Ação Direta de Inconstitucionalidade
Processo
nº162.009-0/4-00
Requerente:
Diretório Municipal do Partido Democrático Brasileiro
Objeto:
Lei Municipal nº1.011, de 13 de novembro de 2007, de Avaré.
Ementa: 1)Ação direta de inconstitucionalidade. Diretório Municipal de Partido
Político. Ilegitimidade ativa. Indicação de parâmetros de controle
constitucionais federais. Inépcia da inicial. Extinção sem exame do mérito
(art.267 VI e 295 I do CPC, c.c o art.4º da Lei nº 9868/99). 2)Lei Ordinária Municipal. Criação da Contribuição para o Custeio da
Iluminação Pública (CIP). 3)Matéria de lei ordinária. Adequação ao permissivo constitucional
(art.149-A CR/88, red. EC nº 39/02). Ausência da violação da isonomia. Não
aplicação do princípio da capacidade contributiva, limitado aos impostos
(art.145 §1º CR/88; e art.160 §1º da Constituição Paulista). 4)Parcial inconstitucionalidade. Não
observância da anterioridade especial - prazo de noventa dias para entrada em
vigor (art.150 III c CR/88, red. EC
nº 42/03, aplicável por força do art.144 da Constituição Paulista). Valor da
contribuição definido mediante “rateio” do valor da fatura de energia
elétrica do Município. Equiparação a taxa (art.145 II da CR/88; art.160 II da
Constituição Paulista. 5)Necessidade de interpretação conforme a Constituição quanto à entrada
em vigor, e declaração da inconstitucionalidade do dispositivo que fixa a
fórmula para o cálculo do valor da contribuição. |
Colendo Órgão Especial
Excelentíssimo Desembargador Relator
1)Relatório.
Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade
proposta pelo Diretório Municipal do Partido Democrático Brasileiro, de Avaré,
tendo como alvo a Lei Municipal nº1.011, de 13 de novembro de 2007, daquele
Município, que “Institui no âmbito da
Estância Turística de Avaré a Contribuição para Custeio dos Serviços de
Iluminação Pública e dá outras providências”.
Fundamenta o pedido de declaração de
inconstitucionalidade nos seguintes argumentos: (a) não observância do prazo de
noventa dias para entrada em vigor (art.150 III c da CR/88); (b) necessidade de lei complementar (art.146 III a da CR/88); (c) foi violado o princípio
da isonomia tributária (art.150 II da CR/88).
Indeferida a liminar (fls.68), foram
prestadas informações pelo Senhor Prefeito Municipal (fls.84/92) e pela
Presidência da Câmara Municipal (fls.93/105), que sustentaram a
constitucionalidade da norma.
Este é o breve relato do que consta dos
autos.
2)Preliminar: ausência de legitimidade
ativa do autor.
A
ação direta de inconstitucionalidade foi proposta por representação municipal
de partido político.
O entendimento que tem prevalecido é de
que o diretório local de partido político não tem legitimidade para dar início
ao processo objetivo.
Aliás,
tal conclusão decorre de posicionamento análogo do E. STF no sentido de que só
partidos com representação no Congresso Nacional estão habilitados à
propositura de ações diretas perante a Suprema Corte. Nesse sentido, confira-se
o seguinte julgado:
“Ilegitimidade ativa ad causam de Diretório Regional ou Executiva Regional. Firmou a jurisprudência desta Corte o entendimento de que o Partido Político, para ajuizar ação direta de inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, deve estar representado por seu Diretório Nacional, ainda que o ato impugnado tenha sua amplitude normativa limitada ao Estado ou Município do qual se originou.” (ADI 1.528-QO, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ de 23-8-02).
Tal entendimento também vem sendo
adotado perante esse E. Tribunal de Justiça.
