Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 159.446-0/0-00

Requerente: Partido Democrático Trabalhista

Requerida: Câmara Municipal de Araçariguama

 

 

 

“Ação direta de inconstitucionalidade. Lei municipal. Ajuizamento por diretório municipal de partido político. Exegese do art. 90, II, da Constituição Paulista. O diretório municipal de partido político não detém legitimidade ativa, mesmo em se tratando de lei municipal, para o ajuizamento da ação, que compete ao diretório regional. Ilegitimidade ativa. Extinção do processo sem resolução do mérito.

Lei orçamentária anual. Imperfeição do processo legislativo. Inconstitucionalidade. Violação dos arts. 5º, 19, II, 28, 112, 144, 174, § 6º, 175 e § 4º, da Constituição Estadual. Procedência da ação.

 

 

Egrégio Tribunal,

Colendo Órgão Especial,

Douto Relator:

 

 

1.           Cuida-se de ação direta de inconstitucionalidade impugnando a Lei n. 453, de 15 de janeiro de 2008, do Município de Araçariguama, lei orçamentária anual, por ofensa aos arts. 4º, 5º, 19, II, 28, 111, 112, 144, 174, § 6º, 175 e § 4º, da Constituição Estadual (fls. 02/35), com pedido liminar denegado (fls. 441/442). Solicitadas informações (fls. 445/446), o Procurador-Geral do Estado manifestou desinteresse no feito (fls. 451/453).

 

2.            Partido político, por seu diretório municipal, é parte ilegítima para promoção de ação direta de inconstitucionalidade, conforme enuncia a jurisprudência deste egrégio Tribunal de Justiça:

“ADIN. Lei Municipal que dispõe sobre a criação e extinção de cargos de servidores municipais. Exegese do art. 90, II, da Constituição Paulista. Diretório Municipal de Partido Político que não detém legitimidade ativa, mesmo em se tratando de lei municipal, para o ajuizamento da ação. Representação que compete ao Diretório regional do Partido Político. Ilegitimidade ativa ad causam reconhecida. Processo extinto sem julgamento do mérito” (TJSP, ADI 135.781-0/3-00, Órgão Especial, Rel. Des. Carlos Stroppa, v.u., 19-09-2007).

 

“Ação direta de inconstitucionalidade - Lei Orgânica do Município de Sandovalina, que revoga integralmente a anterior – sustentada violação aos arts. 22, 111 e 144 da Constituição Estadual, porque ‘constata-se claramente que a Lei Orgânica do Município de Sandovalina, promulgada em 05 de Abril de 1990, somente poderia ser emendada, como ocorre na Carta da República e na Carta Paulista’, em obediência ao poder constituinte derivado. - Órgão Municipal de partido político, por seu Presidente representado, não detém legitimidade para pugnar, em ação direta, a inconstitucionalidade de lei municipal - processo julgado extinto, sem resolução do mérito” (TJSP, ADI 138.863-0/0-00, Órgão Especial, Rel. Des. Palma Bisson, v.u., 01-08-2007).

 

3.           Em conseqüência, opina-se pela extinção do processo sem exame do mérito.

 

4.           Observa, prima facie, que é admissível o exame abstrato, concentrado e direto da constitucionalidade da lei orçamentária anual, mormente se é apontado defeito no processo legislativo respectivo. Capta-se da jurisprudência da Suprema Corte que “mostra-se adequado o controle concentrado de constitucionalidade quando a lei orçamentária revela contornos abstratos e autônomos, em abandono ao campo da eficácia concreta” (STF, ADI 2.925-DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, 19-12-2003, m.v., DJ 04-03-2005, p. 10), mercê de entendimentos diversos considerando a impossibilidade em face de lei de diretrizes orçamentárias, “porque reputadas normas individuais ou de efeitos concretos, que se esgotam com a propositura e a votação do orçamento fiscal (v.g., ADIn 2100, JOBIM, DJ 01.06.01)” (STF, ADI-MC 2.35-MT, Tribunal Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 19-12-2001, m.v., DJ 21-11-2003, p. 07, RTJ 193/73).

 

5.           No mérito, o projeto de lei do orçamento anual, de 2008, foi aprovado em primeira discussão (fls. 108/110) na sessão de 04 de dezembro de 2007. Convocada a Edilidade para a segunda discussão, esta resultou infrutífera por falta de quorum (fls. 116/131) e por outros motivos (fls. 126/131) – estes, pelo sinal, condutores de sustação dos efeitos por ordem judicial (fls. 436/437) -, sendo convocada nova sessão para 15 de janeiro de 2008 (fl. 138) igualmente sem sucesso (fls. 140/141). Além disso, dos elementos apresentados na petição inicial constam certidões evidenciando que não foi emitido parecer sobre a redação final do projeto de lei nem expedido autógrafo (fl. 245) e, tampouco, audiência pública (fl. 247).

 

6.           As regras do processo legislativo do orçamento municipal devem observância ao modelo estadual por força do art. 144 da Constituição Estadual. Assim, há de seguir a elaboração da lei orçamentária anual no município o quanto disposto na Constituição do Estado. Um dos pontos que animou a promoção desta ação foi a imperfeição do processo legislativo. O art. 19, II, em consonância ao art. 175, ambos da Constituição Paulista, submetem à aprovação do projeto de lei orçamentária anual ao Poder Legislativo, observadas as demais normas do processo legislativo conforme reza seu § 4º. Claro está que não houve deliberação final da Câmara Municipal. Nem aprovação na forma regimental, reclamada no art. 28 da Constituição Estadual. As exigências regimentais de discussão em dois turnos (art. 238, § 1º, c) e expedição de autógrafo (art. 258) não foram observadas. 

 

7.           Tampouco se primou pela observância da necessária publicidade em sua íntegra o ato normativo resultante desse processo legislativo, nódoa que culminou com a violação ao art. 112 da Constituição Estadual. Com efeito, os atos normativos exigem publicação integral para proporcionar o conhecimento geral e impessoal de seu conteúdo e demarcar o início de sua vigência e eficácia, não se admitindo publicação resumida ou por extrato.

 

8.           Tudo isso sem contar a oposição de imperfeição do próprio processo legislativo pelas falhas apontadas e pela ofensa ao art. 174, § 6º, da Constituição Bandeirante, exigente do acompanhamento, ao projeto de lei, de demonstrativo dos efeitos decorrente de renúncias fiscais e benefícios tributários, financeiros e creditícios. A medida é salutar, pois, institui norma de responsabilidade fiscal na elaboração e aprovação do orçamento, inibindo dispêndios diretos e renúncias sem lastro na proposta orçamentária globalmente considerada ou desprovida da avaliação de seus efeitos na evolução das finanças públicas.

 

9.           Inconteste, portanto, a violação ao princípio da separação dos poderes (art. 5º, Constituição do Estado) porque, em síntese, se o Poder Legislativo não deliberou a matéria de forma regimental não tem o Chefe do Poder Executivo a possibilidade de sancionar e publicar a lei.

 

10.         Opina-se pela procedência da ação se não acolhida a preliminar de extinção sem exame do mérito por ilegitimidade ativa.

 

             São Paulo, 25 de junho de 2008.

 

 

MAURÍCIO AUGUSTO GOMES

PROCURADOR DE JUSTIÇA

no exercício de função delegada

pelo Procurador-Geral de Justiça