Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade

Autos nº. 163.712-0/0

Requerente: Associação dos Auditores Fiscais da Prefeitura Municipal de Campinas - AFISCAMP

Objeto: Rol de atribuições dos cargos de AGENTE FISCAL TRIBUTÁRIO e de AGENTE DO TESOURO MUNICIPAL, constantes do Anexo II – A e a expressão AGENTE DO TESOURO MUNICIPAL mencionada por três vezes no art. 54 (que alterou a redação dos art. 3º, 5º e 12 da Lei Municipal nº 9.146, de 16 de dezembro de 1.996), ambos da Lei Municipal nº 12.985/2007.

Ementa: Ação direta de inconstitucionalidade, movida por associação de servidores, da Lei nº 12.985, de 28 de junho de 2007, do Município de Campinas, que “dispõe sobre o plano de cargos, carreiras e vencimentos dos servidores do Município de Campinas e dá outras providências”. Ato normativo que altera denominações e atribuições de cargos de nível médio, fazendo com que estas coincidam, na prática, com as atribuições do cargo de AUDITOR FISCAL TRIBUTÁRIO MUNICIPAL. Hipótese de “transformação” de cargos e provimento sem concurso público, que não é viável a teor dos art. 111, 115, I e II, e 144 da Constituição do Estado. Lei que, ademais, estende prêmio de produtividade reservado ao AUDITOR FISCAL TRIBUTÁRIO MUNICIPAL aos cargos transformados. Inconstitucionalidade também sob esse aspecto, eis que a gratificação decorre da indevida equiparação dos cargos que a lei concretizou. Parecer pela declaração de parcial inconstitucionalidade da lei.

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

A ASSOCIAÇÃO DOS AUDITORES FISCAIS DA PREFEITURA MUNICIPAL DE CAMPINAS – AFISCAMP ajuizou a presente ação direta de inconstitucionalidade parcial da Lei nº 12.985, de 28 de junho de 2007, do Município de Campinas.

Explica a requerente que existem na Secretaria Municipal de Finanças do Município de Campinas, dentre outros, os cargos de AUDITOR FISCAL TRIBUTÁRIO, AGENTE FISCAL TRIBUTÁRIO e AGENTE DO TESOURO MUNICIPAL. Ao primeiro está reservada a atribuição legal e constituir e lançar crédito fiscal, com a percepção de prêmio de produtividade a título de gratificação, segundo dispõe outro diploma legislativo.

 Veio a Lei nº 12.985/07, ora impugnada, e, revogando a Lei 12.012/04, igualou as atribuições dos cargos retrocitados, conforme se constata no anexo II do novel ato normativo, o que, para a associação requerente, constitui transformação de cargo, com investidura sem concurso público. Destaca-se que, com a promulgação da lei questionada, o prêmio de produtividade foi estendido aos cargos de AGENTE FISCAL TRIBUTÁRIO e de AGENTE DO TESOURO MUNICIPAL.

Aponta a violação dos artigos 111, 144, 155, inc. I e II, da Constituição Estadual. Cogita, também, de colidência com os arts. 25 e 169, pár. Único, I e II, da Carta Paulista, alegando que não foram indicados os recursos necessários para suportar a despesa acrescida.

O pedido liminar foi deferido (fls. 259).

Contra essa Decisão foi interposto pelo Prefeito agravo regimental, julgado intempestivo pelo v. Acórdão de fls. 383/384. Embargos de declaração foram igualmente rejeitados (fls. 410/412).

Citado, o Senhor Procurador-Geral do Estado declinou de realizar a defesa do ato normativo impugnado (fls. 270/272).