Como
anotou em caso concreto o i. Desembargador Mohamed Amaro:
“Por força do disposto na Constituição Federal, artigo 103, podem propor ação de inconstitucionalidade”(...); VIII- partido político com representação no Congresso Nacional. E, na esfera estadual, para propor ação de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estaduais ou municipais, contestados em face da Constituição do Estado, esta, em seu artigo 90, confere, e, assim, tem legitimidade, no âmbito de seu interesse: “(...) os partidos políticos com representação na Assembléia Legislativa, ou, em se tratando de lei ou ato normativo municipais, na respectiva Câmara.” E nos limites de sua atuação estadual, o partido político é representado pelo órgão regional. Portanto, somente o diretório regional é que detém legitimidade para impugnar leis ou atos normativos perante o Tribunal de Justiça. Segue-se, pois que somente o diretório local no Município é destituído de legitimidade para a referida impugnação. Na espécie dos autos, a presente ação foi proposta pelo citado partido político, “através de seu diretório local no Município de Jarinú”. Destarte, não detendo a representação regional do partido, o autor é parte ilegítima para a propositura da presente ação, cuja carência implica na extinção do processo sem exame de mérito, conforme já decidiu este Egrégio Tribunal de Justiça.”(ADI n.62.965-0/7).
Do
mesmo modo, destacou o i. Desembargador Viseu Júnior, na ADI nº96.068.0/7, que:
“...Não tem o Diretório Municipal de Partido Político legitimidade para ajuizar a ação em tela, mesmo em se tratando de lei municipal. A pertinência subjetiva para a instauração do controle abstrato, perante o Tribunal de Justiça, cabe somente no respectivo Diretório Regional. Processo extinto sem exame de mérito.”
No mesmo sentido: ADI 92.661-0/4,
92.903-0/0, 96.345-0/1, 113.408-0/1, 135.319-0/6-00, 135.781-0/3-00, 156.146-0/0.
Deste
modo, requer-se a extinção do feito sem exame do mérito, por ilegitimidade do
autor, nos termos do art.267 VI do CPC.
3)Preliminar: ausência de indicação de
parâmetro constitucional estadual.
De outro lado, da leitura da inicial se constata que a
impugnação da lei municipal foi formulada sem que tenha o autor indicado
parâmetros de controle situados na Constituição Estadual, apontando exclusivamente
para dispositivos da Constituição Federal.
A falta de indicação de parâmetro
estadual de controle releva inépcia da inicial, na medida em que é ônus do
autor indicar, na inicial, “os
fundamentos jurídicos do pedido em relação a cada uma das impugnações”, nos
termos do art.3º I da Lei nº9868/99, que dispõe sobre o processo e julgamento
das ações diretas de inconstitucionalidade perante o E. STF, analogicamente
aplicável ao processo de controle de constitucionalidade no âmbito dos
Tribunais de Justiça dos Estados.
Nesse
sentido, no E. STF:
"É pacífica a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, antes e depois de 1988, no sentido de que não cabe a Tribunais de Justiça estaduais exercer o controle de constitucionalidade de leis e demais atos normativos municipais em face da Constituição Federal." (ADI 347, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 20-10-06, DJ de 20-9-06). No mesmo sentido: RE 421.256, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgamento em 26-9-06, DJ de 24-11-06.
Assim, a solução é o indeferimento da
inicial, com fundamento no art.4º da Lei nº9868/99, c.c. o art.295 I do CPC.
4)Mérito.
Superadas as preliminares caso seja
conhecida a ação direta, no mérito comportará apenas parcial procedência.
A Lei Municipal nº1001, de 13 de novembro
de 2007, de Avaré, conforme respectiva rubrica, “Instituiu no âmbito da Estância Turística de Avaré a Contribuição para
Custeio dos Serviços de Iluminação Pública e dá outras providências”.
A criação de tributo dessa natureza,
nada obstante a jurisprudência anterior do E. STF que assentou a
inconstitucionalidade das denominadas “Taxas de Iluminação Pública”, foi
autorizada pela EC nº39/02, que acrescentou ao texto da Constituição da
República o art.149-A, com a seguinte redação:
“Art.149-A. Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art.150, I e III.
