcedência da ação.

 

                                                         Inicialmente reiteramos a necessidade de citação do Procurador Geral do Estado.

 

                                                         Quanto ao mérito, sustentamos que o pedido deve ser julgado improcedente.

 

                                                         O art.128 § 3º da Constituição Federal contém a seguinte disposição:

“Art. 128 (...)

§ 3º. Os Ministérios Públicos dos Estados e o do Distrito Federal e Territórios formarão lista tríplice dentre integrantes da carreira, na forma da lei respectiva, para escolha de seu Procurador-Geral, que será nomeado pelo Chefe do Poder Executivo, para mandato de dois anos, permitida uma recondução.”

 

                                                         Regulando a matéria, a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei 8.625/93) prevê o que segue:

 “Art. 9º. Os Ministérios Públicos dos Estados formarão lista tríplice, dentre integrantes da carreira, na forma da lei respectiva, para escolha de seu Procurador-Geral, que será nomeado pelo Chefe do Poder Executivo, para mandato de dois anos, permitida uma recondução, observado o mesmo procedimento”. (g.n.)

 

                                                         Por seu turno, a Constituição Estadual diz o seguinte sobre o tema:

“Art. 94. Lei complementar, cuja iniciativa é facultada ao Procurador-Geral de Justiça, disporá sobre:

(...)

II – elaboração de lista tríplice, entre os integrantes da carreira, para escolha do Procurador-Geral de Justiça pelo Governador do Estado, para mandato de dois anos, permitida uma recondução; (...)” (g.n.)

 

                                                         A Lei Orgânica Estadual do Ministério Público (Lei Complementar nº 734/93) trata da matéria do seguinte modo:

“Art. 10. O Procurador-Geral de Justiça será nomeado pelo Chefe do Poder Executivo, dentre os Procuradores de Justiça integrantes de lista tríplice elaborada na forma desta lei complementar, para mandato de dois anos, permitida uma recondução, observado o mesmo procedimento.

§1º. Os integrantes da lista tríplice a que se refere este artigo serão os Procuradores de Justiça mais votados em eleição realizada para essa finalidade, mediante voto obrigatório, secreto e plurinominal de todos os membros do Ministério público do quadro ativo da carreira.

§2º. Com antecedência de pelo menos 50 (cinqüenta) dias, contados da data de expiração do mandato do Procurador-Geral de Justiça, o Conselho Superior do Ministério Público baixará normas de regulamentação do processo eleitoral, observadas as seguintes regras:

(...)

VII – somente poderão concorrer à eleição os Procuradores de Justiça que se inscreverem como candidatos ao cargo, mediante requerimento dirigido ao Presidente do Conselho Superior do Ministério Público no prazo de 3 (três) dias úteis imediatamente posteriores ao término do prazo previsto para desincompatibilizações”.

 

                                                         A questão central que se coloca diz respeito a possibilidade, ou não, do legislador infraconstitucional estadual, poder restringir o conjunto de pessoas elegíveis ao cargo mais elevado do Parquet paulista. Isso porque tanto a Constituição Federal quanto a Estadual não trazem nenhuma limitação, ficando com expressões que se resumem a impor a escolha dentre os “membros” da Instituição. Desse modo, segundo entende a Associação Paulista do Ministério Público, não poderia a lei orgânica restringir o universo daqueles que detém a capacidade eleitoral passiva.

 

                                                         Além disso, impõe-se discutir se a lei inquinada traz consigo o caráter de generalidade e abstratividade que se exige, pois segundo a inicial faltam-lhe tais requisitos, o que redunda em afronta ao princípio da isonomia, isso tudo porque entendem que a matéria discutida diz respeito a direitos individuais, inclusive citando lição de GILMAR MENDES FERREIRA (fls. 6/8).

