AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE

 

 

 

Processo número 159.577-0/8-00

 

Requerente: Prefeito Municipal de Barbosa

 

Objeto: Lei Municipal n. 1.737, de 08 de dezembro de 2006 e a expressão “e não poderá ultrapassar a quantia de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), do art. 4º, da Lei n. 1.774, de 29 de janeiro de 2008.

 

 

 

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente,

 

 

 

                                               Trata-se de ação ajuizada pelo Prefeito Municipal de Barbosa, visando a declaração de inconstitucionalidade da Lei n. 1.737, de 08 de dezembro de 2006, que “Veda ao Executivo Municipal de Barbosa a realização, organização, participação ou apoio, de qualquer espécie, a eventos de qualquer natureza sem a expressa autorização legislativa, através de lei municipal”  e da expressão “e não poderá ultrapassar a quantia de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), do art. 4º, da Lei n. 1.774, de 29 de janeiro de 2008, que “Dispõe sobre autorização para realização da 18ª Festa do Peão de Boiadeiro, nos termos da Lei Municipal n. 1737/2006, e dá outras providências. A inicial menciona a violação do princípio da independência e harmonia entre os poderes por se tratar de matéria de competência de iniciativa do Poder Executivo, de forma a afrontar o art. 5, da  Constituição do Estado de São Paulo.

                                              O pedido liminar foi deferido, consoante decisão de fls. 52. A Câmara Municipal deixou de prestar informações. O Procurador-Geral do Estado foi citado, mas não  manifestou interesse na presente ação (fl. 60/62).

 

                                               É o relato do necessário.

                  

 

 

 

 

 

                                               O pedido merece ser julgado parcialmente procedente.

                                              

                                     A primeira lei em questão deriva de projeto parlamentar. Depois de vetado pelo Prefeito, o projeto terminou promulgado pela Câmara de Vereadores.

 

                                               Referida legislação, veda ao Executivo Municipal, a realização, organização, participação ou apoio de eventos sem que haja a expressa concordância do Legislativo local. A segunda Lei, apesar de ser de iniciativa do Poder Executivo, foi emendada pelo Legislativo, para a introdução no art. 4º, da limitação do valor de R$ 35.000,00, para a realização da 18ª Festa do Peão e Boiadeiro do Município de Barbosa.

 

                                               No que diz respeito ao pedido de declaração da inconstitucionalidade da expressão “ e não poderá ultrapassar a quantia de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), introduzida  pelo art. 4º da Lei Municipal n. 1774, de 29/01/2008, o mesmo perdeu seu objeto,  na medida em que se trata de lei municipal temporária, que dispunha  sobre a autorização  para a realização da 18º Festa do Peão de Boiadeiro, que já ocorreu.

 

                                               Isto porque, com a realização da mencionada Festa, referida lei não tem mais utilidade e validade.

 

                                               No entanto, o mesmo não acontece com a Lei Municipal n. 1737/2006, de 08 de dezembro de 2006, que se afigura inconstitucional, por contrariar o art. 5º e 144,  da Constituição do Estado de São Paulo eis que contém evidente  vício de iniciativa.  A dicção de tais dispositivos é a seguinte:

 

                                               "Art. 5.º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

 

 

 

 

 

                                               Art. 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição."

                                                                                                                                                                                                         Com se pode observar, através da lei  impugnada,  foi vedado ao Executivo Municipal de Barbosa, a realização, organização, participação ou apoio, de qualquer espécie, a eventos de qualquer natureza, sem a expressa autorização do Poder Legislativo.

 

                                               Ocorre, porém, que tais matérias são relativas ao planejamento e funcionamento da Administração Municipal e, portanto, a competência para legislar sobre referidos assuntos é privativa do Chefe do Executivo.

 

                                               As regras de fixação de competência para a iniciativa do processo legislativo têm como corolário o princípio da separação dos poderes, que nada mais é do que o mecanismo  jurídico      que serve à organização do Estado, definindo órgãos, estabelecendo competências e marcando as relações recíprocas entre esses mesmos órgãos (cf. Manoel Gonçalves Ferreira Filho, em “Do Processo Legislativo”, ed. Saraiva, pp. 111/112).

 

                                               E o processo legislativo estabelecido pela Constituição do Estado prevê que, são leis de iniciativa do Poder Executivo, as que dizem à gestão  administrativa. Isso porque, sendo matérias afetas ao funcionamento e planejamento da Administração Municipal, é importante que a ele se reserve a iniciativa de leis que tratem  dessas matérias. Para Manoel Gonçalves Ferreira Filho “o aspecto fundamental da iniciativa reservada está em resguardar a seu titular a decisão de propor direito novo em matérias confiadas à sua especial atenção, ou de seu interesse preponderante” (ob. cit., p. 204).

              

                                               Desatendida essa exclusividade, como no caso em exame, fica patente a inconstitucionalidade, em face de vício de iniciativa.

 

 

 

Sobre isso, ensinou Hely Lopes Meirelles que se “a Câmara, desatendendo à privatividade do Executivo para esses projetos, votar e aprovar leis sobre tais matérias, caberá ao Prefeito vetá-las, por inconstitucionais. Sancionadas e promulgadas que sejam, nem por isso se nos afigura que convalesçam de vício inicial, porque o Executivo não pode renunciar prerrogativas institucionais inerentes às suas funções, como não pode delegá-las aquiescer em que o Legislativo as exerça” (em “Direito Municipal Brasileiro”, 7º ed., 1990, págs. 544/545).

 

                                               Esse modelo constitucional é de observância obrigatória pelos municípios, por força do disposto no art. 144, da Constituição Estadual.

 

 

                                               Diante do exposto, manifesto-me  pela  extinção do processo sem julgamento do mérito, com relação ao pedido de declaração da inconstitucionalidade da expressão “ e não poderá ultrapassar a quantia de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais), introduzida  pelo art. 4º da Lei Municipal n. 1774, de 29/01/2008 e pela procedência  desta  ação para que seja declarada a inconstitucionalidade da Lei n. 1.737, de 08 de dezembro de 2006, que “Veda ao Executivo Municipal de Barbosa a realização, organização, participação ou apoio, de qualquer espécie, a eventos de qualquer natureza sem a expressa autorização legislativa, através de lei municipal”, do Município de Barbosa,  por ofensa ao disposto nos artigos 5.º, e  144, da Constituição do Estado de São Paulo.

 

 

São Paulo, 04 de junho de 2008.

 

 

MAURÍCIO AUGUSTO GOMES

PROCURADOR DE JUSTIÇA

no exercício de função delegada

pelo Procurador-Geral de Justiça