O Prefeito Municipal prestou informações, defendendo a constitucionalidade do ato normativo. Afirmou que são distintas as atribuições dos cargos em análise, ressaltando que ao AUDITOR FISCAL foi reservado o lançamento de tributos mais complexos (como o ISS), isto é, os que demandam auditoria, enquanto os demais cargos cuidam de impostos de procedimento simplificado, como o IPTU e o ITBI. Diferencia as atividades de lançamento, fiscalização de tributos, análise de mapa de valores e notificação do sujeito passivo, segundo a natureza dos cargos em comparação. No mais, assevera que a extensão do prêmio de produtividade às carreiras de nível médio decorre do exercício da discricionariedade administrativa e que, por isso, é “insindicável”. Por fim, refuta a alegação de imprevisibilidade do impacto financeiro da gratificação instituída. Pede a improcedência da ação. Subsidiariamente, pugna: a) pela interpretação conforme a Constituição, para excluir do âmbito do lançamento, fiscalização e notificação do ISS os agentes fiscais tributários e os agentes do tesouro municipal; b) pelo acolhimento parcial, para suspender a alegada equiparação de funções, mantendo o prêmio de produtividade aos agentes fiscais tributários e aos agentes do tesouro municipal; c) por efeitos ex nunc, para o resguardo dos atos praticados e vencimentos já recebidos, como autoriza o art. 27 da Lei nº 9.868/99 (fls. 331/378).

Este é o breve resumo do que consta dos autos.

Os dispositivos impugnados são, de fato, incompatíveis com os artigos 111, 115, I e II, e 144 da Constituição Paulista, verbis:

Artigo 111 - A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, obedecerá aos princípios de moralidade, impessoalidade (...).

Artigo 115 - Para a organização da administração pública direta e indireta, inclusive as funções instituídas ou mantidas por qualquer dos Poderes do Estado, é obrigatório o cumprimento das seguintes normas:

I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei;

II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia, em concurso público de provas ou de provas e títulos, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão, declarado em lei de livre nomeação e exoneração;

Artigo 144 - Os Municípios, com autonomia política, legislativa, administrativa e financeira se auto-organizarão por Lei Orgânica, atendidos os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

No município de Campinas, a vetusta Lei nº 5.767, de 16 de janeiro de 1987, criou os cargos de FISCAL TRIBUTÁRIO I, II e III, de provimento efetivo (art. 5º), com ingresso na carreira mediante concurso público.

Tais cargos tiveram sua denominação alterada pela Lei nº 8.340, de 26 de maio de 1995, para AUDITOR FISCAL TRIBUTÁRIO.

As atribuições desses cargos constaram, inicialmente, dos sucessivos editais de concurso de provimento dos cargos, até que, com a promulgação da Lei nº 12.012, de 29 de junho de 2004, passaram a constar da legislação. As atribuições do AUDITOR FISCAL TRIBUTÁRIO foram indicadas no Anexo V (mencionado no art. 17 da mesma lei), nos seguintes termos:

1.      Executar tarefas de fiscalização de tributos da municipalidade;

2.      Analisar a escrituração fiscal de prestadores de serviços e de imobiliários;

3.      Realizar buscas e apreensões de documentos fiscais;

4.      Autuar contribuintes em infração;

5.      Auditar os processos da área da administração tributária-financeira;

6.      Participar de programas de planejamento e programação fiscal;

7.      Emitir pareceres parciais e/ou conclusivos sobre documentos auditados;

8.      Atender e prestar informações ao contribuinte;

9.      Realizar vistorias técnicas e diligências fiscais;

10.  Executar outras tarefas da mesma natureza, ou nível de complexidade, associadas a sua especialidade e ambiente organizacional.

Os requisitos para o cargo, também constantes do Anexo V da Lei 12.012, foram definidos da seguinte forma:

Graduação em Administração, Ciências Contábeis, Direito ou Economia. Registro profissional no Conselho da Categoria, quando for o caso.

Cuidemos, agora, do cargo de AGENTE FISCAL TRIBUTÁRIO.

Até a promulgação da Lei nº 8.340, de 26 de maio de 1995, existiam na Secretaria de Finanças os cargos de CADASTRADOR e FISCAL DO SERVIÇO PÚBLICO. Essa lei agrupou os dois cargos (art. 13) sob a denominação de TÉCNICO DE CADASTRO FISCAL.

Para o preenchimento dos cargos de TÉCNICO DE CADASTRO FISCAL exigiu-se, por ocasião do primeiro concurso público, o 2º grau de escolaridade (Edital 3/97).