 

                                                         É nesse ponto que reside nossa primeira discordância com a sedutora tese, pois a Lei Complementar Estadual nº 734/93 trata tão somente da organização – de forma amplamente considerada – de um Órgão de Estado, no caso exercente de função essencial à Justiça, cuja matriz constitucional está em um dos capítulos do Título IV – Da organização dos Poderes (arts. 44 a 135 da Constituição Federal). Portanto, desde logo não se aplica ao caso sub exame a correta teoria da inconstitucionalidade das leis restritivas de direitos, liberdades e garantias, tão densamente estudada por CANOTILHO.[1]

 

                                                         Portanto, o foco da discussão não pode ser a da restrição de direitos, mas sim a organização de órgão de Estado, por lei própria e à qual não se impõe as limitações aplicáveis àquelas. Assim, trata-se de verificar o conteúdo da lei genericamente considerada, inclusive sob o prisma da liberdade conferida ao Legislativo, para disciplinar o funcionamento estatal.

 

                                                         Segundo a doutrina lei é o “ato legislativo emanado dos órgãos de representação popular e elaborado de conformidade com o processo legislativo previsto na Constituição (arts. 59 a 69).”[2] Evidentemente que apenas esse conceito não resolve a questão colocada, exigindo aprofundamento no conceito. Assim:

“Lei. A noção de lei, como regra jurídica obrigatória, deve se tomada em seus sentidos formal e material. Na acepção material, indica-se a regra abstrata e permanente, tendo por conteúdo uma norma de Direito objetivo. Na acepção formal, é todo ato ou disposição emanada do órgão político, a que se atribui poder de legislar, que não venha criar uma norma agendi, mas sim contenha uma deliberação ou uma decisão particular. Assim, somente em relação à forma, dá-se-lhe o nome de lei, embora se trate, por vezes, de uma decisão particular, sem o caráter de generalidade e de obrigatoriedade, que é da natureza intrínseca da lei.”[3]

 

                                                         Na doutrina estrangeira se encontra importantes lições sobre o tema, a começar por KELSEN, para quem “  com la palabra ‘ley’ se piensa, única o principalmente, em normas generales o abstractas. Y si se identifica por completo la legislación com la creación de Derecho, débese a que se concibe el Derecho como uma suma de normas generales, a que se le considera únicamente bajo su forma abstracta y general.”[4] Para MARIENHOFF:

“Después de la Constitución, la ley es la fuente cualitativamente más importante del derecho adminsitrativo. Por ‘ley’ há de entenderse la norma jurídica que emite el órgano legislativo, seguiendo para ello procedimiento que al efecto establece la Constitución. Trátase de la ley ‘formal’, que se diferencia u opone a la ley ‘material’ o substancial, o sea ésta el acto jurídico que establece uma regla de derecho.”[5]         

 

                                                         Nessa linha de pensamento, há de se questionar se a lei inquinada guarda o caráter de abstratividade e generalidade que o conceito exige, para daí se verificar a suposta afronta ao princípio da isonomia. Relativamente à primeira, nítido que a abstração exigida está presente. Com efeito, os dispositivos questionados não se dirigem a situações concretas, ao contrário, prevêem o critério de escolha do Chefe da Instituição por um processo claramente definido, alcançando todas as situações abstratas futuras. “A generalidade inerente à norma liga-se a não instantaneidade, a repetitividade, a uma dimensão temporal, a <uma pretensão imanente de duração> (FORSTHOFF), a uma <vigência sucessiva> (GOMES CANOTILHO). A norma aplica-se um número indefinido de vezes a uma pluralidade de pessoas, o acto administrativo gera uma só vez (MICHEL FROMONT). A execução da norma não a esgota, nem a consome; afirma-a (GARCIA DE ENTERRÍA).”[6]

 

                                                         A norma dita inconstitucional atende ao requisito da generalidade, porquanto não dirigida a grupo de pessoas, mas todos aqueles que atendam o comando. De fato, a lei complementar é mais restritiva que a Constituição Estadual, todavia, legítima a ação legislativa na espécie, uma vez que se trata de opção do Órgão estatal incumbido da ação.  Como afirma HAURIOU:

“Observemos que el poder deliberante reside em la Asamblea considerada como uma institución permanente formando Cuerpo, lo cual se admite fácilmente cuando se trata de Asambleas representativas, que son, em efecto, Cuerpos constituídos. (...) Como la deliberación supone la reflexión y el espíritu crítico, como es uma forma de la discusión, de la que se considera que sale la luz, las decisiones tomadas por el poder deliberante se estima que presentan cualidades de fondo superiores a las de las decisiones que adopta el poder ejecutivo; se presume que son más conformes a la natureza de las cosas y a la justicia, lo cual sirve para establecer del modo siguiente la combinación de las dos clases de decisiones: las decisiones ejecutivas se adoptan para las resoluciones urgentes y provisionales, o bien para la ejecución de las reglas establecidas por el poder deliberante; las decisiones deliberadas se refieren a las resoluciones definitivas y a las reglas estatutarias.”[7]

