Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Ação Direta de Inconstitucionalidade 157.692-0/8-00

Requerentes: Partido Progressista, Partido Comunista do Brasil e Partido dos Trabalhadores

Requeridos: Prefeito e Câmara Municipal de Santa Bárbara D’Oeste

 

 

 

“Ação direta de inconstitucionalidade. Lei municipal. Ajuizamento por diretórios municipais de partidos políticos. Exegese do art. 90, II, da Constituição Paulista. O diretório municipal de partido político não detém legitimidade ativa, mesmo em se tratando de lei municipal, para o ajuizamento da ação, que compete ao diretório regional. Ilegitimidade ativa. Extinção do processo sem resolução do mérito.

Processo legislativo. Lei orçamentária anual. Quorum de instalação e de deliberação. Art. 10, § 1º, Constituição Estadual. Nas votações por maioria simples existem dois momentos diferenciados de análise do quorum: o de instalação requer a maioria absoluta dos membros da casa; o de deliberação, satisfeito o primeiro, demanda maioria dos presentes. Improcedência da ação”.

 

 

Egrégio Tribunal:

 

 

1.                Partidos políticos (Partido Progressista, Partido Comunista do Brasil e Partido dos Trabalhadores) ajuizaram ação direta de inconstitucionalidade impugnando a Lei n. 3.207 de 2007 do Município de Santa Bárbara D’Oeste em face dos arts. 5º, I e XXXV, 37 caput e 47, da Constituição Federal, do art. 10, § 1º, da Constituição Estadual, e preceitos da Lei Orgânica Municipal (arts. 5º, 15, V, 16, II, 34, IV), do Regimento Interno da Câmara Municipal (art. 121), do Estatuto das Cidades (arts. 43, II, e 44), e da Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 48), porque na apreciação e deliberação da lei orçamentária anual (válida para o exercício de 2008) não foi convocada audiência pública e na votação, na sessão ordinária de 05 de dezembro de 2007, foi desrespeitado o quorum de instalação (maioria absoluta dos membros) requerido no art. 47, da Constituição Federal, no art. 10, § 1º, da Constituição Estadual e no art. 121 do Regimento Interno, e, ademais, o autógrafo não foi assinado pelos agentes competentes (fls. 02/09).

 

2.                A liminar foi negada (fl. 303) e a Fazenda Pública do Estado de São Paulo manifestou desinteresse no processo (fls. 315/317).

 

3.                A Câmara Municipal argüiu preliminar de ilegitimidade ativa de diretório municipal de partido político e sustentou a constitucionalidade da lei impugnada (fls. 321/338). O Prefeito Municipal também defendeu a legitimidade do ato normativo (fls. 741/752).

 

4.                Ab initio, é incabível no controle judiciário abstrato, concentrado e direto de constitucionalidade de lei municipal seu contraste com dispositivos de lei orgânica municipal, de regimento interno da corporação legislativa e de leis infraconstitucionais, à luz do art. 125, § 2º, da Constituição Federal.

 

5.                Com relação ao contraste com a Constituição Federal, sua pertinência é limitada aos preceitos reproduzidos na Constituição Estadual ou aos princípios da Constituição Federal, nos termos do art. 144 da Constituição Estadual. E não bastasse, somente diante de antinomia frontal e direta da lei local, observação igualmente hígida para preceitos específicos da Constituição Estadual.

 

6.                 Neste sentido:

“É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, antes e depois de 1988, no sentido de que não cabe a tribunais de justiça estaduais exercer o controle de constitucionalidade de leis e demais atos normativos municipais em face da Constituição Federal” (STF, ADI 347, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 20-10-2006).


Competência — Ação direta de inconstitucionalidade — Lei municipal contestada em face da Carta do Estado, no que repete preceito da Constituição Federal. O § 2º do artigo 125 do Diploma Maior não contempla exceção. A competência para julgar a ação direta de inconstitucionalidade é definida pela causa de pedir lançada na inicial. Em relação ao conflito da norma atacada com a Lei Máxima do Estado, impõe-se concluir pela competência do Tribunal de Justiça, pouco importando que o preceito questionado mostre-se como mera repetição de dispositivo, de adoção obrigatória, inserto na Carta da República. Precedentes: Reclamação n. 383/SP e Agravo Regimental na Reclamação n. 425, relatados pelos ministros Moreira Alves e Néri da Silveira, com acórdãos publicados nos Diários de Justiça de 21 de maio de 1993 e 22 de outubro de 1993, respectivamente” (STF, RE 199.293, Rel. Min. Marco Aurélio, 19-05-2004).

 

“O nosso sistema constitucional não admite o controle concentrado de constitucionalidade de lei ou ato normativo municipal em face da Constituição Federal; nem mesmo perante o Supremo Tribunal Federal que tem, como competência precípua, a sua guarda, art. 102. O único controle de constitucionalidade de lei e de ato normativo municipal em face da Constituição Federal que se admite é o difuso, exercido 'incidenter tantum', por todos os órgãos do Poder Judiciário, quando do julgamento de cada caso concreto” (RTJ 164/832).