O cargo de TÉCNICO DE CADASTRO FISCAL teve sua denominação alterada para AGENTE PÚBLICO – ESPECIALIDADE TÉCNICO FISCAL TRIBUTÁRIO pela Lei nº 12.012/04. Por força desse último ato normativo, o rol de atribuições desse cargo é o seguinte:

1.      Executar vistoria técnica e diligências fiscais em imóveis para cadastramento tributário, incluindo medição de áreas construídas com elaboração de croquis;

2.      Preencher e controlar planilhas de informação cadastral a fim de preparar lançamento tributário;

3.      Preparar e instruir processo de natureza tributária;

4.      Promover a manutenção do cadastro fiscal por meio informatizado;

5.      Elaborar relatórios circunstanciados sobre aspecto tributário e natureza cadastral;

6.      Notificar e/ou intimar, inclusive com lavratura de auto de infração e imposição de multa para cumprimento de obrigação tributária acessória;

7.      Executar outras tarefas de mesma natureza ou nível de complexidade, associadas à sua especialidade e ambiente organizacional.

Com a edição da Lei nº 12.985/07, cuja constitucionalidade ora se discute, o cargo de AGENTE PÚBLICO – ESPECIALIDADE TÉCNICO FISCAL TRIBUTÁRIO passou a se chamar AGENTE FISCAL TRIBUTÁRIO. Suas atribuições também foram modificadas, conforme adiante se verá.

No que diz respeito ao cargo de AGENTE DO TESOURO MUNICIPAL, pode-se dizer que foi criado pela Lei nº 8.340, de 26 de maio de 1995, mediante previsão de seu art. 14, que o denominava TÉCNICO DO TESOURO MUNICIPAL.

Exigiu-se o 2º grau completo dos candidatos ao preenchimento das vagas, como comprova o Edital de concurso nº 01/95.

O cargo em questão foi redenominado pela Lei nº 12.012/04, passando a se chamar AGENTE PÚBLICO MUNICIPAL – TÉCNICO FISCAL TRIBUTÁRIO. Esse mesmo diploma normativo estipulou as atribuições do cargo, a saber:

1.      Planejar, organizar, controlar e assessorar, implementando programas e projetos;

2.      Elaborar planejamento organizacional, promovendo estudos e pesquisas;

3.      Preparar e instruir processos de natureza tributária;

4.      Promover a manutenção do cadastro fiscal, por meio informatizado, controlando dados e planilhas;

5.      Elaborar relatórios circunstanciados sobre aspectos tributários e natureza cadastral;

6.      Executar outras tarefas da mesma natureza ou nível de complexidade, associadas à sua especialidade.

A Lei nº 12.985/07 alterou a denominação do cargo em estudo para AGENTE DO TESOURO MUNICIPAL e redefiniu suas atribuições, conforme veremos em seguida.

Sobre o prêmio de produtividade mencionado na inicial, há notícia de que foi instituído em favor dos cargos de AUDITOR FISCAL TRIBUTÁRIO e TÉCNICO DE CADASTRO FISCAL, pela Lei nº 9.146, de 16 de dezembro de 1996. Essa mesma lei agrupou tais cargos na categoria de Agentes Fiscais Fazendários (art. 3º).

Pois bem.

A Lei nº 12.985, de 28 de junho de 2007 (encartada a fls. 73/92), “dispõe sobre o plano de cargos, carreira e vencimentos dos servidores do município de Campinas e dá outras providências”.

Para o deslinde da questão, reproduzem-se os seguintes dispositivos dessa lei:

Art. 3º Estão abrangidos por esta Lei:

I – Quadro Geral de Cargos; e

II – Quadro de Cargos da Saúde.

§ 1º Os quadros de cargos, com as respectivas denominações, quantitativos e requisitos de ingresso, são os constantes dos anexos I-A e I-B desta Lei.

(...)

Art. 4º Os quadros de cargos de que trata esta Lei são integrados por cargos de provimento efetivo subdivididos nos seguintes Grupos, conforme anexos I-A e I-B:

I – Cargos de Nível Fundamental: Grupos A, B e C;

II – Cargos de Nível Médio: Grupos D e E;

III – Cargos de Nível Técnico: Grupo F;

IV – Cargos de Nível Superior: Grupos G, H, I, J e K.