Parágrafo único. É facultada a cobrança da contribuição a que se refere o caput, na fatura de consumo de energia elétrica.”
A edição de lei municipal criando, concretamente, o
referido tributo, se dá com amparo no referido permissivo constitucional.
Restaria saber se, no caso concreto,
por alguma disposição peculiar contida na lei, estaria presente
incompatibilidade vertical entre esta e o ordenamento constitucional.
Na matriz constitucional tributária, as
contribuições têm como característica peculiar, que as singulariza com relação
aos demais tributos, a sua destinação. Como anota Roque Antônio Carrazza, em
lição aplicável à hipótese em exame, “a
regra-matriz constitucional destas contribuições agrega, de modo indissociável,
a idéia de destinação. Queremos com tal assertiva sublinhar que, por imperativo
da Lei Maior, os ingressos advindos da arrecadação destes tributos devem
necessariamente ser destinados à viabilização das atividades mencionadas no
art.149 da CF” (Curso de Direito
Constitucional Tributário, 22ªed., São Paulo, Malheiros, 2006, p.558).
Em outras palavras, a intenção do
constituinte foi criar uma nova espécie tributária, à parte com relação aos
impostos, taxas e contribuições de melhoria, que possui um regime peculiar - em
que pese a aplicação de princípios gerais do direito constitucional tributário
-, e cuja receita será sempre destinada a uma finalidade específica, o
fundamento último da sua própria instituição.
É evidente que os Municípios possuem,
em razão de sua autonomia, a possibilidade de legislar em matéria tributária,
criando tributos que se amoldem à matriz constitucional tributária (art.30 III
da CR/88).
Ao fazê-lo, entretanto, não devem
descurar dos limites traçados pelo próprio constituinte. Em outras palavras, o
legislador municipal deve concretizar, no respectivo âmbito territorial, aquilo
que decorre dos padrões essenciais traçados na Constituição.
Pode-se então, no caso em exame,
afirmar que não houve violação do princípio da isonomia tributária, apontado
pelo autor através do art.150 II da CR/88, e também assentado no art.163 II da
Carta Paulista.
A contribuição é definida em função de
sua finalidade constitucionalmente assentada, qual seja o custeio do serviço de
iluminação pública.
A lei que a institui prevê o montante
que todos versarão para o alcance dessa finalidade, não havendo violação à
isonomia por não se estabelecer distinção, como pretendido pelo autor, quanto
às características do imóvel beneficiário do serviço, ou mesmo às condições do
contribuinte.
Anote-se que o princípio da capacidade
contributiva, previsto no art.145 §1º da CR/88, e no art.160 §1º da
Constituição Paulista, com o devido respeito a entendimento diverso, aplica-se
apenas aos impostos, e não às demais espécies tributárias.
Deste modo, como o serviço de
iluminação pública é prestado indistintamente a todos, nada impede que a
Contribuição de Iluminação Pública seja estipulada, de forma generalizada, por
meio de um valor fixo.
De
outro lado, o fato de ter sido instituída a Contribuição de Iluminação Pública
por meio de lei ordinária, e não lei complementar, não traduz incompatibilidade
vertical com nossa sistemática constitucional.
A exigência de lei complementar contida
no art.146 da CR/88 não induz ao raciocínio de que todo e qualquer tributo terá
que ser instituído por esta espécie legislativa, mas sim que o diploma
legislativo que estabelece as regras gerais em matéria tributária deve ser, no
plano da hierarquia das normas, lei complementar.