 

7.                A preliminar argüida suscitando a ilegitimidade ativa de diretório municipal de partidos políticos autores desta demanda merece amparo conforme enuncia a jurisprudência deste egrégio Tribunal de Justiça:

“ADIN. Lei Municipal que dispõe sobre a criação e extinção de cargos de servidores municipais. Exegese do art. 90, II, da Constituição Paulista. Diretório Municipal de Partido Político que não detém legitimidade ativa, mesmo em se tratando de lei municipal, para o ajuizamento da ação. Representação que compete ao Diretório regional do Partido Político. Ilegitimidade ativa ad causam reconhecida. Processo extinto sem julgamento do mérito” (TJSP, ADI 135.781-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. Carlos Stroppa, v.u., 19-09-2007).

 

“Ação direta de inconstitucionalidade - Lei Orgânica do Município de Sandovalina, que revoga integralmente a anterior – sustentada violação aos arts. 22, 111 e 144 da Constituição Estadual, porque ‘constata-se claramente que a Lei Orgânica do Município de Sandovalina, promulgada em 05 de Abril de 1990, somente poderia ser emendada, como ocorre na Carta da República e na Carta Paulista’, em obediência ao poder constituinte derivado. - Órgão Municipal de partido político, por seu Presidente representado, não detém legitimidade para pugnar, em ação direta, a inconstitucionalidade de lei municipal - processo julgado extinto, sem resolução do mérito” (TJSP, ADI 138.863-0/0-00, Órgão Especial, Rel. Des. Palma Bisson, v.u., 01-08-2007).

 

8.                Se superada a preliminar, no mérito a ação deve ser analisa unicamente sob o prisma do art. 10, § 1º, da Constituição Estadual, que reproduz o art. 47 da Constituição Federal.

 

9.                O dispositivo estadual assim está redigido:

“Salvo disposição constitucional em contrário, as deliberações da Assembléia Legislativa e de suas Comissões serão tomadas por maioria de votos, presente a maioria absoluta de seus membros”.

 

10.              Na Constituição Estadual, a deliberação da lei orçamentária atende a esse preceito, por força do art. 175, § 4º, ambos extensivos aos Municípios por obra do art. 144 da mesma Carta Política Bandeirante.

 

11.              Invocável abalizada lição de José Afonso da Silva sobre o similar art. 47 da Constituição Federal, sublinhando que “a regra geral estabelecida pela Constituição é a de que o quorum para deliberações seja o da maioria de votos, presente a maioria absoluta dos membros da Casa ou da Comissão” (Comentário contextual à Constituição, São Paulo: Malheiros, 2006, 2ª edição, p. 394). A norma, portanto, estabelece como regra para deliberação a maioria simples, mas, o quorum de instalação da sessão é a maioria absoluta. Disserta Alexandre de Moraes que “o que a Constitucional Federal exige é um quorum mínimo para instalação da sessão, com a finalidade de garantir representatividade à votação, ou seja, pretende evitar que um projeto seja aprovado por um número ínfimo de parlamentares. Dessa forma, presente, no mínimo, a maioria absoluta dos membros da respectiva Casa Legislativa – e, portanto, assegurada a representatividade adequada -, o projeto poderá ser posto em votação, aplicando-se como quorum de votação a maioria dos presentes”. E enfatiza: “nas votações por maioria simples existem dois momentos diferenciados onde o quorum deve ser analisado. Primeiramente, o quorum de instalação, onde deverá estar presente a maioria absoluta dos membros da casa. Posteriormente, satisfeito o quorum inicial, a deliberação será aprovada pela maioria dos presentes” (Constituição do Brasil Interpretada, São Paulo: Atlas, 2002, p. 990).

 

12.              A ata da quadragésima quinta reunião ordinária da Câmara Municipal de Santa Bárbara D’Oeste (fls. 142/162), realizada em 05 de dezembro de 2007, revela que a sessão foi instalada para votação, dentre outros, do projeto de lei orçamentária, com a presença dos doze edis (fls. 143, 348), perfazendo o quorum constitucionalmente exigido para instalação. Após a leitura do expediente, esse quorum permaneceu (fl. 151) e foram lidas as emendas ao projeto de lei. Ingressando na ordem do dia, mantido o mesmo quorum (fl. 157), a sessão foi suspensa por alguns minutos e, constatado, na reabertura, o mesmo quorum (fl. 157), iniciando-se a discussão quando propôs um dos parlamentares obstrução com retirada do plenário (fls. 158/159), agora, com número menor (seis). Ora, no caso, foi aprovado o projeto pela maioria simples dos presentes, após regularmente instalada a sessão com a observância da maioria absoluta.

 

13.              Opino pela extinção do processo sem resolução do mérito por ilegitimidade ativa e, se superada a preliminar, pela improcedência da ação.                   

 


                   São Paulo, 11 de abril de 2008.

 

 

MAURÍCIO AUGUSTO GOMES
PROCURADOR DE JUSTIÇA

no exercício de função delegada

pelo Procurador-Geral de Justiça