Parágrafo único - A cada Grupo corresponde uma Tabela de Vencimento.

(...)

Art. 6º As atribuições dos cargos são as constantes dos anexos II-A e II-B desta Lei, que correspondem à descrição genérica do conjunto de tarefas e responsabilidades cometidas ao servidor público, em razão do cargo em que está investido.

Parágrafo único - O Poder Executivo regulamentará as atribuições dos cargos em Decreto.

(...)

Art. 37. Ficam os cargos alterados e renomeados na conformidade dos anexos VI-A, VI-B e VII desta Lei, observadas as seguintes regras:

I – os cargos considerados na coluna “Situação Anterior” são aqueles definidos na Lei nº 9.340/97;

II – os cargos constantes da coluna “Situação Anterior” ficam com a denominação mantida ou alterada para a constante da coluna “Situação Nova”;

III – ficam criados os cargos constantes na coluna “Situação Nova” sem correspondência na coluna “Situação Anterior”.

(...)

Art. 43. O prazo para o enquadramento dos servidores é de até 270 (duzentos e setenta) dias, a contar da data da publicação desta Lei.

(...)

Art. 54. Ficam alterados os artigos 3º, 5º e 12 da Lei nº 9.146, de 16 de dezembro de 1996, que passam a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 3º O prêmio de produtividade a que faz jus o Auditor Fiscal Tributário Municipal, o Agente Fiscal Tributário e o Agente do Tesouro Municipal, é devido em razão do desempenho individual e do incremento da receita tributária própria da Prefeitura Municipal de Campinas, na forma estabelecida nesta Lei, a saber: (NR)

I – parcela habitual mensal, no valor correspondente a até 85% do respectivo padrão salarial do Auditor Fiscal Tributário Municipal, do Agente Fiscal Tributário e do Agente do Tesouro Municipal apurada com base no esforço individual, mensalmente avaliado, na forma estabelecida em decreto do Executivo, incorporável na forma da legislação municipal pertinente, observado o limite máximo de 85 % mês para 100 (cem) pontos/mês.” (NR)

“Art. 5º A parcela de incentivo à produtividade quadrimestral extraordinária será devida desde que atingido o limite mínimo de 400 (quatrocentos) pontos de produtividade do Auditor Fiscal Tributário Municipal, do Agente Fiscal Tributário e do Agente do Tesouro Municipal, os quais serão apurados e totalizados nos seguintes quadrimestres de referência: (NR)

I - de dezembro a março; (NR)

II – abril a julho; e (NR)

III – de agosto a novembro de cada exercício.” (NR)

“Art. 12 – O valor do prêmio produtividade devido ao Agente de Fiscalização passa a ser de até 85% (oitenta e cinco por cento) do padrão salarial, apurado com base no desempenho individual do servidor.”

(...)

Art. 59. Esta Lei consolida os cargos efetivos criados no âmbito da administração direta da Prefeitura Municipal de Campinas, com exceção dos cargos próprios do Magistério, da Orquestra Sinfônica Municipal e da Guarda Municipal, e revoga as disposições em contrário, em especial:

(...)

VIII – Lei n° 12.012/04, observado o disposto no artigo 43 desta Lei.

Parágrafo único - Os cargos da administração direta não mencionados nesta Lei ou nas legislações específicas do Magistério, da Orquestra Sinfônica Municipal ou da Guarda Municipal ficam extintos na data da publicação desta Lei.