 

                                                         É fato que ao Legislativo é vedado editar leis que destoem do comando constitucional. Todavia, no exercício do poder conferido pela própria Constituição, lícito que adote como opção de política legislativa, calcada em critérios de conveniência e de oportunidade, a concessão de capacidade eleitoral passiva (elegibilidade) apenas àqueles que ocupam o mais elevado degrau da carreira, assegurando assim que somente os mais experientes possam vir a ser eleitos Procurador-Geral de Justiça, funcionando ainda como Presidente do Órgão Especial do Colégio de Procuradores e do Conselho Superior do Ministério Público, na forma da lei em vigor. Tal possibilidade é a comentada por ENTERRÍA e FERNANDEZ:

“No, pues, de una discrecionalidad del legislador, sino de una <libertad de configuración> normativa (Gestaltungsfreiheit des Gesetzgebers, em la expresión usual del Tribunal Constitucional alemán) debe hablarse. Es la imaginación creadora y no la fidelidad a patrones dados, que la Constitución no puede darle, el campo donde se juega la responsabilidad política del legislativo. El Parlamento se desnaturalizaría si se considerase un órgano ejecutivo no independiente (LUECKE).”[8]

 

                                                         A leitura das normas paradigmáticas, quer a Constituição Estadual, quer a Federal, não pode ser feita de maneira a destacar a expressão “dentre integrantes da carreira” em prejuízo de outra expressão encontrada em ambas, ou seja: “Lei complementar, cuja iniciativa é facultada ao Procurador-Geral de Justiça, disporá sobre:” e “na forma da lei respectiva”. É curial que as Constituições conferiram à lei complementar dispor sobre a matéria escolha do Chefe da Instituição, exigindo apenas que seja ele integrante da carreira, interditando desde logo a possibilidade de estranhos virem a ocupar o elevado posto, mas não impondo que todos possam, em tese, vir a ser escolhidos. Não se pode deixar de considerar que a Constituição de 1967/EC 69 previa a nomeação do chefe do Ministério Público Federal pelo Presidente da República[9], a isso sim é que se colocou um basta, exigindo a Lei Maior agora, tanto em relação ao Ministério Público da União, quanto o dos Estados, que as chefias sejam exercidas por integrantes da carreira.

 

                                                         Além disso, não se trata de permitir que apenas uma específica classe de pessoas ou de ocasionais ocupantes de determinados cargos possam vir a ser eleitos, mas sim de garantir que todos e quantos galguem o mais elevado cargo da carreira possam concorrer ao elevado cargo.

 

                                                         Note-se que bem ao contrário do que sugere a exordial, não se trata a eleição para formação da lista tríplice a ser encaminhada ao Governador do Estado, de exercício de direito político, este sim amplo e insuscetível de disciplinamento infraconstitucional restritivo. Em realidade, cuida-se da escolha de servidor público cujo critério de escolha é complexo, envolvendo não só a vontade do 1º mandatário do Estado, mas também a vontade da classe, sem que isso possa ser considerado como direito político tal como os conferidos ao cidadão que, aliás, igualmente guarda relação com a restrição imposta à capacidade eleitoral passiva no caso examinado. Com efeito, ensina ZIPPELIUS:

“As eleições dos deputados para o órgão legislativo formam um caso particularmente importante da designação dos órgãos do Estado. Neste caso, o órgão que designa é a generalidade dos eleitores. Os cidadãos exercem o seu direito eleitoral activo mediante a eleição. Este é o direito organizatório fundamental dos cidadãos maiores de idade a participar na designação dos órgãos do Estado. Quanto ao direito eleitoral passivo, ou elegibilidade, são impostas exigências mais apertadas que as postas ao direito activo. Reside nessas exigências um ponto de partida possível para introduzir na democracia representativa, graças à condição da verificação de qualidades técnicas, um governo de elite.”[10]

 

                                                         A restrição à capacidade eleitoral passiva é razoável em todos os sistemas eleitorais, notadamente quanto à escolha dos dirigentes máximos dos países. Num processo de escolha daquele que ocupará uma das funções de Estado, certamente o será também, nada indicando que no caso do Ministério Público, a elegibilidade seja universal dentre os integrantes da carreira, máxime na hipótese do legislador entender que a experiência adquirida ao longo da carreira é conditio sine qua non para o exercício da função de Chefe da Instituição.

