Autos
n. 156.730.0/5-00
Autor:
Prefeito Municipal de Santa Cruz do Rio Pardo
Objeto
de impugnação:
Lei Municipal n. 2.203, de 7 de novembro de 2007, do Município de Santa Cruz
do Rio Pardo.
Colendo Órgão Especial
O Prefeito Municipal de Santa Cruz do
Rio Pardo propôs a presente ação direta objetivando a declaração de
inconstitucionalidade da Lei Municipal n. 2.203, de 7 de novembro de 2007, que dispõe sobre a obrigatoriedade de
borracharias, empresas de recauchutagem e revendedores de pneus em geral,
adotarem medidas para evitar a existência de criadouros de Aedes Aegypt e dá
outras providências.
O texto normativo está reproduzido a fls.
85.
Entende o autor ser o ato normativo
contrário à Constituição do Estado de São Paulo, em especial aos artigos 5º, 25
e 144.
Registre-se que a iniciativa legislativa
foi parlamentar. Houve veto por parte do Chefe do Executivo, sob o fundamento
da inconstitucionalidade. A Câmara Municipal, porém, rejeitou o veto.
A liminar foi deferida pelo Nobre
Desembargador Relator JARBAS MAZZONI, conforme se vê da R. Decisão de fls. 107/110.
Foram requisitadas informações à Câmara Municipal, prestadas a fls. 131/138.
É uma breve síntese.
Preliminarmente, requer-se seja a Procuradoria-Geral
do Estado citada para se manifestar nos autos.
No mérito, a ação é procedente.
A lei municipal sindicada na presente
ação direta é flagrantemente inconstitucional, pois, sendo de iniciativa
parlamentar, não poderia dispor sobre as formas de combate à dengue e, muito
menos, obrigar o Prefeito Municipal a regulamentar o texto normativo (art. 3º).
De observar que a lei sindicada é de
iniciativa parlamentar e recebeu veto do Poder Executivo que, no entanto, acabou
rejeitado.
Por isso, é possível concluir pela
inconstitucionalidade se a lei for contrastada com os arts. 5º, 25, 47 e 144 da
Constituição do Estado de São Paulo, que estabelecem:
Art. 5º. São Poderes do Estado, independentes e
harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
Art. 25. Nenhum projeto de lei que implique a criação
ou o aumento de despesa pública será sancionado sem que dele conste a indicação dos recursos disponíveis, próprios
para atender aos novos encargos.
Art. 47. Compete privativamente ao Governador, além
de outras atribuições previstas nesta Constituição:
II - exercer, com o auxílio dos Secretários de Estado, a direção superior
da administração estadual;
Art. 144. Os Municípios,
com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto
organizarão por Lei Orgânica, atendidos
os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.
A lei municipal, em função das
determinações apontadas acima, interfere na administração do município.
Ao Prefeito,
por exercer funções de governo, compete o planejamento,
a organização, a direção, o comando, a coordenação e o controle dos
serviços públicos (cf. José Afonso da Silva, “O Prefeito e o Município”, 1977,
págs. 134/143), de tal forma que a lei municipal, de iniciativa parlamentar,
não pode determinar como vai se dar referida administração.
Há flagrante violação, portanto, ao
princípio da separação de poderes, mesmo porque, na sempre atual lição de Hely
Lopes Meirelles, “a atribuição típica e predominante
da Câmara é a normativa, isto é, a de regular a administração do
Município e a conduta dos munícipes no que afeta aos interesses locais. A
Câmara não administra o Município; estabelece, apenas, normas de
administração. Não executa obras e serviços públicos; dispõe, unicamente, sobre
sua execução. Não compõe nem dirige o funcionalismo da Prefeitura; edita,
tão-somente, preceitos para sua organização e direção. Não arrecada nem aplica
as rendas locais; apenas institui ou altera tributos e autoriza sua arrecadação
e aplicação. Não governa o Município; mas regula e controla a atuação
governamental do Executivo, personalizado no prefeito. Eis aí a distinção
marcante entre a missão normativa da Câmara e a função executiva
do prefeito; o Legislativo delibera e atua com caráter regulatório genérico
e abstrato; o Executivo consubstancia os mandamentos da norma legislativa
em atos específicos e concretos de administração (...) A interferência de um
Poder no outro é ilegítima, por atentatória da separação institucional de suas
funções”.
Mas não é só. Há que se pensar na questão
dos recursos a serem destinados à execução da lei municipal, o que certamente
depende de orçamento em cuja elaboração deverá ser objeto de dotação
específica.
A Lei Municipal,
portanto, também deveria indicar os recursos disponíveis para o cumprimento
dessa obrigação. Por não tê-lo feito, representa clara ingerência do
Legislativo nas prerrogativas do Poder Executivo.
Registre-se que o Legislativo não
deliberou sobre um programa geral, pois criou, concretamente, atribuições ao Poder Executivo e determinou o
modo de execução.
Sendo assim, também violou o art. 25 da
Lei Maior paulista, que veda qualquer projeto de lei que implique a criação ou
o aumento de despesa pública sem que
dele conste a indicação dos recursos disponíveis, próprios para atender
aos novos encargos.
Assim, apesar da nobreza da Lei Municipal
n. 2.203, de 7 de novembro de 2007, do Município de Santa Cruz do Rio Pardo, é de ser declarada a sua
inconstitucionalidade.
São
Paulo, 8 de setembro de 2008.
MAURÍCIO AUGUSTO GOMES
PROCURADOR DE JUSTIÇA,
no exercício de função delegada
pelo Procurador-Geral de Justiça