Dos Anexos, reproduzem-se os seguintes quadros:

ANEXO I – A – QUADRO GERAL

QUADRO GERAL DE ENCARGOS

Denominação do cargo

Qtd

Exigência

Grupo

Auditor Fiscal Tributário Municipal

100

BACHAREL EM CIÊNCIAS CONTÁBEIS, DIREITO, ADMINISTRAÇÃO, ENGENHARIA, CIÊNCIA DA COMPUTAÇÃO, ECONOMIA, ANÁLISE DE SISTEMAS + REGISTRO PROFISSIONAL

H

Agente Fiscal Tributário

50

ENSINO MÉDIO COMPLETO

E

Agente do Tesouro Municipal

22

ENSINO MÉDIO COMPLETO

E

 

ANEXO II – A

ATRIBUIÇÕES DE CARGOS – QUADRO GERAL DE CARGOS

Denominação do cargo

Atribuições

Agente Fiscal Tributário

EXECUTAR ATIVIDADES INERENTES À ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA, INCLUINDO GERENCIAMENTO DE CADASTRO; CONSTITUIÇÃO, MEDIANTE

LANÇAMENTO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO; FISCALIZAÇÃO DE TRIBUTOS; NOTIFICAÇÃO DE SUJEITO PASSIVO; ANÁLISE DO MAPA DE VALORES IMOBILIÁRIOS E ANÁLISE DE PROCESSOS ADMINISTRATIVOS E ADMINISTRATIVOS TRIBUTÁRIOS.

Agente do Tesouro Municipal

EXECUTAR ATIVIDADES INERENTES À ADMINISTRAÇÃO ORÇAMENTARIA,

FINANCEIRA, CONTÁBIL E À ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA, INCLUINDO PREPARAÇÃO E INSTRUÇÃO DE PROCESSOS DE NATUREZA TRIBUTARIA;

CONSTITUIÇÃO, MEDIANTE LANÇAMENTO, DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO E ANÁLISE DO MAPA DE VALORES IMOBILIÁRIOS.

Auditor Fiscal Tributário Municipal

EFETUAR A CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO, PELO LANÇAMENTO DOS TRIBUTOS MUNICIPAIS, EXECUTAR TAREFAS DE FISCALIZAÇÃO DE TRIBUTOS MUNICIPAIS; ANÁLISE DO MAPA DE VALORES IMOBILIÁRIOS; NOTIFICAR, FISCALIZAR, AUDITAR E AUTUAR O SUJEITO PASSIVO; ATENDER E PRESTAR INFORMAÇÕES AO SUJEITO PASSIVO; REALIZAR VISTORIAS TÉCNICAS E DILIGÊNCIAS FISCAIS; EXECUTAR OUTRAS TAREFAS DA MESMA NATUREZA OU NÍVEL DE COMPLEXIDADE, ASSOCIADAS A SUA ESPECIALIDADE E ÁREA DE TRABALHO

 

ANEXO VI – A

ALTERAÇÃO DE CARGOS QUADRO GERAL

Denominação dos cargos

Situação anterior

Situação nova

Técnico de cadastro fiscal Jr

Agente Fiscal Tributário

Técnico do Tesouro Municipal Jr

Agente do Tesouro Municipal

Auditor Fiscal Tributário

Auditor Fiscal Tributário Municipal

 

Pode-se dizer que, com a edição da Lei nº 12.985/07, as atribuições dos cargos contrastados foram profundamente modificadas, como mostram as tabelas abaixo:

Cargo: AUDITOR FISCAL TRIBUTÁRIO MUNICIPAL

Atribuições anteriores

Atribuições novas

(a)    Executar tarefas de fiscalização de tributos da municipalidade;

(b)    Analisar a escrituração fiscal de prestadores de serviços e de imobiliários;

(c)     Realizar buscas e apreensões de documentos fiscais;

(d)    Autuar contribuintes em infração;

(e)    Auditar os processos da área da administração tributária-financeira;

(f)      Participar de programas de planejamento e programação fiscal;

(g)    Emitir pareceres parciais e/ou conclusivos sobre documentos auditados;

(h)     Atender e prestar informações ao contribuinte;

(i)      Realizar vistorias técnicas e diligências fiscais;

(j)      Executar outras tarefas da mesma natureza, ou nível de complexidade, associadas a sua especialidade e ambiente organizacional.

(a)    EFETUAR A CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO, PELO LANÇAMENTO DOS TRIBUTOS MUNICIPAIS,

(b)    EXECUTAR TAREFAS DE FISCALIZAÇÃO DE TRIBUTOS MUNICIPAIS; ANÁLISE DO MAPA DE VALORES IMOBILIÁRIOS;

(c)     NOTIFICAR, FISCALIZAR, AUDITAR E AUTUAR O SUJEITO PASSIVO;

(d)    ATENDER E PRESTAR INFORMAÇÕES AO SUJEITO PASSIVO;

(e)    REALIZAR VISTORIAS TÉCNICAS E DILIGÊNCIAS FISCAIS;

(f)      EXECUTAR OUTRAS TAREFAS DA MESMA NATUREZA OU NÍVEL DE COMPLEXIDADE, ASSOCIADAS A SUA ESPECIALIDADE E ÁREA DE TRABALHO

 

Cargo: AGENTE FISCAL TRIBUTÁRIO

Atribuições anteriores

Atribuições novas

(a)    Executar vistoria técnica e diligências fiscais em imóveis para cadastramento tributário, incluindo medição de áreas construídas com elaboração de croquis;

(b)    Preencher e controlar planilhas de informação cadastral a fim de preparar lançamento tributário;

(c)     Preparar e instruir processo de natureza tributária;

(d)    Promover a manutenção do cadastro fiscal por meio informatizado;

(e)    Elaborar relatórios circunstanciados sobre aspecto tributário e natureza cadastral;

(f)      Notificar e/ou intimar, inclusive com lavratura de auto de infração e imposição de multa para cumprimento de obrigação tributária acessória;

(g)    Executar outras tarefas de mesma natureza ou nível de complexidade, associadas à sua especialidade e ambiente organizacional.

(a)    EXECUTAR ATIVIDADES INERENTES À ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA, INCLUINDO GERENCIAMENTO DE CADASTRO;

(b)    CONSTITUIÇÃO, MEDIANTE LANÇAMENTO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO;

(c)     FISCALIZAÇÃO DE TRIBUTOS;

(d)    NOTIFICAÇÃO DE SUJEITO PASSIVO;

(e)    ANÁLISE DO MAPA DE VALORES IMOBILIÁRIOS E ANÁLISE DE PROCESSOS ADMINISTRATIVOS E ADMINISTRATIVOS TRIBUTÁRIOS.

 

Cargo: AGENTE DO TESOURO MUNICIPAL

Atribuições anteriores

Atribuições novas

(a)    Planejar, organizar, controlar e assessorar, implementando programas e projetos;

(b)    Elaborar planejamento organizacional, promovendo estudos e pesquisas;

(c)     Preparar e instruir processos de natureza tributária;

(d)    Promover a manutenção do cadastro fiscal, por meio informatizado, controlando dados e planilhas;

(e)    Elaborar relatórios circunstanciados sobre aspectos tributários e natureza cadastral;

(f)      Executar outras tarefas da mesma natureza ou nível de complexidade, associadas à sua especialidade.

(a)     EXECUTAR ATIVIDADES INERENTES À ADMINISTRAÇÃO ORÇAMENTARIA, FINANCEIRA, CONTÁBIL E À ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA, INCLUINDO PREPARAÇÃO E INSTRUÇÃO DE PROCESSOS DE NATUREZA TRIBUTARIA;

(b)    CONSTITUIÇÃO, MEDIANTE LANÇAMENTO, DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO E ANÁLISE DO MAPA DE VALORES IMOBILIÁRIOS.

 

Os cargos de nível médio, que antes tinham atribuições essencialmente burocráticas, passaram a executar, sem dúvida, muitas das funções do AUDITOR FISCAL TRIBUTÁRIO MUNICIPAL, pois, a par de “executar atividades inerentes à Administração Tributária”, passaram a constituir e lançar tributos.

A requerida obtemperou que o ato de lançamento não envolve complexidade e que aos AGENTES foram reservados os trabalhos relativos aos tributos que não demandam auditoria.

O argumento não convence, pois, como se nota, esse discrímen não está na lei.

Também não seduz o argumento de que a distinção dos cargos está na função de auditar, que ficou reservada aos AUDITORES FISCAIS, que têm nível superior.

A auditoria nada mais é do que o conjunto de operações contábeis destinadas a verificar a regularidade de determinada conduta fiscal. Essa atividade está implícita na de constituição e lançamento dos tributos, prevista para os cargos de AGENTES, mormente se considerarmos que, por força da nova lei, cabe-lhes, agora, analisar processos administrativos tributários ou mesmo prepará-los.

Na ordem constitucional vigente, o Município é entidade estatal integrante da Federação e foi dotado de autonomia política, administrativa e financeira (cf. José Afonso da Silva, Curso de Direito Constitucional, São Paulo, Malheiros, 8ª ed., p. 544), dispondo, assim, de competência para organizar o seu próprio funcionalismo, desde que observadas as normas constitucionais aplicáveis aos servidores públicos (CF, artigos 37 a 41) e os preceitos das leis de caráter complementar (cf. Hely Lopes Meirelles, Direito Municipal Brasileiro, São Paulo, Malheiros, 8ª ed., p. 424).     

A Lei nº 12.985/07 acabou equiparando as atribuições dos cargos de nível médio de AGENTE FISCAL TRIBUTÁRIO e AGENTE DO TESOURO MUNICIPAL com as atribuições do cargo de AUDITOR FISCAL TRIBUTÁRIO MUNICIPAL e, ao fazê-lo, incidiu em inconstitucionalidade.

As novas atribuições relacionadas aos cargos de AGENTES violam, por via oblíqua, o postulado constitucional do concurso público, eis que os servidores ocupantes de tais funções não foram selecionados para exercê-las.

Como se sabe, a Constituição Federal consagrou o livre acesso aos cargos, empregos e funções públicas, na forma prevista em lei, e a submissão prévia a concurso público, ressalvadas, evidentemente, as nomeações para cargos em comissão.

Na definição de Adilson Abreu Dallari, concurso público é “um procedimento administrativo aberto a todo e qualquer interessado que preencha os requisitos estabelecidos em lei, destinado à seleção de pessoal, mediante a aferição do conhecimento, da aptidão e da experiência dos candidatos, por critérios objetivos, previamente estabelecidos no edital de abertura, de maneira a possibilitar uma classificação de todos os aprovados” (Regime Constitucional dos Servidores Públicos, São Paulo, RT, 2ª ed., p. 36, apud Celso Ribeiro Bastos, Comentários à Constituição do Brasil, 3º vol., T. III, São Paulo, Saraiva, 1992, p. 67).

É por meio do concurso que se resguarda “a aplicação do princípio da igualdade de todos (CF., art. 37, I) e, ao mesmo tempo, o interesse da Administração em admitir somente os melhores” (Celso Ribeiro Bastos, op. cit., p. 66), afastando-se “os ineptos e apaniguados, que costumam abarrotar as repartições públicas, num espetáculo degradante de protecionismo e falta de escrúpulos de políticos que se alçam e se mantêm no poder, leiloando empregos públicos” (Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo, RT, 16ª ed., p. 370).

Vê-se, neste caso, manifesta incompatibilidade entre o artigo 115, incisos I e II, da Constituição Paulista, e os dispositivos legais ora impugnados, que permitiram verdadeira transformação dos cargos para quais certos servidores foram inicialmente admitidos, e, em conseqüência, investidura sem a realização de concurso público.

Assim é que o AGENTE FISCAL TRIBUTÁRIO, que antes executava vistorias, preenchia e controlava planilhas, preparava processos tributários, elaborava relatórios e notificava contribuintes, passou a executar “atividades inerentes à Administração Tributária”, inclusive constituição, lançamento e fiscalização de tributos.

Da mesma forma, o AGENTE DO TESOURO MUNICIPAL, antes com funções burocráticas análogas, passou a preparar e instruir processos de natureza tributária, constituindo e lançando tributos.

Não houve, como se constata, apenas a modificação da denominação dos cargos. Houve profunda alteração também das atribuições e, praticamente, a igualação das funções correspondentes aos cargos em estudo.

 A realidade que a lei estabeleceu está proscrita pela Constituição do Estado. Como o concurso público é sempre específico para dado cargo, encartado em carreira certa, quem nele se investiu não pode depois, sem novo concurso público, ser trasladado para cargo de natureza diversa ou de outra carreira ou de encargos mais nobres e elevados.