 

                                                         Nesse passo, é de ser dito, também, que a escolha para a função de Presidente do Tribunal de Justiça é ditada pelo Art. 62 da Constituição Estadual[11], limitando a escolha aos Desembargadores integrantes do Órgão Especial. A base dessa disposição está no inciso I do artigo 96 da Constituição Federal[12], que igualmente não limita a eleição dos órgãos diretivos aos Desembargadores, tal como no caso dos Ministérios Públicos Estaduais. Todavia, não é razoável supor que um juiz de Direito, quiçá um juiz substituto, possa ser eleito para ocupar a função de Presidente do Tribunal de Justiça, de modo que plenamente adequada e justificável a opção legislativa adotada na Constituição Estadual, o mesmo raciocínio devendo ser utilizado em relação à escolha dos integrantes da lista tríplice a ser encaminhada ao Governador do Estado, para escolha do Procurador-Geral de Justiça.

 

                                                         O Pretório Excelso já examinou idêntica hipótese, em decisão proferida pela Minª. ELLEN GRACIE, na condição de Presidente daquele sodalício, quando do exame do pedido de Suspensão de Liminar, formulado contra decisão do Egrégio Superior Tribunal de Justiça que assegurou, em sede de cautelar, a inscrição e participação de Promotores de Justiça de Sergipe no processo eleitoral (SL 134/SE, j. 26.10.2006, DJ 01.11.2006, p. 00025).

 

                                                         Ressalte-se que embora a matéria não tenha sido examinada pelo Plenário da Suprema Corte, a decisão acima referida demonstra que não se vislumbrou viabilidade de acolhimento da tese que sustenta a inconstitucionalidade de normas que restringem a participação de Promotores de Justiça, como candidatos, no processo de escolha do novo Chefe da instituição.

 

                                                         Todavia, o Pretório Excelso teve oportunidade de se manifestar em caso por tudo semelhante ao tratado nesta ação. Tratava-se da ADI nº 1.040/DF, relatada pela Minª. ELLEN GRACIE, julgada em 11 de novembro de 2004, publicada no Diário da Justiça de 1º de abril de 2005, p. 5, e no Ementário Vol. 2185-01, p. 66. O acórdão também foi publicado na RTJ 194-03, pg. 754, tendo por requerente o Procurador-Geral da República e requeridos o Presidente da República e o Congresso Nacional. O julgado ficou assim ementado:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 187 DA LEI COMPLEMENTAR Nº 75/93. EXIGÊNCIA DE UM BIÊNIO NA CONDIÇÃO DE BACHAREL EM DIREITO COMO REQUISITO PARA INSCRIÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO PARA INGRESSO NAS CARREIRAS DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO. ALEGADA OFENSA AOS ARTS. 5º, I, XIII E 37, I DA CF. 1. A exigência temporal de dois anos de bacharelado em Direito como requisito para inscrição em concurso público para ingresso nas carreiras do Ministério Público da União, prevista no art. 187 da Lei complementar nº 75/93, não representa ofensa ao princípio da razoabilidade, pois, ao contrário de se afastar dos parâmetros da maturidade pessoal e profissional a que objetivam a norma, adota critério objetivo que a ambos atende. 2. Ação direta de inconstitucionalidade que se julga improcedente.”