Daí afirmar a doutrina, comentando o
art.146 da CR/88, que “o CTN não é
completo ao definir tributo e suas espécies. Isso porque adveio à época da
classificação tripartida de tributos (impostos, taxas e contribuições de
melhoria). Com a classificação quinquipartida, embasada na Constituição de
1988, temos uma nova realidade. A questão da referibilidade das contribuições
especiais, e.g., poderia ser tratada pelo legislador em nível complementar. A
Doutrina e a jurisprudência é que estão suprindo a ausência da lei, extraindo
as características de cada espécie tributária diretamente a partir do texto
constitucional”(Leandro Paulsen, Direito
Tributário, 9ªed., Porto Alegre, Livraria do Advogado editora, 2007, p.88).
Ou seja, se a lei complementar
tributária – norma geral, consistente no Código Tributário Nacional – não
tratou dos princípios gerais relativos à Contribuição de Iluminação Pública,
não deve haver óbice a que a própria lei municipal, ainda que ordinária, ao
instituir referido tributo, defina seus elementos essenciais (fato gerador,
sujeito passivo, base de cálculo, alíquota, etc.), desde que não se afaste da
matriz constitucional do referido tributo.
Como anota Roque Antônio Carrazza, a
respeito do princípio da legalidade tributária, “no Brasil, só o Poder Legislativo, de regra por meio de lei ordinária, pode criar ou aumentar
tributos” (Curso de Direito
Constitucional Tributário, cit., p.268, g.n.).
Em outros termos, o que o princípio da
legalidade tributária propicia é a segurança jurídica, e a garantia, para o
contribuinte, de que só por meio de lei formal será instituído ou majorado
tributo. Outro, portanto, é o campo da lei complementar tributária, o que,
aliás, é reconhecido, de forma geral, pela doutrina (Cf. Hugo de Brito Machado,
Curso de Direito Tributário, 17ªed.,
São Paulo, Malheiros, 2000, p.62/63; Paulo de Barros Carvalho, Curso de Direito Tributário, 18ªed., São
Paulo, Saraiva, 2007, p.207 e ss; entre outros).
Entretanto, há, de fato, duas
inconstitucionalidades na lei.
São elas: (a) o desrespeito ao prazo de
noventa dias para a vigência (cf. art.11, que determinou sua entrada em vigor
em 1º de janeiro de 2007, em que pese sua publicação em 13 de novembro de
2007); e (b) a forma de cálculo do valor da contribuição (cf. §1º do art.3º,
que prevê o simples rateio, do valor total da fatura dos serviços de iluminação
pública, pelas unidades de consumo particular).
4.a)Inconstitucionalidade da fórmula
para definição do valor da Contribuição.
Quanto à fórmula adotada para o cálculo
do valor da contribuição, incidiu o legislador municipal em ofensa a princípio
constitucional estabelecido (art.144 da Constituição Paulista), decorrente da
aplicação da matriz constitucional tributária assentada no art.149-A da CR/88.
Plenamente aplicável, nesse passo, a
lição de Roque Antônio Carrazza, no sentido de que não é possível que “a base de cálculo da exação seja o custo
global do serviço de iluminação pública, que, como vimos quando tratamos das
taxas (...), vem prestado uti universi, não sendo, pois, específico e divisível
(caso do serviço de fornecimento domiciliar de energia elétrica), já que nele
não se pode distinguir a quantidade de benefício que cada pessoa obtém no
território do Município ou do Distrito Federal. Noutras palavras, é incogitável o rateio, entre os
contribuintes, do custo global do serviço em apreço” (Curso de Direito Constitucional Tributário,
cit., p.607, g.n.).
A razão para tanto é evidente. O
serviço de iluminação pública é prestado uti
universi, de forma indivisível, não passível de mensuração específica com
relação a cada contribuinte que dele usufrui.
Foi por essa razão que o E. STF
pacificou seu entendimento no sentido da inconstitucionalidade da cobrança de
taxa de iluminação pública, editando, inclusive, o verbete nº 670 da súmula da
sua jurisprudência dominante, com a seguinte redação:
“Súmula nº 670. O serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa”.
Deste modo, ao instituir a Contribuição de
Iluminação Pública, não pode o legislador municipal tratá-la como se taxa de
serviço público fosse, simplesmente repartindo entre todos os contribuintes
o valor da fatura mensal do Município. Fazendo-o, afasta-se da matriz
tributária constitucional, instituindo tributo não previsto no ordenamento
jurídico.
Também não seria possível adotar
alíquotas progressivas, por exemplo, por que o E. STF já assentou que elas só
podem ser adotadas nos estritos limites contemplados na Constituição da
República.
Nesse sentido:
“Tratando-se
de matéria sujeita a estrita previsão constitucional — CF, art. 153, § 2º, I;
art. 153, § 4º; art. 156, § 1º; art. 182, § 4º, II; art. 195, § 9º
(contribuição social devida pelo empregador) — inexiste espaço de liberdade
decisória para o Congresso Nacional, em tema de progressividade tributária,
instituir alíquotas progressivas em situações não autorizadas pelo texto da
Constituição. (...)” (ADC 8-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em
13-10-99, DJ de 4-4-03; g.n.).
“ESTRUTURA PROGRESSIVA DAS ALÍQUOTAS. A PROGRESSIVIDADE EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA SUPÕE EXPRESSA AUTORIZAÇÃO CONSTITUCIONAL. RELEVO JURÍDICO DA TESE. Relevo jurídico da tese segundo a qual o legislador comum, fora das hipóteses taxativamente indicadas no texto da Carta Política, não pode valer-se da progressividade na definição das alíquotas pertinentes à contribuição de seguridade social devida por servidores públicos em atividade. Tratando-se de matéria sujeita a estrita previsão constitucional – CF. art.153, §2º, I ; art.153, §4º; art.156, §1º; art.182, §4º, II; art.195, §9º (contribuição social devida pelo empregador)- inexiste espaço de liberdade decisória para o Congresso Nacional, em tema de progressividade tributária, instituir alíquotas progressivas em situações não autorizadas pelo texto da Constituição (...)” (STF, Plenário, ADI 2.010-2/DF, rel. Min. Celso de Mello, set/99, DJ 12.04.2002, p.51; g.n.)
Deste
modo, para a definição da base de cálculo da Contribuição de Iluminação
Pública, “deverá existir uma
razoabilidade entre o custo do serviço público e o valor exigido do
contribuinte”, como anota Leandro Paulsen (Direito Tributário, cit., p.167).
Nesse sentido é que pode ser
compreendida a afirmação de Ricardo Lobo Torres, de que “a contribuição de iluminação pública deve respeitar os princípios de
justiça, principalmente o custo / benefício e a solidariedade do grupo”(Tratado de Direito Constitucional Financeiro
e Tributário, vol. IV, Rio de Janeiro, Renovar, 2007, p.649).
Em
outras palavras, deve o legislador escolher um valor fixo, dentro de parâmetros
razoáveis (sem progressividade, e sem que se signifique a simples divisão da
fatura de energia do Município entre os contribuintes), e determinar a sua
cobrança indistintamente. Essa é a solução que se afigura, em nosso sentir,
constitucionalmente legítima.
4.b)Inconstitucionalidade do termo
inicial da cobrança da Contribuição.
Finalmente, caso não seja declarada a
inconstitucionalidade da regra que estabelece a fórmula para o cálculo do valor
da Contribuição de Iluminação Pública, restará a questão do termo inicial para
sua cobrança.
O
desrespeito à anterioridade especial de noventa dias, prevista no art.150 III c da CR/88 (red. EC nº 42/03), é
sinônimo de violação de um princípio estabelecido, por isso aplicável aos
Municípios e invocável como parâmetro de controle no âmbito estadual, nos
termos do art.144 da Constituição Paulista.
A respeito disso, assentou o E. STF que
é imprescindível a observância das limitações constitucionais ao poder de
tributar, dentre elas a prevista no art. 150 III c, com a redação dada pela EC nº 42/03, o denominado “prazo nonagesimal - para que a lei
tributária se torne eficaz." (ADI 3.694, Rel. Min. Sepúlveda Pertence,
julgamento em 20-9-06, DJ de 6-11-06).
No
mesmo sentido, especificamente quanto à Contribuição de Iluminação Pública, é o
posicionamento de Leandro Paulsen (Direito
Tributário, cit., p.166).
Nesse particular, não é necessária a
simples anulação do dispositivo constitucional que gerou desrespeito à
anterioridade especial.
A doutrina e a jurisprudência evoluíram, no sentido de
admitir novas técnicas para o controle de constitucionalidade das leis. Atualmente,
a própria legislação admite métodos alternativos, e, entre eles, a declaração
de inconstitucionalidade sem redução de texto, bem como a interpretação
conforme a Constituição.
O parágrafo único do art.28 da Lei nº 9868/99 prevê
expressamente que “a declaração de
constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação
conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem
redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos
demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e
municipal”.
O reconhecimento da inconstitucionalidade sem redução
de texto significa, em outras palavras espécie de redução teleológica na
eficácia da norma, enquanto a interpretação conforme tem o condão de destacar
qual a única interpretação válida a ser conferida a determinado texto
legislativo, compatibilizando-o com a Constituição (na doutrina, por todos, v.
Gilmar Ferreira Mendes e Ives Gandra da Silva Martins, Controle concentrado de constitucionalidade – comentários à Lei 9868,
de 10-11-1999, 2ªed., 2ª tir., São Paulo, Saraiva, 2007, p.407/419; e ainda
Oswaldo Luiz Palu, Controle de
constitucionalidade, 2ªed., São Paulo, RT, 2001, p.188/191).
Tais técnicas podem ser aplicadas no
âmbito do controle concentrado estadual. Se o Tribunal de Justiça pode “o mais”
(rectius= declarar a
inconstitucionalidade da norma), deve também poder “o menos” (rectius= dizer qual das interpretações
possíveis é constitucionalmente aceitável, tornando-a vinculante).
No caso em exame, a cláusula de
vigência da lei (“a partir de 1º de janeiro de 2008”), se interpretada
literalmente, rende ensejo à vertical incompatibilidade com o princípio da
anterioridade especial, inserido no art.150 III c da CR/88 e aplicável ao Município por força do art.144 da
Constituição Paulista.
Entretanto, uma interpretação
sistemática permitiria extrair da cláusula de vigência – sem necessidade de
declará-la inconstitucional – a exegese no sentido de que a lei que institui
o tributo entrou em vigor no exercício de 2007, mas sua cobrança só deveria ter
início 90 (noventa) dias após a publicação da lei. Esse E. Tribunal pode
declarar a inconstitucionalidade do dispositivo de vigência da lei, sem redução
de texto, conferindo-lhe, destarte, interpretação conforme a Constituição.
5)Conclusão.
Diante do exposto, nosso parecer é no sentido da
extinção do feito sem exame do mérito, pelos motivos expostos anteriormente.
Em caráter alternativo, caso conhecida
a ação, deverá ser julgada parcialmente procedente, para: (a) declaração da
inconstitucionalidade do §1º do art.3º da Lei nº1001/2007, de Avaré; (b) e caso
não acolhido o vício acima alegado, seja reconhecida a inconstitucionalidade
sem redução de texto e interpretação conforme à Constituição do art.11 da Lei
nº1001/2007, para que seja determinado o início de cobrança da Contribuição de
Iluminação Pública apenas noventa dias após a publicação da lei instituidora,
ocorrida em 13 de novembro de 2007.
São Paulo, 10 de julho de 2008.
Maurício Augusto Gomes
Procurador de Justiça
no exercício de função delegada
pelo Procurador-Geral de Justiça