O expediente a que se alude foi algumas vezes adotado, no passado, sob a escusa de corrigir desvio de funções ou com arrimo na nomenclatura de ‘transposição de cargos’. Corresponde a uma burla manifesta do concurso público, pois “permite a candidatos que ultrapassaram apenas concursos singelos, destinados a cargos de modesta expressão – e que se qualificaram tão somente para eles – venham a aceder, depois de aí investidos, a cargos outros, para cujo ingresso se demandaria sucesso em concursos de dificuldades muito maiores, disputados por concorrentes de qualificação bem mais elevada” (Celso Antônio Bandeira de Mello, Regime Constitucional dos Servidores da Administração Direta e Indireta, São Paulo, RT, 1995, p. 55).

É verdade que os Municípios dispõem de ampla competência para proceder à criação, à transformação e à extinção dos seus cargos, como, aliás, ponderou o Sr. Prefeito.

O que não se admite é evocar a autonomia administrativa (CF, artigo 30, inciso I) como justificativa para que o Município aprove leis como a da espécie, e que, na prática, equipararam cargos de nível médio com o cargo de AUDITOR, cujo provimento demanda nível superior e requisitos especiais.

A propósito do tema, o STF já assentou que “o provimento de cargos públicos tem sua disciplina traçada, com vigor vinculante, pelo constituinte originário, não havendo que se falar, nesse âmbito, em autonomia organizacional dos entes federados” (STF, RTJ 154/45).

Também se afigura manifesta a violação do artigo 111 da Constituição do Estado de São Paulo, que impõe à administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes do Estado, o dever de estrita observância, na realização de suas atividades, dos princípios constitucionais da legalidade, finalidade, impessoalidade e moralidade.

Bem a propósito, aliás, o Colendo Supremo Tribunal Federal já teve a oportunidade de assentar que a transferência de servidores para outros cargos ou para categorias funcionais diversas traduzem, quando desacompanhadas da prévia realização de concurso público de provas ou de provas e títulos, formas inconstitucionais de provimento no serviço público, pois implicam o ingresso do servidor em cargos diversos daqueles nos quais foi legitimamente admitido (STF, RDA 196/107).

Assim também:

“Embora, em princípio, admissível a “transposição” do servidor para cargo idêntico de mesma natureza em novo sistema de classificação, o mesmo não sucede com a chamada “transformação” que, visto implicar em alteração do título e das atribuições do cargo, configura novo provimento, a depender da exigência de concurso público, inscrita no art. 37, II, da Constituição” (ADI 266, Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 06/08/93).

A transformação dos cargos questionados, consistente em nova denominação e feixe de atribuições, não se sustenta diante da Constituição Bandeirante, daí porque se espera desse Sodalício decisão que restaure o status quo anterior das funções afetas aos cargos de AGENTE FISCAL TRIBUTÁRIO e AGENTE DO TESOURO MUNICIPAL.

Em decorrência desse encaminhamento, será forçoso reconhecer a inconstitucionalidade do art. 54 da Lei nº 12.985/07, pois a extensão do prêmio de produtividade aos cargos de nível médio tem como razão de ser a indevida equiparação de atribuições que a lei concretizou.

Diante do exposto, opinamos pela procedência da presente ação direta de inconstitucionalidade, declarando-se:

(a)             a insubsistência do rol de atribuições dos cargos de AGENTE FISCAL TRIBUTÁRIO e de AGENTE DO TESOURO MUNICIPAL, para o restabelecimento das atribuições originárias, previstas na Lei nº 12.012/04; e

(b)             a insubsistência do art. 54 da Lei nº 12.985/07, que estendeu aos cargos questionados, pela alteração dos art. 3º., 5º. e 12 da Lei 9.146/96, o prêmio de produtividade a que faz jus o Auditor Fiscal Tributário Municipal.

 

São Paulo, 14 de maio de 2009.

 

 

        Maurício Augusto Gomes

        Subprocurador-Geral de Justiça

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