Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

Processo nº  163.230-0/0

Requerente: Prefeito de Presidente Prudente

Objeto: Lei Municipal nº 6.748/2008, do Município de Presidente Prudente

 

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

 

 

1) Relatório.

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade movida pelo Prefeito Municipal de Presidente Prudente, tendo por objeto a Lei Municipal n.º 6.748/2008, de 7 de abril de 2008, que “dispõe sobre recebimento, pelas agências bancárias, de contas de água, luz, telefone, taxas, impostos municipais, estaduais, federais de qualquer valor, no âmbito do Município”.

Sustenta o autor que o projeto que a antecedeu iniciou-se na Câmara Municipal e que estabelece indevidas obrigações à Administração, como a de fiscalizar, instaurar processo administrativo e impor penalidades a instituições bancárias que não se adequarem à norma.

A Lei teve a vigência e eficácia suspensas ex nunc, atendendo-se ao pedido liminar (fls. 9).

O Presidente da Câmara Municipal, citado por via postal (fls. 22), não se manifestou .

A Procuradoria-Geral do Estado declinou da defesa do ato impugnado, observando que o tema é de interesse exclusivamente local (fls. 19/21).

Este é o breve resumo do que consta dos autos.

2) Fundamentação.

Deflui dos autos que a Lei em análise decorre de projeto de autoria do Vereador José Caetano Silva (fls. 7) e tem por escopo obrigar instituições bancárias a disponibilizar “caixas físicos” (sic) aos “cidadãos e/ou usuários” para o pagamento boletos e faturas de água, luz, telefone, taxas e tributos.

É sabido que compete à União legislar sobre os serviços bancários e que esse E. Tribunal de Justiça já declarou inconstitucionalidade de lei municipal que tratava da matéria, afirmando a violação do Princípio Federativo:

Ao desacatar o princípio constitucional de que à União compete privativamente legislar sobre o funcionamento dos bancos, [a lei] contrariou o diploma legal ora impugnado o artigo 144 da Constituição do Estado - que ordena atendam os Municípios os princípios estabelecidos nas Constituições Federal e Estadual - e ainda o seu artigo 1º, que expressamente acolheu - repita-se - o Princípio Federativo, pelo qual a capacidade normativa dos Municípios é exercida em conformidade com a divisão de competência prevista nas Constituições.

E violou, igualmente, o Princípio da Separação dos Poderes do Estado, consagrado no artigo 5o da Carta Estadual, na medida em que impôs ao Poder Executivo, através de sua Secretaria de Serviços Urbanos, a realização de tarefas que não são de sua competência, qual a de cumprir e zelar pela observância de atos autorizados por normas inconstitucionais, inclusive o recebimento das denúncias contra os bancos e o processamento administrativo das reclamações e imposição de multas (ADin nº 74.304-0/4 - SÃO PAULO, Rel. Dante Busana, 3.4.2002).

De toda sorte, há uma violação mais evidente da Constituição Bandeirante

É que somente ao Chefe do Poder Executivo assiste a iniciativa de leis que criem – como é o caso – obrigações e deveres para órgãos municipais (art. 47, inc. II da Constituição Estadual, de aplicação extensível aos municípios por força do art. 144 da mesma Carta).

Note-se que a lei em análise, concebida na Câmara dos Vereadores, impõe à Administração o ônus de impor multa às instituições renitentes, cassar alvarás de funcionamento e instaurar processo administrativo, através do Procon Municipal (art. 2º. a 4º.).

Invadiu-se, à evidência, a seara da administração pública, da alçada exclusiva do Prefeito, violando-se a prerrogativa deste em analisar a conveniência e oportunidade das providências que a lei quis determinar. Bem por isso, a matéria somente poderia objeto de tramitação legislativa por proposta do próprio Chefe do Poder Executivo.

Ofendeu-se, igualmente, o princípio basilar da separação de poderes. Como já proclamou esse Sodalício:

“Ao Executivo haverá de caber sempre o exercício de atos que impliquem no gerir as atividades municipais. Terá, também, evidentemente, a iniciativa das leis que lhe propiciem a boa execução dos trabalhos que lhe são atribuídos.  Quando a Câmara Municipal, o órgão meramente legislativo, pretende intervir na forma pela qual se dará esse gerenciamento, está a usurpar funções que são de incumbência do Prefeito” (Adin n. 53.583-0, rel. Des. FONSECA TAVARES).

Nesse panorama, divisa-se como solução deste processo a declaração de inconstitucionalidade, pois “se a Câmara, desatendendo à privatividade do Executivo para esses projetos, votar e aprovar leis sobre tais matérias, caberá ao prefeito vetá-las, por inconstitucionais. Sancionadas e promulgadas que sejam, nem por isso se nos afigura que convalesçam do vício inicial, porque o Executivo não pode renunciar prerrogativas institucionais, inerentes às suas funções, como não pode delegá-las ou aquiescer que o Legislativo as exerça”[1].

3) Conclusão.

Diante do exposto, nosso parecer é no sentido da integral procedência desta ação direta, declarando-se a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 6.748/2008, do Município de Presidente Prudente.

 

São Paulo, 20 de agosto de 2008.

 

 

 

 

Maurício Augusto Gomes

Procurador de Justiça

no exercício de função delegada

pelo Procurador-Geral de Justiça

/jesp



[1] Hely Lopes Meirelles. Direito Municipal Brasileiro, 16ª. ed., São Paulo: Malheiros, 2008,  p. 748.