 

                                                         Interessante notar que a Procuradoria-Geral da República se utilizou de argumento idêntico ao desenvolvido pela requerente nesta ação, conforme consta do relatório do acórdão: “Opinou a Procuradoria-Geral da República, no parecer de fls. 79/83, pela procedência da ação, assinalando ‘que a expressão ‘há pelo menos dois anos’ inscrita no art. 187 da Lei Complementar nº 75/93 é inconstitucional, por violar os princípios da razoabilidade e da isonomia e afrontar os arts. 5º, incisos I e XIII, e 37, inciso I, da Constituição Federal’”

 

                                                         Além disso, a medida cautelar foi negada, ajustando-se a ementa como luva à tese aqui discutida. Trata-se da ADI-MC/DF, relatada pelo Min. NÉRI DA SILVEIRA, julgado em 9 de março de 1994, pelo Pleno, publicado no Diário da Justiça de 17 de março de 1995, p. 5.788 e no Ementário Vol. 1779-02, p. 58. Assim a ementa:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA CAUTELAR.

2. Argüição de inconstitucionalidade do art. 187 da Lei Complementar nº. 75, de 20/5/1993 (LEI ORGÂNICA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO), alegando-se incompatibilidade da norma com os incisos I, XIII e LIV do art. 5º, e como art. 37, I, todos da Constituição.

3. Em linha de princípio, impende entender que a Constituição reserva à lei estipular requisitos e condições ao provimento de cargos públicos, por via de concurso, também no que concerne a qualificações profissionais e inclusive idade. As restrições da lei à admissão ao concurso para provimento de cargos ou ao exercício de ofício, decerto, não podem constituir obstáculo desarrazoado à aplicação dos princípios da acessibilidade de todos aos cargos públicos ou da liberdade para o exercício de ofício ou profissão.

4. E juízo cautelar, não se tem, no caso, desde logo, como desarrazoada a norma de lei complementar que prevê o interstício de dois anos, a partir do término do curso jurídico, para o bacharel em direito concorrer ao provimento de cargo do Ministério Público da União. TRATAMENTO DA MATÉRIA NA LEGISLAÇÃO ANTERIOR. RAZÕES GERAIS DE CONVENIÊNCIA E O JUÍZO POLÍTICO DO LEGISLADOR.

5. "Periculum in mora”, no caso concreto, que também não se verifica.

6. Cautelar indeferida. (g.n.)

 

                                                         Como se nota, a questão da conveniência e o juízo político do legislador foram afirmados pelo Pretório Excelso, em hipótese por tudo semelhando à tratada nestes autos. Daí nos posicionarmos pela improcedência da ação, ante a perfeita coerência do artigo 10, caput, bem como dos §§ 1º e 2º, e seu inciso VII, todos da Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993, com a norma do artigo 94, inciso II da Constituição Estadual.

 

São Paulo, 19 de agosto de 2008.

 

PEDRO FRANCO DE CAMPOS

Procurador-Geral de Justiça substituto



[1] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional. 6. Ed. Coimbra: Almedina, 1993, págs. 601 a 627.

[2] SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 14. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 401.

[3] SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 9. ed, Rio de Janeiro: Forense, 1986, p. 63.

[4] KELSEN, Hans. Teoría General del Estado. Trad. Luis Legaz Lacambra. Granada: Editorial Comares, 2002, p. 386.

[5] MARIENHOFF, Miguel S. Tratado de Derecho Administrativo. Buenos Aires: Abeledo-Perrot, 2003, p. 219.

[6] MIRANDA, Jorge. Teoria do Estado e da Constituição. Coimbra: Coimbra Editores, 2002, p. 349.

[7] HAURIOU, Maurice. Principios de Derecho Público Y Constitucional. Trad. Carlos Ruiz Del Castillo. Granada: Editorial Comares, 2003, p. 517.

[8]  ENTERRÍA, Eduardo García. FERNÁNDEZ, Tomás-Ramón. Curso de Derecho Administrativo I. 12. ed, reimpressa. Madrid: Civitas, 2005, p. 127.

[9] Art. 95. O Ministério Público federal tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República, dentre cidadãos maiores de trinta e cinco anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada.

[10] ZIPPELIUS. Reinhond. Teoria Geral do Estado. Trad. António Cabral de Moncada. 2. ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian. 1984, p. 238.

[11] Artigo 62 - O Presidente e o 1º Vice-Presidente do Tribunal de Justiça e o Corregedor Geral da Justiça, eleitos, a cada biênio, pela totalidade dos Desembargadores, dentre os integrantes do órgão especial, comporão o Conselho Superior da Magistratura.

[12] Art. 96. Compete privativamente:

I - aos tribunais:

a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos;